Vilmar Berna - Adeus a um cidadão Brasileiro

O escritor e jornalista Vilmar Berna partiu. Deixou esposa, filhos e netos e, também, uma enorme legião de amigos e admiradores. Gente que jamais esquecerá do grande pensador bonachão que agiu e inspirou com decisiva contribuição para um mundo mais civilizado!

Por Dal Marcondes, amigo –  

Uma das tarefas mais difíceis é falar sobre um amigo de parte. Mais ainda quando ele não é apenas um amigo, mas sim um homem que construiu uma vida muito além de qualquer limite que a própria vida lhe impôs. Há muito o que se possa dizer dessa pessoa, pai, marido, avô dentro da dimensão humana. Um caráter inquieto e incapaz de desviar o olhar de uma iniquidade. Vilmar Sidnei Demamam Berna, ou simplesmente Vilmar Berna nunca guardou para si sua acurada visão da humanidade e do mundo. Tornou-se jornalista para contar histórias e defender o maior bem da vida, o Planeta Terra.

Foi reconhecido pela ONU como um lutador, recebeu o Prêmio Global 500 das mãos do imperador Akihito, do Japão, por ser um incansável defensor da vida, em todas as suas formas e dimensões. Nisso esteve ao lado de gigantes como seringueiro Chico Mendes e o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho.

Conta-se que os diplomatas brasileiros estavam preocupados, porque Vilmar não deveria e não poderia dirigir a palavra ao Imperador. O protocolo japonês colocou todas as regras de uma cerimônia solene e pediu que Vilmar apenas se dirigisse ao palco, recebesse a honraria e retornasse a seu lugar. Não deu certo.

Vilmar dirigiu-se ao palco, olhou fixamente e imperador e fez um arrazoado sobre a política japonesa de caça às baleias. Tentaram interromper, mas o próprio imperador pediu que continuasse e chamou seu interprete. Ao final da fala prometeu a Vilmar que iria se inteirar dos dados e conversar com seu primeiro ministro.

Transformou a militância ambiental em uma missão. Inspirou gerações de jovens jornalistas que hoje brilham em todas as mídias. Usou seu talento com as palavras e seu conhecimento para falar com todos os públicos, desde gestores públicos, empresários, que sempre o respeitaram, até as crianças, a quem dedicou seu melhor com a publicação de dezenas de livros em uma linguagem que respeita a inteligência de seus leitores, de qualquer idade.

Vilmar dirigiu-se ao palco, olhou fixamente e imperador e fez um arrazoado sobre a política japonesa de caça às baleias. Tentaram interromper, mas o próprio imperador pediu que continuasse e chamou seu interprete. Ao final da fala prometeu a Vilmar que iria se inteirar dos dados e conversar com seu primeiro ministro.

Vilmar criou uma das primeiras mídias a dedicar-se exclusivamente à pauta ambiental no Brasil, o Jornal do Meio Ambiente. Com a internet, criou a REBIA – Rede Brasileira de Informação Ambiental, com milhares de participantes em todo o país.

Vilmar Berna por Vilmar Berna

Ninguém melhor para falar sobre a vida do ser humano, jornalista, militante, escritor e pensador Vilmar Berna, do que ele mesmo. Os textos abaixo foram publicados por Vilmar Berna em seu blog: http://escritorvilmarberna.blogspot.com/

Boa leitura:

Escolhas de uma vida

“A cana só dá suco depois de passar por uns bons apertos”. – Berilo Neves

Sempre gostei de biografias. Elas contam a história por detrás da história, as circunstâncias dos ‘apertos’ que os autores viveram para escrever o que escreveram, compartilharam conosco um pouco de seus dramas, suas paixões, seus amores, seus ódios, seus delírios, sua felicidade, suas infelicidades, boa ou má sorte, enganos, traições, imprevistos, destino, fatalidade, escolhas… Ao ler as histórias de vida de outras pessoas, encontrei material suficiente para ir compreendendo a mim mesmo, à minha natureza e condição humanas, e assim, compreender melhor o humano que há nos outros. Terêncio, poeta e dramaturgo romano, que viveu em torno de 150 a.C., disse que “nada do que é humano me é estranho” e Charles C. Colton escreveu que “aquele que conhece a si mesmo conhece os outros.”

Nos encontros com meus leitores frequentemente me perguntam onde encontro inspiração para escrever!? E quando digo que minha inspiração nasce do meu cotidiano vivido, e conto um pouco sobre os limões que recebi e como fiz uma limonada com eles, os leitores querem saber mais e sempre me pediram que escrevesse um livro sobre a minha vida. Esta é uma tentativa de atender a estes pedidos.

“Não sou melhor porque me elogiam, não sou pior porque me caluniam. Eu sou o que sou, e não o que dizem.” – Tomás de Aquino

Escrevi estes textos não com a intenção de me vangloriar ou receber mais reconhecimentos dos que os que já tive a honra e a felicidade de receber em vida, mas como um processo de autoconhecimento que compartilho aqui com os leitores, sem maiores pretensões!

“O todo sem a parte não é todo, a parte sem o todo não é parte; mas se a parte fez todo, sendo parte, não se diga que é parte, sendo todo.” – Gregório de Matos, poeta do barroco brasileiro (século XVII).

A primeira dificuldade que tive de enfrentar foi a decisão em dividir a história em partes. Fritjof Kapra alerta que a abordagem mecanicista reducionista não é apropriada para compreender seres vivos. “Se separarmos uma entidade viva, matamo-la”. Entretanto, resolvi correr o risco, na tentativa de me fazer compreensível. Estas partes, escolhidas, darão conta de revelar realmente o que ou quem eu sou ou me tornei, ou apenas revelarão uma imagem que faço de mim? Então, alerto aos leitores que estas partes, verdadeiramente, não existem, por que não existe um “eu criança”, um “eu adolescente”, um “eu adulto”, um “eu ecológico”, um “eu literário”, um “eu amoroso”, um “eu espiritual”, um “eu pai”, um “eu filho”, etc. Estes são apenas papéis ao longo da vida! Talvez uma tentativa de nos tornar mais compreensíveis, mas o que existe na verdade é uma pessoa complexa tentando ser simples, em processo contínuo de se tornar pessoa, e que ainda assim não sou eu, por que não sou sozinho!

“Todos os seres humanos estão presos numa teia inescapável de mutualidade; entrelaçados num único tecido do destino. O que quer que afete a um diretamente, afeta a todos indiretamente. Não posso nunca ser o que deveria ser até que você seja o que deveria ser e você não pode nunca ser o que deveria ser até que eu seja o que devo ser” – Martin Luther King

Para me compreender adequadamente preciso compreender os outros com quem me relaciono, que exercem influência sobre mim e que influencio. Preciso compreender o contexto em que vivi e ainda vivo, como ele interagiu e interage comigo, e como interajo nele. Então, a idéia que faço de mim é uma falsa idéia de mim, por que não sou pessoa, sou um dos nós de uma imensa rede dentro de outras redes, todas interligadas e interconectadas, apoiando-se mutuamente, uma rede que não inclui apenas aos meus semelhantes, mas também aos que não são semelhantes, ao Planeta inteiro, ao Universo inteiro! Mas como não consigo dar conta deste ser holístico, que na verdade somos, então, tive de apelar para o velho reducionismo cartesiano, na esperança de que os leitores, uma vez compreendendo as partes, consigam intuir o todo, do qual, a partir deste momento, também passam a fazer parte!

“Há pessoas que nos falam e nem as escutamos; há pessoas que nos ferem e nem cicatrizes deixam, mas há pessoas que simplesmente aparecem em nossa vida e nos marcam para sempre.” – Cecília Meireles

Os leitores também costumam me perguntar sobre que autores me influenciaram. Então, ao longo do texto, estarei compartilhando pensamentos e trechos escolhidos que foram e ainda são importantes para mim. Gosto de pensar nesses autores como ‘amigos espirituais’, por que foram generosos o bastante para compartilhar suas experiências de vida, suas reflexões ou perplexidade diante da vida, suas histórias.

Durante boa parta de minha infância vendi sonhos, doces que meu pai fabricava com maestria. De uma certa maneira, continuo como um vendedor de ‘sonhos’ agora na forma de ideias…

“Vilmar acredita – e convence seus interlocutores de maneira inquestionável – que a grande mudança que o Brasil precisa se inicia com o despertar da consciência de cada brasileiro a respeito de si próprio e de sua importância para o tecido social. Mas o Vilmar é mais do que isso. Além de falar, ele produz. E como! Escreve livros para todas as idades – com fluência e elegância – e planta sementes num futuro melhor. Edita uma revista e um portal ambiental – e consegue, com rara habilidade, a fórmula do sucesso: ser honesto intelectualmente (não abre mão de seus pontos de vista) e vitorioso economicamente (consegue sobreviver com isto). Produz raciocínio eco e lógico para atuação parlamentar, se multiplicando como cidadão político. E ainda encontra tempo para ser uma verdadeira liderança ambiental, daquelas que a gente precisa ter, gostaria de ser e não tem coragem. Vilmar denuncia, propõe e cobra providências. O dia inteiro. Em todos os canais. De todas as maneiras. Do alto de suas sandálias, Vilmar mostra que influenciar pessoas é um ato de persistência, inteligência e fé. E que a mudança de comportamento é uma questão de modelos, referências, e de vontade. Do alto de suas sandálias, Vilmar está ficando cada vez mais parecido com a causa ambiental: ele mostra que é possível ser complexo, sendo simples. Na convivência com ele, espero aprender a calçar sandálias.” – Rogério R. Ruschel – jornalista e publicitário

Postado por Vilmar S. Demamam Berna às 12:41 3 comentários:

Quando me chamavam de Sidnei

“Não existe um caminho para a felicidade. A felicidade é o caminho.” – Gandhi

 

“É preciso cortar antes de limar, entalhar antes de polir”. – Provérbio chinês

Nasci em Porto Alegre (RS), em 11 de outubro de 1956, em uma família pobre, que se desagregou cedo, e sobre a qual até hoje não tenho muitas informações. As primeiras lembranças de minha infância são por volta dos cinco anos de idade, quando já morava em Brasília.

No ano que nasci, foi eleito presidente do Brasil o mineiro Juscelino Kubitschek, com o lema “Cinquenta anos de progresso em cinco anos de governo”. Sua gestão foi marcada pela implementação de um ambicioso programa de obras públicas com destaque para construção da nova capital federal. Em busca de melhores condições de vida, pessoas de todos os cantos do Brasil chegavam a Brasília, apesar da maioria das construções estarem ainda em seus esqueletos. Assim, os operários e trabalhadores, os ‘Candangos’, foram os primeiros habitantes de Brasília. Meu pai foi um deles, e nos levou juntos, eu, com cinco anos, meu irmão, César, com três e Cléia, com um ano e meio. Meu pai saía para trabalhar e nos deixava trancados, num barraco de um único cômodo, com apenas um saco de pão dormido. Não me lembro de ter notícias de minha mãe ou mesmo de alguma figura feminina nesta época. Cresci achando que minha mãe havia morrido num incêndio, segundo versão do meu pai, na qual acreditei até aos 13 anos, quando descobri que minha mãe era viva!

Desde cedo tive de ir à luta. Tive de ‘fazer uma limonada dos limões que recebi’. Existem pessoas que diante das dificuldades – que são inerentes à existência -, preferem se acomodar a se sentirem vítimas das circunstâncias, ou então, nem tentam, por medo de errar, e assim acabam reproduzindo as mesmas escolhas.

Descobri muito cedo que o mundo melhor que eu desejava dependia de mim e não do outro, que não tinha o direito de depositar sobre os ombros de ninguém a responsabilidade de me fazer feliz.

Meu irmão, César, me lembra que ficava esperando eu voltar da rua, passando pelo basculante que tinha no alto de sua cama, por que sempre trazia algo para comer – que naturalmente eu conseguia na vizinhança! Por ser o mais velho dos três, eu era mais solicitado. Assim, acabei tendo de assumir muito cedo, responsabilidades para as quais, claro, não estava preparado.

Meu maior temor, nessa época, eram as boiadas. Antes de me arriscar em sair para as ruas, me assegurava de não haver nenhuma nuvem de poeira no horizonte, pois podia significar uma boiada vinda em minha direção! O resultado dessa dieta pobre foi que nós três ficamos muito doentes e meu pai acabou migrando para Niterói, no Estado do Rio de Janeiro, separada da capital, a Cidade do Rio de Janeiro, pela Baía de Guanabara.

Comparo o meu amadurecimento com um seixo rolado, aquelas pedras redondas depositadas nas margens dos rios. No início, ao se desprender do rochedo, a pedra era cheia de arestas e ao longo de sua descida, ao se confrontar com outras pedras no caminho, foi perdendo as arestas até ficar redonda e assim pode passar a fluir com mais facilidade rio abaixo.

“Não devemos ter medo dos confrontos. Até os planetas se chocam e do caos nascem as estrelas!” – Charles Chaplin

Cada confronto que tive na vida certamente me ajudou a amadurecer a ponto de conseguir lidar com as dificuldades com cada vez maior facilidade. O amadurecimento da pessoa não tem a ver, necessariamente, com a quantidade de anos que viveu, mas como a maneira como soube aproveitar o que aconteceu à sua volta e consigo própria. Existem jovens já muito maduros e idosos ainda imaturos! Quando era criança, lembro que os adultos gostavam de conversar comigo e que eu me sentia melhor no meio deles que entre os jovens e crianças de minha idade! Pouco a pouco fui aprendendo a escolher, e a assumir os ônus e os bônus de minhas escolhas.

“Sou do tamanho do que vejo. E não do tamanho da minha altura.” – Fernando Pessoa

Assim que chegamos a Niterói moramos um tempo na rua, numa calçada perto da rodoviária, no centro da cidade. Meu pai fixava uma espécie de lençol no muro, para nos abrigar – ou nos esconder dos olhos do público! Mais uma vez, ele contava comigo para se ausentar. Com cerca de seis anos de idade tinha de cuidar de meus irmãos menores. Creio que durante alguns dias ou semanas, esta foi a nossa ‘casa’ até que meu pai levou a mim e ao meu irmão para a Casa do Garoto, no bairro do Cubango, em Niterói, onde havia um abrigo do Juizado de Menores. Cléia ele levou para outro internato, para meninas, no Rio de Janeiro.

Meu pai nos deixou ali e foi embora. As pessoas que me conheceram na ocasião contam que eu era muito falante e curioso e vivia cantarolando uma música: “Carolina, Carolina, você tem a perna fina, oh, oh, Carolina!” Só mais tarde, quando conheci minha mãe descobri que ela tinha uma perna mais fina do que a outra. A música devia ter algo a ver com ela…

“Se à noite choras pelo Sol, não verás as estrelas.” – Tagore

Reconheço que muito do meu jeito de pensar, de reagir, de me comportar ainda hoje, tem raízes nessas experiências que vivi ainda na infância! O sentido de responsabilidade e seriedade que dou a tudo o que faço, o cuidado que tenho com as pessoas que dependem de mim de alguma maneira, a valorização que dou à vida, à natureza, à família, a tendência a não deixar passar batido o que acontece à minha volta tendendo a ser reflexivo e a extrair um ensinamento de cada episódio, por mais banal que pareça, a tendência de tentar resolver por mim próprio os problemas antes de pedir ajuda. Identifico em cada um desses aspectos um pouco do que vivi quando criança. O que me fez ficar alerta quando tive de educar meus próprios filhos, sabendo que o que vivemos desde a nossa primeira infância pode nos marcar para a vida toda.

Como não tínhamos idade para ingressar formalmente na Casa do Garoto, o Diretor, Sr. Miller, ia nos encaminhar ao Juizado. Entretanto, o casal de zeladores foi generoso e pediu para ficar conosco, informalmente. Os chamávamos de ‘Papai João Couto’ e ‘Mãe Hogla’. Com quatro filhas adolescentes Marísia, Mércia, Marluce e Marilúcia e um filho, Moisés, num total de cinco irmãos, nos abraçaram como se fôssemos membros da família. Foi a mais importante experiência que eu e meu irmão tivemos na infância, de viver numa família estruturada.

Era chamado pelo segundo nome. Meu irmão César e as pessoas que me conheceram antes do Serviço Militar, ainda me chamam de Sidnei! Só a partir do Exército é que passei a ser chamado pelo primeiro nome, Vilmar, e até eu próprio estranhava, já que até então ninguém nunca havia me chamado assim!

Postado por Vilmar S. Demamam Berna às 12:31 Nenhum comentário:  

 

A difícil convivência com meu pai

“Me ame quando eu menos merecer, pois é quando eu mais preciso” – Provérbio chinês

Quando meu pai ressurgiu em minha vida eu tinha uns nove anos. Lembro das brigas com o casal que cuidava de nós. Meu pai os acusava, injustamente, de nos ter ‘roubado’ dele. Na verdade, ele estava interessado mais em mim, para vender doces nas ruas de Niterói, o que acabou acontecendo depois que fui obrigado a voltar a morar com ele. Era uma realidade completamente diferente para mim. Na casa de Mãe Hogla nem sair à rua eu podia! Com meu pai, a rua era onde eu tinha de passar o meu dia e tinha de ficar esperto para não ser enganado na hora do troco ou para evitar perder a mercadoria para os chamados ‘rapa’, como eram chamados os guardas municipais, que reprimiam o comércio clandestino de camelôs! Um dia recolheram minha mercadoria. Pequei uma pedra grande e lancei sobre o vidro do carro dos ‘rapas’ e corri até não poder mais. Ao chegar a casa, ainda levei uma surra do meu pai por ter perdido a mercadoria. Revoltado com a situação fugi e voltei para a casa de Mãe Hogla, que me recebeu com alegria. Mas meu pai voltou lá e me resgatou novamente. Para evitar que eu continuasse fugindo, ele mudou-se para mais longe, Tribobó, em São Gonçalo, município muito carente, vizinho a Niterói, aonde vim a conhecer um pouco mais sobre minha história.

Um dia, recebemos a visita de dois irmãos, por parte de pai, a Elmínia, que veio com o filhinho, e o Fernando, acompanhado pela esposa Odite. Para mim, uma surpresa, pois pouco sabia sobre o passado do meu pai, muito menos que eu tinha outros irmãos, Fernando, Elmínia e a Odete. Soube então que o meu pai obrigava a primeira esposa a conviver com minha mãe na mesma casa até o desquite, um ano antes do meu nascimento. Na época, o Fernando tinha 13 anos, a Elmínia 11 e Odete, 5 anos. O pai pagou pensão por algum tempo, mas logo deixou de pagar, e o meu irmão Fernando, com apenas 13 anos teve de trabalhar duro para ajudar a mãe dele a sustentar a família.

Mesmo pequeno, pude perceber quanta dor e assuntos mal resolvidos existiam na vida passada do meu pai. Lembro que ele reclamou bastante de mim ao Fernando. Que eu era muito rebelde, fujão e que o enfrentava. O sentimento que tive foi de que ninguém ali gostava de mim, e, claro, nestas condições só reagia no sentido de gostarem menos ainda.

“Todos têm uma criança alegre dentro de si, mas poucos a deixam viver.” – Augusto Cury

Logo depois, fugi de novo, de volta para a casa de Mãe Hogla e Papai João Couto. Caminhei descalço por cerca de dez quilômetros, só de calção e sem camisa, debaixo de um sol de verão carioca de mais de 40 graus! Sentia o asfalto mole debaixo dos meus pés, de tão quente! Meu esforço sensibilizou uma das filhas, Mércia, que acabara de se casar com Silvinho e estava de mudança para Macaé (RJ). Decidiram me levar junto. Foi um dos melhores períodos de minha infância!

