TERRAMÉRICA - Macaco sauá subsiste em pequeno paraíso privado

Uma floresta jovem, plantada por uma mulher da Amazônia peruana, atraiu cerca de 40 exemplares de um pequeno primata que já não encontra lugares onde sobreviver.

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A espécie Callicebus oenanthe habita somente esta área de selva de San Martín, no Peru.
Juanjuú, Peru, 11 de abril de 2011 (Terramérica).- Uma área de conservação de apenas 23,5 hectares se transformou em abrigo de um animal único e em risco de extinção na região de San Martín: o macaco sauá. Uma mulher que ama a vida resgatou este lugar há 17 anos. Logo se ouve alguns cantos guerreiros. Alguns vêm do Norte, outros do Sul, do Oeste e do Leste. Marcam o território ao amanhecer e procedem de dez famílias de macacos sauá (Callicebus oenanthe), cada uma de quatro membros: pai, mãe e dois filhotes.

 

 

 

“Cada um grita em diferente momento, mas todos entre seis e 7h30”, contou ao Terramérica a jovem bióloga norte-americana Josephine (Josie) Chambers, mostrando emocionada as provas em vídeos e fotos. Sua cor fica entre o acastanhado e o alaranjado e medem 30 centímetros de comprimento. Alguns olham com curiosidade para a câmera, outros se escondem e emitem ruídos em sinal de perigo. Ainda existem e se refugiam na área de conservação privada Pucunucho, na província Mariscal Cáceres de San Martín.

Esta região é uma das três mais desmatadas da Amazônia peruana. Para enfrentar o problema, organizações sociais e moradores conseguiram que o Estado lhes concedesse quatro áreas de conservação com um total de 267.133 hectares, amparando-se na Lei Florestal e de Fauna Silvestre de 2000. Pucunucho faz parte dessa rede para preservar ou restaurar a biodiversidade.

“Surpreende uma floresta jovem como Pucunucho, recuperada em apenas 16 anos, poder ser o refúgio de uma espécie em vias de extinção”, afirmou Josie, que aos 21 anos já teve oportunidade de trabalhar com os macacos colobos de Uganda e os macacos machín de cara branca da Costa Rica. Os sauá podem viver apenas até uma altitude de mil metros, nas áreas baixas onde mais rareiam as florestas, que cederam lugar à agricultura, pecuária e aos centros urbanos.

Pucunucho, por exemplo, está a dez minutos de carro da zona urbana de Juanjuí, capital de Mariscal Cáceres. “É preciso ampliar seu habitat para que não fiquem isolados porque, do contrário, em 30 ou 40 anos desaparecerão por falta de intercâmbio genético”, disse a bióloga. O Projeto Macaco Sauá pretende criar um corredor de 180 hectares. Para isso é necessária a ajuda dos moradores do lugar, pois devem ceder uma parte de seus terrenos.

O corredor ficaria nas áreas laterais da microbacia do Rio Pucunucho, que nasce entre as bacias dos rios Huallaga e Huallabamba. “Sim, estaria disposto a ajudar os macaquinhos”, disse ao Terramérica Isaías Moreno, de 70 anos e morador de Pucunucho. Ele quer seguir os passos de Trinidad Vela, mulher de 74 anos que em 1994 começou o resgate desta floresta cultivando espécies naturais do lugar.

“Houve a mão inteligente da minha mãe, que primeiro buscou plantas propícias como as leguminosas para recuperar o solo, depois cultivou ingá (Inga sp.), buriti (palmeiras Mauritia flexuosa), moenas (Aniba gigantiflora), mogno, tudo em desordem como uma floresta natural”, explicou emocionada ao Terramérica a bióloga Karina Pinasco, filha de dona Trinidad, como é conhecida na região.

A cruzada iniciada por sua mãe permitiu recuperar o caudal do Pucunucho que estava seco. Em 2005, essa água salvou seus vizinhos agricultores de uma forte seca. Hoje, a surpresa são os macacos sauá que se alimentam principalmente de ingá e frutas. “Quando comecei a recuperar a floresta, não pensei que seria um habitat com tanta vida”, disse Trinidad ao Terramérica.

No entanto, as ameaças estão latentes porque os moradores caçam os macacos como alimento e há projetos de desenvolvimento que não consideram o impacto ambiental. Em abril de 2010, a estatal Electro Oriente desmatou parte da área para colocar uma torre de alta tensão sem pedir autorização. Karina fez, então, uma avaliação das espécies de flora e fauna afetadas que chegava a US$ 117.357.

A companhia foi imediatamente denunciada, mas a promotoria do meio ambiente regional notificou Karina há pouco tempo que não houve crime ambiental. Em Pucunucho existe uma grande riqueza de espécies. A equipe de biólogos que investigou os sauá identificou variedades de aves como pavão de monte, tucanos, colibris e jacu cigano, considerados o elo perdido das aves primitivas, uma espécie de répteis emplumados.

“O Peru é um país megadiverso que abriga espécies únicas nessa transição entre a selva e a Cordilheira dos Andes. Há muito a se pesquisar aqui”, disse ao Terramérica o biólogo espanhol César Aguilar. Josie e César chegaram a San Martín enviados pela organização não governamental britânica Neotropical Primate Conservation. Aqui entraram em contato com um grupo de jovens engenheiros ambientais da região que desde 2007 trabalham no resgate do macaco sauá, entre eles Sergio Rodríguez.

“Chamou minha atenção a forma como eles se agrupam e que, ao contrário de outros primatas, é o macho que carrega a cria, não a fêmea”, disse Sergio, do Projeto Macaco Sauá. Segundo as pesquisas deste grupo, a espécie se encontra na zona do Alto e Baixo Rio Mayo e chega até o Huallaga central, em uma extensão de 8.640 quilômetros. “Queremos fazer um circuito turístico para que nossa gente conheça o que temos”, disse o prefeito da província de Mariscal Cáceres, Renán Saavedra, que no dia 4 percorreu logo cedo o Pucunucho e ouviu os cantos guerreiros dos macacos.

* A autora é correspondente da IPS.

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Neotropical Primate Conservation, em português, espanhol e inglês

Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.