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Resiliência da Jamaica está em construções “inteligentes”

Na medida em que aumenta a possibilidade de desastres naturais, os assentamentos irregulares, com este de Trinidad, são causa de preocupação na Jamaica, onde se estima que 20% da população vivam em construções precárias. Foto: Jewel Fraser/IPS
Na medida em que aumenta a possibilidade de desastres naturais, os assentamentos irregulares, com este de Trinidad, são causa de preocupação na Jamaica, onde se estima que 20% da população vivam em construções precárias. Foto: Jewel Fraser/IPS

 

 

Porto Espanha, Trinidad e Tobago, 15/8/2014 – Os edifícios estão entre os maiores consumidores de certos recursos naturais. Segundo a Iniciativa de Construção Sustentável e Clima, essas construções costumam usar 40% da energia e 25% da água do planeta, enquanto emitem um terço das emissões de gases-estufa do mundo.

Anthony Clayton, professor de desenvolvimento sustentável da jamaicana Universidade das Índias Ocidentais, afirmou que essas estatísticas indicam que os edifícios são fundamentais para construir a resiliência à mudança climática e reduzir os bolsões de pobreza instalados na região do Caribe.

“Atualmente, a maioria dos prédios na Jamaica faz um uso muito ineficiente da energia e, com uma eletricidade muito cara, isso diminui o nível de renda disponível, que é um dos fatores de desequilíbrio da economia”, apontou Clayton. “Se construirmos um maior padrão de eficiência energética, o país será mais resistente à mudança climática”, afirmou.

Clayton e seu colega Tara Dasgupta trabalham em um protótipo de edifício inteligente cujos elementos principais serão “eficiência e sustentabilidade ótima”, com particular interesse na eficiência hídrica, nas energias renováveis, nos materiais e recursos, bem como na qualidade ambiental interna.

O edifício de “energia nula”, o primeiro de seu tipo na região, está na  fase de projeto. O Instituto de Desenvolvimento Sustentável, da Universidade das Índias Ocidentais, trabalha em colaboração com o Fundo para o Meio Ambiente Mundial e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) em um projeto de pesquisa e construção que chega a US$ 7 milhões.

Clayton, que integra vários grupos assessores – como o Mecanismo Regional de Negociação do Caribe, a Divisão de Tecnologia, Indústria e Economia do Pnuma, e o Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Mudança Climática (IPCC) –, ressaltou à IPS que a proliferação de assentamentos informais é um grande problema de moradia na Jamaica e também incide no aquecimento global. Segundo afirmou, 20% da população da Jamaica vive em favelas. “

Há moradias em terrenos não adequados e em ladeiras instáveis. Com a mescla das chuvas torrenciais e a mudança climática, ficam expostas a inundações ou deslizamentos de terra”, destacou Clayton. Muitas dessas casas, construídas em terrenos ocupados, não têm uma construção particularmente boa. “A maioria das casas é basicamente de bloco, concreto, lata, madeira e estão apinhadas. Algumas são apenas de madeira com teto de zinco”, acrescentou.

Resta muito trabalho por fazer na Jamaica e no resto do Caribe com relação à criação e ao fortalecimento de códigos de construção que ofereçam certa proteção contra desastres naturais. O Instituto de Desenvolvimento Sustentável fez um projeto, financiado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), “para avaliar riscos vinculados à mudança climática e ajudar a construir resiliência nas moradias jamaicanas”. A primeira etapa foi “fazer uma avaliação de riscos de moradias e áreas urbanas, e redigir um projeto legislativo sobre regulamentação ambiental”.

Entre as conclusões do trabalho, o médico Kwame Emmanuel, consultor técnico do projeto, disse que o governo é, em parte, responsável pela insegurança na construção. “O regime de controle do desenvolvimento é incentivar o desenvolvimento ilegal mediante um longo processo burocrático para o desenvolvimento formal”, explicou. “O governo da Jamaica persegue uma política de moradia que busca aumentar a quantidade de casas para pessoas de baixa renda. Um conflito possível tem a ver com a localização desse desenvolvimento em grande escala”, acrescentou.

“Podem localizá-los em áreas vulneráveis ou sensíveis do ponto de vista ambiental devido ao baixo custo da terra ou a construção pode aumentar a vulnerabilidade das zonas adjacentes. Além disso, talvez a resiliência climática não conste no desenho dos empreendimentos ou das unidades” habitacionais, pontuou Emmanuel.

“Há uma desconexão entre a agenda política e o cronograma da mudança climática. Os dirigentes políticos se preocupam principalmente com os problemas que o eleitorado enfrenta, como pobreza, custo de vida, desemprego, mau estado das estradas, entre outros”, disse Emmanuel a título de explicação. Por essa razão, “é difícil que considerem temas que ainda não se manifestaram totalmente, como, por exemplo, a elevação do nível do mar”, acrescentou.

Outro grande problema na Jamaica “é a autonomia da Corporação para o Desenvolvimento Urbano e o Ministério da Habitação, facilitada pelas próprias leis, que influenciaram as inconsistências nos padrões de desenvolvimento e a exploração de vazios legais”, afirmou Emmanuel.

Após a avaliação de riscos, foram feitas propostas para modificar o atual código da construção e garantir a eficiência energética e a resiliência dos prédios diante de eventos climáticos. As iniciativas atualmente são compartilhadas com profissionais da construção, informou Clayton, e a resposta tem sido positiva no geral. A organização multidisciplinar Mode revisa os códigos de construção para o Instituto de Desenvolvimento Sustentável.

O arquiteto Brian Bernal, gerente de projeto da Mode que fez a revisão, disse à IPS que o projeto “examina como os códigos de construção podem servir como avenida para promover, incentivar e fortalecer a resiliência dos edifícios à mudança climática em escala nacional e regional”. “Códigos de construção sólidos e bem aplicados são muito efetivos para garantir melhor qualidade na construção e, junto com padrões e práticas ‘verdes’, aumentarão de forma significativa a resiliência funcional de nossos prédios”, enfatizou à IPS.

O grupo fez a seguinte proposta para melhorar os atuais códigos de construção:

– Adotar, cumprir e atualizar o Código Nacional de Construção de 2009.

– Adotar o Código Internacional de Construção Verde, pois “será o menos difícil de implantar no código ambiental local”.

– Implantar um sistema de qualificação de edifícios verdes, que inclua “ferramentas voluntárias para qualificar o rendimento ambiental das construções, que costumam ser verificadas por uma terceira parte para conseguir reconhecimento pelo projeto exemplar e os níveis de conservação”.

– Dar incentivos aos edifícios verdes.

“O principal objetivo dos códigos de construção é proteger a saúde, a segurança e o bem-estar dos moradores”, destacou Bernal. Envolverde/IPS