por Samyra Crespo –
No texto anterior ressaltei que há dificuldades sistêmicas e culturais na doação de dinheiro privado para as obras sociais em geral em nosso País.
No caso do meio ambiente – ou da causa ambiental melhor dizendo – não é diferente e uma dúzia de gatos pingados (ou verdes, o que é mais raro ainda) habitam o cenário da filantropia ou dos “ricos engajados”.
Destes militantes ricos e que não receiam se expor em posicionamentos políticos mais contundentes é de quem estamos falando. É uma denúncia positiva – com a finalidade de despertar outras vocações cívico-verdes. Quem sabe?
Em minhas pesquisas de opinião ao longo de 20 anos, nas 5 edições de O Que O Brasileiro pensa do Meio Ambiente (1991- 2012) verifiquei que apenas 1% dos entrevistados (amostra nacional) afirmava doar para ONGs, Movimentos ou Projetos Ambientais. A média européia variou no período de 4 a 8%. Individualmente, países como Alemanha alcança índices que variaram de 11 a 14% da população. O mesmo se dá com a Holanda.
Num artigo apenas exploratório sobre bilionários verdes, repito, certas figuras são obrigatórias. Uma delas é o Zé Roberto (José Roberto Marinho).
Eu o conheci nos anos 90 quando fundou com amigos uma ONG – o Instituto Acqua.
uncionava num prédio decadente art-deco, na Rua do Russel, no bairro da Glória.
Como o nome deixa entrever, a missão da organização era promover a conservação da água doce e foi escolhido o Rio Paraíba do Sul, uma das principais fontes de abastecimento do Rio e de várias cidades do Estado.
O público-alvo eram prefeituras e escolas e me lembro de uma camioneta MARIA DA TOCA – que era um verdadeiro laboratório ambulante, muito atraente e uma novidade da época. Havia kits de monitoramento da água e anos depois a ONG S.O.S. Mata Atlântica faria algo semelhante no Rio Tietê.
Com o Zé Roberto estavam duas figuras também carimbadas da militância ambiental carioca: o Guido Gelli, que ocupou intermitentemente vários postos na secretaria estadual de Meio Ambiente e o Claudison Rodrigues, técnico eclético que anos depois fundou o programa de Meio Ambiente do VIVA RIO.
O principal recurso vinha da Petrobrás e acabou logo. Coincidentemente a família Marinho chamou o filho pródigo para assumir suas responsabilidades empresariais e o Acqua deixou de existir.
Mas o ambientalista Zé Roberto não saiu completamente de cena. Rastreamos sua presença em vários conselhos como o da WWF (World Wilde Life Fund) e o do FUNBIO (Fundo Brasileiro para a Biodiversidade). Em outras palavras, faz o que a maioria dos ricos ambientalista fazem: empresta seu prestígio, dá palpites e mobiliza sua rede de influência.
Outro empresário que apoiou publicamente a causa e com seu próprio dinheiro foram Guilherme Leal e Pedro Passos, ambos fundadores e hoje bilionários sócios da NATURA. No caso do Guilherme, este posicionou -se sempre no espectro do desenvolvimento sustentável e assumiu publicamente seu engajamento. inclusive, foi vice na chapa da ex- ministra e senadora Marina Silva, na sua primeira campanha à presidência da República. Nada mal. Sabe-se que Guilherme deu suporte especial ao IPÊ, ONG paulista, assim como ao Instituto Ethos e Akatu no início de ambas. Pedro Passos foi na mesma direção e podemos vê-lo atuando tanto no Greenpeace como na S.O.S.Mata Atlântica. Outra que se engajou na trupe da Marina foi a Neca Setúbal (Banco Itau).
Conheço muitos “lideres” no mundo corporativo que contribuem para a causa. O jornalista Ricardo Voltolini se especializou neste clube. Mas poucos têm fortuna pessoal empenhada na promoção dos valores ou de projetos socioambientais. Raramente um rico brasileiro doa dinheiro significativo a uma causa ambiental.
Quando presidi o Jardim Botânico do Rio de Janeiro (2013-2016) tentei mobilizar as famílias ricas da cidade para ajudar no projeto de modernização do mesmo e na manutenção das suas preciosas coleções botânicas. Obtive a resposta tímida de três famílias que atuam discretamente e pediram anonimato. Ajudas parcimoniosas e elegantes.
Sempre que o tema da doação de recursos. Individuais vem à baila surgem as dificuldades mais apontadas: falta de transparência na aplicação dos recursos; falta afinidade com determinadas causas; medo de ser identificado com um certo radicalismo que ronda parte do movimento ambientalista.
Pena.
Numa outra ponta – a das celebridades – cada vez mais emergem vozes (e dinheiro) em favor da causa. A queridinha dos artistas é a Amazônia.
Sobre isto falaremos em outra postagem.
Samyra Crespo é cientista social, ambientalista e pesquisadora sênior do Museu de Astronomia e Ciências Afins e coordenou durante 20 anos o estudo “O que os Brasileiros pensam do Meio Ambiente”.
(#Envolverde)
Este texto faz parte da série que escrevo para o site Envolverde/Carta Capital, desde março, sobre o ambientalismo no Brasil.