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Resiliência local é prioridade da ONU em gestão de desastres

Reunião em uma aldeia, dirigida por mulheres, prepara um “mapa social” da comunidade local. Foto: Naimul Haq/IPS
Reunião em uma aldeia, dirigida por mulheres, prepara um “mapa social” da comunidade local. Foto: Naimul Haq/IPS

 

Bangcoc, Tailândia, 27/6/2014 – A sexta Conferência Ministerial Asiática sobre Redução do Risco de Desastres na Ásia e no Pacífico terminou ontem com uma declaração que enfatiza a participação das comunidades locais na resposta dos governos aos embates da natureza. Realizada todos os anos em colaboração com o Escritório das Nações Unidas para a Redução do Risco de Desastres (UNISDR), a conferência deste ano, organizada pelo governo da Tailândia, foi a última reunião das partes interessadas antes da cúpula mundial no Japão, em 2015, que reunirá os governos para redigir planos pós-2015.

Margareta Wahlstrom, representante especial do secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU) para esse tema, disse na abertura do encontro que a questão necessita de um modelo inclusivo e participativo que permita o trabalho conjunto das comunidades de base e das autoridades locais.

Suas palavras foram bem recebidas por Harjeet Singh, coordenador internacional da ActionAid, organização de desenvolvimento internacional com sede na África do Sul. “Não deveríamos estar desenvolvendo soluções em salas de juntas e conferências como estas”, disse à IPS. “Deveríamos trabalhar com as comunidades, que sabem muito mais como isto as afeta. Muitas vezes há soluções que funcionam melhor”, assegurou.

Em uma entrevista coletiva posterior Wahlstrom disse que a Ásia oriental é um modelo para o resto do mundo, já que suas políticas de redução do risco de desastres nos últimos 20 anos permitiram uma queda importante na mortandade como consequência das ameaças naturais. Segundo Wahlstrom, a conferência abordou a questão fundamental de como conseguir o diálogo entre as comunidades de base, que já realizam o trabalho árduo de mitigação e adaptação, e os responsáveis políticos nacionais com a finalidade de influir na agenda de desenvolvimento.

Em preparação para o encontro no Japão, em março de 2015, a Declaração de Bangcoc exorta os governos e as partes interessadas a melhorarem a capacidade de recuperação em nível local mediante a institucionalização das estratégias comunitárias integradas ao desenvolvimento. Também recomenda a inclusão das redes de voluntários e comunitárias e o fortalecimento do papel das mulheres como uma força na criação de resiliência em nível local. O documento destaca ainda a necessidade de adoção de fortes medidas de transparência nas relações entre a comunidade e os governos locais.

A Tailândia incorporou o conceito de “economia de suficiência” do rei Bhumibol Adulyadej no documento, que destaca a importância do modelo de desenvolvimento centrado nas pessoas como forma de “reduzir o impacto da incerteza e aumentar a autoimunidade das comunidades locais”. A economia de suficiência, baseada nos princípios budistas da moderação, da auto-suficiência e da sustentabilidade, promove um modelo econômico comunitário que rechaça a cobiça, a superexploração e o desperdício.

O Marco de Ação de Hyogo (HFA2), que a conferência de Bangcoc adotou como modelo para a contribuição que a região fará na cúpula do Japão em 2015, deu máxima prioridade à construção da resiliência comunitária na gestão do risco de desastres. No processo de consulta para o HFA2, que aconteceu entre março de 2012 e maio de 2013, a ênfase se deslocou da redução das vulnerabilidades para o aumento da resiliência. Isto implicaria a devolução de autoridade do nível de governo central para o local e o uso de plataformas de múltiplos interessados.

Isto é particularmente importante na região da Ásia-Pacífico, onde, segundo documento elaborado para a reunião de Bangcoc pela UNISDR, a quantidade de pessoas expostas às inundações anuais passou de 29,5 milhões para 63,8 milhões nos últimos quatro anos, enquanto o número de habitantes de zonas propensas aos ciclones passou de 71,8 milhões para 120,7 milhões.

Invariavelmente, as mais prejudicadas são as pessoas pobres e as comunidades de baixa renda que vivem nos lugares mais vulneráveis à mudança climática, como os assentamentos de moradias informais e as zonas costeiras.

“Temos que ser inovadores e pensar com criatividade para conseguir a reforma da governança no nível da comunidade”, declarou em Bangcoc o legislador de Bangladesh, Saber Chowdhury, para quem o próximo ano é decisivo, com três grandes conferências internacionais abordando a agenda de desenvolvimento pós-2015. “Quanto mais crescimento temos, mais problemas geramos. Na medida em que a Ásia cresce precisamos de coerência política, prestação de contas e transparência”, acrescentou.

Stefan Kohler, do grupo de infraestrutura sustentável do Escritório das Nações Unidas de Serviços para Projetos, disse à IPS que um componente fundamental de todo o processo é a consulta comunitária. “São eles que participarão do uso da infraestrutura de redução de riscos de desastres criada para eles, e nós devemos entender suas necessidades para podermos incorporá-las ao processo de desenho”, afirmou.

Por exemplo, o Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (Pnud) definiu o Nepal como o quarto país mais vulnerável às consequências da mudança climática. Embora este país tenha desenvolvido planos de ação nacional referentes à gestão de desastres desde 1996, só recentemente melhorou a participação em nível local. O subsecretário do Ministério de Assuntos Federais e Desenvolvimento Local do Nepal, Gopi Khanal, explicou em um painel durante a conferência em Bangcoc que o governo passou a responsabilidade da gestão da redução de riscos de desastres para o nível comunitário.

Por meio de fóruns da sociedade civil e de 3.625 conselhos de desenvolvimento das aldeias que funcionam nas estruturas dos governos locais, o governo central criou um sistema de troca de informação que inclui o plano nacional, de distrito e das aldeias. “A integração da gestão do risco exige a coordenação entre os diferentes níveis de governo, bem como a distribuição dos recursos financeiros”, acrescentou.

Becky Jay Harrington, da Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e da Meia-Lua Vermelha, com sede no Nepal, afirmou à IPS que o plano-piloto que é implantado em sete dos 75 distritos do país destinou uma considerável quantidade de recursos financeiros públicos para a gestão comunitária do risco de desastres. O orçamento total do projeto é de US$ 2,5 milhões. Envolverde/IPS