Macaé, nesta época, era uma cidade pequena do interior antes de ser invadida pelo ‘progresso’, com a descoberta do Petróleo na Bacia de Campos. Acompanhei o que o crescimento econômico fez com a pequena cidade. A concentração de renda aprofundou a divisão entre ricos e pobres e criou uma cidade partida, de um lado a miséria e do outro o luxo, com uma classe média entre eles. Recentemente, Macaé foi apontada em pesquisa nacional como uma das mais violentas do Brasil! A explosão demográfica e a especulação imobiliária não mediram esforços na ocupação de margens de rios e lagoas, desmatando e subindo encostas, poluindo as águas com esgoto e o solo com lixo! O que vi acontecer com Macaé serviu-me de referência e reflexão sobre um tipo de ‘progresso’ que mais apropriadamente deveria se chamar ‘retrocesso’, pois costuma deixar atrás de si um rastro de terra ambientalmente arrasada, miséria e exclusão social. Em termos de progresso e qualidade de vida, em minha opinião, a Macaé de hoje é uma pálida imagem da Macaé do passado, embora agora a riqueza seja farta nas mãos de uns poucos. Vi diante de meus olhos o legítimo e necessário consumo para atender nossas necessidades ser transformado num consumismo desperdiçador de recursos, onde TER se tornou mais importante que SER e a felicidade passou a ser confundida com a posse de bens materiais.

Apesar das adversidades, considero que fui uma criança feliz, ao meu jeito, pois desde cedo percebi que a felicidade não dependia de eu ter uma mãe presente, ou um pai amoroso, ou brinquedos, ou roupas e calçados da moda, essas coisas que via que as outras crianças tinham, e eu não. Descobri que ninguém tinha a responsabilidade de me fazer feliz, a não ser eu mesmo!

“Nossas dúvidas são traidoras e nos fazem perder o que, com freqüência, poderíamos ganhar, por simples medo de arriscar.” – William Shakespeare

Como saber se minhas escolhas me conduziriam à felicidade? Como ter certeza de que, ao tentar mudar de uma situação que considero infeliz, não cairia em outra que me traria ainda mais infelicidade? Como ser uma pessoa boa, generosa, num mundo onde o mal parece triunfar mais que o bem? Ao procurar pelas respostas tive de encarar o desafio de viver de verdade e não apenas existir.

“A natureza faz do homem um ser natural. A sociedade faz dele um ser social. Somente o homem é capaz de fazer de si um ser livre.” – Rudolf Steiner

Ninguém nasce predestinado a ter uma visão otimista ou pessimista da vida, ou a ser feliz ou infeliz. Somos o resultado de nossas escolhas. Estou falando aqui de situações de normalidade e não de casos de doenças. A depressão, por exemplo, pode influir em nossa maneira de ver o mundo e tomar decisões, por isso merece tratamento. Normalmente, podemos reagir ao que nos acontece, de maneira instintiva, por impulso, de acordo com a nossa natureza, ou de acordo com a nossa cultura ou, ainda, segundo nossas escolhas; mas o fato é que não temos de ser vítimas nem marionetes do destino ou das circunstâncias!

Lembro de uma de minhas peraltices na época em que vivi em Macaé. Os funcionários da garagem da Viação Macaense me flagraram brincando de motorista num dos ônibus e naturalmente me retiraram do local. Mas eu era criança e não compreendia ainda certas coisas. Então, voltei escondido e, para me vingar, roubei as chaves dos ônibus, o que provocou um caos na rodoviária e na Viação Macaense.

As crianças precisam ser orientadas por seus pais e tutores em suas escolhas, por que ainda não estão prontas. Fazer escolhas de maneira acertada é um aprendizado para a vida toda. À medida que cresce, a criança vai tomando cada vez mais em suas mãos o seu destino, a possibilidade de fazer suas escolhas livremente sem ser tutoradas. Claro que isso depende do acerto de nossas escolhas, pois mesmo na vida adulta, quando escolhemos errado, a sociedade dispõe de mecanismos, como por exemplo, a prisão, para voltar a tutorar nossas escolhas.

Naquele dia todo mundo teve o horário atrasado por conta de minha travessura! Silvinho, que tinha o hábito de brincar comigo me jogando para o alto, ao chegar para o almoço, viu as chaves dos ônibus caírem do meu bolso! Imediatamente ele foi à garagem e as devolveu, para o alívio de todos.

Em outra oportunidade, fugi à noite para assistir ao espetáculo de um circo que só começava depois das 21 horas. Enfiei-me por debaixo da lona e fiquei deitado, assistindo ao espetáculo, até que senti alguém me puxar pelos pés! Pensei ser o dono do Circo que tinha me descoberto, mas era Silvinho, que tinha conseguido me achar depois de uma longa e preocupante busca pela cidade.

Silvinho era uma dessas pessoas especiais, muito trabalhador, sempre risonho, gostava de brincar comigo. Mesmo com todas as confusões que aprontei, nunca foi violento comigo! Quem me castigava era Mércia, sua esposa e minha irmã de criação. Geralmente me proibia de sair, ou de andar de bicicleta, ou me obrigava a varrer o enorme quintal da casa onde morávamos, nada que se comparasse com a brutalidade de meu pai que, por qualquer motivo, me surrava de cinto.

Meu pai continuava pressionando o casal João Couto, agora no Juizado de Menores, por que queria pegar a mim e ao meu irmão de volta, para colocar na venda de doces. O Juiz determinou que voltássemos a morar novamente com meu pai. Desta vez, para que eu não voltasse mais a fugir, ele se mudou para o Rio de Grande Sul. Era o ano de 1968, e fomos morar numa cidade conhecida por Alvorada, na região metropolitana de Porto Alegre, onde minha irmã Cléia ficou morando até hoje e onde nasceram seus filhos, minha sobrinha Dini, e meus sobrinhos gêmeos, Rafael e Daniel.

Postado por Vilmar S. Demamam Berna às 11:44 2 comentários:  

 

Eu tinha mãe! E era viva!

“Não seja escravo do seu passado. Busque novos oceanos, mergulhe fundo, nade para longe da praia. Quando voltar, estará livre de frustrações, carregando um poder que desconhecia. Isso o fará olhar além das montanhas do medo, em direção a um novo presente.” – Ralph W. Emerson

Um dia, em nossa casa em Alvorada, no Rio Grande do Sul, meu pai ainda era vivo e eu tinha uns 13 anos, apareceu uma mulher baixinha, com uma perna bem mais fina e menor que a outra, assustada com a possibilidade de meu pai voltar enquanto ela estivesse ali. Apresentou-se como minha mãe, que até aquele instante eu imaginava morta!

Minha primeira atitude foi de surpresa e depois uma mistura de incredulidade e revolta. Sentia-me enganado não só por meu pai ter mentido o tempo todo, mas também pela minha mãe, que eu julgava não ter nos procurado antes.

Sempre que se referia a minha mãe, o pai não poupava críticas. Dizia que não ‘prestava’, que era uma ‘prostituta que tinha tirado da zona’, e outras palavras grosseiras para encerrar de vez o assunto e evitar que continuássemos perguntando. Cresci com a informação de meu pai de que a mãe tinha morrido queimada na fatalidade de um incêndio, provocado por um curto-circuito no armazém que tiveram juntos.

Lembro que, na escola, quando criança, era obrigado a fazer trabalhos valendo nota para o ‘Dia das Mães’ e entregava à professora, que assumia o ‘papel de mãe’! Quantas vezes acordei com pesadelos, quando criança, com minha mãe gritando por socorro no meio do fogo!

A visita de minha mãe durou pouco, tempo suficiente para ela contar a sua versão da história. Disse que o pai sim é que ‘não prestava’ e que havia nos roubado dela e fugido, depois de tocar fogo no armazém que tinham, na tentativa de receber o seguro. Contou que, mesmo grávida, nos procurou por todo o canto, e que ‘chorou lágrimas de sangue’ (a expressão que usou) a perda de nós três, ficando apenas com estas fotos, que guardava na carteira como lembrança.

Ela disse que o pai agiu daquela maneira após retornar de uma viagem de alguns meses a trabalho, e encontrá-la grávida e, pelos cálculos dele, não teria dado tempo para que fosse ele o pai. Sentindo-se traído, a briga foi inevitável e colocou fogo no armazém. Enquanto minha mãe buscava abrigo em outro lugar para se proteger, ele fugiu do Rio Grande do Sul, para Brasília, levando os três filhos pequenos com ele. Essa foi a história que ela contou, entretanto, não confere com os fatos, pois minha irmã, Sheila Cristina, é nascida em Brasília, no mesmo período em que eu e meus irmãos vivíamos lá, apenas com o pai. Teriam meu pai e minha mãe divididos os filhos entre eles? Teriam convivido também em Brasília, onde nasceu a Sheila? Não temos mais como saber. O fato é que meu pai ficou com três filhos, eu, César e Cléia, e a mãe com o Tarcísio e a Sheila. Mais tarde, a mãe teve mais três filhos, de pais diferentes, a Fernanda, que faleceu vítima de atropelamento, aos nove anos, a Daiana e o Luiz Alberto.

Minha mãe mostrou então a foto de meu novo irmão, de nome Tarcísio, e que não sabemos o paradeiro, e a Sheila, mais nova que ele.

Depois desta rápida visita de minha mãe, nunca mais voltei a vê-la e, apesar de tentar encontrá-la, através de catálogos de telefones, não fazia a menor ideia nem mesmo em que cidade procurar. Talvez por medo que o pai a encontrasse, não deixou nenhum endereço! Depois de um tempo procurando, desisti, por que pensei que se eu não tinha o endereço dela, nem como fazer contato, ela tinha o meu endereço, e faria contato comigo, se quisesse.

Soube depois, pelo meu irmão César, que ela retornou ainda umas duas vezes à casa do meu pai, e que eles brigaram. Da primeira vez, minha mãe atirou uma pá contra o pai, e na segunda, uma enxada. Com este grau de animosidade entre eles, realmente, não tínhamos a menor chance de viver numa família estruturada. A tendência foi o afastamento, e a mãe desapareceu novamente. Nesta época, eu não morava mais com o pai, pois estava internado no Juizado de Menores, onde nunca recebi a visita nem de meu pai, nem de minha mãe!

Só em 2005, voltei a ter notícias de minha mãe, graças ao Orkut e ao meu irmão mais novo, Luiz Alberto, que vim a conhecer através da internet. Chefe de escoteiros e segurança por profissão, meu irmão Luis Alberto é também um apaixonado pela natureza, como também era meu irmão Fernando, por parte de pai!

Soube então que minha mãe havia conseguido mudar o próprio nome trocando o Demamam pelo nome de solteira de sua mãe. Como procurava nos catálogos telefônicos por Síria Marina Demamam, realmente não conseguiria encontrar, pois o nome dela passou a ser Síria Marina Bombardieri.

E soube também que uns dois anos antes, ela tinha morrido, vítima de um atropelamento no ponto do ônibus. Chovia muito, e o veículo não conseguiu parar ao derrapar no asfalto molhado. Ironicamente, no mesmo local onde também morreu atropelada minha irmã Fernanda, com apenas 9 anos de idade. Nos seus últimos anos, minha mãe vivia na companhia do meu irmão Luis Alberto, pois as duas filhas Sheila e Daiana já estavam casadas.

Postado por Vilmar S. Demamam Berna às 11:32 Um comentário:  

sexta-feira, 12 de março de 2010

 

Tempo de construir muros em vez de pontes

“Enquanto não tiveres conhecido o inferno, o paraíso não será bastante bom para ti.” (provérbio curdo)

Os confrontos com meu pai se aprofundaram à medida que eu crescia. Nunca me conformei com sua agressividade e, à medida que fiquei maior, passei a enfrentá-lo. Às vésperas de completar 15 anos, em 1970, durante mais uma das tentativas do pai em me agredir com um cabo de vassoura, eu o enfrentei e tomei a madeira da mão dele e, nisso, ele acabou se machucando, quebrando os óculos e se ferindo. Então, levou-me até a Delegacia de Polícia e disse que não podia mais ficar comigo. Como eu também não queria mais ficar com ele, não achei ruim. Então, o Delegado me encaminhou ao Juizado de Menores e fui levado como se fosse bandido perigoso em camburão da polícia para a antiga FEBEM-RS (Fundação do Bem-Estar do Menor do Rio Grande do Sul), e extinta em 2002, em parte devido à campanha do Jornal Zero Hora que denominava o local de “Casa de Horrores”. Tratava-se de uma “unidade de contenção máxima” para menores, sem distinguir entre infratores e abandonados, na verdade, um presídio para menores, a grande maioria negra e a maioria absoluta pobre, localizado no Morro de Santa Tereza, em Porto Alegre. Meu aniversário de 15 anos foi passado na solitária, aonde voltei no meu aniversário de 51 anos, para rever (foto por Leonardo Berna).

Na FEBEM-RS era adotado o regime de confinamento por qualquer motivo, ainda que fútil. A solitária, entretanto, era meu lugar preferido pois recebia livros trazidos pelas assistentes sociais. Lia vários ao mesmo tempo, às vezes na média de um por dia! Não tinha mais que vender sonhos ou me defender de meu pai. E podia relaxar, ao contrário de quando estava no pátio junto com os outros menores, onde precisava ficar alerta para não ser agredido, um estado de estresse permanente.

“Ler é transcender, é possibilitar, é ir além do nosso por vezes cruel mundo imediato – tantas e tantas vezes nos abrigamos no confronto acolhedor da leitura quando estamos amuados ou pesarosos. Ler é abrir janelas, destramelar portas, enxergar com outros olhares, estabelecer novas conexões, construir pontes que ligam o que somos com o que outros, tantos outros, imaginaram, pensaram, escreveram. Ler é fazer-nos expandidos. Quando falamos de livro e leitura falamos, portanto, de expansões e de potencialidades.” – Gilberto Gil

As assistentes sociais e psicólogas achavam curioso um menor tão erudito, com uma conversa tão sofisticada e filosófica! Chegavam a vir discutir trabalhos de faculdade comigo! Eu lia de tudo, romance, poesia, mas gostava mesmo era de filosofia, psicologia, sociologia, religião, biografias, enciclopédias e até a Bíblia! Quando um autor citava outro, eu anotava o livro citado e pedia que me trouxessem. O livros eram para mim como os amigos que eu não tinha na prisão! Consegui também que me dessem caderno e caneta e passei a escrever intensamente como uma forma de arrumar e mesmo esvaziar o pensamento, de dialogar comigo mesmo, de me recolher ao meu mundo interior.

“A liberdade é a possibilidade do isolamento. Se te é impossível viver só, nasceste escravo.” – Fernando Pessoa

O tempo que passei na solitária me ensinou a gostar da minha companhia e a ser o meu melhor amigo. Não me sentia sozinho, por que tinha os meus ‘amigos espirituais’, os autores dos muitos livros que lia. Eles me faziam viajar, conhecer outros lugares, outros olhares. Conversava com eles, me inspirava neles. Então, durante um tempo em minha vida preferi construir muros em vez de pontes, para deliberadamente deixar de fora da minha vida um mundo que não era o meu, do qual não me sentia parte. Apesar de meu corpo estar prisioneiro, minha alma era livre! Nesta época, tive acesso a um texto de William Shakespeare que foi muito importante para mim desde então:

Depois de algum tempo você aprende a diferença, a sutil diferença, entre dar a mão e acorrentar uma alma.
E você aprende que amar não significa apoiar-se, e que companhia nem sempre significa segurança.
E começa a aprender que beijos não são contratos e presentes não são promessas.
E começa a aceitar suas derrotas com a cabeça erguida e olhos adiante, com a graça de um adulto e não com a tristeza de uma criança.
E aprende a construir todas as suas estradas no hoje, porque o terreno do amanhã é incerto demais para os planos, e o futuro tem o costume de cair em meio ao vão.
E aprende que não importa o quanto você se importe, algumas pessoas simplesmente não se importam…
E aceita que não importa quão boa seja uma pessoa, ela vai feri-lo de vez em quando e você precisa perdoá-la por isso.
Aprende que falar pode aliviar dores emocionais.
Descobre que se levam anos para se construir confiança e apenas segundos para destruí-la, e que você pode fazer coisas em um instante, das quais se arrependerá pelo resto da vida.
Aprende que verdadeiras amizades continuam a crescer mesmo a longas distâncias.
E o que importa não é o que você tem na vida, mas quem você tem na vida.
E que bons amigos são a família que nos permitiram escolher.
Aprende que não temos que mudar de amigos se compreendemos que os amigos mudam, percebe que seu melhor amigo e você podem fazer qualquer coisa, ou nada, e terem bons momentos juntos.
Descobre que as pessoas com quem você mais se importa na vida são tomadas de você muito depressa, por isso sempre devemos deixar as pessoas que amamos com palavras amorosas, pode ser a última vez que as vemos.
Aprende que as circunstâncias e os ambientes têm influência sobre nós, e nós somos responsáveis por nós mesmos.
Começa a aprender que não se deve comparar com os outros, mas com o melhor que se pode ser.
Descobre que se leva muito tempo para se tornar a pessoa que quer ser e que o tempo é curto.
Aprende que não importa onde já chegou, mas aonde está indo, mas se você não sabe para onde está indo, qualquer lugar serve.
Aprende que, ou você controla seus atos ou eles o controlarão, e que ser flexível não significa ser fraco ou não ter personalidade, pois não importa quão delicada e frágil seja uma situação, sempre existem dois lados.
Aprende que heróis são pessoas que fizeram o que era necessário fazer, enfrentando as conseqüências.
Aprende que paciência requer muita prática. Descobre que algumas vezes a pessoa que você espera que o chute quando você cai é uma das poucas que o ajudam a levantar-se.
Aprende que maturidade tem mais a ver com os tipos de experiência que se teve e o que você aprendeu com elas, do que quantos aniversários você celebrou.
Aprende que há mais dos seus pais em você do que você supunha.
Aprende que nunca se deve dizer a uma criança que sonhos são bobagens, poucas coisas são tão humilhantes e seria uma tragédia se ela acreditasse nisso.
Aprende que quando está com raiva tem o direito de estar com raiva, mas isso não lhe dá o direito de ser cruel.
Descobre que só porque alguém não o ama do jeito que você quer que ame, não significa que esse alguém não o ama com tudo o que pode, pois existem pessoas que nos amam, mas simplesmente não sabem como demonstrar ou viver isso.
Aprende que nem sempre é suficiente ser perdoado por alguém, algumas vezes você tem que aprender a perdoar a você mesmo.
Aprende que com a mesma severidade com que julga, você será em algum momento condenado.
Aprende que não importa em quantos pedaços seu coração foi partido, o mundo não pára para que você o conserte. Aprende que o tempo não é algo que possa voltar para trás. Portanto, plante seu jardim e decore sua alma, ao invés de esperar que alguém lhe traga flores.
Você aprende que realmente pode suportar porque realmente é forte, e que pode ir muito mais longe depois de pensar que não se pode mais.
E que realmente a vida tem valor e que você tem valor diante da vida!
Nossas dúvidas são traidoras e nos fazem perder o bem que poderíamos conquistar, se não fosse o medo de tentar…

Nesta época comecei a escrever, a caneta, intensamente em cadernos uma espécie de diário, registrando meus comentários e reflexões sobre o que estava lendo, como se dialogasse com o autor do livro. Não tinha nenhuma ideia de que aquele conjunto de textos daria origem mais tarde aos meus livros

 

É Possível Ser Feliz e O Desafio do Mar

“As mais belas vitórias são as que alcançamos sobre nós mesmos”.– Chamfort

A FEBEM ficava no alto do Morro de Santa Tereza, em Porto Alegre (RS), de onde podia contemplar os pôres-de-sol no Rio Guaíba. A observação destes belíssimos entardeceres me reconfortava a alma!

Como o número de funcionários não era suficiente, e também não haviam oficinas de trabalho para todos, muito menos escola, os menores, muitos com assassinatos, roubos a mão armada, tráfico, ficavam à toa, no pátio, ocupando o tempo em evitar serem agredido ou em agredir. Os guardas pouco intervinham e, quando o faziam – talvez por terem de lidar com um grande número de menores sem ter estrutura, talvez por vivermos numa Ditadura Militar, onde a violência substituía o diálogo -, agiam com violência e recolhiam os mais rebeldes para a solitária.

