Sergio C. Trindade* –
A quarta Assembleia do Círculo Ártico teve lugar em Reykjavík (7 – 9 Outubro 2016). Mais de 2 mil pessoas compareceram. Esta série de reuniões anuais foram originadas em 2013, pelo então Presidente da Islândia, Ólafur Grímsson, e pela jornalista estadunidense Alice Rogoff. Essa Assembleia foi concebida como um fórum democrático aberto, onde todos os tipos de ideias sobre o Ártico poderiam ser propostas e discutidas.
Participei em todas elas. Na reunião inicial fiz uma apresentação plenária sobre a mudança climática e a sustentabilidade do Ártico. Em 2014, reuni panelistas do Canadá, Finlândia, França, Rússia e da OCDE para discutir as métricas de sustentabilidade no Ártico. No ano seguinte, o tema foi o Brasil e a sustentabilidade do Ártico e os painelistas foram o Embaixador Flavio Macieira; Prof. Jeferson Simões, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Prof. Carolina Freire, da Universidade Federal do Paraná; Ieda Gomes, consultora internacional de energia baseada no Reino Unido, e eu.
Neste ano, em 7/10, o painel focou em oportunidades emergentes para iniciativas colaborativas entre os BRICS no Ártico. Representantes da Rússia e do Brasil, e remotamente da China (Yao Zhang, Centro de Marítimo e Estudos Marítimos e Polares, Xangai) e Índia (R. K. Pachauri, ex-Presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) participaram. Ninguém da África do Sul participou. A professora Carolina Freire; Celma Hellebust, brasileira com base na Noruega, advogada e consultora empresarial, membro do Conselho de Administração da Câmara de Comércio Brasil-Noruega – BNCC e Vice-Cônsul Honorário do Brasil em Stavanger, Noruega, e eu representamos o Brasil, todos em capacidade individual e às nossas próprias custas.
BRICS: o Oeste global muda-se para o Leste
A noção de BRICs emanou de Jim O’Neill, um banqueiro da Goldman Sachs, que viu semelhanças entre os países dos BRICs e sugeriu, em 2001, o acrônimo BRIC para representar a todos. Cinco anos mais tarde, os BRICs (menos África do Sul, que aderiu apenas em 2010), reuniram-se em Nova Iorque no momento da sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas e formalizaram o agrupamento. A primeira reunião formal teve lugar em Ekaterinburg, Rússia em 2009. O ímpeto inicial era unir forças para melhorar a economia global, que na época estava sofrendo de uma grave recessão. Além disso, os BRICs tinham a intenção de reformar as instituições financeiras internacionais, as chamadas instituições de Bretton-Woods.
Os BRICS são grandes, mas carecem de influência internacional expressiva
A população dos BRICS atinge cerca de 3 bilhões de pessoas. Seu PIB combinado é de cerca de 20% do mundo estimado em US $ 16 trilhões. Detêm cerca de US $ 4 trilhões em reservas financeiras. No entanto, eles não têm muito a dizer na governança internacional, apesar do fato de que dois deles, China e Rússia, são membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Consequentemente, os BRICS oferecem-se como uma alternativa geoeconômica e geopolítica ao atual paradigma de governança global.
Os BRICS são de fato uma alternativa para o sistema de Bretton-Woods. Eles já criaram um banco de desenvolvimento alternativo na forma do Novo Banco de Desenvolvimento, com sede em Xangai, em julho de 2015. Já contam com um escritório regional em Johanesburgo e um memorando de entendimento com o Banco Asiático de Desenvolvimento, assinado em Julho de 2016. Outra opção oferecida pelos BRICS é um arranjo alternativo de reservas financeiras de contingência para facilitar as transações financeiras entre seus membros.
Em suma, os BRICS compartilham preocupação com segurança e com o desenvolvimento econômico. Todos os BRICS, exceto a África do Sul têm grande extensão territorial e economias grandes. Mas, hoje eles já não têm taxas similares de crescimento económico que exibiram no passado. Rússia, China e Índia têm território contíguo no Hemisfério Norte, enquanto o Brasil e a África do Sul estão em diferentes continentes do Hemisfério Sul. Há uma história de tensões entre a Rússia e a China, bem como entre a China e Índia.
Apesar das dificuldades, se os BRICS se dispõem a ter um impacto duradouro sobre assuntos mundiais devem encontrar mais pontos em comum e possibilidades de iniciativas conjuntas. Todos os BRICS estão envolvidos individualmente em trabalho na Antártica. Assim, é um desdobramento natural que os BRICS explorem trabalho colaborativo no Ártico!
Colaboração entre os BRICS no Ártico
Há uma ampla margem para a cooperação BRICS no Ártico. Mas, o primeiro passo seria para o Brasil e África do Sul para se tornarem membros do Conselho do Ártico em condição de Observador, como a China e a Índia já são. Rússia, é claro, é um membro permanente do Conselho do Ártico.
Brasil e África do Sul poderiam considerar juntar os projetos em curso com a China, Índia e Rússia em vários domínios. Em geral, os BRICS podem procurar oportunidades de trabalho conjunto no Ártico em áreas de interesse comum e competência, em ciência, tecnologia, meio ambiente e comércio.
A cooperação científica poderia envolver mudanças climáticas; biologia marinha; glaciologia; geologia, e muitas outras áreas. Iniciativas conjuntas em tecnologia poderiam cobrir as energias renováveis; gestão de metano e dióxido de carbono do permafrost; pesquisa e exploração seguras exploração de petróleo e gás, e outros interesses. Quanto ao meio ambiente, tanto em ambientes físicos quanto humanos, a cooperação poderia considerar concepção e implementação de marcos regulatórios; a expansão de medidas de prevenção de desastres e recuperação, e muitos mais. No comércio e investimento, a maior duração anual da abertura do oceano Ártico está fazendo da região ártica a última fronteira de desenvolvimento. Isso oferece oportunidades para iniciativas de colaboração no sector da pesca, mineração, petróleo e gás, transporte, construção naval, construção de portos, desenvolvimento urbano e turismo.
Entretanto, na recente reunião dos BRICS (Goa, Índia, 15-16 outubro), a ampliação do escopo dos BRICS para desenvolver iniciativas no Ártico é, portanto, uma nova ideia digna de consideração, mas infelizmente não esteve na agenda da reunião de Goa. Nosso país, acredito, necessita ser mais criativo e ousado e explorar novas ideias se deseja perseguir um destino de liderança global e de liderança em desenvolvimento sustentável. (ECO21/#Envolverde)
*Consultor global de negócios sustentáveis sediado em New York. Contribuiu para o Prêmio Nobel da Paz de 2007 concedido ao IPCC