Roma, Itália, outubro/2014 – Costuma-se dizer que as boas notícias interessam menos ao público do que as más, e que por isso os meios de comunicação são inundados por informações sobre desgraças e catástrofes humanas ou naturais.
Felizmente, há exceções: o informe lançado no dia 16 de setembro pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), que registra uma importante redução da fome no mundo, teve uma vasta divulgação internacional com mais de dois mil artigos publicados, inclusive nas grandes mídias.
Algumas das matérias expressaram surpresa sobre esse avanço contra a fome, porque existia um estado de opinião que supunha um aumento da miséria e da fome no mundo.
O êxito de mídia correspondeu à importância da notícia, não só pelo avanço em si, mas também por revelar a tendência para uma posterior diminuição da fome.
De fato, recente estimativa da FAO indica que a redução global da fome continua. Para o período 2012-2014 calcula-se o número de pessoas cronicamente desnutridas em 805 milhões, cem milhões a menos do que na década anterior e 209 milhões a menos do que no período 1990-1992.
Um aspecto que não foi suficientemente analisado pelos veículos de comunicação é que 63 países já superaram o primeiro dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), de reduzir a fome pela metade no período 1990-2015, e que são numerosos os países que ainda têm um ano para atingir essa meta.
Na verdade, apesar do progresso alcançado, há marcadas diferenças entre as diferentes regiões.
A África subsaariana é a região do mundo que sofre mais fome e só registrou modestos avanços nos últimos anos, já que uma em cada quatro pessoas ainda sofre desnutrição. Em vários países do norte da África, a situação é muito melhor e os níveis de desnutrição são baixos.
Na Ásia, a região mais povoada do planeta, encontra-se o maior número de famintos, também com diferenças internas: poucas melhoras na Ásia meridional, bons avanços na Ásia oriental e no Sudeste Asiático.
A América Latina e o Caribe exibem progressos muito rápidos, particularmente no sul do continente.
Naturalmente, uma das principais causas desses resultados é o estímulo das políticas públicas, algumas originais e outras inspiradas em casos de sucesso, como o programa Fome Zero do Brasil.
Mas vemos que na guerra contra a fome só se venceu algumas batalhas e ainda temos um longo caminho pela frente.
Para cantar vitória faltam mais esforços e melhor coordenação entre os mesmos atores que já tiraram da miséria milhões de pessoas: governos e organizações internacionais, os atores não estatais, a opinião pública e quem a informa, os meios de comunicação.
Então, como informar sobre esses processos, cuja tendência é claramente positiva para os destinos da humanidade, e não se limitar a publicar os dados que os informes das organizações internacionais apresentam sobre a situação?
A resposta está exatamente ali, esses números não podem ser lidos como um acontecimento pontual, mas como um processo de mudanças com múltiplos atores, públicos e privados, para uma total compreensão.
Por que a mídia não dá mais atenção a esses temas que cada vez se colocam com mais força na agenda global informativa? Quem pode pôr em dúvida que a segurança alimentar, as perdas pelos desperdícios de alimentos, ou as políticas de nutrição não sejam assuntos de interesse para a opinião pública internacional?
Somos conscientes das gigantescas mudanças que ocorrem no campo da comunicação, somados aos efeitos que a profunda e prolongada crise econômica desfechou a inúmeros veículos de comunicação.
Menos meios de comunicação escritos, jornais com menos páginas, menos jornalistas nas redações, multiplicação dos meios digitais multimídia, dificuldades dos jornalistas em enfrentar novos temas em profundidade pelos limites dos processos de formação nas universidades talvez sejam alguns dos pontos que devem ser levados em consideração na presente situação.
Isso está presente na atual geração, mas, sobretudo nas novas gerações que terão a responsabilidade de informar mais e melhor sobre esses temas.
Em poucas semanas haverá um novo desafio de comunicação, a Conferência Internacional sobre Nutrição, a segunda após 22 anos, que acontecerá em Roma, entre 19 e 21 de novembro.
A convocação da conferência afirma que apenas se comprometer não é suficiente, é apenas o começo. A conferência desenhará o contexto para que os países possam transformar seus compromissos em ação e em impacto. Não se poderia ter escolhido uma oportunidade melhor do que esta para essa reunião.
Este é o momento em que os governos negociam a segunda série dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), denominados Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que começarão a ser aplicados no próximo ano, precisamente para erradicar a fome e a miséria no mundo.
É evidente que também neste caso não se trata apenas de informar sobre o desenvolvimento da conferência, mas também de enfrentar os grandes nós deste debate estratégico para o crescimento de sociedades mais sadias e equilibradas, na qual a responsabilidade pública dos governos é chamada a desempenhar um papel determinante. Envolverde/IPS
* Mario Lubetkin é diretor de Comunicação Corporativa da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).