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Crianças e adolescentes na Amazônia

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Foto: Reprodução/ Shutterstock

Por João Meirelles Filho e Thiara Fernandes –

Apesar de os indicadores sociais deste grupo terem melhorado na média nacional, a situação é gravíssima na Região Norte, exigindo atenção do Estado e de empresas

Será infrutífero tratar da sustentabilidade na Amazônia sem enfrentar as necessidades das crianças e dos adolescentes e lidar de frente com a cultura machista. Se, nos últimos 20 anos, o Brasil conseguiu melhorar os indicadores sociais para este grupo, a situação na Amazônia é gravíssima. Descrevemos questões que exigem atenção do Estado e de empresas, levando em conta que as dimensões continentais, a dispersão populacional e seu isolamento exigem maior perseverança e capilaridade das políticas públicas.

A situação torna-se mais preocupante quando tratamos de indígenas, quilombolas, povos e comunidades tradicionais, com mais de 5 milhões de amazônidas. Mesmo o que parece simples – como o registro de nascimento em cartório (primeiro ato de cidadania) hoje gratuito – torna-se dramático. Enquanto no Brasil registram-se 94,74% das crianças até um 1 ano de vida, na Amazônia quase 20% das crianças não têm registro e, entre indígenas, 40% [1]. Apresentamos a seguir quatro indicadores, entre os mais críticos:

Exploração sexual infantil

Não se restringe a regiões isoladas. Esse crime ocorre de forma velada e sistêmica, sem punição aos abusadores. A maioria das mães e de cuidadores desconhece seus direitos e os canais de denúncia. Muitas mulheres que passaram por esse tipo de abuso, ao não encontrar uma solução, entendem que, mesmo com a denúncia, nada se resolve. Daí a lei do silêncio imperar nas pequenas vilas e cidades amazônicas. A fragilidade dos conselhos tutelares, que raramente recebem atenção da gestão municipal, agrava a situação.

O impacto das grandes obras

Nos territórios de influência de hidrelétricas, mineração, portos etc., com presença majoritária de homens entre 18 e 35 anos morando longe de suas famílias, a exploração sexual infantil é ainda maior. Líderes na arrecadação de impostos e royalties de gás, petróleo, bauxita (alumínio) e minério de ferro, os municípios de Coari, no Amazonas, e de Altamira, Barcarena, Juruti, Parauapebas e Paragominas, no Pará, vivem um boom econômico, mas registram índices de violência incompatíveis com sua capacidade material de agir.

Exploração do trabalho doméstico

Enquanto o Brasil evolui nos direitos dos trabalhadores domésticos, a região reproduz práticas da escravidão. Anúncio no Diário do Pará (em 2 de maio) causou polêmica: “Casal evangélico precisa adotar uma menina de 12 a 18 anos que resida, para cuidar de uma bebê de 1 ano que possa morar e estudar, ele empresário e ela também empresária. Apresentar-se com os Pais ou Responsável (sic)” [2]. Mesmo desmentido, o anúncio demonstra o forte machismo e a banalização do trabalho infantil doméstico, que recai em meninas desde os 10 anos. Meninas “adotadas de forma ilegal”, porque são pobres e servem para “criar” os filhos de famílias no meio urbano, são mais comuns do que parece, e a prática é aceita socialmente. No meio rural, o trabalho doméstico é ainda mais velado, visto que não há registros. São temas urgentes para campanha pública. Em paralelo, é preciso agir diretamente com as meninas em situação de trabalho, para que reconheçam seus direitos.

Gravidez na adolescência

Embora, segundo o IBGE [3], a taxa nacional seja decrescente (de 20,9% em 2000 para 17,7% em 2011), o índice mantém-se alto na Região Norte (de 25,2% a 23,2%). No Pará e Maranhão, mais da metade das grávidas estava na faixa entre 10 e 15 anos. Em cidades das regiões mais excluídas, como o Marajó, conforme o estudo Escuta Marajó [4]– Cachoeira do Arari, Curralinho, Santa Cruz do Arari e São Sebastião da Boa Vista –, 35% das grávidas são adolescentes, o dobro da média nacional. É um indicador relacionado à pouca esperança, à falta de oportunidade e de um projeto de vida e educação. Para seu enfrentamento, é preciso que a educação sexual alcance as residências e as escolas.

Referências

[1] Ministério da Saúde, 2009, Inquérito Nacional de Saúde e Nutrição de Povos Indígenas. O dado para a Amazônia é 82,03% e para os indígenas, 57,9%

[2] Veja mais

[3] IBGE, 2012, Estatísticas do Registro Civil. Gravidez até 19 anos

[4] Escuta Marajó – Diagnóstico Socioeconômico do Marajó, Instituto Peabiru, 2012. A fonte específica deste dado é o Ministério da Saúde – Sinasc, publicado em 2009

* João Meirelles Filho é empreendedor social e escritor, dirige o Instituto Peabiru em Belém. Thiara Fernandes é pesquisadora do Instituto Peabiru, trabalha com agricultores familiares e grupos sociais tradicionais

** Publicado originalmente no site Página 22.