Ambiente

Povos originários processam governo australiano por mudança climática

Por ClimaInfo – 

Com economia presa a combustíveis fósseis, Austrália tem uma das piores metas no Acordo de Paris

Os líderes dos povos originários das Ilhas do Estreito de Torres, na Austrália, estão levando o governo federal australiano ao tribunal em uma tentativa de impedir a destruição de suas comunidades pela mudança climática.

Os autores da ação argumentam que a Austrália, a segunda economia mais suja do mundo em termos per capita segundo a OCDE, tem a responsabilidade legal de garantir que suas comunidades não sejam prejudicadas pelos impactos da crise climática que ela está provocando ativamente.

Os nativos do Estreito de Torres estão exigindo ação por parte do governo há anos. Um caso separado foi apresentado às Nações Unidas dois anos atrás, ligando a inação climática da Austrália às violações dos direitos humanos pela primeira vez. A ONU ainda não tomou uma decisão sobre este caso.

“Nossos ancestrais vivem nestas ilhas há mais de 65.000 anos. O fracasso do governo em prevenir a crise climática significa que nossas ilhas serão inundadas, nossos solos arruinados pelo sal e nossas comunidades forçadas a partir”, afirma Paul Kabai, um dos autores da ação. “Tornar-se refugiado climático significa perder tudo: nossas casas, nossa cultura, nossas histórias e nossa identidade.”

“Não posso imaginar ser obrigado a sair de Boigu porque esta ilha sou eu, e eu sou esta ilha”, define Pabai Pabai, também autor na ação. “Há 65.000 anos de riqueza e experiência aqui. Perder Boigu significa perder isso. Se você nos levar para longe desta ilha, não somos nada. É como a Geração Roubada, você tira as pessoas de suas terras tribais, elas se tornam ninguém”.

Várias das ilhas do Estreito de Torres estão situadas em áreas extremamente baixas. Os dados mostram que o nível do mar no Estreito está aumentando a uma taxa duas vezes maior do que a média global. Como esta tendência continua, toda a infraestrutura das comunidades será impactada.

Direito climático

O direito climático pode ser a única maneira de forçar a Austrália a reduzir as emissões. Apesar da esmagadora evidência científica, o governo continua a expandir os projetos de combustíveis fósseis e se recusa a cortar as emissões com a rapidez necessária para evitar os piores danos.

A Austrália é o país com pior desempenho climático de todos os países desenvolvidos. Antes das negociações da COP26, ela reapresentou sua meta climática para 2015 sem nenhuma melhoria, entrando na categoria ” altamente insuficiente” do Climate Action Tracker.

O novo caso está sendo conduzido pela Grata Fund e foi modelado após o caso Urgenda Climate , nos Países Baixos. A vitória holandesa inspirou litígios climáticos em muitos países nos últimos anos, incluindo os EUA, Brasil , Coréia do Sul, Canadá, Nova Zelândia, Itália e Reino Unido. e também seguindo o exemplo holandês, tribunais da Colômbia, Irlanda, França, Alemanha e Bélgica consideraram a ação climática de seus governos inadequada. Agora é a vez da Austrália.

“Quando lançamos nosso litígio na Holanda, havia a visão de que um caso como este era impossível e não tinha nenhuma chance de sucesso. Em vez disso, ganhamos, o que levou o governo a adotar um amplo conjunto de políticas para reduzir as emissões, incluindo, significativamente, o fechamento de usinas elétricas alimentadas a carvão”, conta Dennis Van Berkel, conselheiro jurídico da Urgenda Foundation. “Estamos muito otimistas de que o mesmo pode ser alcançado na Austrália”, afirma.

Para Isabelle Reinecke, fundadora da Grata Fund, todos os australianos e em particular as comunidades tradicionais já estão sendo prejudicados pelo fracasso do governo em enfrentar a crise climática seriamente. “Estamos orgulhosos de apoiar Paul e Pabai enquanto eles tomam uma posição em nome de suas comunidades. Todos têm o direito de defender seus direitos nos tribunais e nós acreditamos que eles têm um grande caso que poder fazer história”, diz Reineck.

“O governo australiano tem um dos piores registros de ação climática de qualquer país rico do mundo, apesar da extraordinária vulnerabilidade da Austrália aos impactos da crise climática. Portanto, não é surpresa que esses corajosos líderes dos povos originários, que estão na linha de frente desses impactos, tenham tido que recorrer à justiça para responsabilizar seu governo”, afirma a advogada Tessa Khan, diretora da Uplift, uma organização britânica que tem se especializado em apoiar litigâncias climáticas.

“Somente este ano, houve uma série de ações judiciais bem-sucedidas contra os governos do mundo todo, e esses casos foram cruciais para acelerar a ação e proteger as pessoas contra danos climáticos graves”, reflete Khan. “A inadequação da política climática do governo australiano tornou o litígio inevitável, e a iniciativa desses demandantes deve ser aplaudida”.

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