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Sri Lanka avalia familiares de desaparecidos pela guerra

Protestos diante da sede da ONU em Colombo, durante a visita da Alta Comissária para os Direitos Humanos, Navy Pillay, em setembro de 2013. Foto: Amantha Perera/IPS
Protestos diante da sede da ONU em Colombo, durante a visita da Alta Comissária para os Direitos Humanos, Navy Pillay, em setembro de 2013. Foto: Amantha Perera/IPS

 

Colombo, Sri Lanka, 30/4/2014 – O Sri Lanka iniciou sua primeira pesquisa sobre famílias de pessoas desaparecidas, cinco anos depois do fim da guerra civil na qual morreram 40 mil pessoas nesse país de 20 milhões de habitantes. Espera-se que o estudo produza recomendações de assistência e acabe com o luto de muitos, afirmaram funcionários e membros do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICR) encarregados de realizar a pesquisa.

Em janeiro, o CICR propôs ao governo desse país que estudasse as necessidades das famílias dos desaparecidos nos últimos 25 anos. “Estamos fazendo isso em todo o país a partir deste mês. Nos aproximaremos de uma mostra representativa das famílias dos desaparecidos para compreender quais são suas necessidades”, informou à IPS o diretor da CICR no Sri Lanka, David Quesne. O Ministério do Bem-Estar Social é a contraparte do governo nesse trabalho.

A questão é controversa. A guerra civil no Sri Lanka se desatou no início da década de 1980, quando a organização armada Tigres de Libertação Tamil Eelam (LTTE) começou sua luta por um Estado independente no norte para a minoria tamil. As forças do governo finalmente derrotaram os rebeldes em 2009. O conflito deixou mais de 70 mil mortos e até 40 mil desaparecidos, embora o cálculo sobre o número de pessoas desaparecidas apresente variação.

O CICR só registra os dados dos desaparecidos após receber uma solicitação de busca. Quesne explicou que o CICR recebeu mais de 16 mil pedidos desse tipo que remontam à década de 1990. Em 24 de março, o Conselho de Direitos Humanos da ONU divulgou uma resolução durante reunião especial em Genebra, na qual exorta a Alta Comissária para os Direitos Humanos, Navi Pillay, a iniciar uma investigação sobre as violações de direitos humanos durante a guerra, incluída a questão dos desaparecidos.

O ministro das Relações Exteriores do Sri Lanka, Gamini Peiris Laksham, rejeitou em nome do governo a resolução e garantiu que não apoiaria essa investigação. “Continuaremos com os mecanismos nacionais”, afirmou, destacando o trabalho do CICR e a avaliação das necessidades dos refugiados de guerra, feita em conjunto com a Organização das Nações Unidas (ONU).

Gwenaelle Fontana, encarregada de proteção do CICR no Sri Lanka, explicou à IPS que a pesquisa será feita em toda a ilha e que serão utilizadas uma amostragem de famílias. “A ideia inicial é avaliar as necessidades dessas famílias. Vamos avaliar todos os aspectos (econômicos, administrativos, legais e psicossociais)”, acrescentou. A mostra incluirá as famílias dos membros das forças armadas que figuram como desaparecidos. “Será uma ferramenta valiosa para as autoridades no desenho de políticas que beneficiem essas famílias”, ressaltou Fontana.

Os familiares dos desaparecidos não foram considerados um grupo de necessidades especiais durante a fase de reconstrução posterior à guerra. “Isso é injusto, porque temos necessidades próprias. Temos que buscar nossos queridos desaparecidos e garantir que podemos manter nossas famílias”, disse a mãe de um desaparecido de Kilinochchi, que pediu para não ser identificada.

O governo anunciou planos para ajudar as famílias. Uma comissão presidencial sobre os desaparecidos concluirá seu trabalho em agosto. Até o momento já recebeu 16 mil queixas.

É provável que a pesquisa do CICR termine no final do ano. Segundo funcionários, o relatório final será entregue ao governo para que tome as medidas correspondentes. Entre finais de 2008 e abril de 2009, o CICR evacuou cerca de 14 mil pessoas com necessidade de cuidados médicos. Mais tarde, alguns deles foram registrados como não localizados. “Recebemos pedidos de familiares por evacuados dos quais perderam todo contato e qualquer pista”, disse Quesne. O CICR começou a buscar em janeiro os evacuados que faltam no distrito de Jaffna. No final de março, havia localizado ao menos 26 casos.

Fontana detalhou à IPS que as autoridades preferem emitir “certificados de ausência” para os desaparecidos, em lugar de “certificados de óbito”. O documento facilita os trâmites legais e administrativos, como pagamento de pensões e entrega de títulos de propriedade. “As autoridades demonstraram muito interesse. Mas, como a adaptação do contexto legislativo sempre é complexa, o processo de emissão de ausência levará tempo”, acrescentou. Envolverde/IPS