“Do rio que tudo arrasta se diz que é violento, mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem.” – Bertold Brecht

Então, deliberadamente eu cometia pequenas infrações para retornar à solitária, o que quase sempre conseguia, mas não sem antes apanhar dos guardas! Aprendi que se deixasse a mão descer junto com a palmatória, ela não doía tanto, mas não funcionava com o Guarda Euzébio, que era especialmente perverso e parecia sentir prazer em bater nos menores.

Um dia, no plantão dele, um menor furou a fila do café da manhã bem na minha frente. Sem pensar nas consequências, empurrei-o com força e ele caiu no chão. Euzébio viu e quem apanhou fui eu. Com ele não funcionava o macete de abaixar a mão, por que se eu fizesse isso ele batia com o cacetete na cabeça. Jurei que iria matá-lo, mostrando o quanto a raiva pode ser má conselheira e responsável por muitos crimes que poderiam ter sido evitados.

“Você quer ser feliz por um instante? Vingue-se! Você quer ser feliz para sempre? PERDOE!” – Tertuliano

Por exemplo, ao sofrer uma injustiça, podemos escolher nos vingar ou perdoar, e isso fará toda a diferença. Claro, não significa que devemos conviver com as injustiças, pois, segundo Martin Luther King, “perdoar não significa ignorar o que foi feito ou colar uma etiqueta falsa sobre um mau ato. Significa, antes, que esse ato mau cesse de ser obstáculo às relações”.

Anos depois encontrei o Guarda Euzébio por um acaso, passeando no Parque da Redenção, onde teria a chance de atacá-lo e fugir, e escolhi não fazer nada. A raiva tinha passado. Descobri então que nem sempre o que eu desejava podia ser bom para mim, e agradeci por não ter sido atendido naquele momento!

Quando meu pai também entregou meu irmão César na Delegacia e ele foi parar na FEBEM onde eu já estava, consegui protege-lo. Passei a ser procurado por menores que me pediam proteção e queriam fazer parte do meu ‘bando’! Outros me procuravam para trocar drogas por roupa ou dinheiro, mas eu não tinha nem uma coisa nem outra e recusava o uso de drogas. Os poucos anos que vivi com aquela família de Mãe Hogla e Papai João Couto me deram os valores morais para recusar até mesmo o uso de cigarro ou álcool, que dirá drogas pesadas como as que circulavam livremente entre os menores na FEBEM!

Todos os domingos eram dias de visita. Mesmo os piores bandidos recebiam a visita geralmente da mãe, ou de irmãos, ou outros parentes que traziam doces, sanduíches, cigarro, dinheiro. Quando terminavam as visitas, e os menores voltavam com as sacolas cheias de doces, sanduíches, cigarros, roupas e calçados novos, e até dinheiro, eu ficava por perto, e sempre ganhava alguma coisa me aproveitando da lógica do bando, ao sugerir que se me dessem alguma coisa eu os protegeria.

Eu nunca recebi a visita de ninguém! Até a visita do meu pai seria bem vinda, mas ele nunca foi me visitar! Muito menos a minha mãe, que tinha conhecimento da situação, pois enquanto estive preso, fez novas visitas à casa onde moravam meus irmãos César e Cléia, e naturalmente ficou sabendo onde eu estava.

“No início, os filhos amam os pais. Depois de um certo tempo, passam a julgá-los. Raramente ou quase nunca os perdoam.” – Oscar Wilde

Depois que tive meus próprios filhos, perdoei meu pai. Compreendi que ele deu a mim o que podia dar e imagino que sua infância também deve ter sida dura, pois aparentemente reproduziu com os filhos o que provavelmente fizeram com ele.

Meu pai morreu aos 75 anos de idade de ataque cardíaco fulminante, e depois de passar cinco anos do final de sua vida lutando com um câncer provocado pela nicotina. Perdeu as cordas vocais e um pulmão, e ainda assim seguiu fumando pelo buraco que os médicos deixaram em sua laringe para que respirasse. Não o vi mais, desde aquele dia que me deixou na Delegacia de Polícia.

Postado por Vilmar S. Demamam Berna às 08:13 3 comentários:  

 

Violência

“Nunca perca a fé na humanidade, pois ela é como um oceano. Só porque existem algumas gotas de água suja nele, não quer dizer que ele esteja sujo por completo. “ – Gandhi

Li uma história, não lembro mais o autor, e que foi muito inspiradora para que eu compreendesse que o mal não era a ausência do bem, mas uma escolha consciente ou inconsciente. Um dia perguntaram a um sábio como ele lidava com os seus conflitos internos e respondeu que dentro dele existiam dois cachorros, um muito mau, uma fera, e outro muito bom e gentil e que ambos viviam brigando entre si. Quanto perguntaram quem ganhava a briga ele respondeu, aquele que eu alimentar. O problema nessa história é que de uma certa forma procura inocentar o tomador de decisão, como se as maldades fossem resultado de uma terceira pessoa, ou no caso, do cão feroz, ou do diabo!

“Não são as ervas más que afogam a boa semente, e sim a negligência do lavrador.” – Confúcio

Lembro do ‘Maníaco do Parque’ que após matar dezenas de moças e finalmente ser pego, afirmou candidamente que ‘na hora, me deu uma coisa que não sei o que foi, acho que eu estava incorporado do demônio’. Uma tentativa em justificar-se perante si próprio ou para pessoas a quem não gostaria de ter magoado, de que no fundo é uma boa pessoa e não pode ser responsabilizado pelas escolhas e decisões erradas que tomou, por que foi ‘influenciado pelo demônio’. Conversa fiada! Não existem nem deuses nem demônios, nem cãos mansos ou ferozes dentro de nós! O que existe somos nós, e nossa capacidade de escolher fazer o bem ou o mal.

“No Oriente, uma pessoa virtuosa não é aquela que busca concretizar a tarefa impossível de lutar pelo bem e eliminar o mal, mas, sim, aquela que se mostra capaz de manter um equilíbrio dinâmico entre o bem e o mal”. – Fritjof Capra

Na FEBEM, as circunstâncias que me foram impostas me obrigavam a escolher ser feroz em vez de ser manso, ou seria mais um a engrossar as estatísticas dos menores vítimas da violência dos demais. A tensão era permanente entre eles, principalmente no pátio, onde viviam de certa forma como cães de briga, rosnando uns para os outros, ou tramando crimes para quando fugissem dali. A própria Polícia Militar, em relatório reservado, afirmava tratar-se de um “berçário de formação de quadrilhas”. Procurava me manter longe dessas brigas e tensões e escolhi ficar independente. Entretanto, na lógica deles, não havia lugar para independentes. Ou você era ‘vencedor’ e se juntava a ‘vencedores’, ou você era ‘perdedor’ e seria abusado sexualmente e massacrado pelos mais fortes. Com Thomas Fuller aprendi que seria “loucura para o carneiro promover uma conferência de paz com o lobo.” Para me defender eu tinha de brigar e por isso vivia sendo ‘castigado’ com a solitária, o que na lógica dos menores me dava um certo status de forte, valente, vencedor e não de frágil ou perdedor. O pátio tinha o tamanho de um campo de futebol onde aglomeravam-se cerca de 300 menores que se ‘organizavam’ em bandos e sempre seguiam um líder. O equilíbrio de forças entre os bandos era quebrado uma vez ou outra por brigas entre eles, para ajustar as forças.

O mal tinha muitos nomes, um deles era indiferença. Alimentava o mal ao escolher não intervir quando via um menor mais fraco sofrendo crueldade por parte de outros. Existe um provérbio árabe que diz que quando queremos fazer alguma coisa, sempre arranjamos um jeito de fazer e, quando não queremos, sempre arranjamos uma desculpa. A minha desculpa para não agir era considerar que aquele não era um problema meu, que existiam guardas para cuidar do assunto e que cada um tinha de saber se virar, e virava as costas ao problema. Entretanto, a minha covardia passou a me incomodar por que para me manter indiferente eu também tinha de me tornar uma pessoa fria e insensível diante do sofrimento alheio. Então, mesmo correndo riscos, passei a defender outros menores. Certa vez, durante o banho, enfrentei dois menores mais fortes que eu que tentavam abusar sexualmente de uma criança, que devia ter uns 8 ou 9 anos de idade. Acabei apanhando por que é muito difícil lutar nu e com o corpo molhado. O barulho atraiu a atenção dos guardas que interviram rapidamente, e assim consegui escapar, claro, sendo levado para a solitária por mais trinta dias. A criança escapou, pelo menos desta vez. E ganhei a inimizade dos dois, principalmente por que foram descobertos, e passaram a me acusar de ser um ‘caguete na sugesta’, ou seja, eu não caguetava diretamente, mas, ao passar a intervir, gerava barulho e criava confusão que atraia a atenção dos guardas. Felizmente, a acusação não teve maiores consequências, mas poderia ter tido, pois imperava entre os menores a Lei do Silêncio onde você podia fazer ou ser vítima de qualquer violência ou barbaridade, só não podia cometer o imperdoável erro de delatar, seja por que motivo fosse, ou a pena poderia ser até a morte! Existia uma ala na FEBEM chamada de ‘seguro’, só para estes menores ameaçados!

As assistentes sociais e psicólogas não conseguiam compreender como um menor podia ser tão inteligente e erudito num momento, e tão ‘desajustado’ e violento em outro. Lembro de outra briga com um menor cujo apelido era Carnaval, um líder respeitado por todos e bem mais forte que eu. Não lembro mais o motivo da briga, mas lembro das consequências. Por sorte, um de meus socos o atingiu no supercílio e ele desmaiou. O soco foi tão forte que quebrei a mão! Os guardas me recolheram novamente à solitária e minha mão teve de curar sozinha. Depois disso, passei a ser respeitado entre os menores. Carnaval jurou que me mataria na primeira oportunidade, e eu passei a evitá-lo. O fato é que nunca mais ele me enfrentou e também nunca mais o vi depois que saí da FEBEM.

Hoje, quando vejo pessoas de bem flagradas cometendo crimes, como religiosos envolvidos com pedofilia, policiais e políticos envolvidos com corrupção, e mesmo pessoas comuns, pacíficas a vida inteira, mas que explodem de uma hora para a outra cometendo crimes às vezes bárbaros que resultam na morte de um motorista que os tenha fechado no trânsito, por exemplo, lembro da história do cachorro bom e do cachorro mal. Somos pessoas de bem, honestas, solidárias, pacíficas, gentis, por que alimentamos escolhas do bem, mas não devemos nunca descuidar pois dentro de nós existe a capacidade de também escolher o mal. Ninguém está a salvo, nem o mais santo dos religiosos, nem o mais honesto dos policiais ou a mais alta autoridade. E este mal tem nome e seu nome é ‘legião’ pois são muitos! É a indiferença, a frieza, a ganância, o egoísmo, a falta de gentileza, a arrogância, a covardia, a preguiça, a gula, a hipocrisia, a mentira, etc. Minha passagem pela FEBEM me permitiu aprender esta lição e não me iludo mais achando que se escolher sempre o bem afastarei de mim a possibilidade de escolher o mal. Minha capacidade de escolher o mal pode estar enfraquecida por que não a alimento mais e por que cultivo valores do bem, mas é uma capacidade em potencial, faminta por minha atenção e por minhas escolhas, e o preço de eu permanecer seguro no caminho das boas escolhas é a permanente vigilância e a busca da clareza sobre minhas alternativas e possibilidades, meus sonhos e propósitos, jamais cometendo o erro de deixar que minhas decisões me ‘carreguem’, ou escolher não escolher, por que aí outros estarão escolhendo em meu lugar, mas os ônus dessas escolhas recairão sobre mim!

Postado por Vilmar S. Demamam Berna às 08:08 Nenhum comentário:  

 

‘33’

“O presente não devolve o troco do passado, sofrimento não é amargura, tristeza não é pecado, lugar de ser feliz não é o supermercado” – Zeca Baleiro

Por volta dos dezessete anos, fui transferido para o Novo Lar de Menores, em Viamão (RS), uma instituição mantida por Padres católicos para menores carentes e infratores. Não queria ser transferido, a não ser que meu irmão fosse junto, o que me prometeram fazer logo em seguida, pois dependiam de vaga.

Ganhei o número 33, que aparecia nas roupas, armário, cama. Meu próprio nome passou a ser 33! No início, me rebelei contra isso, e fazia de conta que não ouvia enquanto não me chamassem pelo meu nome. Com o tempo, acabei me acostumando a ser 33. Aprendi o ofício de tipógrafo e revisor gráfico, por que já lia muito bem e tinha facilidade em descobrir erros nos textos. Alguns meses depois, meu irmão César se juntou a mim, e também consegui que ficasse na gráfica, comigo. César especializou-se em impressão gráfica, e até hoje vive da profissão, com a ajuda de sua família, a esposa Cláudia e meus sobrinhos Bruno e Júnior! A gráfica que fundou em Macaé, a Sulimpress, já passou dos 30 anos de existência!

A árvore, na entrada do Novo Lar de Menores, em Viamão (RS), faz parte da história do meu livro “Parábola da Felicidade”, onde coloco na história de quatro personagens mitos que fazem as pessoas correrem às tontas atrás da felicidade, como dinheiro, fama, beleza, amor. Neste livro, conto sobre quatro jovens que queriam ser felizes e sobre um momento mágico que permitiu que encontrassem o que desejavam, até que descobriram que a felicidade não dependia em nada daquilo que buscavam por que ela sempre esteve ali mesmo, ao alcance da mão. Esta árvore inspirou-me quando precisei pensar em alguma coisa mágica para ilustrar minha história.

Alguns meses antes de completar dezoito anos, fui transferido para uma Casa Lar, em Porto Alegre, e passei a trabalhar como Office-boy no Motel Clube dos Militares. Na semana em que ia completar 18 anos, e ser desligado do Juizado de Menores, encontrei por acaso na rua um grupo de antigos ex-internos da FEBEM que planejavam assaltar um banco! Convidaram-me para participar, sob diversos argumentos, primeiro o de demonstrar coragem, e o segundo da certeza da impunidade, pois já tinham tudo arranjado e até contavam com a cumplicidade de um dos seguranças do próprio banco. Ou seja, argumentavam que seria fácil entrar na madrugada pelo esgoto e sair com dinheiro suficiente para fazermos o que quiséssemos da vida! Pedi a eles um dia para pensar e nunca mais os procurei. Poderia ter cedido, seja pela perspectiva do ganho financeiro ou para demonstrar ‘coragem’! Lembrei do que Ghandi disse, que “é preferível mil vezes afrontar o mundo estando de acordo com a sua consciência a afrontar a sua consciência para ser agradável ao mundo. Tudo está bem com você, mesmo que tudo pareça estar completamente errado, se tem paz interior. Inversamente, tudo está errado com você, mesmo que exteriormente tudo pareça estar bem, se não está em paz com sua consciência”. Percebi que não poderia continuar vivendo no Rio Grande do Sul, pois corria o risco de continuar esbarrando com estes antigos ex-internos, agora já adultos e que escolheram permanecer no caminho do crime, e até acabar sendo confundido com eles, caso estivessem sendo vigiados! Quanto ao dinheiro que poderia ganhar, não me encheu os olhos, como não me enche até hoje. Lembro das palavras de George Horace Lorimer de que “é bom ter dinheiro e as coisas que o dinheiro pode comprar. Mas é bom também verificar de vez em quando se não estamos perdendo as coisas que o dinheiro não pode comprar.” De maneira alguma poderia perder novamente a minha liberdade!

Nesta época, descobri o poema Instantes, de Jorge Luiz Borges, que foi decisivo naquele momento de minha vida, para saber o de fato merecia ser valorizado:

“Se eu pudesse viver novamente a minha vida, na próxima, trataria de cometer mais erros.
Não tentaria ser tão perfeito, relaxaria mais.
Seria mais tolo ainda do que tenho sido; na verdade, bem poucas coisas levaria a sério.
Seria menos higiênico.
Correria mais riscos, viajaria mais, contemplaria mais entardeceres, subiria mais montanhas, mais rios.
Iria a mais lugares aonde nunca fui, tomaria mais sorvetes e menos lentilha, teria mais problemas reais e menos problemas imaginários.
Eu fui uma dessas pessoas que viveu sensata e produtivamente cada minuto da sua vida; claro que tive momentos de alegria, mas, se não sabem, disso é feita a vida, só de momentos; não percas o agora.
Eu era um desses que nunca ia a parte alguma sem um termômetro, uma bolsa de água quente, um guarda-chuva e um pára-quedas; se voltasse a viver, viajaria mais leve.
Se eu pudesse voltar a viver, começaria a andar descalço no começo da primavera e continuaria assim até o fim do outono.
Daria mais voltas na minha rua, contemplaria mais amanheceres e brincaria com mais crianças, se tivesse outra vez uma vida pela frente.
Mas, já viram, tenho 85 anos e sei que estou morrendo.”

Não tive nenhuma dúvida, principalmente após ler em Disraelli que a vida é muito curta para ser pequena. Pedi demissão do emprego e, com o dinheiro da rescisão, comprei a passagem e voltei de ônibus para Niterói.

Ao chegar, busquei abrigo com a família de Mãe Hogla e Papai João Couto, e cheguei a morar com eles por alguns meses. Receberam-me com alegria, como sempre. Conseguiram com o Pastor Alberto Lessa, da Igreja Batista de Neves, uma vaga à noite na escola da Campanha Nacional de Escolas da Comunidade (CNEC), em São Gonçalo, no bairro Pita, para que eu concluísse o antigo primeiro grau. Na escola, logo passei a me destacar em várias atividades extraclasse. Fundei o jornal ‘O Corujão’, onde eu era repórter, redator, editor, impressor (em mimeógrafo) e distribuidor.

Esta experiência estimulou-me a ingressar no jornalismo, colaborando como voluntário, e escrevendo sobre democracia, cidadania e comunicação, desde 1976, no Jornal “A Palavra” do Jornalista Tácito Tani que em seguida, convidou-me a compor a chapa que disputou a eleição para o Sindicato dos Jornalistas do Estado do Rio de Janeiro, onde fiz parte da Diretoria por três legislaturas, um cargo voluntário, não remunerado. Fundei, no sindicato, o primeiro núcleo de repórteres fotográficos e o primeiro núcleo de jornalismo ambiental no Estado do Rio de Janeiro e ajudei na moralização do quadro de associados.

Também ingressei no grupo de teatro da Escola, que era coordenado pela Professora Sônia, onde interpretei o papel principal de O Pequeno Príncipe, de Antoine de Saint-Exupéry, Juca Mulato, de Menotti Del Picchia, e Vida e Morte Severina, de João Cabral de Melo Neto.

Durante o dia, procurava emprego, mas ninguém queria contratar um jovem que ainda dependia de cumprir o serviço militar. Luis, marido de Marísia, uma das filhas do casal João Couto, conseguiu-me um estágio remunerado como auxiliar de modelador de calçados numa fábrica, em São Gonçalo (RJ), onde chequei a desenhar alguns modelos. Entretanto, para o desgosto do Luis, que se empenhara para me conseguir aquele lugar, não me adaptei ao barulho ensurdecedor das máquinas de lixar couro, ao cheiro forte das tintas, ao calor insuportável das telhas de amianto, à poeira constante no ar do couro lixado, e acabei deixando o estágio. Esta minha decisão deixou a família irritada comigo, como se eu fosse malandro e não quisesse trabalhar.

