Enquanto segmentos da sociedade civil lutam contra governos para que esses se responsabilizem pelo combate efetivo às mudanças climáticas, um outro grupo vem encontrando soluções para resolver problemas criados pelo desenvolvimento a qualquer preço. A dianteira desse jogo de conciliar a preservação com o crescimento econômico está acelerado, rápido e já mostra um placar de desempate. É que diante das oportunidades que a crise ambiental apresenta, investidores e empreendedores começam a aliar a responsabilidade socioambiental empresarial ao que as companhias (ainda) buscam em primeiro lugar: o lucro.
Só para ficar no óbvio, a preservação de ambientes naturais nativos – como o mercado de carbono, por exemplo –, promete movimentar anualmente centenas de milhões de dólares – quem sabe bilhões – no país. Essa possibilidade de ganhos por meio de áreas com florestas já está gerando um novo tipo de aquecimento no mercado imobiliário. Não é raro encontrar em jornais e na internet anúncios de venda de áreas verdes voltadas à conservação.
O agrônomo Karl Lenoch, que já assinou cerca de 20 projetos para viabilizar a venda de crédito de carbono brasileiro para a Europa, assegura que o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), previsto no Protocolo de Kyoto, é uma ótima possibilidade de se ganhar dinheiro e ainda manter a biodiversidade intacta. Somente em um de seus projetos – uma propriedade de 540 mil hectares no Maranhão, onde 200 mil deles devem gerar créditos de carbono – a União Europeia pagará até R$ 92 milhões por ano, com uma garantia efetiva de R$ 74 milhões.
Outro caso vem do município de Dom Eliseu (PA), onde está uma das áreas mais devastadas da Amazônia. Lá, como informa a reportagem “Fundos provados investem em plantio”, publicada no dia 23 de dezembro pelo jornal Valor, cerca de R$ 300 milhões já foram investidos em 68 fazendas de gado e soja, que estão sendo convertidas em eucalipto ou tendo suas matas nativas restauradas. Enfim, começa-se a dar um valor decente aos serviços que a natureza presta gratuitamente aos humanos.
Mas se já tem gente lucrando com o interesse dos europeus pelo carbono das florestas, há quem perceba também que dá dinheiro investir nas empresas que apresentam soluções para problemas ambientais e que ofereçam inovações tecnológicas.
Se em 2004 não havia ninguém de olho nesse tipo de oportunidade, em 2009, ano em que o tema ganhou grande destaque com a COP15, a Conferência Climática da Organização das Nações Unidas (ONU), realizada em Copenhague, o cenário começou a mudar. Como explica André Carvalho, professor da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas, centenas de fundos de investimentos que captam recursos no exterior estão apostando em negócios verdes com a esperança de obterem ganhos maiores dos que os oferecidos pelos bancos.
O Banco Mundial também está abrindo os olhos para esse mercado. De acordo com Joaquim Figueiredo Lima, da International Finance Corporation (IFC), braço da entidade que atua em investimentos no setor privado, o capital para negócios associados a inovações em tecnologias limpas, deverá aumentar de 10% a 30% na América Latina.
Tudo isso leva a crer que o mercado para empresas que pesquisam, descobrem e utilizam tecnologias voltadas ao contexto socioambiental, respeitando os preceitos da sustentabilidade, e, tão importante quanto isso, geram lucro, está se tornando cada vez mais interessante no Brasil.
Esta visão é reforçada pelo relatório The Science, Technology and Industry Outlook 2010, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD). O documento mostra que o país, assim como a China, a Indonésia e a Índia, é um dos mais promissores na adoção de estratégias que englobam novas tecnologias e inovações sociais.
Todo isso mostra que o Brasil já não é mais um mero coadjuvante na produção de tecnologias e começa a despontar como referência mundial em diversos setores. Para se ter uma ideia, o número de patentes relacionadas a energias renováveis registradas pelos BRICs (grupo de países que reúne Brasil, Rússia, Índia e China) foi o dobro das registradas pelos Estados Unidos e Japão, os campeões de patentes do mundo.
Além das boas ideias
Apesar de toda essa atratividade do mercado sustentável brasileiro, é sabido que somente as iniciativas bem estruturadas conseguem os investimentos necessários para o desenvolvimento dos negócios. Isto significa que boas ideias ou bons produtos sozinhos não são suficientes. É aí que boa parte dos empreendedores tupiniquins acabam tropeçando. Eles sabem do potencial de seus produtos e serviços, mas têm pouco conhecimento de mercado e/ou gestão profissional.
Com o objetivo de ajudá-los a acabar com esses entraves, o World Resources Institute (WRI) criou o Programa New Ventures, que busca auxiliar novos empreendedores a potencializar o desempenho de seus empreendimentos focados na responsabilidade socioambiental. A iniciativa oferece apoio técnico na formulação de planos de negócio e ainda aproxima-os de investidores interessados nesse nicho.
Uma das formas que a iniciativa promove isto é por meio do Fórum de Investidores em Negócios Sustentáveis. A sétima edição do evento foi realizada em dezembro, na capital paulista. Na ocasião, seis empresas foram selecionadas para apresentar suas iniciativas a um grupo seleto de pessoas influentes e detentoras de capital: a Ecotelhado, a Ecoplasma, a Ecospirit, a Care-Eletric, a Meta-Biomassa e a Sharewater.
A Ecotelhado e a Sharewater receberam menção honrosa pelo trabalho desenvolvido. A primeira utiliza pequenos pedaços de solas de sapato na construção de telhados verdes, uma espécie de jardim localizado no telhado dos prédios, além de outros produtos, como ecopavimentos e ecoparedes. Já a Sharewater oferece soluções para diminuir o desperdício de água, que chega a 50% aqui no Brasil.
Outra atração foi a Care-Eletric, uma companhia de desenvolvimento de novas tecnologias, incubada no Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia (Cietec) da Universidade de São Paulo (USP). Ela foi a primeira empresa sul-americana a ter um projeto de tecnologia aprovado no Fórum Econômico Mundial de Tecnologias Pioneiras, em Davos, na Suíça. A proposta é gerar energia elétrica que aproveita o fluxo das águas dos rios, em harmonia com o ecossistema onde está inserida. É uma autêntica geração de energia renovável, sem a necessidade de obras de alto impacto ambiental ou inundação de terras.
Para apresentarem seus negócios aos investidores, essas empresas tiveram que vencer vários obstáculos, convencendo especialistas do quanto a sua proposta vale pena. De todos os inscritos no programa, são escolhidos apenas dez empreendimentos para a fase de Mentoring. Nessa etapa, que dura seis semanas, os empresários recebem o apoio do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getúlio Vargas (GVces) e dos parceiros para o aprimoramento de seus planos de negócios.
Na avaliação do coordenador do GVces, Mario Monzoni, a introdução de procedimentos com responsabilidade socioambiental é uma questão inexorável para o mundo corporativo. Segundo ele, as mudanças na economia estão vindo mais rápido do que se imagina e as empresas precisam se adaptar, tanto no seu portfólio, quanto em suas práticas, adotando mais sistemas de eficiência energética, energias renováveis, entre outras inovações. “Este comportamento é uma obrigação para as empresas manterem-se competitivas. Caso contrário, elas serão questionadas e perderão espaço no mercado”, conclui o professor.
Para participar do Programa New Ventures, a empresa precisa ser brasileira e operar no Brasil.
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Outros endereços para aprofundar o assunto
Alguns links de instituições investidoras de negócios socioambientais
* Conteúdo gentilmente cedido pelo Sesi – Serviço Social da Indústria.
** Publicado originalmente no site Mercado Ético.