Política para etanol na contramão da lógica da economia

Ao anunciar medidas de apoio à produção e estoque de etanol, governo diz que suspendeu temporariamente a decisão de reduzir do álcool misturado à gasolina. Bom para a qualidade do ar.

A redução da mistura de etanol na gasolina, teria benefício pequeno no preço, porque o preço do etanol continuará pressionado e aumentará o preço da gasolina na bomba. Além disso, em algum momento, a Petrobrás terá que descongelar o preço da gasolina ao distribuidor, porque já enfrenta enormes desequilíbrios no seu balanço. A medida teria muito mais impacto negativo na qualidade do ar, do que benefício no controle da inflação.

As medidas anunciadas mostram que o Ministério das Minas e Energia não entendeu nada do que está se passando no mercado de etanol. Pôs o olho na produção – usina – e no estoque – do álcool – e a raiz do problema está na oferta de cana. Houve problema de safra aqui e no mundo inteiro por razões climáticas. Nevascas em enchentes no EUA. Furacões no Caribe. Enchentes no Brasil.

A cana 2010-2011 disponível para a produção de açúcar e álcool não foi muito maior que a de 2009-2010, cuja colheita foi afetada por eventos climáticos. Além disso, em muitas regiões, a produtividade da cana está em queda por causa do envelhecimento dos canaviais. A crise financeira deprimiu preços e reduziu o investimento na renovação dos canaviais. A safra de cana de primeiro e segundo cortes, mais produtiva, é menor do que a de cana mais velha, até quinto corte.

O ministério e o governo demonstram que também não entendem a lógica do mercado de açúcar e bioetanol. Ele é cíclico. E mercados com ciclos muito marcados reagem menos a intervenções cujo foco é alterar seu resultado natural.

Com a redução global na produção de alimentos causada por vários anos com eventos climáticos adversos (aqui e aqui) os preços dos alimentos aumentou muito. Houve, claramente, elevação de preços de alimentos por razões climáticas. Os preços do açúcar superaram os do etanol e os produtores calibraram a produção para fazer mais açúcar que álcool.

Este ano, de safras ainda comprometidas, a demanda por etanol está muito forte. No EUA, pela primeira vez o uso de milho para etanol superou o uso para alimentação. A demanda chinesa também está em alta. Na Europa aumentou o consumo de etanol e pela primeira vez se discute seriamente a importação mais aberta. Resultado, preço em alta. Se o Brasil pretende, além de subsidiar a produção, importar etanol, vai comprar em um mercado pressionado, a preços elevados. O custo fiscal das medidas deve superar seu benefício no controle da inflação.

Não dá para fazer mágica com os preços. Sempre dependerão da relação entre oferta e demanda. Intervenções arbitrárias só criam distorções. É o que está acontecendo com a gasolina. Preços sobem e descem. O congelamento da gasolina pela Petrobrás gera desequilíbrios fiscais que têm efeito muito mais durável nas contas públicas e na inflação. A Petrobrás amarga enorme prejuízo. O preço sobe na bomba porque está sendo pressionado pela parcela de etanol.

Não adianta, também imaginar aumento da área de plantio de cana, para atender à demanda. Quando ela cair, a área plantada encolhe. O que o governo deveria estar fazendo é cooperando com os produtores de cana, para tocar um programa intensivo de renovação dos canaviais e aumento de produtividade. É melhor do que aumentar a área plantada.

Melhor ainda seria incentivar o desenvolvimento do etanol de segunda geração, celulósico. Primeiro, porque ele não compete no mercado de alimentos. Tem oferta diferenciada de matéria prima. Parte dela vem de resíduos agrícolas (e não só bagaço de cana) e florestais (aparas de eucalipto, principalmente). Segundo, porque precisamos dominar a produção de etanol celulósico para mantermos a liderança e competitividade no mercado futuro de biocombustíveis. Não é só uma questão de vantagem comparativa. É que o mercado global vai discriminar a favor do etanol de segunda geração porque tem produção especializada e haverá maior número de produtores no mercado. Vai ficar mais competitivo e, provavelmente, surgirão barreiras regulatórias a biocombustíveis derivados de culturas alimentares.

O Brasil continua improvisando na política ambiental e energética e bioenergética. Vai pagar o preço da improvisação, porque os outros países que estão no mesmo mercado que o nosso, estão todos mudando e implementado estratégias de longo prazo. Nós, além de ficarmos da mão para a boca, reagindo às oscilações da conjuntura, insistimos em velhos paradigmas, sem futuro.

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** Publicado originalmente no site Ecopolítica.