Além disso, a casa era pequena, e a família grande, e por mais boa vontade que tivessem comigo, e tinham, eu já não era mais aquele garotinho que eles conheceram no passado. Cabeludo, parecendo um hippie, com ideias próprias, e, agora que pedira demissão, também malandro…

Como estava cada vez mais próximo do dia de me apresentar para cumprir o Serviço Militar obrigatório, via uma oportunidade de ter moradia, alimento e ainda um soldo. Então, decidi deixar a casa, pois sentia que estava importunando a família. Disse a eles que iria acampar, atividade que adorava fazer. Arrumei minhas poucas coisas na mochila, me despedi de todos, e nunca mais voltei.

Por uns tempos, dormi nas ruas mesmo, em carros abandonados. Pedia dinheiro dizendo que era para procurar emprego, mas era para comer mesmo. Por isso, hoje, quando sou abordado por pedintes, ajudo sempre, assim como me ajudaram um dia também, e nem por isso virei mendigo.

Consegui então um emprego de guardador de automóveis na antiga CODERTE e por uns dois meses trabalhei na Avenida Amaral Peixoto, a principal de Niterói. Com o pouco dinheiro que ganhava, aluguei uma cama numa pensão para rapazes, e comprei uma bicicleta por que não tinha dinheiro para pagar a passagem. Mas ficava pouco tempo nos empregos, pois não conseguia me ajustar a ser guardador de carros ou office boy.

Confundido com terrorista

“Viver é correr risco.” – Stephane Peter Hansel

Como não tinha onde morar, ingressar no serviço militar parecia-me uma boa opção, pois ganharia casa, comida, roupa. Hoje, isso seria impossível. Atualmente, o Exército tem iniciado o expediente às segundas-feiras, a partir das 13 horas e encerra às 18 horas, sem refeições, e não tem ‘rancho’ na sexta, sábado e domingo! O jornalista Alexandre Garcia denunciou o fato que desde os anos 80 as forças armadas vêm sendo sucateadas, enquanto muitos vizinhos se armam e alerta que a melhor maneira de derrotar um exército, sem precisar dar um tiro, é cortar-lhe os suprimentos. “Saladino derrotou assim os cruzados cristãos; a Rússia derrotou Napoleão e Hitler porque faltaram suprimentos aos invasores. Nas Malvinas, os ingleses cortaram os suprimentos da ilha.”

Eu tinha a possibilidade de ficar como sobra de contingente e não servir, pois um professor na escola onde estudei era sargento naquela unidade e estava na hora do meu recrutamento. Ele sugeriu me dispensar, mas, meio constrangido, disse que preferia servir, e fui classificado como voluntário. Ele não conhecia a minha história e dificuldades, e ficou sem entender a minha decisão e eu tinha vergonha de dizer a ele que era por que não tinha onde morar, não tinha emprego, e passava fome… Assim, passei a morar no Quartel do 30º Grupo de Artilharia, no Barreto, em Niterói (RJ), onde fui designado para o setor de comunicações, na Bateria de Comando. Era conhecido como ‘percevejo’, alusivo aqueles alfinetes que ficam grudados no quadro verde.

Como desenhava muito bem, o Comandante deu-me a missão de desenhar a logomarca do Batalhão nas guaritas do Quartel, o que fiz com capricho, por que era a chance de não me darem outras tarefas, assim, procurei demorar-me ao máximo desenhando e pintando a granada símbolo da artilharia em cada guarita externa.

Servi em 1975. Apesar de certo abrandamento da censura à imprensa, neste ano ocorreram inúmeras prisões de cidadãos considerados ‘subversivos’. O jornalista Vladimir Herzog foi morto neste ano, sob tortura, nas dependências do DOI-CODI de São Paulo. No Quartel, os instrutores faziam uma verdadeira lavagem cerebral nos jovens recrutas alertando sobre os perigos dos ‘inimigos da democracia’, os subversivos e terroristas, a necessidade de sermos firmes e patriotas para defender o Brasil dos comunistas! Diziam-nos para desconfiar até de velhinhas e crianças, de mães chorosas por seus filhos, pois todos podiam estar sendo ‘massa de manobra’ de terroristas!

Durante uma madrugada de domingo, eu dormia, sozinho no alojamento, quando fui acordado pelo próprio Comandante de minha unidade! Aquilo não era comum, entretanto, a regra era de que ‘soldado no quartel quer serviço’, então, à primeira vista, achei que era alguma tarefa que iriam me dar. Levantei meio assustado, lavei o rosto rapidamente e vesti a farda e me apresentei. Ao comparecer ao gabinete, um susto. O conteúdo do meu armário, os livros que eu lia e minhas anotações sobre trechos que destacava, estava empilhado na mesa do comandante.

Ele foi direto ao ponto, perguntou se eu era comunista, e o que aqueles livros de comunistas estavam fazendo em meu armário! Nervoso, tentei explicar que os livros não eram meus, mas pertenciam à Biblioteca Pública Estadual e, por serem livros de empréstimo a qualquer um, achei que não tinha nada de mais em também pedir emprestado. E como não tinha onde morar, o único jeito era trazer para o quartel e guardar em meu armário! Sobre os motivos, expliquei que gostava muito de ler e que fiquei curioso sobre o que motivava os comunistas, com que tipo de gente estaríamos lidando! Disse que queria saber como pensava o ‘inimigo’ para poder combatê-lo melhor.

O Comandante então começou a ler alguns de meus comentários em voz alta para mostrar que minha justificativa podia ser falsa, pois não eram comentários de quem analisa um ‘inimigo’, mas de quem, quer ou busca se associar ao ‘inimigo’. Entre os livros, o Comandante leu um trecho que transcrevi para um papel:

“Com o predomínio sempre crescente da população urbana, acumulada em grandes centros, a produção capitalista concentra, por um lado, a força motriz histórica da sociedade, mas, por outro, dificulta o intercâmbio entre o ser humano e a natureza, isto é, o regresso à terra dos elementos do solo gastos pelo homem na forma de meios de alimentação e vestuário, ou seja, perturba a eterna condição natural de uma fecundidade duradoura da terra”. – Marx, O Capital

O Comandante me disse que eu estava preso, a partir daquele momento, e fui recolhido à prisão no próprio Quartel. Curioso isso, enquanto alguns livros me libertavam, outros me prendiam! O Comandante disse que eu deveria aguardar preso pela decisão do Comando Maior! Imaginei que seria torturado e poderia mesmo ser assassinado, como aconteceu com Herzog, e temi pelo meu futuro! Lembrava também do líder guerrilheiro Carlos Lamarca, dirigente da extinta Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), um ex-capitão que desertou do Exército para abraçar as causas revolucionárias, e acabou morto, uns quatro anos antes, metralhado após ser caçado no sertão nordestino.

Não sei o aconteceu, que decisão tomaram, mas o fato é que logo depois me deixaram sair da prisão e fiquei ainda algum tempo, com a sensação de estar sendo vigiado, e logo veio a primeira baixa, na qual fui incluído. Senti-me aliviado. Entretanto, durante algum tempo ainda fiquei com a sensação de estar sendo seguido. E tenho quase certeza de que realmente fui seguido, pois conhecia os militares do serviço secreto do Exército, que trabalhavam infiltrados dentro dos movimentos sociais naquela época, e os vi duas ou três vezes por perto de mim, e aquilo não devia ser coincidência. Talvez não tivessem acreditado em mim, e achavam que mais cedo ou mais tarde eu os levaria ao meu ‘grupo de terroristas’! Depois de um tempo, acho que desistiram de mim, e passei a viver a minha vida sem medo de ser preso e torturado a qualquer instante.

Encontros e desencontros

Todo mundo aceita naturalmente que a matemática, por exemplo, de tão importante, deve ser aprendida na escola, com livros e cadernos sobre o assunto. Mas e o amor? Também é muito importante, mas ninguém nos ensina! Será que é porque acham que já nascemos sabendo amar? Se o amor é uma arte, como toda arte, ele exige teoria e prática. Em meus relacionamentos, aprendi sobre o amor que ele é importante para criar uma espécie de ponte entre diferentes personalidades. Para seduzir e manter o outro a quem amamos, precisamos aperfeiçoar o que há de melhor em nós, e não se consegue isso através da auto-anulação, mas do aperfeiçoamento de nossa própria individualidade.

“A glória da amizade não é a mão estendida, nem o sorriso carinhoso, nem mesmo a delícia da companhia. É a inspiração espiritual que vem quando você descobre que alguém acredita e confia em você” – Ralph Waldo Emerson

Também aprendi que não existe uma ‘pessoa certa para amar’. Sam Keen escreveu que “passamos a amar não quando encontramos uma pessoa perfeita, mas quando aprendemos a ver perfeitamente uma pessoa imperfeita”. Príncipes encantados só existem em novelas e contos de fadas. Não existem seres humanos perfeitos. Assim como existem defeitos e virtudes em nós, também existem no outro a quem amamos. A fase de namoro, da paixão, permite-nos descobrir afinidades que farão valer a pena amar, investir no estabelecimento de vínculos permanentes, eterno enquanto dure, como escreveu nosso poeta Vinícius de Moraes.

Na fase de namoro, o jogo da sedução faz com que nos esforcemos para revelar ao outro o que temos de melhor em nós, mas é a convivência do dia-a-dia que nos irá revelar por inteiro. Não é possível representarmos um papel o tempo todo, só mostrando ao outro um lado de nós que julgamos mais bonito e melhor. Na fase da sedução exageramos nossos atributos, como um farol que lança luz sobre nossas virtudes e deixa os defeitos nas sombras. Neste sentido, o amor nos motiva, nos impulsiona a querer ser o melhor que pudermos. Por isso, amar é, sem dúvida, uma das experiências mais ricas que um ser humano pode ter.

Dificilmente nos apaixonamos pelos defeitos dos outros. Precisamos de sonho, de idealização, pois a realidade pode não ser suficientemente atraente e ao buscarmos um relacionamento queremos ser felizes, queremos viver uma situação que é diferente da situação real em que vivemos. Sem o romantismo, que idealiza o ser amado, talvez não tenhamos a energia e a disposição necessárias para romper com a inércia e então preferimos ficar sozinhos. Entretanto, romantismo demais pode atrapalhar, por exemplo, quando a pessoa idealiza com tão grande imaginação que se descola da realidade. Pessoas assim acabam se apaixonando pela idéia que fazem do outro e não pela pessoa de verdade. E é bem comum se decepcionarem quando, na convivência do dia-a-dia, se confrontam com o ser real. Pessoas românticas em excesso acham que o problema está nos outros, que não conseguem corresponder às suas idealizações.

“O amor começa quando uma pessoa se sente só e termina quando uma pessoa deseja estar só.” – Léon Tolstoi

Alguns defendem que o amor não acaba, mas se transforma, na melhor das hipóteses, em amizade, respeito, consideração, gratidão, amizade, ternura, afeto e, na pior, em indiferença, ódio, tédio, vazio, etc. Outros defendem que o amor acaba sim, como Felipe Machado, por que a vida é assim mesmo, imperfeita:

“Ao contrário do que dizem os poetas, amor acaba, sim. Não há nada de romântico nisso, apenas uma verdade pragmática e palpável. Quando o amor acaba, o monstro que estava escondido debaixo do tapete da sala acorda e domina rapidamente o apartamento. Frases que nunca deveriam ter sido sequer pensadas são pronunciadas com a determinação dos carrascos. Não se pode atravessar uma ponte que foi queimada; com as palavras acontece a mesma coisa. Agora os dois se olham e sabem que não têm mais o que fazer. Dentro deles há uma dor contínua, uma tristeza que sai pelos olhos. Os dois corações estão vazios, porque no lugar daquele amor todo agora não existe nada. E a vida segue assim, imperfeita.”

Entretanto, saber quando o amor acaba, ou se transforma em outra coisa, boa ou má, nunca é muito fácil, por que não é de uma hora para outra. O relacionamento começa a balançar entre bons e maus momentos, até que os maus momentos superam os bons, e aí os sinais vão ficando cada vez mais claros. Fica mais difícil ainda quando o amor acaba, se transforma, ou diminui para um, e o mesmo não ocorre com o outro.
Um dos sinais de que as coisas mudaram é quando não nos interessamos mais nem em contar sobre as novidades, e o que aconteceu em nosso dia a dia, e também não sentimos mais vontade em saber do outro, as novidades da vida dele. É um indicador de que você perdeu a vontade de compartilhar com o outro a sua vida, e que também não está mais interessado na vida do outro.

Outro sinal é quando a diversão acaba, e nem mesmo o lugar onde se está, que pode ser maravilhoso, é capaz de mudar a situação! Você não sente mais prazer em estar do lado do outro, não sente vontade de rir, de relaxar, se irrita por qualquer coisa, inicia ou dá força a brigas sem sentidos, que só servirão para afastar ainda mais o casal.

O sexo, geralmente confundido com amor, é usado como termômetro no relacionamento do casal, mas não deveria, pois sexo é uma necessidade física que pode continuar existindo mesmo depois que o relacionamento amoroso já acabou ou se transformou em outros sentimentos. Diferente de compartilhar com outro sua vida e experiências, uma necessidade espiritual. O sexo é importante num relacionamento amoroso e reforça os laços de intimidade e cumplicidade, mas não se deve exagerar o seu papel, pois diversos fatores podem influenciar na diminuição da libido que não necessariamente a falta de amor. Um simples estresse pode acabar com a vontade de fazer sexo, mesmo quando o casal está numa fase apaixonada! Por outro lado, existem pessoas que tem o sexo como vício, ou como profissão, é nem um caso nem o outro são indicativos de amor!

É deprimente e melancólico perceber que uma pessoa que você amou, com a qual conviveu e compartilhou tantos momentos, viagens, experiências, a criação dos filhos, já não o ama mais, ou que você já não a ama mais como antes. Você se sente impotente para mudar as coisas, por que não tem como mudar um sentimento. Amor, assim como a felicidade, não é algo que se compra na farmácia ou na prateleira do supermercado. Trata-se de um sentimento, e a gente não manda nos sentimentos. Podemos mudar a maneira de perceber as coisas, mudar a rotina, mudar as atitudes, mudar as palavras, mas se não houver mais amor, talvez seja tudo esforço inútil que apenas prolongará o sofrimento.

Se a primeira dificuldade é saber quando o amor acaba ou se transforma, a segunda é saber como acabar o relacionamento e, a terceira, é como superar o fim do relacionamento! Francesco Petrarca afirma que “as duas cartas de amor mais difíceis de escrever são a primeira e a última.” E William Shakespeare alerta que “guardar rancor é como beber veneno e ficar esperando que o outro morra”!

Hoje, procuro dar mais espaço para as minhas emoções sem precisar explicar tudo o que sinto, a não ser quando os sentimentos exigem uma explicação, pois o outro não tem de ser adivinho. Vivo um dia de cada vez, sem ansiedade pelo futuro que não domino nem sei como vai ser ou culpa por um passado que não posso mais mudar. Muito menos me sinto tão comprometido com o outro a ponto de valorizar mais os sentimentos do outro que os meus próprios sentimentos. Exercito diariamente ser mais flexível com o outro, pois são pessoas diferentes e o que deve importar não é o quanto um ou o outro tem razão, como se amar fosse uma competição para ver quem ganha, mas o quanto podemos ser felizes juntos. E, quando tenho de dizer o que o incomoda no outro, faço no momento oportuno e sempre com ternura e palavras mansas, pois o objetivo não é ter razão, mas manter a felicidade da relação. Confio na capacidade do outro em se proteger emocionalmente até mesmo de mim, afinal, quando um não quer dois não brigam – nem se amam. É um erro me fechar para novas possibilidades e insistir numa relação onde se esgotaram as chances de felicidade conjunta. Não me sinto tão responsável quando um relacionamento não dá certo, pois ninguém é obrigado a gostar de ninguém, e existem tantos nãos no mundo quantos sins.
“Aprendi que não posso exigir o amor de ninguém… Posso apenas dar boas razões para que gostem de mim… E ter paciência para que a vida faça o resto…” – William Shakespeare
Entretanto, não existem pessoas perfeitas, relacionamentos perfeitos, família perfeita, muito menos as pessoas têm de ser como imaginamos ou queremos que sejam, e perdoá-las é uma forma de aproveitar o melhor delas e até reforçar laços de afeto, mesmo quando pensam ou agem diferente do que gostaríamos que agissem. Novamente lembro William Shakespeare:

“Depois de algum tempo você aprende a diferença, a sutil diferença, entre dar a mão e acorrentar uma alma. E você aprende que amar não significa apoiar-se, e que companhia nem sempre significa segurança. E começa a aprender que beijos não são contratos e presentes não são promessas… E aceita que não importa quão boa seja uma pessoa, ela vai feri-lo de vez em quando e você precisa perdoá-la por isso… Aprende que não temos que mudar de amigos se compreendemos que os amigos mudam, percebe que seu melhor amigo e você podem fazer qualquer coisa, ou nada, e terem bons momentos juntos… Aprende que não importa em quantos pedaços seu coração foi partido, o mundo não pára para que você o conserte. Aprende que o tempo não é algo que possa voltar para trás. Portanto, plante seu jardim e decore sua alma, ao invés de esperar que alguém lhe traga flores. “

“Gentileza gera gentileza”, escrevia pelos muros da cidade do Rio de Janeiro o Profeta Gentileza, um ‘maluco beleza’ dos tempos em que eu morava em São Gonçalo e trabalhava no Rio de Janeiro. Pela janela do ônibus era comum vê-lo pintando os muros! A mensagem é verdadeira, mas a visão é ingênua ao achar que a gentileza será capaz de tornar o mundo melhor! Lembro de políticos velhacos e corruptos que no Parlamento tratam-se uns aos outros com a maior gentileza, vossa excelência para cá e para lá, mas que na verdade são lobos em pele de cordeiro! Os estelionatários também usam da gentileza, da amizade, da beleza, da inteligência para nos conquistar e se aproximar de nós, para nos fim nos trair com seus golpes. Quando uma pessoa folgada e interesseira entra em nossa vida, por mais que você ame e seja generoso, isso não a transformará numa pessoa melhor, necessariamente. Pode torná-la ainda mais mesquinha e gananciosa. E quando você tentar se livrar ou exigir mudança vai descobrir o quanto uma pessoa assim pode ser manipuladora, pode explorar seus sentimentos de generosidade a ponto de fazê-lo se sentir culpado por cobrar mudanças, ou pode despertar um carrasco! Lembro dos inúmeros crimes passionais e também dos tristes casos de filhos e filhas que matam os pais e avós por que querem receber mais e mais! Em outubro de 2002, a estudante Suzane von Richthofen chocou o país ao confessar o assassinato dos pais enquanto eles dormiam em casa, no bairro do Brooklin, Zona Sul de São Paulo. O motivo do crime seria uma suposta oposição deles ao namoro de Suzane com Daniel Cravinhos, também envolvido nas mortes. Na mesma época, outro crime bárbaro perpetrado por um jovem de 17 anos que confessou ter matado a mãe estrangulada, afirmando que o crime ocorrera após uma discussão. Casos de violência extrema como esses mobilizam a sociedade não somente por sua natureza, mas também por refletir um desgaste nos relacionamentos familiares. Esta violência não aconteceu de uma hora para outra. Uma educação e sociedade permissivas, que cultivam o individualismo, o consumismo, a indiferença como valores, geram pessoas sem valor, sem personalidade, que acham que o mundo é como as novelas, que o padrão de vida não pode cair quando se tenta entrar no mercado de trabalho ou constituir família. O filho da família ou de uma sociedade permissiva não sabe como lidar com frustrações nem está acostumado à dificuldade e ao esforço, base da educação do caráter. O nível de violência nas ruas será menor à medida que cresça na sociedade o respeito mútuo – e este se aprende em família, com pais conscientes de que sua verdadeira missão no mundo é formar o caráter dos filhos. Claro, educar e pôr limites, exercer autoridade, dá trabalho, requer dedicação, exige de nós, por isso é um ato de amor e de doação, que nem todos os pais ou adultos estão dispostos a ter pelas crianças e jovens sob sua responsabilidade. Crescendo abandonados quase que à própria sorte, dependendo de babás despreparadas e da televisão como babá eletrônica, ou de esperança que a escola vá dar conta da tarefa de educar, não me surpreende o grau de violência e de infelicidade, e de depressão de nossa sociedade!

