Ambiente

Nova espécie de bromélia é descoberta no território do PAT Capixaba-Gerais

Com informações do Jardim Botânico do Rio de Janeiro – 

A planta classificada como criticamente em perigo de extinção chamou a atenção de um morador, que enviou fotos a pesquisadores

Uma nova espécie de bromélia foi descoberta recentemente na área do Plano de Ação Territorial para a Conservação de Espécies Ameaçadas de Extinção do Território Capixaba-Gerais (PAT Capixaba-Gerais), que abrange os estados do Espírito Santo e Minas Gerais. A planta, nomeada Krenakanthus ribeiranus, tem característica incomum por apresentar folhas cobertas por pelos e foi essa característica que atraiu a atenção de um morador da região, que compartilhou fotos com pesquisadores.

O artigo que descreve a nova planta foi publicado na revista científica Phytotaxa e tem como autores pesquisadores do Instituto Nacional da Mata Atlântica (INMA), do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro (JBRJ), da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Por estar apenas em uma área específica do vale do rio Doce, a bromélia já se encontra em alto risco de extinção. “Com base na distribuição muito restrita e o avançado grau de degradação da região onde foi encontrada, nós avaliamos essa espécie como Criticamente em Perigo de extinção, o grau mais alto de risco”, destaca Eduardo Fernandez, Coordenador de Projetos do Núcleo Avaliação do Estado de Conservação, do Centro Nacional de Conservação da Flora (CNCFlora), do JBRJ, responsável pela elaboração da Lista Vermelha Nacional.

A região faz parte do território do PAT Capixaba-Gerais, que é coordenado pelo Instituto Estadual de Meio Ambiente do Espírito Santo (IEMA) e pelo Instituto Estadual de Florestas de Minas Gerais (IEF). O plano de ação é apoiado pelo Projeto Pró-Espécies: Todos contra a extinção, financiado pelo Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF, da sigla em inglês para Global Environment Facility Trust Fund), coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, implementado pelo Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), sendo o WWF-Brasil a agência executora, e atua no desenvolvimento e execução de estratégias que visam melhorar o estado de conservação e conhecimento de espécies ameaçadas.

Ciência cidadã

A descoberta aconteceu no município de Alvarenga, no leste de Minas Gerais, e teve um início inesperado, quando Júlio César, morador da região, explorava uma área com muitas cachoeiras. Em um paredão rochoso, ele se deparou com pequenas plantas de folhas verdes pálidas e, entre as folhas, surgia uma pequena flor de cor rosa. “Além de ser uma planta que eu nunca tinha visto na região, me chamou a atenção as folhas peludas como as do capim e as flores saindo no meio das folhas”, conta Júlio, que fotografou a planta e mandou as fotos para os pesquisadores. “Essa planta é tão diferente que quando o Júlio mandou a foto dela pra gente, achamos que pudesse ser tudo, menos uma bromélia!”, conta Dayvid Couto, pesquisador do INMA. “Ela possui as folhas recobertas por pêlos (tricomas) brancos, uma característica incomum em bromélias”, complementa.

As folhas peludas são uma das características que tornam essa espécie tão única e que levaram os cientistas a acreditarem estarem lidando na verdade com uma outra família de plantas. Esses pelos poderiam ter a função de absorção de água ou, ainda, de proteção contra a perda d’água para o ambiente, sugerem os pesquisadores.

“Antes da descoberta dessa nova espécie, apenas uma outra espécie, que não é peluda, era conhecida do gênero Krenakanthus, cujo nome significa ‘flor dos Krenak’, uma homenagem ao povo originário dessa região, no vale do rio Doce”, conta Paulo Gonella, professor da UFSJ. Já o epíteto dessa nova espécie, ribeiranus, é uma homenagem ao seu descobridor, o jovem Júlio César Ribeiro.

Reconhecimento

Segundo Gonella, “a homenagem é um reconhecimento ao olhar apurado do Júlio, que já contribuiu na descoberta de outras espécies da região, atuando como cidadão cientista”. A ciência cidadã é uma parceria entre cientistas e cidadãos no desenvolvimento de pesquisa científica, na qual os cidadãos podem participar em várias fases da pesquisa, como na coleta de dados, interpretação e análise, e na elaboração conjunta de projetos para responder questões científicas. “No caso dessa pesquisa, o Júlio contribuiu desde o levantamento de uma questão que era ‘que espécie é essa que eu não conheço?’ até a coleta de dados que foram fundamentais não só para confirmar que se tratava de uma espécie nova, mas também para estimar seu risco de extinção”, completa Gonella.

Os pesquisadores alertam para a conservação dessa bromélia, que já nasce extremamente ameaçada devido ao desmatamento para abertura de pastagens, aumento na frequência e na intensidade de incêndios descontrolados e na expansão das lavouras de café. “Algumas medidas urgentes precisam ser tomadas para a proteção dessa espécie, como um estudo para criação de uma Unidade de Conservação e a inclusão da espécie em políticas de conservação que vêm sendo elaboradas para a região. Essas medidas, combinadas a estratégias de conservação ex situ, podem nos ajudar a assegurar um futuro próspero para a bromélia-peluda “, completa Eduardo Fernandez.

A descoberta se soma a diversos outros achados recentes e fantásticos realizados no leste de Minas Gerais, que consolidam a região como uma das últimas fronteiras do conhecimento botânico no leste do Brasil. Só na última década, mais de 30 novas espécies de plantas foram descobertas nas serras do leste de Minas Gerais. “Pela sua alta riqueza, única e extremamente ameaçada, as serras do leste de Minas vêm aos poucos atraindo a atenção do poder público, mas ainda de maneira incipiente. É crucial o estabelecimento de Unidades de Conservação na região, que possui um dos mais proeminentes déficits de medidas de conservação in situ na região do Médio Rio Doce”, comenta Paulo Gonella. “Além de abrigarem uma biodiversidade única, essas serras funcionam como ‘caixas d’água’, protegendo nascentes que abastecem os municípios da região e que foram fundamentais para assegurar água de qualidade para muitas cidades quando o rio Doce foi afetado pelo desastre de Mariana”, finaliza. (Envolverde)