Por IPAM Amazônia –
Novo estudo do IPAM mostra que terras públicas foram até 85% mais devastadas e terras indígenas tiveram aumento proporcional de 153%; pesquisadoras alertam para risco de avanço da derrubada com as eleições deste ano e recomendam medidas de mitigação.
A derrubada de florestas na Amazônia alcançou um novo e alarmante patamar nos últimos três anos. O desmatamento no bioma foi 56,6% maior entre agosto de 2018 e julho de 2021 que no mesmo período de 2015 a 2018. É o que mostra novo estudo do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), publicado nesta quarta-feira (2). O avanço ficou evidente ainda no segundo semestre de 2018, como consequência das eleições presidenciais daquele ano, e pesquisadoras avaliam que o efeito tende a se repetir em 2022.
“Estamos subindo degraus rápido demais quanto à destruição da Amazônia e não podemos nos acostumar com isso. Quando olhamos para os números dos últimos três anos, fica claro o retrocesso daquilo que o Brasil foi um dia. Seguimos um caminho totalmente oposto às atitudes que o planeta precisa, com urgência, neste momento”, diz Ane Alencar, diretora de Ciência no IPAM e principal autora do estudo. “Sabemos como fazer isso, já derrubamos o desmatamento antes.”
Os aumentos consecutivos desde 2018 parecem determinar, segundo as autoras, a nova dinâmica de desmatamento na Amazônia – problema regido, na atual gestão, por meio do enfraquecimento de órgãos de fiscalização e, portanto, pela falta de punição a crimes ambientais, bem como pela redução significativa de ações imediatas de combate e controle e pelos retrocessos legislativos.
De acordo com o texto, mais da metade (51%) do desmatamento do último triênio ocorreu em terras públicas, principalmente (83%) em áreas de domínio federal. Em termos absolutos, Florestas Públicas Não Destinadas foram as mais atingidas: tiveram alta de 85% na área desmatada, passando de 1.743 km² derrubados anualmente para mais de 3.228 km². No último ano, essa categoria de floresta pública concentrou um terço de todo o desmatamento no bioma.
Proporcionalmente à área dos territórios, terras indígenas (TIs) tiveram alta de 153% em média no desmatamento comparado do último triênio (1.255 km²) para o anterior (496 km²). Já o desmatamento em unidades de conservação (UCs) teve aumento proporcional de 63,7%, com 3.595 km² derrubados no último triênio contra 2.195 km² nos três anos anteriores.
Antes e depois
Com base em dados brutos do Prodes (Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite), sistema do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), a análise mostra as categorias fundiárias e os Estados nos quais o desmatamento tem se concentrado nos últimos seis anos, e constrói um “antes e depois” da troca de gestão federal. “O estudo indica áreas críticas que demandam ações imediatas para o combate ao desmatamento e para o fortalecimento de ações de comando e controle”, explica Alencar.
Uma das regiões mais afetadas citadas no estudo é a divisa Amacro, entre Amazonas, Acre e Rondônia, caracterizada como a nova fronteira do desmatamento no bioma. Amazonas, inclusive, passou da terceira para a segunda posição como Estado que mais desmatou a Amazônia. Está atrás apenas do Pará, Estado onde se encontram as áreas mais críticas de perda de floresta, e que se mantém em primeiro lugar desde 2017.
Ao evidenciar a distribuição geográfica de regiões com altos índices de desmatamento no Brasil, as pesquisadoras indicam caminhos para mitigar o problema a partir de responsabilidades de atuação dos governos federal, estaduais e municipais, bem como da iniciativa privada na tomada de decisão sobre o uso do solo tanto em terras públicas como em áreas de propriedade particular.
Recomendações
Entre as diretrizes, além do combate à grilagem e às invasões de terras que desmatam e degradam o patrimônio público em prol de benefícios privados, as autoras reforçam a necessidade de segurança territorial em áreas protegidas de TIs e de UCs, com apoio a economias de base florestal. São recomendadas a valorização da bioeconomia e a efetivação de linhas de financiamento, de fomento e de assistência técnica à agricultura familiar, povos e comunidades tradicionais.
O investimento em uma agenda de incentivo às boas práticas na agropecuária também é lembrado, prática que reduziria quase metade (49%) do desmatamento ocorrido no Brasil, hoje concentrado em imóveis e em assentamentos rurais. O pagamento por serviços ambientais (PAS) seria uma dessas possibilidades, a exemplo do Conserv, mecanismo privado de adesão voluntária idealizado pelo IPAM, que compensa produtores rurais por conservarem a vegetação nativa que poderia ser legalmente suprimida em suas propriedades.
“Políticas de valorização dos ativos ambientais, PAS e sistemas jurisdicionais de créditos de carbono em conjunto com o fomento às cadeias produtivas sustentáveis, têm grande potencial de estabelecer uma nova economia para a Amazônia, contando com o engajamento do mercado e da iniciativa privada na sua alavancagem, complementando ações governamentais de comando e controle e trazendo impacto positivo na redução do desmatamento com desenvolvimento econômico sustentável para a região”, propõe o diretor sênior de Políticas Públicas e Desenvolvimento Territorial no IPAM, Eugênio Pantoja.
O estudo destaca a importância de uma estratégia regional robusta integrada aos planos estaduais de prevenção e controle do Desmatamento, com o restabelecimento de liderança, articulação entre órgãos governamentais responsáveis e estruturação de governança clara para o combate ao desmatamento ser implementado de maneira eficiente, como através da destinação de florestas públicas para a conservação e produção florestal sustentável. É ainda importante revisar os retrocessos na política ambiental, com a revogação dos Projetos de Lei (PLs) nº 2.633/2020 e 510/2021, da grilagem, n° 2.159/2021, do licenciamento ambiental, e n° 191/2020 e da mineração em terras indígenas.
“Todas essas medidas terão como efeito a redução do desmatamento, melhorando a qualidade de vida das pessoas, trazendo eficiência produtiva e conectando o mercado brasileiro ao engajamento de atores globais por produtos sem o rastro do desmatamento”, acrescenta Alencar. “Nesse sentido, a revogação de projetos de lei e de retrocesso é essencial para dar um sinal claro de que estamos nos movimentando para barrar o crime ambiental, e não para que ele esteja dentro da lei no futuro.”
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