“O desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca, e que, esquivando-nos do sofrimento, perdemos também a felicidade”. – Carlos Drummond de Andrade

Tem gente que escolhe não amar para não sofrer, então prefere viver só, ou entra nas relações amorosas com um pé atrás, geralmente em função de decepções do passado. E depois se surpreende por que ‘nunca dá certo’! O medo paralisa, mas a vida é risco! “A vida é maravilhosa se não se tem medo dela” disse Charles Chaplin. Não tenho medo de correr riscos ou de sofrer. Entretanto, também não sou mais tão ingênuo e assim que percebo algum folgado tentando se aproveitar de mim, não tenho a menor dificuldade em estabelecer claramente os limites! É uma forma de protegê-las delas mesmas para que não façam estragos que venham a se lamentar mais tarde, por que ninguém que parasita outra consegue ser feliz muito menos fazer o outro feliz e não estarei ajudando as pessoas a escolherem por si próprias e serem pessoas autônomas, uteis a si próprias e à sociedade, permitindo que me parasitem de alguma maneira!

Educando para fazer boas escolhas


“Os vossos filhos não são vossos filhos. São os filhos e as filhas da Vida que anseia por si mesma. Eles vêm através de vós mas não de vós. E embora estejam convosco não vos pertencem. Podeis dar-lhes o vosso amor mas não os vossos pensamentos, pois eles têm os seus próprios pensamentos. Podeis abrigar os seus corpos mas não as suas almas. Pois as suas almas vivem na casa do amanhã, que vós não podereis visitar, nem em sonhos. Podereis tentar ser como eles, mas não tenteis torná-los como vós. Pois a vida não anda para trás nem se detém no ontem. Vós sois os arcos de onde os vossos filhos, quais flechas vivas, serão lançados. O arqueiro vê o sinal no caminho do infinito e Ele com o Seu poder faz com que as Suas flechas partam rápidas e cheguem longe. Que a vossa inflexão na mão do Arqueiro seja para a alegria; Pois assim como Ele ama a flecha que voa, Também ama o arco que se mantém estável.” – Gibran Khalil Gibran (O Profeta)

Educar filhos não é uma tarefa fácil. Fomos educados numa época que rapidamente deixou de existir, e pela geração de nossos pais e avós, que, por sua vez viveram numa época ainda mais diferente do que foi a nossa! Ainda assim, temos de enfrentar o desafio de sensibilizar nossos filhos a serem cidadãos independentes, capazes de saber fazer escolhas entre as diversas opções e caminhos que a vida nos oferece, sabendo suportar os ônus e os bônus de suas escolhas. E como demoramos a dominar essas capacidades – se é que as dominamos inteiramente!

Não criamos os filhos para nós, mas para o mundo, bom ou mau, onde terão de viver. Logo, nosso papel como pais não é pretender transformar os filhos numa extensão de nós mesmos, de nossos sonhos não realizados, como se os filhos, ao crescerem, tivessem de serem os adultos que não conseguimos ser, em outras palavras, tivessem de seguir as escolhas que fizemos por eles. Não é impedindo que nossos filhos façam escolhas, ou escolhendo a vida inteira o que é melhor para eles, ou assumindo as responsabilidades ou os ônus das decisões deles – que os ajudaremos a crescer. Não devemos assumir para nós, mesmo que consigamos suportar, os fardos de outras pessoas, muito menos de nossos filhos, pois cada um deve ser capaz de assumir os riscos e os perigos dessa vida, responsabilizando-se pelos seus atos e escolhas, caso contrário, só irão gerar mais sofrimento inútil e não irá adquirir o necessário aprendizado moral que forja os bons seres humanos.

As crianças de hoje, ao chegarem à alfabetização, já assistiram uma infinidade de horas de televisão, centenas de imagens de assassinatos e violências, horas e horas de propaganda estimulando o consumismo. O acesso das crianças a toda essa tecnologia e estímulos de consumo, faz com que os problemas do mundo contemporâneo cheguem até elas na forma de imagens e texto, muito antes que estejam prontas para compreender e processar tantas mudanças e transformações. Por isso, sempre nos preocupamos em dosar o tempo de nossos filhos na frente da televisão, e em ler e oferecer bons livros para eles.

À medida que nossa sociedade se torna mais complexa e competitiva, crescem as exigências para formar adequadamente uma pessoa, tanto em termos de tempo quanto de recursos financeiros. Se no passado bastava garantir aos filhos uma boa formação educacional para que o acesso ao mercado de trabalho estivesse assegurado, hoje isso não é mais suficiente. E os pais ainda têm de ter a habilidade de lidar com as frustrações profissionais dos filhos procurando manter-lhes a auto-estima e entusiasmo depois de formados, diante do desemprego ou subemprego.

“Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço” é um método ‘educacional’, infelizmente, ainda usado até hoje. Isso tem produzido mais adultos hipócritas que um mundo mais justo, pacífico e ecológico poderia suportar. A mentira não é mais convincente que a verdade, e esta é uma lição para ser ensinada através do exemplo, pois os jovens costumam observar muito mais os exemplos que as palavras. Quantas vezes os adultos falam uma coisa e praticam outra! Sem coerência o discurso perde a eficácia. Um exemplo disso é quando os mesmos pais que proíbem os filhos de ir a uma festa com os amigos, por medo que venham a usar drogas, pedem que os filhos comprem cigarros ou cerveja no mercado da esquina. E com que moral um adulto, que possui amante, pode aconselhar seus filhos a serem fiéis em seus relacionamentos? As pessoas mentem, às vezes, achando que a verdade pode magoar o outro. Ou então mentem para fantasiar a realidade e criar uma imagem de si próprias que preencha a expectativa dos outros a seu respeito. As pessoas não percebem que a mentira magoa mais que a verdade. Na hora, a verdade pode doer até mais, porém mantém a confiança no outro. Já a mentira, ao ser descoberta, além da mágoa vem também a falta de confiança, que é difícil restabelecer depois, como um vaso de cristal que, uma vez quebrado, você pode colar de novo, mas as emendas permanecerão visíveis, como um alerta para tomar cuidado!

“A vida só pode ser compreendida olhando-se para trás; mas só pode ser vivida olhando-se para a frente.” – Soren Kierkegaard

A herança genética e a herança cultural que recebemos ao longo da vida, as pessoas com quem nos relacionamos, os livros e autores que lemos, todos exercem influência sobre nós, direta ou indiretamente, com maior ou menor intensidade. Entretanto, ninguém vive a vida em nosso lugar! Para Nietzsche, “o espírito de um ser humano se constrói a partir de suas escolhas…” Conscientes ou inconscientes, somos o resultado de nossas escolhas! Quanto mais capazes estivermos de fazer escolhas conscientes, menos vulneráveis estaremos a sermos escravos ou mesmo vítimas de nossos instintos ou das circunstâncias à nossa volta. Ernani Fornari afirma que “viver consciente disso desenvolve nosso discernimento e nossa responsabilidade para com a vida, com as pessoas e com nossas atitudes.”

“Existir é mudar, mudar é amadurecer, amadurecer é criar a si próprio infinitamente”. – Henri Bergson

Não existem escolas para nos ensinar a amar e ser amado, a ser feliz e fazer os outros felizes, a ser democrático, generoso, solidário, justo, sustentável… Estas lições estão no mundo, mas teremos de aprender. Às vezes aprendemos por simples observação dos erros e acertos alheios, às vezes precisamos vivenciar esses erros e acertos para aprender, e, existem situações, que se repetem em nossa vida, revelando que tem vezes que não aprendemos nem com os próprios erros, logo, tenderemos a repeti-los!

Ao vermos uma criança, um jovem, temos a ilusão de estar diante de um sujeito completo. Nada mais falso. O que vemos diante de nós é apenas a casca. A personalidade, o caráter, os sentimentos, os valores, a espiritualidade, estão fora do alcance de nossas vistas. Muitas vezes os adultos cobram das crianças ou adolescentes comportamentos de ‘gente grande’, como se fossem pessoas completas, amadurecidas, como se estivessem prontas, quando, no entanto, ainda estão se construindo.

“A verdade é que a gente não faz filhos. Só faz o layout. Eles mesmos fazem a arte-final”. – Luís Fernando Veríssimo

Educar a nova geração para a autonomia é um processo de educação também dos educadores, pois ao mesmo tempo em que precisamos nos esforçar em dar o melhor de nós, também precisamos nos educar para abrir mão do nosso poder de fazer escolhas por eles. Claro que essa transferência se dará à medida que a nova geração comprove ser capaz de escolher adequadamente entre as diversas alternativas, e demonstre capacidade em assumir os ônus de suas escolhas.

Escrevi o livro “O Desafio de Escolher” como forma de contribuir para que as pessoas possam refletir sobre suas escolhas e o papel que elas representam em nossas vidas.

Quando nascemos, até por volta da pré-adolescência, nossa capacidade de fazer escolhas adequadamente é praticamente nula. Não nascemos sabendo escolher o que é melhor para nós. Por isso, se os pais deixarem a decisão por conta da criança, ela pode preferir comer só doces em vez de legumes, feijão, arroz, dormir e brincar em vez de ir à escola etc. É uma fase em que os pais precisam tomar decisões pelas crianças, ao mesmo tempo em que devem aproveitar as oportunidades de mostrar às crianças como fazer escolhas adequadas, mostrando-lhes as suas conseqüências, para que adquiram as habilidades necessárias para fazerem suas próprias escolhas.

Na adolescência, o papel dos pais e educadores é muito importante na vida dos jovens que precisam testar seus limites e capacidade de escolhas, sem que sejam punidos injustamente ou exageradamente como a sociedade normalmente faz com os jovens infratores. É no ambiente familiar que os adolescentes poderão fazer experiências com seus pais e adultos mais próximos a fim de testar suas habilidades e saber quando estarão prontos para o mundo adulto, e não existe outra forma de testar limites a não ser ultrapassando-os, tendo de aprender também a lidar com as perdas, com as frustrações, com os ônus das decisões quando elas saem errado. Os pais são os primeiros adultos com os quais esses futuros adultos deveriam poder dialogar, trocar idéias, e mesmo enfrentar sem medo de serem rechaçados ou punidos injustamente. Neste aspecto, os conflitos entre pais e filhos não precisam ser um mal em si, se houver a compreensão de que os jovens em crescimento estão lutando para tomar suas vidas e destinos em suas mãos, embora não estejam ainda preparados para isso.

Cada um tem o seu momento próprio para migrar de autonomia nenhuma para autonomia cada vez maior de escolher o que é melhor para ele, assumindo os riscos dessas escolhas e os conseqüentes ônus e bônus. Entretanto, é natural que, tanto os pais quanto os próprios filhos sintam medo diante das incertezas desse mundo. Os pais se perguntam: “será que meus filhos estão preparados para fazer as escolhas certas? Estarão prontos para constituir uma nova família e educar adequadamente seus próprios filhos?” Tanto para os pais quanto para os filhos é difícil decidir entre a segurança de viver sob a guarda – e a tutela das escolhas – dos pais, e a liberdade de viver – e escolher a própria vida e destino – que o mundo oferece aos filhos já crescidos.

Sexo e adolescência


Nossa sociedade se esforça para ensinar sobre os perigos do sexo e sobre métodos contraceptivos, mas se esforça bem pouco para ensinar a amar, como construir uma relação afetiva com o outro. Biologicamente, por volta dos 12 anos uma pessoa já está pronta para gerar filhos, pois na natureza, quanto mais rápido houver a procriação, melhor, para garantir a perpetuidade da espécie. Entretanto, do ponto de vista cultural, as pessoas só podem ser consideradas maduras para terem filhos quando são capazes de sustentar uma família, o que hoje, com a vida difícil como anda, vai demorar bastante. O campo de batalha para o conflito entre natureza e cultura são os corpos e as mentes dos adolescentes, cheios de hormônios, prontos para o sexo, mas limitados e vigiados pelos adultos, que são os guardiões involuntários dessa necessidade cultural. Os jovens se revoltam, juram que quando tiverem seus próprios filhos irão agir de maneira diferente, mas acabam reproduzindo novamente o mesmo ciclo.Os pais vêem os namoros desse tempo como uma ameaça à formação dos jovens – e não estão errados. Um adolescente não reúne condições financeiras nem emocionais para educar uma nova vida. É comum haver o início de um período de desentendimentos e incompreensões de parte a parte, seja por se tornarem os pais insistentes em seus alertas, ou seja, mesmo, por proibir encontros em determinados locais, na tentativa de impedir certas ‘facilidades’, ou mesmo proibir simplesmente o relacionamento. A escolha por não engravidar deve ser dos adolescentes e não de seus pais, pois não terão como vigiar os filhos adolescentes o tempo todo! Os pais devem ser capazes de sensibilizar seus filhos à compreensão do que significaria para eles, e mesmo para os futuros netos, uma gravidez indesejada ou simplesmente prematura.

Os jovens, por sua vez, sentem-se incompreendidos. “Como meus pais são capazes de dizer que me amam e se preocupam comigo, se não percebem como é fundamental meu amor por outra pessoa?” E as paixões no início da vida podem ser avassaladoras e dominar de tal forma o coração, a mente e os corpos dos jovens, que não sobra tempo para fazer mais nada direito, como se a vida só fosse possível juntos um do outro. “Se meus pais me limitam e me proíbem, é porque não percebem o quanto esse amor é importante para mim, então não me amam nem se preocupam comigo de verdade, ou me deixariam em paz para viver meu amor!”

Uma gravidez fora de hora fatalmente irá prejudicar a formação dos filhos, pois terão de assumir mais esta responsabilidade e ainda precisarão de habilidade para lidar com as frustrações e feridas emocionais que resultam de desilusões amorosas, quando um dos parceiros resolve não assumir a responsabilidade pelo novo filho. E nem sempre a gravidez é indesejada ou resulta de uma ‘camisinha furada’, pois pode ser uma escolha equivocada, mas consciente, de um dos jovens ou do casal de apaixonados, na esperança de que um bebê vá consolidar os laços amorosos, ou mesmo que o bebê irá contribuir para a formação de uma nova família, em outro lugar, longe da influência dos pais. Se os pais recusarem apoiar os filhos nesse momento delicado, estarão abandonando também os netos – que não têm responsabilidade ou culpa pelas decisões dos jovens pais.

Filhos melhores para o mundo




“Não existimos apenas para nós, e só começamos a amar-nos de verdade, e portanto a amar a outros, quando estamos plenamente convencidos deste fato.” – Thomas Merton, Homem algum é uma ilha

Geralmente os pais desejam que o mundo seja melhor para seus filhos, mas nem sempre pensam em criar filhos melhores para o mundo.

Fotos:

(1) Leonardo (com o regador nas mãos), ajudado pelo Gustavo, de camiseta branca, plantam árvores no Batalhão Florestal, em São Gonçalo (RJ), durante uma manifestação ecológica da UNIVERDE.

(2) Décadas depois, foi a vez dos meus netos, filhos do Gustavo, Lucas (de chuteiras com cadarço vermelho) e Íris (de calça clara) também fazerem a sua parte, no Dia Mundial do Meio Ambiente, durante evento de doação de mudas de árvores.

(3) Gustavo formou-se biólogo, pós-graduou-se em meio ambiente na COPPE/UFRJ, tem especialização em resíduos sólidos, e está fazendo mestrado na UFF. Seguiu minha carreira de ambientalista e acabou tornando-se coordenador na Comissão de Meio Ambiente da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, mesmo cargo que ocupei por vários anos.

(4)Leonardo herdou meu lado aventureiro, o gosto pela fotografia, pela vida junto ao mar e à natureza e cursa Administração de Empresas.

Convivendo com os filhos adultos





“Muitas vezes, quando queremos estar na companhia de nossos amigos e parentes, queremos que as coisas aconteçam exatamente como desejamos. Se todas as pessoas lidassem com as relações dessa maneira, ninguém se sentiria feliz. Em vez de pensar apenas naquilo que você quer, leve em consideração também aquilo que os outros querem. Aceite que sempre haverá diferenças entre as pessoas e que, se você for flexível, poderá aproveitar melhor o encontro e reforçar os laços de afeto.” – Minetti

Penso que o que caracteriza um adulto maduro não é a quantidade de tempo que viveu, mas a sua capacidade de tomar decisões e correr riscos ao fazer suas escolhas, sabendo que terá de responder pelos ônus dessas decisões. Alguns pais passam tanto tempo escolhendo pelos filhos que se acostumam a assumir responsabilidades e tomar decisões por eles, e, nessas circunstâncias, com o crescimento dos filhos, ou os conflitos se tornam inevitáveis, ou os filhos se submetem aos pais e se tornam adultos incapazes de escolher com independência.

No passado, era comum os filhos quando adultos deixarem a casa dos pais e seguirem suas próprias vidas e os pais darem por concluída a missão de educá-los. Hoje, cada vez mais os filhos adultos permanecerem na casa dos pais, e nem sempre este é um convívio fácil ou pacífico. Como pais, passamos tanto tempo de nossas vidas educando nossos filhos enquanto cresciam, que às vezes temos dificuldades para abandonar o papel de tutores depois de criados. Como adultos, eles precisam assumir responsabilidades, podem decidir por si próprios e já não dependem tanto de nós. Se não querem fazer isso em suas próprias casas e decidem continuar vivendo na casa dos pais, devem compreender, primeiro, que casa é dos pais, e são estes que devem mandar nela, e não os filhos, pois investiram suas energias, seus recursos e seu tempo no intuito de construir um abrigo confortável e sossegado para se refugiar das agruras do mundo externo, e agora que estão envelhecendo, mais do que nunca precisam deste refúgio de bem-estar, tranqüilidade ou alegria, e nenhum filho, sob qualquer pretexto, tem o direito de prejudicar ou dificultar as coisas para seus pais, mas é exatamente o contrário. Ao escolherem permanecer na casa dos pais, devem também assumir com deveres, despesas e compromissos para tornar a casa um lugar agradável, confortável e justo.

Em qualquer convívio, tem que haver respeito e cortesia. Pessoas civilizadas se saúdam, se despedem, comunicam seus planos e as mudanças nestes, como também possíveis atrasos, com as pessoas com quem interagem, especialmente se existem vínculos familiares e o andamento da vida destas pode ser afetado. Isto vale para os jovens e também para seus pais, para que não haja ocasião para surpresas ou preocupações desnecessárias ou ocorram desencontros desagradáveis.

Esse novo pacto exigirá um novo aprendizado de parte a parte e, mais uma vez, não existem escolas para nos ensinar sobre isso, teremos de aprender com a própria vida, e nem sempre o que funcionou com outra família irá também funcionar com a nossa! Entretanto, como sempre, busco na leitura a orientação que preciso. Com Elizabeth Zekveld Portela, aprendi que os pais não têm mandato para manter controle sobre todos os aspectos da vida dos filhos adultos enquanto eles moram na mesma casa. O objetivo dos pais deve ser de educar seus filhos para a autonomia das escolhas, progredindo da fase da tutoria quase total (criança pequena) para o estágio de liberdade vigiada (adolescência) até a etapa de independência total de decisão e ação (adulto). Se os filhos adultos escolhem permanecer na casa dos pais, e estes aceitam essa decisão, é preciso estabelecer de parte a parte um novo pacto familiar, onde os filhos sabem que precisam respeitar o fato de quem manda na casa são os pais, mais os pais também devem compreender que seus filhos adultos são capazes e devem tomar suas próprias decisões e deve deixá-los arcarem com as conseqüências ou resultados, principalmente quando se trata do filho que já se sustenta. O processo de criação terminou. A fase de disciplinar acabou. Nem os pais, nem os filhos, devem querer viver numa situação em que um domina o outro, mas onde compartilham decisões, compromissos, obrigações, onde há respeito e cortesia de parte a parte.

