Por, Cinthia Leone, ClimaInfo –
O meio ambiente invadiu o debate econômico e político global, colocando a Amazônia no centro do palco
Não é de hoje que a pauta ambiental se descolou dos setores mais ligados à ecologia e à ciência para se tornar assunto de investidores e criadores de políticas públicas, mas nada se compara ao recente protagonismo que o tema ganhou nos últimos meses. Isso se deve a uma conjunção de fatores que tem dois eixos principais: a emergência de novo ciclo econômico mundial baseado na adoção de tecnologias “verdes”; e a percepção cada vez mais clara de que nenhum país pode isoladamente resolver a emergência climática, mas alguns podem sozinhos piorar bastante o cenário – e o Brasil é um deles.
As mudanças climáticas ocorrem como consequência do aumento da temperatura média da Terra. Esse aquecimento tem origem nas emissões de gases causadores do efeito estufa, e o dióxido de carbono (CO2) é um dos principais deles. Se por um lado florestas são capazes de absorver esses gases – o chamado sequestro de carbono – e contribuem para estabilizar o clima em todo o mundo, o reverso também é verdadeiro: o desmatamento transforma as matas em fontes de emissão. Como a Floresta Amazônica representa 10% de toda a biomassa do planeta, sua destruição contribui mais para o aquecimento global do que a derrubada de qualquer outro bioma. Quanto menos Amazônia, mais mudança climática. Mesmo quando pensamos apenas no Brasil: a maior fatia das emissões brasileiras é a derrubada da vegetação nativa – 44%, segundo dados de 2019.
E muitos andam se perguntando por que o foco na Amazônia quando há tantos outros problemas ambientais?
Contaminação do solo, descarte irregular de lixo, pesca predatória, poluição do ar são problemas ambientais também, mas a maioria deles ocorre em escala local ou regional e podem ser resolvidos nessas instâncias. O desmatamento da Amazônia é um problema grande demais para os municípios resolverem. Ele envolve a gestão de uma fatia imensa do território brasileiro e um volume considerável do comércio internacional de proteína animal, grãos, madeira, minérios e outras commodities. É por isso que, diferentemente de outras preocupações ambientais, o desmatamento da Amazônia ocupa mais espaço nas agendas política e econômica internacionais e, por consequência, na imprensa.
Nas grandes cidades, há quem pense que a Amazônia não é problema seu. Os “rios voadores”, evapotranspiração da floresta que leva umidade para a porção mais ao sul da América do Sul e influencia todo o regime de chuvas da região, está longe de ser o único elo entre a Amazônia e as águas do mundo. O Rio Amazonas, que nasce das geleiras dos Andes, e é o maior rio do planeta em volume de água, é responsável por quase um quinto de toda a água doce levada aos oceanos. Ele carrega em seu trajeto até o mar uma quantidade extraordinária de nutrientes e organismos que farão parte da cadeia alimentar marinha.
Mas, se nem toda essa interconexão for suficiente para convencer o leitor da importância dessa floresta para a vida de todos, ainda resta lembrar que é a elevada umidade que faz da Amazônia a região com a maior biodiversidade por metro quadrado da Terra. A perda da floresta significará o desaparecimento em massa de espécies e a desertificação de algumas partes do planeta, como o Sudeste brasileiro.
Assim como existem problemas que só podem ser resolvidos com o trabalho conjunto de municípios, estados e do governo federal, outros exigem a união de todos os países. Esse é o caso da maioria das crises ambientais, incluindo a climática. E nas últimas décadas, o consumo começou a ser identificado como o principal vetor para a degradação ambiental. Empresas do mundo inteiro serão cada vez mais cobradas a apresentar compromissos de sustentabilidade e a agir para que seus negócios não contribuam para o agravamento da crise climática. Ao mesmo tempo, nas democracias liberais, a população passa a exigir de seus governos o cumprimento de metas para a estabilização do clima, com a emergência de jovens lideranças ambientais. Consumidores e eleitores estão cada vez mais preocupados com o tema.
A crise de COVID-19 fez com que as principais economias do mundo acelerassem uma transição verde que já estava em curso, e pacotes bilionários dedicam agora atenção especial à redução de emissões. Esse movimento potencializa a corrida tecnológica pela descarbonização. A emergência sanitária também deu protagonismo à cooperação científica internacional, e o discurso anticiência, próprio dos negacionistas do clima, passa a ser visto como um perigo para a humanidade e não como uma mera questão de opinião.
É nesse contexto que surgem também lideranças antiambientais, como o presidente Jair Bolsonaro. E o Brasil, que já disputou o protagonismo ambiental no mundo, se tornou uma dor de cabeça para esses novos consumidores e eleitores. Também pesa para a imagem negativa do país a retórica bolsonarista contra indígenas, quilombolas e outras Comunidades Tradicionais – pessoas que desenvolveram um modo de vida compatível com a natureza e por isso são reconhecidos mundialmente como os Guardiões da Floresta. Fotos de satélite divulgadas em 2019 mostrando a magnitude das queimadas na Amazônia acenderam o alerta que faltava para que o mundo entendesse que a destruição da maior floresta tropical do planeta é um problema de todos.
O governo brasileiro tem desacreditado a ciência do clima, mentido sobre dados de desmatamento produzidos por órgãos do próprio governo e apelado para o velho mito das “disputas geopolíticas em torno da Amazônia”. Uma rede de fake news cada vez mais exposta dissemina essas ideias, afastando uma parte da opinião pública brasileira de um dos seus mais belos patrimônios.
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