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Pequenos agricultores buscam chegar aos mercados

Especialistas dizem que, embora tenha melhorado o apoio aos pequenos produtores africanos, estes ainda necessitam de acesso aos mercados. Foto: Stanley Kwenda/IPS

 

Arusha, Tanzânia, 28/9/2012 – O investimento em infraestrutura rural e o apoio a milhões de pequenos agricultores africanos aumentaram na década passada. Mas a consequente maior produção agora precisa de um melhor acesso aos mercados. O presidente do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Ifad), Kanayo Nwanze, disse que nas áreas rurais da África existem as condições para receber investimentos com oportunidades sem precedentes.

“A África tem o maior crescimento populacional e a mais alta taxa de urbanização do mundo”, disse Nwanze aos delegados presentes ao Fórum para uma Revolução Verde Africana, que terminou no dia 28 de setembro, na cidade tanzaniana de Arusha. Os governos africanos, seus sócios para o desenvolvimento e os agroindustriais concordam que a chave para aumentar a produção é contar com melhores sementes e fertilizantes, bem como melhorar a infraestrutura, como estradas e irrigação.

No entanto, muitos produtores carecem de armazéns, de lugar para o processamento e meios de transporte para suas colheitas. O setor privado pode conectá-los com os mercados comprometendo-se a adquirir sua produção. Em Moçambique, a multinacional agroindustrial indiana Olam International tem uma concessão de 850 mil hectares por 20 anos, não longe do porto de Beira. Possui acordo com dois milhões de agricultores em cerca de 20 países.

“Não havia nada ali há quatro anos”, recordou M. D. Ramesh, gerente de operações da Olam para a África oriental. “Agora temos 60 mil agricultores trabalhando em 60 mil hectares”, afirmou à IPS. A Olam oferece aos agricultores crédito, sementes e fertilizantes, e depois compra suas colheitas. O problema inicial foi que muitos produtores não sabiam como cultivar algodão. A empresa organizou demonstrações para capacitá-los. O resultado ainda não é ótimo, admitiu Ramesh, mas a colheita aumentou de 300 quilos por hectare iniciais, há seis anos, para 600 atualmente.

A título de comparação, os produtores mais experientes com os quais a Olam trabalha no Zimbábue colhem 1,2 toneladas. “Considerando que trabalhamos sem infraestrutura, nem telefones, nem bancos, isto significa que todas as transações são feitas em dinheiro. É um desafio”, disse Ramesh. Entretanto, acredita que até 2015 se estará trabalhando em cerca de cem mil hectares com 120 mil agricultores produzindo entre 60 mil e 70 mil toneladas de algodão por ano, o que representará cerca de US$ 40 milhões depois do processamento.

“O maior risco com os pequenos agricultores é que, quando se dá um crédito, não há solução se algo sai errado, e costuma acontecer. Contudo, com o tempo se desenvolve uma dependência mútua”, explicou Ramesh. Carter Coleman é diretor-geral da Agrica, uma companhia na Tanzânia totalmente diferente e em escala completamente distinta, mas que enfrenta os mesmos riscos. “A agricultura é capital intensivo, de alto risco, e oferece benefícios de longo prazo. Muitos investidores ouvem isso e fazem na porta”, acrescentou. Mas, ele não.

A Agrica foi fundada em 2005 com a intenção de criar padrões para uma agricultura comercial e sustentável na África oriental. Seu único projeto é o arrozal de Kilombero, de 5.800 hectares, na Tanzânia, criado em um local abandonado de uma iniciativa entre este país e a Coreia do Norte. O Kilombero Plantations Limited (KPL) é um centro inovador, onde não se remove a terra e se faz fertilização aérea e uso eficiente da água. Conta com um moinho que funciona graças a uma mini-hidrelétrica, tudo segundo a filosofia de seus proprietários, a Agrica.

Também ajuda cinco mil pequenos produtores da região a passarem de uma agricultura de subsistência para a venda de excedentes até 2016. Há dois anos a KPL trouxe um especialista da Índia para capacitar agricultores do Vale de Kilombero no cultivo intensivo de arroz. A técnica, desenvolvida há anos por um padre jesuíta em Madagascar, consiste no cultivo sistemático de sementes, cuidadosamente escolhidas, em covas de 25×25 centímetros.

Isto permite triplicar a produção e reduzir a quantidade de sementes empregadas, bem como o tempo necessário para cultivar e limpar a terra. Foram capacitados 15 agricultores, e cada um testou o novo método durante uma temporada em um terreno de 30×30 metros. A experiência teve resultados excelentes. No ano seguinte foram capacitadas mais 365 famílias, e os participantes do primeiro grupo ampliaram a área cultivada para meio hectare.

O maior volume de arroz produzido dificultou a colheita, pois simplesmente não havia mão de obra. “Trouxemos duas colheitadeiras do Vietnã para ajudar. Cada uma colhia menos de meio hectare em três horas, o que na mão levaria três dias”, contou Coleman. “E sai 20% mais barato para os agricultores. Agora queremos mais algumas”, acrescentou.

Os produtores estão contentes, mas a KPL não tem o mesmo sucesso. A companhia compra arroz sem processar ao preço de mercado, mas o custo do grão com casta duplicou desde o ano passado, chegando a US$ 446 a tonelada. Por outro lado, o arroz moído que a KPL vende aumentou apenas 40%, o que não deixa margem à companhia sobre o que acaba levando para Dar es Salaam, capital da Tanzânia.

Coleman também lamentou que a falta de infraestrutura prejudique a empresa. Transportar pela estrada sem pavimentação que vai do Vale de Kilombero para o mundo exterior na época das chuvas é um pesadelo, afirmou. “Onde estão as estradas, o fornecimento de água, a eletrificação, os armazéns para reduzir as perdas após a colheita?”, perguntou Nwanze. “Onde está a boa governança para gerir maiores níveis de fundos. Não vou dizer tudo que de bom fizemos ou fazemos, mas vou desafiá-los a fazer mais”, ressaltou. Envolverde/IPS