O amor é uma questão de foro íntimo, uns tem de mais, outro tem de menos, mas o respeito nas relações é devido a todos os que decidem compartilhar uma mesma relação! Por outro lado, os pais precisam compreender que nenhum filho agirá como adulto, e muito menos se tornará um líder, se for sempre tratado como criança! Como nosso filho descreveria o seu relacionamento conosco? Sente-se sufocado? Manipulado? Fiscalizado? Vigiado? Controlado? Por demais protegido? Respeitamos o seu gosto e a sua individualidade ou ficamos insistindo que bons filhos devem ser clones dos seus pais? Damos palpites em tudo, ainda quando eles não pedem? Ficamos ressentidos e transmitimos as nossas mágoas toda vez que ele toma uma decisão ou faz algo com que discordamos? Conseguimos engolir as palavras “Eu não lhe disse…?” ou “Se tivesse me perguntado…” Ficamos plantados, emburrados, na sala até que todos cheguem a casa, não importa a hora? Estamos afirmando, encorajando e elogiando mais de que censurando, admoestando e criticando?…

Ser ecológico



Não assumi a vida como um presente só meu, mas como uma possibilidade de colaborar para deixar este mundo um lugar melhor do que encontrei! Penso que não vim a esse mundo a passeio e que o futuro não está pré-determinado, mas depende de nossas escolhas. Podemos escolher choramingar pelo limão que recebemos da vida, ou arregaçar as mangas e fazer com ele uma limonada. “Viver”, ensina Benjamin Franklin “é enfrentar um problema atrás do outro. O modo como você o encara é que faz a diferença.” Para mim, apenas viver e ser feliz é pequeno e egoísta demais. Não acho que nasci para atender alguma necessidade de mim mesmo. Apesar de todas as dificuldades pessoais que tive de enfrentar, dediquei-me a tentar deixar este mundo melhor do que o encontrei, claro, na medida de minhas possibilidades e limitações.Tive a sorte de, ao longo de minha vida, encontrar parceiros que participaram do mesmo sonho, e é em homenagem a eles que dedico esta terceira parte do livro, onde procuro falar um pouco das atividades em que participamos juntos, pedindo desde já desculpas pelos que não citei por alguma razão injustificável, e que por isso mesmo reforço o convite para que contribuam com as suas partes nessa história através do site www.escritorvilmarberna.com.br ! Sejam todos bem vindos!

“Não é a terra que é frágil. Nós é que somos frágeis. A natureza tem resistido a catástrofes muito piores do que as que produzimos. Nada do que fazemos destruirá a natureza. Mas podemos facilmente nos destruir.” – James Lovelok

Desde a minha juventude, sempre gostei de ler sobre notícias e entrevistas envolvendo questões socioambientais. Assim acompanhava de longe as atividades do engenheiro agrônomo José Lutzenberger e seu esforço e de seus companheiros pela criação, em 1971, da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (AGAPAN), uma das primeiras associações ecologistas a surgir no Brasil e na América Latina. Descobri na biblioteca do Novo Lar de Menores um livro do naturalista Henrique Roessler, de São Leopoldo (RS), que já nas décadas de 50 e 60 defendia o meio ambiente.

Os jornais da época refletiam a idéia de um crescimento econômico acelerado que se tornou um ponto de consenso das elites brasileiras desde que o presidente Juscelino Kubitscheck o erigiu em ideologia dominante através da palavra de ordem: “avançar 50 anos em 5”. A ideologia do crescimento acelerado e predatório chegou ao paroxismo durante a presidência de Médici, quando o governo brasileiro fazia anúncios nos jornais e revistas do 1º Mundo convidando as indústrias poluidoras a transferirem-se para o Brasil, onde não teriam nenhum gasto em equipamento antipoluente, e a delegação brasileira na Conferência Internacional do Meio Ambiente (Estocolmo, 1972) argumentava que as preocupações com a defesa ambiental mascaravam ‘interesses imperialistas’ que queriam bloquear o acesso dos países em desenvolvimento.

Entretanto, em 1972, um episódio marcou a minha vida, quando deixei de ser apenas um ‘ser humano’ para descobrir-me um ‘ser ecológico’. Tinha cerca de 17 anos e estava interno no Novo Lar de Menores, em Viamão, no Rio Grande do Sul, um internato conduzido por padres católicos para menores oriundos da FEBEM gaúcha. A caça era permitida em lei, no Rio Grande do Sul, desde que em épocas próprias e sobre regras rígidas, e a Direção costumava levar os menores para caçar nos banhados da região. Influenciado pela filosofia de não-violência de Gandhi, a idéia de pegar em arma, que encantava aos outros menores, para mim parecia um absurdo! Então, me recusava a caçar, mas tinha de acompanhar o grupo, pois não podia ficar sozinho no Internato.

Assim, os instrutores me designavam para ‘tomar conta do acampamento’, enquanto meus colegas participavam da caçada com alegria. Era uma algazarra, para sorte dos animais que podiam assim se esconder e fugir, mas os tiros espalhavam chumbinho para todo lado. Era só mirar uma moita com algum movimento e depois ir catar o pobre animal vítima daquela selvageria.

Então, certa vez, vi uma família de ratões de banhado apavorados, numa moita perto de mim, como se pedissem ajuda! Meu coração ficou apertado por que me sentia impotente para salvá-los, pois os instrutores e os outros menores já vinham na direção de onde eu estava, e com as armas nas mãos. Comecei a pular e dizer para os animais que fugissem dali rápido, e vi o olhar perplexo deles, sem entender, como se pedissem socorro!

“Eu temo pela minha espécie quando penso que Deus é justo.” – Thomas Jefferson

Todos ficaram muito chateados comigo por que esperavam que eu os chamasse para matar os animais, afinal de contas, era uma caçada, e ficar deliberadamente assustando a ‘caça’ não é propriamente o que se espera de um membro da ‘equipe’! Pouco me importei com as críticas, por que, pelos menos aquela família de ratões de banhado havia sido salva! O resultado é que nunca mais me levaram para caçar.

A causa dos animais inspirou-me a escrever O Tribunal dos Bichos, mas muito mais para resgatar o que há de humano em nós.

Eu me interessava por leituras sobre pacifismo, humanismo, democracia, ecologismo, entretanto, tinha dificuldade de encontrar livros sobre estes assuntos e tinha por hábito freqüentar bibliotecas onde pegava os livros por empréstimo. Um dos primeiros livros que li foi “Primavera Silenciosa”, da jornalista Rachel Carson, que se tornou um clássico na história do movimento ambientalista, desencadeando uma grande inquietação internacional sobre a perda de qualidade de vida.

Entretanto, dentre tudo o que li, na época, nada me marcou mais profundamente, a ponto de me fazer decidir por dedicar minha vida às lutas socioambientais, que a Carta do Cacique Seatle. O texto era uma resposta à proposta do Presidente dos EUA de comprar as terras dos índios, em vez de simplesmente invadir com a cavalaria e tomar à força, matando todos os indígenas, como era comum naquela época. As terras pertenciam às tribos indígenas Suquamish e Duwamish, localizadas na região de Puget Sound, no atual estado de Washington, no extremo noroeste dos Estados Unidos, fazendo divisa com o Canadá. O governo dos EUA pretendia deslocar as duas tribos para uma reserva indígena, oferecendo-lhes algumas garantias e compensações. Então, em 10 de janeiro de 1854, Isaac Stevens, Governador do Território de Washington, esteve em Puget Sound para reforçar a oferta de compra das terras. O Cacique Seattle, como era conhecido o chefe das tribos Suquamish e Duwamish, já havia lutado em inúmeras batalhas pelo seu povo e sabia que recusar a oferta do presidente americano significaria, cedo ou tarde, o extermínio de seu povo. Proferiu então um histórico discurso em que destacou a transitoriedade da existência, expressou seu profundo amor pela natureza e mostrou a necessidade de se tomar conta da terra e de toda vida sobre a terra. Era o ano de 1854, quando ainda nem existia o termo ‘ecologia’, que só foi proposto em 1869, pelo biólogo alemão Ernst Heinrich Haeckel.

“O Grande Chefe de Washington mandou dizer que deseja comprar nossa terra. O Grande Chefe assegurou-nos também de sua amizade e sua benevolência. Isto é gentil de sua parte, pois sabemos que ele não ne¬cessita da nossa amizade. Porém, vamos pensar em sua oferta, pois sa¬bemos que se não o fizermos o ho¬mem branco virá com armas e tomará nossa terra. O Grande Chefe em Washington pode confiar no que o chefe Seatle diz, com a mesma certeza com que os nossos irmãos brancos podem confiar na alteração das estações do ano. Minha palavra é como as estre¬las. Elas não empalidecem.

Como podes comprar ou vender o céu – o calor da terra? Tal idéia nos é estranha. Nós não somos donos da pureza do ar ou do res¬plendor da água. Como podes comprá-los de nós? Decidi¬mos apenas sobre o nosso tempo. Toda esta terra é sagrada para o meu povo. Cada fo¬lha reluzente, todas as praias arenosas, cada véu de neblina nas flo¬restas escuras, cada clareira e to¬dos os insetos a zumbir são sagrados nas tradições e na cons¬ciência do meu povo.

Sabemos que o homem branco não compreende o nosso modo de vi¬ver. Para ele um torrão de terra é igual a outro. Porque ele é um es¬tranho que vem de noite e rouba da terra tudo quanto necessita. A terra não é sua irmã, mas sim sua inimiga, e de¬pois de exauri-la, ele vai embora. Deixa para trás o túmulo do seu pai, sem remorsos de cons¬ciência. Rouba a terra dos seus filhos. Nada respeita. Esquece as se-pulturas dos antepassados e os direitos dos filhos. Sua ganância empo¬brecerá a terra e vai deixar atrás de si os desertos. A vista de tuas cidades é um tormento para os olhos do homem vermelho. Mas talvez isto seja assim por ser o homem vermelho um selvagem que nada compreende.

Não se pode encontrar paz nas cidades do homem branco. Nem um lugar onde se possa ouvir o desabrochar da folhagem na primavera ou o tinir das asas dos insetos. Talvez por ser um selvagem que nada en¬tende, o barulho das cidades é para mim uma afronta contra os ouvidos. E que espécie de vida é aquela em que o homem não pode ouvir a voz do corvo noturno ou a conversa dos sapos no brejo à noite? Um índio pre¬fere o suave sussurro do vento sobre o espelho d’água e o próprio cheiro do vento, purificado pela chuva do meio-dia e com aroma de pi¬nho. O ar é precioso para o homem vermelho, porque todos os seres vi¬vos respiram o mesmo ar – animais, árvores, homens. Não parece que o ho¬mem branco se importe com o ar que respira. Como um mori¬bundo, ele é insensível ao mau cheiro. ,,,,

Se eu me decidir a aceitar, imporei uma condição. O ho¬mem branco deve tratar os animais como se fossem irmãos. Sou um selvagem e não compreendo que possa ser certo de outra forma. Vi milhares de bisões apodrecendo nas pradarias abandonados pelo homem branco, que os abatia a tiros disparados do trem. Sou um selvagem e não compreendo como um fumegante cavalo de ferro possa ser mais valioso do que um bisão que nós, índios, matamos apenas para sustentar a nossa própria vida. O que é o homem sem os animais? Se todos os animais acabassem, os homens morreriam de solidão espiritual, porque tudo quanto acontece aos animais pode afetar os homens. Tudo está relacionado entre si. Tudo quanto fere a terra fere também os filhos da terra.

Os nossos filhos viram seus pais humilhados na derrota. Os nos¬sos guerreiros sucumbem sob o peso da vergonha. E depois da derrota passam o tempo em ócio, e envenenam o corpo com ali¬mentos doces e be¬bidas ardentes. Não tem grande importância onde passaremos os nossos últimos dias – eles não são muitos. Mais algumas horas, até mesmo uns invernos, e nenhum dos filhos das grandes tribos que viveram nesta terra ou que têm vagueado em pequenos bandos nos bosques sobrará para chorar sobre os túmulos. Um povo que um dia foi tão poderoso e cheio de con-fiança como o nosso.

De uma coisa sabemos que o homem branco talvez venha um dia a descobrir: o nosso Deus é o mesmo Deus. Julgas, talvez, que O podes possuir da mesma maneira como desejas possuir a nossa terra. Mas não podes. Ele é Deus da humanidade inteira. E quer o bem igualmente ao homem vermelho como ao branco. A terra é amada por Ele. E causar dano à terra é demonstrar desprezo pelo seu Criador. O homem branco também vai desaparecer, talvez mais depressa do que as outras raças.

Continua poluindo a tua própria cama e hás de morrer uma noite, sufocado nos teus próprios dejetos! Depois de aba¬tido o último bisão e domados todos os cavalos silvestres, quando as matas misteriosas fede¬rem à gente – onde ficarão então os sertões? Terão acabado. E as águias? Terão ido embora. Restará dar adeus à andorinhas da torre, à caça do fim da vida e o começo da luta para sobreviver…

Talvez compreendamos se conhecêssemos com que sonha o homem branco, se soubéssemos quais esperanças transmite a seus filhos nas longas noites de inverno, quais visões do fu¬turo oferece às suas men¬tes para que possam formar os desejos para o dia de amanhã. Mas nós somos selvagens. Os sonhos do ho¬mem branco são ocultos para nós. E por serem ocultos, temos de escolher o nosso próprio caminho.

Se consen¬tirmos, é para ga¬rantir as reservas que nos prometeste. Lá talvez pos¬samos viver os nossos últimos dias conforme desejamos.

Depois que o último homem vermelho tiver partido e a sua lembrança não passar da sombra de uma nuvem a pairar acima das pradarias, a alma do meu povo continuará a viver nestas florestas e praias, porque nós as amamos como um recém-nascido ama o bater do coração de sua mãe.

Se te vender¬mos a nossa terra, ama-a como nós a amávamos. Protege-a como nós a protegíamos. Nunca esqueças como era a terra quando dela tomaste posse. E com toda a tua força, o teu poder, e todo o teu coração con¬serva-a para teus filhos, e ama-a como Deus nos ama a todos.

Uma coisa sabemos: o nosso Deus é o mesmo Deus. Esta terra é querida por ele. Nem mesmo o homem branco pode evitar o nosso destino comum.”

Presente à ocasião estava o médico Henry Smith que chegara a Seattle como superintendente escolar em 1853 e tinha um talento especial para idiomas, e logo aprendeu a língua dos índios. Smith verteu o discurso do Cacique Seattle para o inglês a partir das anotações apressadas que fez ali na hora. Trinta e três anos depois, em 29 de outubro de 1887, Smith publicou o discurso no jornal Seattle Sunday Star junto com um relato sobre o momento que viveu: “Cacique Seattle – um cavalheiro por instinto”. Smith deixou claro em seu artigo que a versão que publicava não era uma cópia exata do discurso original de Seattle, mas o que pôde reconstruir das notas que tomara na ocasião. Somente quase um século depois, já na década de 1970, é que o documento ganhou a dimensão de manifesto ecológico a partir da recriação livre e poética do artigo de Smith pelo roteirista e diretor do Programa de Cinema e Cultura Midiática da Middlebury College, Ted Perry, e que foi distribuída em universidades como uma forma de conscientizar os estudantes a cuidar do meio ambiente, tornando-se a versão mais difundida do que hoje se conhece como “A Carta do Cacique Seattle”.

O Cacique Seattle migrou com sua tribo para a Reserva Suquamish, de Port Madison, onde veio a falecer em 7 de junho de 1866. A cidade de Seattle foi fundada em 13 de novembro de 1851, com o nome de Duwamps sendo posteriormente mudado por David Swinson (“Doc” Maynard), um dos fundadores da cidade e principal promotor, e finalmente, o nome da cidade mudou para Seatle, em homenagem ao grande Cacique.

A partir de 1978, descobri a revista Pensamento Ecológico, do Movimento Arte e Pensamento Ecológico, editada por Luis Carlos de Barros, que reunia artigos e debates sobre temas ecológicos brasileiros e que durante um tempo foi colunista do Jornal do Meio Ambiente. Cheguei a pensar seriamente na possibilidade de me mudar para alguma Comunidade Rural Alternativa em busca de um novo modo de vida, um novo cotidiano, longe dos efeitos predatórios e egoístas gerados pelo atual estilo de vida urbano. Freqüentei os primeiros ENCAs (Encontro de Comunidades Alternativas) na intenção de encontrar alguma Comunidade, mas não consegui me adaptar ao fundamentalismo do grupo e à forte rejeição da atividade política. Num desses encontros, conheci uma revista denominada “Outra”, editada pela Cooperativa “Coovida”, do Rio de Janeiro, pelo astrólogo Fernando Fernandes. Procurei pelo Fernando e acabei ajudando durante um tempo na elaboração da Revista, uma das pioneiras na mídia ambiental Brasileira.

Passei a valorizar mais meu tempo junto da natureza. Descobri a fotografia e o camping como formas de estar junto da natureza, onde eu voltava com as energias renovadas! Sempre que podia, fugia das cidades que, em certos locais, afastaram-se tanto da natureza, ao admitirem como inevitável a poluição do ar, sonora, visual, que se tornaram lugares feios e tristes.

Sempre que podia, acampava em lugares remotos da natureza ainda preservada. No Estado do Rio de Janeiro, acampava em Búzios, Penedo, numa época em que estes lugares eram pequenas comunidades cercadas de natureza à sua volta. Dessa rica experiência nasceu meu primeiro livro, “O Livro do Camping – O Prazer da Vida ao Ar Livre”, publicado pela Tecnoprint, numa tentativa de ajudar aos que acampavam a cuidarem melhor da natureza à sua volta.

“Mas, por onde eu devia começar? O mundo é tão vasto, começarei com meu país, que é o que conheço melhor. Meu país, porém, é tão grande. Seria melhor começar com minha cidade. Mas minha cidade também é grande. Seria melhor eu começar com minha rua. Não: minha casa. Não: minha família. Não importa, começarei comigo mesmo.”- Confúcio

Apesar de, para mim, as liberdades democráticas e as questões socioambientais serem interligadas, percebia a tensão entre elas. Ser democrático não pressupunha ser também ecológico. Em nome da Democracia, assisti muitos políticos tomando decisões democráticas e legítimas, mas que ignoravam os limites da natureza ou o seu equilíbrio. Por outro lado, ser ecológico não pressupunha também ser democrata. Conheci muitos ambientalistas autoritários e donos da verdade. Os nazistas eram defensores do meio ambiente e dos animais, por exemplo.

As lutas pelas liberdades eram um caminho natural para mim, que vivia preso por todos os lados. Cresci durante a Ditadura Militar, onde o silêncio era a melhor defesa, onde criticar o Governo ou suas empresas podia ser confundido com subversão ou terrorismo! As maiores empresas poluidoras como Petrobrás, CSN, eram empresas de ‘segurança nacional’. Criticar suas poluições era correr o risco de ser confundido com subversivo ou terrorista. O jornalista Randau Marques, por exemplo, em 1968, foi preso pela Operação Bandeirantes e taxado de subversivo pelo conjunto de reportagens sobre contaminação ambiental com chumbo no Município de Franca – SP, berço dos curtumes. Em seu trabalho, abordou ainda a questão dos defensivos agrícolas, seus perigos e contaminações ao meio ambiente e à população em geral.

Quando o país começou a exigir o fim da Ditadura, aderi ao movimento, como o ‘Diretas Já!’, que exigia a volta da democracia no país. Em 10 de abril de 1984, levei meus filhos Leonardo, com 6 anos e Gustavo com quatro para participarem da maior manifestação pública da história do Brasil até então, em frente a Igreja da Candelária, no Rio de Janeiro, onde se aglomeraram mais de 1 milhão de pessoas. Fui cedo para estacionar o carro que tinha na época, uma Variante Verde, no melhor lugar, o mais perto possível do palanque, de forma que pudesse colocar meus filhos em segurança no teto do carro, e ao mesmo tempo acompanhar os acontecimentos.

