Internacional

Resistência a antibióticos pede resposta global

antibioticos-629x381Por Lyndal Rowlands, da IPS – 

Nações Unidas, 14/6/2016 – Enfrentar o problema da resistência aos antibióticos exige uma resposta global semelhante à que foi necessária para lidar com a mudança climática e o HIV/aids, opinou à IPS o ministro de Saúde Pública da Suécia, Gabriel Wikström.A atenção a esses problemas “começou com um pequeno grupo de especialistas debatendo e tentando alertar o resto do mundo, mas foi depois de entrar na agenda política que se converteu em um tema com uma possível solução”, acrescentou.

Segundo Wikström, “naturalmente, com a resistência aos antibióticos, temos que resolver muitas questões técnicas e médicas, mas também é uma questão política”.Os antibióticos permitem prolongar em 20 amos a expectativa de vida de uma pessoa, mas seu uso descuidado os torna inservíveis.

Chefes de Estado e de governo debaterão sobre o grave problema da perda de efetividade dos antibióticos em uma reunião de alto nível que acontecerá na sede da Organização das Nações Unidas (ONU) em setembro. Na segunda semana deste mês, especialistas e funcionários dos setores de saúde, agricultura e economia falarão na ONU e no Clube Yale de Nova York sobre o que será necessário ocorrer nessa cúpula.

“O que está claro é que todos os países do mundo precisam deixar de tratar os antibióticos como se fossem guloseimas”, pontuou à IPS o presidente da Revisão sobre a Resistência Antimicrobiana (AMR), Jim O’Neil. “É certo nos humanos e é certo na agricultura”, ressaltou. O uso incorreto desse medicamento, tanto em humanos como em animais de criação, contribui para o rápido aumento de micro-organismos resistentes aos medicamentos que temos atualmente.

Um estudo dirigido por O’Neil mostra que, se o problema não for atendido, morrerão dez milhões de pessoas a mais por ano até 2050.O fato de não se ter encontrado novos antibióticos desde a década de 1980 faz com que as novas infecções resistentes sejam mais preocupantes, explicou Sally Davies, a principal assessora em medicina da Grã-Bretanha. “Basicamente, o fornecimento de novos medicamentosfoi cortado”, afirmou em uma entrevista coletiva, no dia 7 deste mês.

Segundo o estudo, já morrem 700 mil pessoas por ano em razão de infecções resistentes aos remédios, um número subestimado. Uma dessas doenças, a mais relacionada com a resistência aos medicamentos, é a tuberculose. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que cerca de 480 mil pessoas desenvolveram,em 2014, a doença resistente a múltiplos antibióticos

O ministro da Saúde da África do Sul, Aaron Motsoaledi, que também preside a Associação para Frear a Tuberculose, disse aos jornalistas que o único medicamento capaz de enfrentar a tuberculose multirresistente é extremamente tóxico, e que, mesmo após várias doses, há apenas 50% de probabilidade de que faça efeito.

Enfrentar o problema da tuberculose resistente exige tanto investimentos em novos antibióticos como nos sistemas de saúde dos países em desenvolvimento, apontou Motsoaledi. “É um fracasso de mercado e moral para a maioria dos laboratórios não poder investir em encontrar curas efetivas para uma das principais causas de morte por doenças infecciosas”, acrescentou.

Segundo Motsoaledi, a resistência microbiana não é o único problema que emerge em escala global e ameaça os sistemas de saúde dos países em desenvolvimento, além de sua capacidade de fazer frente a enfermidades infecciosas. “Não virá apenas a resistência microbiana, trata-se também da mudança climática, não sabemos o que trará e estamos invadindo o habitat de outros organismos do reino animal”, ressaltou.

O fortalecimento dos sistemas de saúde pode ajudar a enfrentar a resistência, prevenindo infecções mediante medidas como imunização e higiene. Também ajudará melhorar a capacitação de médicos e enfermeiras sobre o uso mais apropriado dos antibióticos.

Mas Davies destacou que o uso apropriado não necessariamente significa reduzir o uso em geral. “Não podemos esquecer que atualmente morrem mais pessoas porque não têm acesso ao antibiótico apropriado do que pela resistência; este também é um problema de desenvolvimento”, afirmou. E tomar menos antibióticos do que o receitado também pode gerar resistência.

Em seu livro The Drugs Don’t Work (Os Remédios Não Funcionam), Davies descreve como as bactérias se tornam resistentes aos medicamentos quando uma pessoa não toma os antibióticos o tempo necessário. Se não lhe é dado o tempo suficiente para eliminar totalmente a bactéria, esta pode sobreviver e aprender a resistir ao próximo tratamento com a mesma droga. Por isso é importante completar o tratamento com antibióticos exatamente como foi receitado pelo médico.

Segundo Wikström, para enfrentar a resistência microbiana é preciso que os setores da saúde e agricultura trabalhem juntos. Mas a falta de regulamentação no setor agrícola em todo o mundo favorece o abuso de antibióticos como profilaxia ou para promover o crescimento. “É muito comum usarem antibióticos para incentivar o crescimento dos animais”, indicou Davies.

A resistência ao poderoso antibiótico Colistin, utilizado na agricultura, chegou aos Estados Unidos, após começar na China. Apesar da importância desses medicamentos, não existe nenhum acordo global que regule seu uso na agricultura, o que poderia mudar na reunião que acontecerá em setembro na ONU.

Toda normatização deveria aproveitar os exemplos positivos dos países onde se conseguiu regular o uso de antibióticos na agricultura. Países como Coreia do Sul e Holanda são a prova de que é possível regulamentar o uso de antibióticos sem um impacto econômico negativo no setor agrícola, enfatizou O’Neil.

Também é importante recordar que os pequenos agricultores são particularmente vulneráveis às consequências da resistência antimicrobiana porque vivem e trabalham em contato direto com os animais, disse à IPS Carla Mucavi, diretora do escritório da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, em Nova York. Envolverde/IPS