Manuel é um empresário de Moçambique. Dirige uma firma de investimentos e participações, que atua em praticamente todos os setores da economia africana. Mora na Namíbia, e até agora todos os investimentos do grupo foram feitos com recursos próprios. Tem uma posição que lhe dá uma visão panorâmica e ao mesmo tempo profunda do que se passa na África. Conversamos recentemente sobre a África e suas relações com a China. Em off, por isso não escrevo seu sobrenome.
“A África está sendo dominada pela China”, me disse ele. É voraz e predatória, acrescenta. Segundo ele, como a China está principalmente interessada em recursos minerais de todo tipo, está encurtando a visão e reduzindo as chances de desenvolvimento na África. Os governos, diz, têm grande interesse nos investimentos em mineração. Geram alta receita para eles, sem custo. Alimentam, também, muita corrupção. Mas não geram progresso. Enchem os bolsos da elite no poder e deixam só buracos. Não promovem outros investimentos, não permitem a diversificação das economias. Os governos trocam os planos de desenvolvimento por concessões de exploração mineral.
Manuel diz que a outra grande área de interesse dos chineses é a madeira. Estão desmatando violentamente. Mas, diz, a China é uma força inevitável para a África, “precisamos descobrir como lidar com ela”. Para entender os chineses e se antecipar aos seus movimentos na África, seu grupo abriu escritórios em Pequim e Xangai. Até investe na China. Ao mesmo tempo, tenta fazer parcerias com grupos brasileiros e sul-africanos. Ele acha que o desenvolvimento da África terá essas três grandes forças: China, Brasil e África do Sul.
No Brasil, vem buscar capacitação científica em áreas em que investe pesado, como logística e energia. Está muito interessado em energia eólica e fotovoltaica e não entende como o Brasil não tem investido fortemente na instalação de usinas eólicas e solares, mas também na pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias para essas duas fontes. “Com o potencial enorme de vento e sol do país, é uma pena e um desperdício”, que não esteja se preparando para ter posição de liderança mundial nesses setores.
Manuel é a cara da nova África que tenta sair dos escombros das guerras civis, da má governança, da degradação social e da corrupção generalizada. Há outros como ele. É claro que, para prosperarem na região, têm que manter boas relações com os governos. “E a corrupção está por todo lado. Nada se faz na África sem corrupção. É uma pena.” Se não falasse português, não chamasse Manuel e não fosse branco, poderia ser confundido com qualquer investment banker contemporâneo, desses que correm o mundo atrás de oportunidades. Mas Manuel é diferente, não só por causa da língua, do nome e da cor. Ele corre o mundo atrás de oportunidades para sua região, a África. Ele se mostra sempre interessado e preocupado com o seu país mas, outro traço que o diferencia, ele pensa na África como um conjunto.
Talvez essa seja a visão apropriada para o Século 21. Uma visão integrada para a África, que leva em consideração sua diversidade, mas sabe que uma parte não se desenvolverá enquanto outra estiver mergulhada no atraso, na violência, na corrupção. Até porque as fronteiras desse continente foram desenhadas pela conveniência colonial.