Agoniado pela crescente degradação do solo que traga terras férteis, o Quênia dedica enormes esforços à recuperação de vastas zonas áridas e semiáridas a fim de deter a desertificação.
Por Justus Wanzala, da IPS –
Nairóbi, Quênia, 27/10/2016 – O ministro de Ambiente e Recursos Naturais, Charles Sunkuli, informou que foi lançado,em setembro deste ano,um programa para recuperar 5,1 milhões de hectares até 2030. Além disso, o país procurará estender sua cobertura florestal dos atuais 7% de seu território para um mínimo de 10%.
“Criamos um fundo de compensação para ajudar as comunidades que vivem em terras secas e degradadas a ganharem a vida e participar das iniciativas de recuperação”, disse Sunkuli, por ocasião da 15ª sessão do Comitê de Revisão da Implementação (CRIC15) da Convenção das Nações Unidas para a Luta Contra a Desertificação (UNCCD), realizada em outubro, em Nairóbi, capital do país.
O reflorestamento acontecerá principalmente em zonas áridas e semiáridas, que constituem 80% do território do país, mas também se estenderão a outras áreas.Para conseguir esse ambicioso objetivo, o ministro informou que está se implantando um programa para promover o plantio de espécies de árvores tolerantes à seca, como Melia volkensii (conhecida no país como mukau), nas zonas áridas.
O Quênia investe muito em pesquisa de árvores resistentes à falta de água para reflorestar as zonas secas e melhorar as fontes de renda das populações locais.Em Tiva, no árido condado de Kitui, no leste do país, o Instituto de Pesquisa Florestal do Quênia (Kefri) criou um centro de pesquisa para cultivar duas espécies ideais para plantar em regiões áridas e semiáridas, com apoio do governo e da Agência de Cooperação Internacional do Japão (Jica).
O diretor do Programa de Pesquisa da Ecorregião Árida do Kefri, James Ndufa, explicou que o crescimento da população e a transformação da selva em terras férteis para cultivar levaram a um uso pouco sustentável do solo e contribuiu para a degradação e a desertificação.E acrescentou que o centrode pesquisa de Tiva se concentra em adaptar duas espécies de árvores às condições mais quentes e mais secas, para que as zonas áridas se adaptem à mudança climática”.
A reprodução acontece pelo método convencional de selecionar as espécies que prosperam nas condições desejadas. A ideia é distribuir entre os agricultores as sementes melhoradas geneticamente de árvores tolerantes à seca, de rápido crescimento e que oferecem madeira de boa qualidade, além de forragem para os animais, destacou Ndufa. Com o tempo, a iniciativa permitirá recuperar as áreas degradadas e conservar a diversidade biológica, acrescentou.
A análise do DNA ocorre durante a seleção, e o enxerto é praticado para conseguir os resultados desejados. Assim, criaram uma horta de sementes e um sítio de provas das espécies modificadas de mukau e acácia. O projeto, iniciado em 2012, permite distribuir as sementes melhoradas geneticamente das duas espécies entre os agricultores.Além da Jica, o Kefri conta com a colaboração dos Serviços Florestais do Quênia, de universidades quenianas, do Instituto de Pesquisa de Florestas e Produtores Florestais do Japão e da japonesa Universidade de Kyushu.
O centro de pesquisa fica em uma zona semiárida que recebe apenas 700 milímetros de chuva por ano. Os produtores só conseguem magras colheitas, o que gera uma pressão sobre os recursos naturais pela consequente superexploração. Ndufa explicou que as comunidades locais dependem do corte de árvores, que usam para fazer carvão e vendê-lo em Nairóbi, o que acelera o desmatamento e a degradação do solo. Além disso, outros grupos de pessoas, de forma deliberada, recolhem areia e prejudicam a vegetação, o que também degrada a terra.
A madeira de mukau é vendida pelo equivalente a um dólar por pouco menos de meio metro. “E pode-se cultivar cerca de 400 árvores em um hectare, que quando maduras podem gerar entre US$ 200 mil e US$ 500 mil”, acrescentou Ndufa. As duas espécies com as quais trabalham foram superexploradas. A mukau, cuja madeira é roxa, tem valor equivalente ao mogno e é a preferida pelos fabricantes de móveis, enquanto a acácia é valiosa pelo carvão.
O objetivo é desenvolver árvores de rápido crescimento, que possam ser cortadas em 15 ou 20 anos. Foram plantadas cerca de três mil mukau e mil acácias em cem hectares do sítio de provas de Tiva, e já foram coletados aproximadamente 2.500 quilos de sementes.
Também são estudadas outras duas espécies com folhas mais duradouras, para que sirvam de forragem para os animais, especialmente para as cabras. O projeto também conta com atividade de extensão para distribuir as sementes e conscientizar sobre a importância das árvores,por meio de visitas de campo, demonstrações agrícolas e dias de campo.
Verónica Kioko, residente em Kitui, opinou que o pouco interesse demonstrado pelas árvores em algumas áreas pode estar relacionado com a insegurança alimentar e a pobreza. Os agricultores receberam a informação sobre os benefícios de plantar árvores, mas para eles é difícil esperar de 15 a 20 anos até ficarem prontas para o corte. De fato, as cortam principalmente para fazer carvão, mesmo antes de estarem maduras, ressaltou.
A seca e a fome exacerbam a situação. “As pessoas costumam ficar sem alimentos em caso de má colheita, e, não tendo dinheiro, cortam as árvores para fazer carvão e vendê-lo barato”, explicou Kioko. No tocante à acácia, Ndufa disse que a ideia é desenvolver uma variedade que produza muitas ramas e folhas para alimentar as cabras e os camelos, e madeira.
No entanto, para lutar contra a desertificação e a degradação são necessárias intervenções em escala nacional e transfronteiriça, apontou Frank Msafiri, presidente do capítulo queniano da rede East African Sustainability (SusWatch), que reúne várias organizações da África oriental.
A grande preocupação é que a elevada pobreza, a pouca disponibilidade de água, o desmatamento e a degradação do solo avivem os conflitos, observou Msafiri. “Os atores de setores como água, silvicultura e agricultura, bem como dos centros de pesquisa da África, não devem perseguir estratégias contraditórias, mas harmonizá-las sob o guarda-chuva da gestão sustentável da terra”, explicou.
Por sua vez, a secretária executiva da UNCCD, Monique Barbut, disse no CRIC15 que muitos países que se dedicam à recuperação florestal conseguem resultados positivos. Ao citar o exemplo da Etiópia, afirmou que a terra recuperada graças a um plano específico suportou a seca provocada pelo fenômeno El Niño, que afetou a região da África austral e oriental no ano passado. Envolverde/IPS