Rio de Janeiro, Brasil, maio/2014 – Em 2013 o produto interno bruto (PIB) do Brasil cresceu 2,3%, 2,7% em 2012 e 1% em 2011. As perspectivas para este ano não são otimistas. No entanto, a inflação se mantém tenazmente em alta: cerca de 6%.
Além disso, a balança de pagamentos mostra crescentes déficits na conta corrente, a que registra as exportações de bens e serviços menos as importações.
A boa notícia provém do mercado de trabalho, que se aproxima do pleno emprego e mostra uma alta de qualidade, com a passagem de trabalhadores do setor informal para o formal, e os consequentes benefícios, como o seguro-desemprego e aposentadoria.
Há uns poucos anos, a economia brasileira era aclamada, junto com a de outros países do Brics (Rússia, Índia, China e África do Sul), como a nova fronteira do crescimento no cenário internacional.
Qual a razão dessa drástica mudança de perspectiva em tão curto período?
As raízes da presente situação estão em uma complexa combinação de dificuldades internacionais, uma condução política pouco eficaz e algumas desgraças.
O fator mais visível que afeta a economia brasileira durante o mandato da presidente Dilma Rousseff, iniciado em 2011, é a conjuntura internacional.
Durante o segundo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (2007-2011), o Brasil foi favorecido por um vento de popa, representado em particular pela vigorosa demanda chinesa por matérias-primas e alimentos. Não só manteve em boa posição a balança de pagamentos como impulsionou o crescimento econômico.
Esse quadro mudou, devido à orientação atual de governo da China, de esfriar e reformar a economia. Esse freio à expansão das exportações evidencia um problema estrutural da economia brasileira, que se acentuou após a derrota da alta inflação em 1994.
Desde aquele ano – salvo breves períodos que interromperam a tendência – a valorização do real foi o fator principal de contenção da inflação. A moeda forte estimulou a importação de bens baratos, bem como conteve o aumento de preços por parte dos produtores locais, temerosos de perder mercados.
Isso significa que desde 1994 o Brasil enfrentou um conhecido dilema: a inflação pode ser mantida baixa valorizando a moeda nacional, ou se pode promover o crescimento industrial desvalorizando a moeda. Mas não se pode alcançar os dois objetivos simultaneamente.
Em consequência, a economia brasileira oscilou entre períodos de intensa “desindustrialização” pela alta do real, e períodos de pressão inflacionária pela queda do real.
Enquanto a economia chinesa crescia em alta velocidade e aumentava as importações de países como o Brasil, foi possível sustentar o crescimento econômico, de modo que o aumento das exportações substituísse o crescimento industrial. Mas a desaceleração da economia chinesa deixou exposto o dilema brasileiro.
A forte dependência da economia internacional caracterizou a economia nacional durante os últimos 20 anos e a recente diminuição do comércio internacional desnudou as limitações da política atual.
Diante da impossibilidade de resolver o dilema entre crescimento e inflação, o governo adotou políticas ad hoc que não deram os resultados desejados e criaram novos problemas.
Por exemplo, como não conseguiu estabelecer um tipo de câmbio que incentivasse a indústria nacional, o governo concedeu vantagens fiscais a determinados setores.
Essa estratégia, se é que pode ser chamada assim, tem escassa eficácia. Os benefícios são temporais, concedidos geralmente a setores em dificuldades que graças à ajuda se mantêm de pé, mas não investem ou expandem a produção, enquanto subtraem recursos do Estado.
Diante desses exemplos, os empresários deduzem que lhes convém mais fazer lobby do que investir e aumentar a produtividade. O fracasso dessa política induz os partidários da “austeridade” a reclamar o corte de gastos públicos. O resultado é que são eliminados investimentos públicos necessários.
A inabilidade para definir estratégias para a inserção do Brasil na economia mundial foi uma característica permanente dos governos posteriores à ditadura militar (1964-1985) e pode ser consequência, em parte, da realidade criada pelo modo como o sistema político, e sobretudo o sistema partidário, foi reconstruído depois que os militares voltaram aos seus quartéis.
O regime político é claramente disfuncional e reduz muito a capacidade dos governos para instrumentar estratégias coerentes de longo prazo. No Brasil, a política opera em um mercado “varejista” e nesse contexto são viáveis apenas as operações de curto prazo.
Se concedermos a Dilma Rousseff o benefício da dúvida, pode-se afirmar que, embora tivesse uma diáfana visão do que é necessário para vencer as dificuldades da economia brasileira, seria quase impossível realizá-la com o atual regime político.
Na ausência de um ambiente internacional propício, as limitações brasileiras emergem como uma barreira insuperável.
Finalmente, há que se reconhecer o papel desempenhado pela má sorte. Uma prolongada seca que afetou a produção agrícola e a geração de energia hidráulica, principal fonte de eletricidade do país. Isso não só impulsionou a inflação como também deixa sombrio o futuro porque muitas empresas decidem adiar seus investimentos.
Em suma, essa época não é benéfica para o Brasil. E as eleições de outubro não melhorarão o quadro, já que o debate político tende a se polarizar e desaconselha a adoção de medidas importantes durante este ano.
Todos esses fatores levam à conclusão de que a recuperação econômica do Brasil não chegará antes de 2015, no melhor dos casos. Envolverde/IPS
* Fernando Cardim de Carvalho é economista e professor na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).