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Novo presidente para um país partido

Novo presidente nigeriano, Goodluck Jonathan.

Lagos, Nigéria, 31/5/2011 – Os atentados com bomba do final de semana na Nigéria foram uma dura lembrança para o novo presidente, Goodluck Jonathan, de que o país mais populoso da África continua fortemente dividido. As explosões ocorreram poucas horas depois de Jonathan fazer seu juramento como mandatário. Pelo menos dez pessoas morreram e mais de uma dezena ficaram feridas em um atentado contra uma base militar na cidade de Bauchi, e outras três teriam morrido em um ataque em Zuba, nos arredores da capital.

Mais de 800 pessoas morreram na violência pós-eleitoral que começou no Norte do país, em abril passado. O presidente criou na época um grupo para investigar os fatos, mas observadores duvidam que possa conseguir muito. Kafanchan, uma localidade do Estado de Kaduna, no Norte, onde havia um grande número de partidários, tanto de Jonathan quanto de seu principal rival, o general da reserva Muhmmadu Buhari, foi uma das mais afetadas pela violência.

“Em Kafanchan e localidades vizinhas, as pessoas não podem dormir direito porque todos os dias estão conscientes do fato de que alguém pode cortar suas gargantas”, disse à IPS o pastor Emmanuel Nuhu Kure, diretor do grupo cristão Throneroom Ministry, nessa localidade a 200 quilômetros da capital, Abuja. Quando os resultados eleitorais mostraram que Jonathan, procedente do Sudeste de maioria cristã, vencera Buhari, líder da maioria muçulmana do Norte, os partidários deste último denunciaram fraude na votação. O partido de Buhari, o Congresso para a Mudança Progressista, apresentou uma petição junto ao Tribunal de Apelações de Abuja solicitando a anulação das eleições em 24 dos 36 Estados do país. O partido disse que havia clara evidência de que Jonathan não era o verdadeiro ganhador.

“Não há atividade econômica em Kafanchan agora. As casas foram destruídas, o mercado foi incendiado. A maioria das casas cristãs foi incendiada e toda a economia ruiu. Precisam recomeçar do zero”, disse Kure. Por sua vez, o secretário do grupo Muçulmanos Indígenas Jama’a Ummah, Alhaji Saleh Jema’a, responsabilizou os cristãos pela violência. “Os muçulmanos foram atacados ao acaso, e destruíram suas propriedades”, disse aos jornalistas.

As duas partes acusam a polícia de não intervir rapidamente para deter os confrontos, nos quais teriam sido usadas armas de grosso calibre. Kure, que presenciou choques entre cristãos e muçulmanos na localidade onde nasceu, disse que se trata de um conflito de longa data. “A religião e a política estão misturadas. A crise é um reflexo da religião e da política. Por um lado, ouve-se pessoas dizendo que lutam pela religião, por outro ouve-se os que dizem lutar por poder político”, acrescentou.

Responder às diferentes reclamações neste país tão diverso será um dos grandes desafios de Jonathan nos próximos quatro anos. A Nigéria está dividida quase perfeitamente pela metade entre o Sul cristão e o Norte islâmico. As duas partes lutam por poder político em nível nacional. A competição pelo controle às vezes é dura, particularmente em localidades centrais como Kafanchan e Jos, onde há grandes populações, tanto de cristãos quanto de muçulmanos.

Kure, que perdeu dois membros de sua igreja durante a violência pós-eleitoral de abril, disse estar cansado de rezar pelas famílias que perderam seus entes queridos. “Pode a minha gente acreditar que o governo a protegerá ou deve se preparar para o pior? E preparar-se para o pior significa que devem começar a conseguir suas próprias armas para lutar”, acrescentou. Este mesmo sentimento foi expresso em outras partes do país.

Para alguns grupos, como a Coalizão Nigeriana para o Tribunal Penal Internacional, os esforços do governo para investigar a violência são um exercício inútil. “Legalmente, o grupo que criou não tem o poder de obrigar pessoas a deporem, o que significa que foi criado para dar a impressão de que se está fazendo algo”, disse à IPS o presidente da Coalizão, Chino Obiagwu. Envolverde/IPS