Para reprimir as manifestações, o então presidente João Figueiredo aumentou a censura sobre a imprensa e ordenou prisões. Houve violência policial. E mesmo com o apelo e pressão popular, a Emenda Dante de Oliveira, na Câmara dos Deputados, que aprovaria as eleições diretas no Brasil, foi rejeitada. Apesar da enorme frustração popular, o movimento da sociedade teve grande importância na redemocratização do Brasil, pois estava cada vez mais claro para a Ditadura instalada no Brasil que seus dias estavam contados. No ano seguinte, em 1985, o processo de redemocratização termina com a volta do poder civil, com a aprovação de uma nova Constituição Federal, em 1988 e com a realização das eleições diretas para Presidente da República em 1989.

Em São Gonçalo, participei itensamente dos Plenarinhos Pró-Constituinte, na companhia do Rebêlo e do Barros, oficiais do recém-criado Batalhão Florestal, com sede na cidade. Fizemos o capítulo de meio ambiente da Lei Orgânica da Cidade e que serviu de subsídios para a elaboração do capítulo de Meio Ambiente no Governo do Estado, através do Carlos Minc, então Deputado Estadual, e também para a elaboração do capítulo de meio ambiente da Constituição Federal, através do companheiro e deputado Fábio Feldmann, que mais tarde me indicou para ganhar o Prêmio Global 500 da ONU Para o Meio Ambiente, antes recebido por ele próprio, pelo Minc, pelo Chico Mendes, pelo Betinho, entre outros.

UNIVERDE




“Quando se sonha sozinho é apenas um sonho. Quando se sonha junto é o começo da realidade.” – Miguel de Cervantes (em Dom Quixote)

Vivendo em São Gonçalo, não poderia pensar a questão ambiental sem também levar em conta as influências das lutas sociais e comunitárias, o que me levou a buscar a aproximação e o diálogo com os sindicatos, as associações de moradores, entre outras organizações comunitárias.

“Sou um só, mas ainda assim sou um. Não posso fazer tudo, mas posso fazer algo. E, por não poder fazer tudo, não me recusarei a fazer o que posso.” – Edward Everett Hale

Entre as lutas que melhor revelam esta dimensão social e ecológica está a conquista do Parque Ecológico do Engenho Pequeno. Destinado a se tornar no Aterro Metropolitano da Região Metropolitana, através das intensas articulações e ações no campo dos dois movimentos, o ecológico e o comunitário, o que era para virar lixo virou uma nova unidade de conservação. Uma vitória destes dois movimentos, liderados, pela UNIVERDE e pela Associação de Moradores do Engenho Pequeno. O lema ecológico “Pensar globalmente, agir localmente” expressa a compreensão de que as realidades locais são profundamente afetadas por ações, decisões e políticas definidas de ‘cima para baixo’, seja regionalmente, seja globalmente, mas que não precisamos – não temos – que aceitar como fato consumado, pois muitas vezes um impacto ambiental bastante localizado é fruto de decisão gerada no bojo das correlações de força e dos princípios de ‘interesses de Governo’, ou de negócios, ou mesmo globais, da chamada nova ordem econômica mundial.

Nos segmentos mais ricos da sociedade e das nações, a maioria das pessoas tem resolvida a satisfação das necessidades materiais básicas (alimentação, moradia, saneamento básico, vestimenta, transporte), já nos segmentos mais pobres da sociedade e das nações, a maioria da população vive em condições miseráveis. Enquanto para os segmentos mais ricos da sociedade tratar de temas ligados à fauna e à flora era bem compreendido e apoiado, nos segmentos mais pobres era incompreendido, como se fosse um tema inoportuno diante das misérias que ameaçavam a sobrevivência dos seres humanos mesmo, e não das plantas ou dos animais. Ao escolher fundar uma organização não governamental ambientalista em São Gonçalo, um município pobre, na região metropolitana da Cidade do Rio de Janeiro, enfrentei o desafio de adaptar o ‘ecologês’ às carências daquela sociedade. Em São Gonçalo, a maioria não conta com água potável nem saneamento básico e sua subnutrição os expõe em escala ampliada e um meio ambiente super-poluído. Os trabalhadores são contaminados no próprio ambiente de trabalho! Nas áreas rurais, os agricultores eram vítimas de agrotóxicos em escala indiscriminada expondo suas próprias vidas, além do conjunto do ciclo biológico.

Ao buscar um lugar em São Gonçalo onde pudesse promover debates sobre estes assuntos, recebi o apoio da direção da escola onde estudavam os meus filhos ainda pequenos, no Colégio Santa Terezinha, no Rodo de São Gonçalo. Contava com uma platéia assídua aos debates, como o Prof. Hélter e Ricardo Harduim, então um estudante de biologia, e que mais tarde fundou a organização não governamental PRIMA, e que ajudaram bastante em refletir e construir o novo pensamento ecológico que surgia.

Em 1981, convidei alguns amigos como o Walfrido Rocha (já falecido), o Lauro Nobre, o Daniel Ferreira, o Edson, entre outros, para fundar a UNIVERDE, que nasceu no quintal dos fundos de minha casa, no bairro Pita. A partir de 1982, enquanto trabalhava em editoras para ganhar a vida, presidi a UNIVERDE, iniciando uma série de campanhas de denúncia ambiental em São Gonçalo, mas sempre com o enfoque na qualidade de vida das pessoas, mostrando o equívoco de achar que o meio ambiente é tudo o que está à nossa volta, por que nos inclui também, uma verdade óbvia, mas que aqueles que queriam destruir e poluir a natureza faziam questão de minimizar, como se pudéssemos fazer o que quiséssemos com a natureza, sem ser igualmente afetados com isso.

A UNIVERDE atuou na informalidade até por volta de 1985, quando foi formalizada como uma organização ambientalista, sem fins lucrativos. Uma característica importante em nossa atuação ambientalista foi a construção de alianças com o movimento comunitário e com a imprensa, por que o meio ambiente e o que acontece com ele, é de interesse público. Esta estratégia revelou-se adequada para a formação de uma opinião pública sensível à questão ambiental, segundo comprovou a pesquisa realizada pelo Major Hazard Incident Data Service, da Grã-Bretanha. Dos 2.500 acidentes industriais no mundo, mais da metade (1.419) ocorreram apenas cinco anos, entre 1981 e 1986. Já os grandes acidentes ambientais, que envolveram maior número de mortes e milhões de dólares de indenização, num total de 233 acidentes, ocorreram no curto período entre 1970 e 1989. A divulgação em escala mundial destes fatos não só contribuiu para sensibilizar a opinião pública, mas também para fortalecer os movimentos ambientalistas, que se multiplicaram nesse período, além de gerar um conjunto de leis ambientais e de órgãos de controle que não existiam antes de 1970.

Tínhamos de enfrentar com coragem os desmatadores, a especulação imobiliária, os poluidores que nos ameaçava de morte a todo o momento. Sentíamos a falta de uma polícia ambiental para assumir nossas denúncias. Encaminhei ofícios ao Governador da época, Moreira Franco e ao Comando Geral da Polícia Militar solicitando a criação no Estado do Rio de Janeiro de um Batalhão Florestal, como já existia em outros estados. Após diversas conversas e reuniões para pressionar o Governo, finalmente descobri, através do Coronel Arouca que o impedimento se devia ao fato de não ter ainda aonde abrigar o novo Batalhão Florestal. Ofereci-me então para ajudar a solucionar o problema, e, após levar o Coronel e o Secretário Estadual de Meio Ambiente, Carlos Henrique de Abreu Mendes, a diversos possíveis locais, em São Gonçalo, o Governo acabou decidindo por instalar o novo Batalhão num desses lugares, a Fazenda do Colubandê, um prédio de enorme importância histórica, localizado em São Gonçalo, e que estava abandonado.

Foi uma conquista importante da UNIVERDE, e realizamos diversas manifestações e ações ecológicas no local, inclusive plantando árvores com meus filhos ainda pequenos, e que participavam comigo das atividades ambientais.

A UNIVERDE destacou-se ainda na defesa de um dos importantes redutos de mata atlântica em São Gonçalo, ameaçado de virar lixeira da região Metropolitana. O Governo do Estado chegou a construir o prédio da balança, fez movimentos de terra no local, colocou cerca, mas quando levou 15 caminhões de lixo para criar um fato consumado, a comunidade não deixou. Deitamos no chão para impedir a passagem dos caminhões e passamos a ocupar o lugar de forma mansa e pacífica, com atividades como o Festival de Pipas Ecológicas, caminhadas na mata com os alunos e professores do lugar, para que conhecem a riqueza natural que estava ameaçada e tomassem o lugar como uma conquista da cidadania. Esta luta resultou na criação Parque Ecológico do Engenho Pequeno.

“Ser ecologista, não é apenas ser contra aquilo que se chama progresso, não é apenas ser anti qualquer coisa ou anti tudo porque está na moda, não é apenas ser por certas manifestações com o seu quê de folclore (que também é, aliás, importante); ser ecologista é sobretudo acreditar que a vida pode ser melhor se as mentalidades mudarem e tiverem em consideração os ensinamentos que a velha terra e ainda o velho universo não cessam de nos transmitir.” – Fernando Pessoa

Partido Verde



“O preço que os homens de bem pagam pelo seu desinteresse da política é a qualidade dos políticos.” – Platão

A cada eleição via uma oportunidade de colocar em debate as causas socioambientais, pois é sempre uma boa hora, numa democracia, para se rever posições e escolhas e promover mudanças. A questão ambiental é prioritária, pois sem um Planeta capaz de suportar a vida, de nada vai adiantar toda a riqueza e toda a democracia ou justiça social do mundo! Assegurar a preservação do Planeta não é causa para um ou outro partido político, mas para todos, e também inclusive para quem não é ligado a partido algum.

Muitos dos problemas socioambientais que conhecemos têm origem em legislações e ações do poder público, ou podem ser solucionados por eles. Como eleitor e ambientalista, sentia-me convocado a votar melhor, a escolher candidatos comprometidos com o interesse público, e não com os interesses privados, comprometidos com as causas das liberdades democráticas, a preservação ambiental e a maior justiça social.

Os maus políticos e maus administradores, os corruptos, não chegam sozinhos ao poder, mas são colocados – e mantidos – lá pelo voto desinteressado, ou dos que se omitem, ou dos que não ‘querem saber’ de política, ou dos que trocam o seu voto por uma vantagem pessoal qualquer. E só existem dois caminhos para mudar isso, ou pela força de uma revolução – mas aí, quem iria tirar as armas dos revolucionários depois que chegassem ao poder? – ou pelo voto consciente e responsável. Escolhi este segundo caminho.

No início, comecei procurando pelos partidos políticos e a participar de debates políticos, por que sempre defendi que para votar consciente tínhamos que conhecer direito em que estávamos votando, e não apenas procurar saber disso no dia das eleições. Procurava por um representante político que tivesse idéias iguais ou melhores que as minhas.

Comecei uma campanha sistemática junto à sociedade pelo voto consciente e responsável. Preparei uma relação de perguntas e enviei por carta a alguns potenciais candidatos, alguns responderam, outros não. Passei a considerar apenas os que responderam, por que se o candidato quer manter o distanciamento dos eleitores agora, quando está em campanha, imagine depois de eleito!

Em minha carta falava de preocupações sócio-ambientais com a cidade ou bairro e fazia perguntas específicas sobre como o candidato se propunha a dar solução ou a encaminhar as questões, uma vez eleito.

Também fazia contato com a coordenação de campanha dos candidatos que me responderam para saber sobre a agenda do candidato, onde eu poderia estar presente para ouvi-lo discursar. Passei a comparecer a comícios e debates com candidatos e sempre que podia fazia perguntas e colocava o tema ambiental em debates, lembrando ao candidato que minha presença ali não significava nenhum compromisso eleitoral nem meu nem das pessoas que me acompanhavam. Assim, através deste contato direto, passei a conhecer melhor os candidatos de minha cidade. Muitos deles completamente vazios, só palavreado bonito e, às vezes, nem isso. E nesses, eu já sabia que não devia votar.

Também me preocupava em saber sobre o partido do candidato, se ele teria força para lutar pelas idéias que defendia, pois nenhum político, por melhor que seja, faz nada sozinho. Claro, isso não significava que devia votar em alguém só pelo partido do candidato, se fosse de minha preferência, pois para mim o mais importante eram as idéias e a cabeça do próprio candidato. Entretanto, o prefeito precisa de maioria na Câmara. Os vereadores precisam de maioria para aprovar seus projetos. Maioria é uma conquista que depende de capacidade de convencimento, articulação e diálogo com quem pensa e tem interesses diferentes dos nossos. Se o candidato não conseguisse demonstrar essa habilidade, ficaria isolado e pouco poderia fazer ao chegar ao Poder. Por isso, achava importante questionar o candidato sobre seus compromissos éticos, até onde estaria disposto a ir para conseguir adesões. E como fazer propaganda custa caro, eu também questionava sobre a origem dos recursos que financiava a campanha do candidato. De onde vinha todo o dinheiro para as despesas? Que tipo de acordo ou negócio o candidato poderia estar fazendo para ganhar a eleição? Estaria se comprometendo com interesses privados que o afastarão depois de eleito do interesse público?

Tinha a preocupação de ser autêntico e votava pela minha cabeça e não pela cabeça dos outros. Meu voto iria para um candidato da oposição, se eu achasse que as coisas estavam erradas e precisavam mudar, e que os políticos e administradores que estavam no poder não eram capazes de promover as mudanças necessárias. E também votaria num candidato da base de apoio ao governo, se achasse que o poder deveria continuar nas mesmas mãos.

Quando o candidato que escolhi já detinha um mandato, tinha o cuidado de examinar não apenas os projetos que apresentou, mas se ele se empenhou para que estes projetos fossem cumpridos. Há políticos que apresentam bons projetos, mas que não sabem ou não se interessam em lutar para tirá-los do papel. Então, eu estudava o histórico dos votos e apoios do candidato e comparava como votou em votações estratégicas para o meio ambiente da cidade, que emendas apresentou ao orçamento. Durante essas votações, buscava saber se o meu potencial candidato esteve presente ou ausente, se omitiu ou votou em favor de bons projetos e contra os maus!

Entre as demandas mínimas que apresentava aos candidatos incluía-se a promoção de ciclovias para transporte interligadas a meios de transporte de massa e coletivos como trem, metrô, ônibus, bonde – baratos ou gratuitos como alternativa aos engarrafamentos e à poluição provocados nas cidades e zonas rurais pelo carro individual e pelo sistema dos transportes rodoviários; a defesa da saúde pública contra a poluição do ar, da água; a redução do tempo de trabalho como resposta ao desemprego e como visão da sociedade que privilegia o tempo livre em relação a acumulação de bens; a substituição da energia baseada na queima de combustíveis fósseis pela energia flexível que trabalha com os ciclos do sol, da água e do vento; agricultura de regeneração que reabastece o solo e incorpora meios naturais de controle das pragas; fim da devastação das fontes de recursos naturais (renováveis e não-renováveis); parada do envenenamento da biosfera pelo descarregamento de lixo tóxico; drástico controle da poluição do ar efetuada pelas indústrias e meios de transporte e redução dos “níveis aceitáveis” de exposição radioativa, entre outras reivindicações.

Comecei a freqüentar a Assembléias Populares, na Cidade do Rio de Janeiro, na Escola Senador Correa, que reuniam de 50 a 200 pessoas para debater sobre os problemas socioambientais da Cidade, reunindo pessoas de todas as tendências e correntes de pensamentos. Deste caldeirão democrático nasceu a APEDEMA – Assembléia Permanente de Entidades de Defesa do Meio Ambiente, que ajudei a fundar. Já sabia que a questão ambiental podia e era abordada por diferentes ângulos, mas ali, naquelas assembléias, estes diferentes ângulos ganharam rostos, vozes, conflitos. Foi, para mim, uma escola de democracia e de aprimoramento do pensamento ecológico! Nos confrontos das idéias divergentes, aprimorei meu próprio pensamento ecológico. Os debates se dividiam em correntes de pensamento, seguindo análise de Eduardo Viola, onde sobressaíam os ‘pragmáticos’.

Além da maioria de pragmáticos, haviam também os ‘ecologistas fundamentalistas’ que tendiam a considerar os ‘ecocapitalistas’ e ‘ecossocialistas’ como um tanto estranhos ao movimento ecológico e potencialmente deturpadores da pureza do movimento. Os ‘ecocapitalistas’ e ‘ecossocialistas’ que, por sua vez, tendiam a desconsiderar os ‘fundamentalistas’ pelo seu caráter romântico e politicamente ingênuo, embora reconhecessem a dedicação ao movimento por parte daqueles. Os ‘ecossocialistas’ que desconfiavam das reais e potenciais vinculações com a burguesia por parte dos ‘ecocapitalistas’ e tendiam a criticar, em bloco, a ‘tecnoburocracia ecocapitalista’ das agências estatais do meio ambiente. Os ‘ecocapitalistas’, por sua vez, desconfiavam dos objetivos dos ‘ecossocialistas’ e temiam que “aparelhassem” o movimento ecológico para transformá-lo num apêndice dos partidos de esquerda.

Desse ‘caldeirão cultural’, surgiu também o Partido Verde, do qual fui um dos fundadores junto com algumas figuras de longa presença no movimento ecológico brasileiro como o Fernando Gabeira, Liszt Vieira e Carlos Minc. Acabei me envolvendo nas campanhas dos três, cada um em épocas diferentes. Primeiro, ajudei na campanha do Liszt, a deputado estadual pelo PT, para depois me dedicar a eleger o Minc, ainda um professor universitário que se lançava candidato pela primeira vez a Deputado Estadual e que acabou se elegendo e reelegendo várias vezes, e chegou a ser Ministro do Meio Ambiente no segundo Governo Lula. Também me envolvi diretamente na coordenação da Campanha do Gabeira ao Governo do Estado do Rio de Janeiro, pela coligação PT/PV, com destaque para o grande abraço ecológico à Lagoa Rodrigo de Freitas, em 1994.

Aceitei a missão de ser candidato a vereador pelo PV, em São Gonçalo, cidade onde eu morava e onde havia fundado a UNIVERDE, pois o Partido recém-fundado precisava divulgar seu ideário e atrair eleitores. Compreendi a importância de minha candidatura para o Partido e vi também como uma oportunidade de fazer educação ambiental junto à população.

“Vilmar tem sido um dos pilares de sustentação das questões ambientais / sociais do estado do Rio de Janeiro nos últimos 10 anos. Para mim, o convívio e o debate de inúmeras questões que afligem a sociedade e a natureza do Rio de Janeiro, ao longo dos anos com o Vilmar, têm sido sempre um contínuo aprendizado e desenvolvimento de novas soluções técnicas, econômicas, mesmo políticas na busca do tão almejado desenvolvimento sustentável. A Educação Ambiental, visando a informação e o desenvolvimento da cidadania do verde tem sido seu principal instrumento e objetivo como ambientalista. Inúmeras são as suas contribuições nesta área. Neste sentido, Vilmar, sem dúvida é uma referência na questões ambientais no estado do Rio de Janeiro.” – PROF. David Zee, UERJ

Foi muito importante como cidadão ter passado pela experiência de ser candidato, pois me permitiu circular pela cidade e falar sobre meio ambiente e a importância de sua preservação para a nossa qualidade de vida em muitos lugares onde de outra forma não seria possível. Apesar de sermos livres para irmos aonde quisermos, na prática, acabamos freqüentando e indo aos mesmos lugares a vida toda, como nichos urbanos dentro de nossas cidades. E, quando se é candidato, aceitamos convites para palestras e vamos a outros ‘nichos’, circulando por toda a cidade. Então, ser candidato me permitiu subir morros, ir a favelas, palestrei em escolas e associações de moradores, sindicatos, clubes, igrejas, onde tive de traduzir o ecologês às carências da população, falei com gente de todas as classes sociais, circulei pela cidade como jamais imaginaria que poderia fazer! Como canta Milton Nascimento, fui onde o “povo está”! Ser candidato ampliou minha visão de mundo e também o espaço que ocupava na cidade. Fui questionado – e questionei-me – em minha ética, meu discurso, minha visão de mundo e do povo, minha linguagem, minha postura. Saí da eleição mais maduro e rico de momentos e experiências, de conhecer gentes, lugares, visões de mundo diferentes! Saí mais brasileiro e com mais vontade de ajudar nosso povo a superar suas limitações e as condições de miséria, social, econômica e cultural em que vivia!

“Você não pode ensinar nada a um homem; você pode apenas ajudá-lo a encontrar a resposta dentro dele mesmo.” – Galileu Galilei

Entretanto, apesar de saber sobre as carências de nossa sociedade, estar com as pessoas mais carentes em seu próprio ambiente foi uma experiência que me marcou profundamente. Uma coisa é você saber da realidade, outra coisa é você encará-la de frente, como eu tive de fazer quando fui candidato. Deparei-me com uma carência profunda em nosso povo, muito maior que apenas econômica, mas principalmente cultural e cidadã. Nas comunidades de baixa renda falei para um tipo de público de gente trabalhadora, humilde, e descrente com os políticos e a política, uma gente acostumada a não ter seus direitos de cidadania respeitados, a maioria analfabetos funcionais, que apesar de saberem ler e escrever tinham dificuldade para apreender as idéias de um texto, e dificuldade maior ainda para perceberem as entrelinhas, o que um texto não dizia quando tentava dizer! Então, me dispus a mostrar o quanto um meio ambiente preservado era fundamental para assegurar a qualidade de vida de todos, que um meio ambiente ecologicamente equilibrado era um direito de todos e que também era um dever de todos lutarem e reivindicarem sua preservação para as presentes e futuras gerações, de acordo com as capacidades e responsabilidade de cada um! Lia para eles e mostrava as entrelinhas, ajudava na interpretação dos textos, na identificação das idéias nos panfletos políticos, para que o povo pudesse cobrar mais tarde de seus representantes as promessas que escreveram e mandaram distribuir à população! Também explicava sobre o papel de um vereador, o que podia e não podia fazer, que tinha de fazer boas leis e fiscalizar o Poder Executivo e, este sim, é quem teria de fazer as obras, abrir concurso público para empregos, assegurar vagas nas escolas e leitos nos hospitais!

Ao término do meu discurso, quando já me despedia, era comum ser cercado no ‘cantinho’, ao me dirigir ou entrar no carro, por alguns moradores e lideranças com pedidos legítimos de metros de cano para trazer a água potável até suas casas, empregos de merendeiras e faxineiras em colégios ou postos de saúde, vagas na escola municipal para seus filhos, camisetas para o time de futebol, etc. Eu ficava com a sensação de que não tinham ouvido uma única palavra do que eu havia dito e só esperavam a hora em que eu iria parar de falar para que pudessem me pedir alguma coisa. A descrença nos políticos e na política chegava a tal ponto que parecia que estávamos num jogo de gato e rato! O candidato fingia que ao ser eleito iria cuidar do interesse público e não de seus interesses privados ou dos interesses do seu partido, e o povo que o escutava fingia que acreditava. E, quando acabava a brincadeirinha, então o povo queria saber o que o candidato estaria disposto a dar aqui e agora pelo voto do eleitor, quanto seria pago pela boca de urna, por que sabia que, uma vez eleito, nunca mais veriam o candidato novamente. Assim, o voto era trocado por sacos de cimento, camisetas para o time de futebol, promessas de emprego e vagas na escola ou posto de saúde, ou por qualquer outra vantagem objetiva. Descrentes da política, as pessoas não acreditavam mais que tivessem chance a terem seus direitos de cidadãos respeitados, e contentavam-se com alguma vantagem ou privilégio aqui e agora!

Nestes momentos, ouvia com atenção e compreensão, pois sabia das carências econômica, cultural e de cidadania de nosso povo sofrido, mas educadamente não fazia concessões, e reforçava a explicação sobre o real papel de um vereador, fazer leis e fiscalizar leis, e que não estava ao seu alcance distribuir vantagens e privilégios e que ficassem atentos a candidatos que prometessem tais coisas, pois não iriam cumprir mesmo! Também alertava sobre a necessidade do eleitor mudar de atitude e passar a reivindicar direitos e não vantagens e privilégios, pois ao agir assim, atraia um tipo de candidato que também está interessado em vantagens e privilégios, e não no interesse público! Claro, não me elegi. Na verdade, nem mesmo o meu voto apareceu na urna! E tenho certeza de que votei em mim e portando, pelo menos meu voto teria que aparecer na urna!

Então compreendi por que políticas de ‘pão e circo’ ainda faziam tanto sucesso e o quanto nossa sociedade ainda teria de lutar e avançar para se chamar de democrática! E decidi a não me candidatar novamente, não por que tenha deixado de acreditar na democracia representativa, mas por que percebi que eu seria mais útil à sociedade atuando na educação e comunicação ambiental e na construção e fortalecimento da sociedade civil e do movimento ecológico.

“A política é a mais nobre atividade de um ser humano, por ser a virtude e a prática do bem comum.” – Aristóteles

O PDT de Brizola ganhou a eleição para a Prefeitura de São Gonçalo (RJ), em 1986, tendo como candidato a Prefeito o engenheiro da Petrobrás, e deputado estadual, Edson Ezequiel, numa coligação com outros partidos entre os quais o Partido Verde. Fui indicado pelo meu partido para assumir a pasta Ambiental no governo Ezequiel. Em princípio, pensei em não aceitar, pois não me sentia à altura do cargo e preferia permanecer no movimento ecológico, cobrando por políticas públicas ambientais, mas fui convencido pela insistência dos companheiros de partido a assumir. Aceitei como desafio pessoal e profissional.

Ao assumir funções públicas, imediatamente comuniquei à UNIVERDE que não poderia continuar representando a organização e renunciei ao cargo de presidente. Para minha frustração, vi a UNIVERDE enfraquecer-se a ponto de em poucos meses estar correndo o risco de acabar e aquilo me preocupava muito, pois contava com um movimento ecológico atuante e que cobrasse bastante da Prefeitura por que aí eu teria força, internamente, para dar encaminhamento à pauta ambiental.

Até que um dia recebi na Prefeitura um líder comunitário muito indignado cobrando de mim por que a Prefeitura ainda não tinha tirado a lixeira de dentro do manguezal! Enquanto ele falava, em vez de ficar chateado, em vez de tentar questionar onde estava ele quando durante anos lutei contra aquela lixeira, fiquei pensando que ótimo presidente seria para a UNIVERDE! Era o Roberto Félix, na época, garçom de profissão e atuando na Associação de Moradores do Boassu. Então, após dar razão ao Roberto em sua reclamação e falar dos meus esforços dentro do governo para dar solução ao problema, convidei o Roberto a assumir a UNIVERDE, e reerguer a entidade, com a minha ajuda e total apoio. Tivemos algumas reuniões sobre o assunto até que ele aceitou, quando lhe passei todos os documentos da UNIVERDE em várias sacolas e caixas, e a ONG é uma organização atuante e combativa até hoje, em São Gonçalo. De garçom e líder comunitário, Roberto tornou-se num ambientalista guerreiro, estudou sobre meio ambiente e também filiou-se ao PV e chegou a presidir o IEF – Instituto Estadual de Florestas.

A ecologização da administração


Ao assumir meu cargo no Governo, constatei que o setor de meio ambiente da Prefeitura de São Gonçalo não tinha a menor estrutura, nem física nem legal, para cuidar de suas responsabilidades com o meio ambiente da Cidade, o que deixava o Governo em situação de fragilidade legal, podendo ser questionado judicialmente. Preparei uma proposta de estruturação ao Prefeito Edson Ezequiel e conversei com ele durante uma audiência, onde fui muito bem recebido, mas o prefeito deixou claro que não tinha nem recursos financeiros nem condições de promover naquele momento uma reforma administrativa, mas que eu estivesse preparado pois na primeira oportunidade ele daria uma solução ao problema.Na proposta, em vez de apropriar o meio ambiente numa Secretaria, como os demais municípios vinham fazendo, propus a ecologização da Administração, onde a responsabilidade em cuidar do meio ambiente seria de todos os órgãos, subordinados a uma coordenadoria executiva ligada direta ao Gabinete do Prefeito, uma espécie de fórum executivo, onde os membros seriam indicados por cada Secretário Municipal como os coordenadores responsáveis pelo meio ambiente na Secretaria. Este colegiado também examinaria, em grau de recursos, sobre multas, embargos e licenciamento ambiental.

Assim, caberia à Secretaria de Educação cuidar da Educação Ambiental tanto dentro da Rede Escolar quanto na comunidade, com projetos como, por exemplo, a formação de Clubes de Amigos do Planeta.

A Secretaria de Comunicação e Imprensa implantaria programas de comunicação e publicidade ambiental para a sensibilização ambiental da sociedade.

O Setor de Limpeza Urbana coordenaria o Plano de Gerenciamento de Resíduos do Município com ênfase na reciclagem e na redução da geração de lixo, estabelecendo em parceria com a Secretaria de Fazenda políticas tributárias diferenciadas que tornassem a coleta seletiva atrativa para empresas e população, com abatimento em taxas e impostos. Realizaria campanhas informativas e educativas em parceria com a Secretaria de Educação e de Comunicação para estimular a sociedade a adotar a Coleta Seletiva de lixo na origem de geração dos recursos, implantando gradualmente, até atingir toda a cidade, um sistema de coleta seletiva porta a porta em parceria com cooperativas de catadores. E implantaria a coleta de óleo de cozinha usado para fabricar biodiesel em mini-usinas locais para uso na frota de veículos da Prefeitura.

A Guarda Municipal cuidaria do patrimônio ambiental e das unidades de conservação e atuaria articulada em sistema de força tarefa com os demais fiscais da prefeitura, de postura e de obras, e com os demais órgãos estaduais e federais de meio ambiente, e com a sociedade civil através dos Amigos do Planeta, voluntários ambientais. Os fiscais de postura seriam fiscais do meio ambiente, combatendo a poluição visual, sonora, do ar, das águas, do solo, etc. e os fiscais de obras iriam conferir também o cumprimento de medidas mitigadoras e compensatórias, a adequação das construções e o uso adequado do solo, o uso de tecnologias ecoeficientes como energia solar, aproveitamento de água de chuva, instalação de sistemas de tratamento de esgotos, facilitando procedimentos e a concessão de descontos e isenções no IPTU, etc. O licenciamento ambiental das atividades seria de responsabilidade da Secretaria de Obras, em parceria com as demais secretarias.

A Secretaria da Fazenda conduziria uma política diferenciada que estimulasse, através de mecanismos tributários, quem cuidasse do meio ambiente e punisse quem não cuidasse, por exemplo, os proprietários de RPPN (Reserva Particular do Patrimônio Natural) estariam isentos de pagar IPTU e os que adotassem a coleta seletiva de lixo em 100% estariam isentos 100% da taxa de lixo.

O setor de compras da Prefeitura estabeleceria uma Política Ecológica de Compras, recusando o que não fosse biodegradável ou o que estimulasse o descartável ou o desperdício de energias ou materiais, adotaria em toda a administração pública o uso do papel reciclado, só contrataria o serviço de terceiros que assegurassem o controle das emissões de seus veículos, o descarte adequado do gás de refrigeração, etc. Madeira, só com selo de certificado de origem!

A Secretaria de Agricultura cuidaria dos aspectos ambientais de sua área, como os cuidados com os agrotóxicos e suas embalagens e sua substituição por técnicas menos agressivas ao solo, às águas, às florestas, à vida, e implantaria a reciclagem de composto a partir de resíduos orgânicos e a implantação de hortas sem uso de agrotóxicos para ocupar terrenos baldios em áreas urbanas, destinando a produção dessas hortas para a merenda escolar. E assim por diante.

O Coordenador do sistema funcionaria como um consultor a serviço de cada Secretaria, buscando soluções para problemas específicos que fossem trazidos pelos coordenadores de cada Secretaria, ajudando na elaboração e consolidação da legislação ambiental. Também promoveria campanhas de sensibilização dos funcionários e oficinas de capacitação, em parceria com a Secretaria de Educação, criaria mecanismos internos de medição e premiação de resultados, estabeleceria convênios e contratos com universidades e ONGs para a elaboração de projetos e captação de recursos, etc. O coordenador seria o representante legal do Poder Municipal junto a Fóruns e Colegiados regional e nacional.

Infelizmente, quando teve a oportunidade de fazer a reforma administrativa, o Prefeito preferiu escolher o tradicional caminho de criar uma nova Secretaria, uma solução administrativa que vinha sendo empregada nas demais prefeituras do PDT pelo país, mas que, em minha opinião, não era a melhor maneira de tratar a questão ambiental numa administração pública, pois criava um único órgão para cuidar de um assunto que é multidisciplinar e fazia com que os demais órgãos da administração pública se sentissem desobrigados de cuidar do meio ambiente e, pior, mesmo que quisessem, estariam impedidos legalmente, tendo obrigatoriamente de passar os assuntos ambientais para a Secretaria correspondente.

Apesar de frustrado, compreendi que a democracia é um regime político de dissenso, que permite a convivência entre os contrários e onde quem vence nem sempre é quem tem a melhor idéia, mas quem tem mais votos, e o Prefeito era ele. Aprendi com William Shakespeare que “depois de algum tempo você começa a aceitar suas derrotas com a cabeça erguida e olhos adiante, com a graça de um adulto e não com a tristeza de uma criança. Aprende que não importa em quantos pedaços seu coração foi partido, o mundo não pára para que você o conserte.”

Uma questão de princípios


Ao decidir participar do Governo, havia estabelecido uma condicionante. Contribuir para tirar a lixeira municipal de dentro do manguezal, que fazia limite com a APA (Área de Proteção Ambiental) de Guapimirim, no fundo da Baia de Guanabara, uma área rica de vida e principal responsável pela retenção dos sedimentos que impediam o assoreamento da Baía, e uma verdadeira cozinha e berçário da natureza!Minha proposta era que a prefeitura parasse imediatamente de lançar lixo no manguezal e fazer um aterro controlado (que recebe cobertura com argila por cima do lixo) na área ao lado, fora do manguezal, embora próximo a ele, apenas enquanto em alguns meses localizávamos uma nova área e montávamos os projetos para a aquisição de uma usina de reciclagem de lixo com um aterro sanitário (que protege o lençol freático com brita, argila e manta protetora e recobre o lixo com argila, em sistemas de células). A idéia da usina da reciclagem era para atuar paralelamente a um programa de Coleta Seletiva de lixo na origem, e não apenas coletar tudo junto para depois ver o que dava para aproveitar na usina.

Tratava-se de reivindicações que nos já mantínhamos a vários anos a partir da UNIVERDE e agora que estava no Governo, considerava meu dever ajudar na solução!

Em princípio, creio que o Prefeito concordou para ganhar a adesão do PV e a minha própria, mas desconfio que se tratou apenas de uma estratégia política para atrair nossa aliança, pois só tomou providências depois que o Ministério Público o obrigou a fazer. Ou seja, se não podia fazer antes, por qualquer motivo, falta de dinheiro ou de prioridade, então por que pode fazer quando foi obrigado?

A montanha de lixo se formou desde o governo anterior, quando na Univerde e com a ajuda da imprensa mantínhamos a pressão sobre o governo para que não aterrasse mais mangue do que já tinha feito até agora. Então o lixo, passou a crescer para cima e virou uma montanha!

Durante os meses iniciais, acreditando que o Prefeito realmente estava em busca de uma solução para o destino final do lixo do Município, me empenhei bastante e contei com a ajuda do Armando Mendes, então Secretário de Planejamento, na busca de um local para a instalação da Usina de Reciclagem e do aterro sanitário, e, a partir daí, iniciar então os estudos e o projeto que permitiria a aquisição da Usina a custo zero pela Prefeitura, junto a fundos de fomento oficiais. Mas não deu tempo. Cerca de uns seis meses após o início do novo governo, durante um final de semana, o então secretário de Obras mandou empurrar o lixo para dentro do manguezal! Com aquele gesto, o governo do qual eu participava destruía mais mangue em seis meses que o governo anterior em seis anos! Um fato consumado, um crime ambiental sem chance de voltar atrás! Para mim, uma questão de princípios e não uma razão de governo. Procurei o prefeito e apresentei os meus protestos. Ele justificou-se argumentando que a montanha de lixo corria o risco de provocar um acidente e cair sobre um trator ou caminhão e acabar matando alguém! Argumentei que existiam alternativas para dar segurança aos trabalhadores sem cometer crime ambiental. Permanecer no governo, naquelas circunstâncias, seria compactuar com o crime e concordar com a destruição do manguezal que eu tanto defendia! Fiz então minha carta de renúncia e saí do Governo. Uma decisão difícil, pois tinha filhos pequenos e o salário de professora de minha esposa não daria para nos sustentar. Minha esposa me acompanhou na decisão e tive de ficar desempregado algum tempo, passamos por dificuldades, mas estava em paz com minha consciência.

Pouco tempo mais tarde, o Ministério Público obrigou o prefeito a retirar a lixeira do manguezal, sob pena de prisão. E só aí ele mandou fazer o aterro controlado, ao lado do antigo lixão, como eu havia recomendado. Entretanto, não deu seqüência ao resto do Projeto, que seria buscar um novo local e implantar uma Usina de reciclagem de lixo associada a uma coleta seletiva de lixo na origem das fontes geradoras de resíduos.

O Partido Verde, que ajudei a fundar, preferiu continuar apoiando ao governo e indicou o ambientalista e amigo Lauro Nobre para o meu lugar.

Eu compreendia perfeitamente que um partido político não é uma ONG, e existe para chegar ao poder e exercê-lo, entretanto, essa disputa pelo poder e principalmente a coligação com outros partidos deve se dar obedecendo a princípios, ou a população não conseguirá mais saber qual é a diferença entre um e outro partido. Em minha opinião, por princípio, o PV jamais deveria aceitar permanecer num governo que não desse a devida atenção às questões ambientais!

O meio ambiente não pertence aos governos, ou aos partidos, mas é um patrimônio e um direito de todos os habitantes e não pode ser usado como moeda de troca ou para receber lixo! O interesse público e do povo, ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, como assegurado no artigo 225 da Constituição Brasileira, não pode e não deve ser subordinado aos interesses de partidos políticos de ganhar e permanecer no poder ou mesmo a interesses de governo. Os governos são eleitos pelo povo para cuidar dos interesses do povo, e não dos seus próprios interesses partidários ou coletivos, e quando não fazem isso, devem ser denunciados e substituídos pelo povo.

Procurei democraticamente levar este debate dentro do Partido, mas o Diretório Municipal não me deu ouvidos. As versões que circulavam era que eu tinha um problema pessoal com o Prefeito e que era despreparado para o cargo, por ser ideológico e radical demais!

Paralelo a estes debates, eu também tinha outro, dentro do partido. Não me conformava com a falta de eleição direta dos dirigentes dos Diretórios Municipais, por que ficavam sem autonomia nas decisões políticas, principalmente locais, permitindo que coligações acontecessem de forma a comprometer a imagem do partido localmente. Por causa dessa política, os diretórios municipais estavam se tornando ‘feudos’ políticos de uns poucos, e uma ferramenta de negociação política por cargos!

Os fundadores do partido, entre os quais me incluía, e muitos deles com uma história de luta pela democracia, pelas liberdades e contra a ditadura, não mereciam serem confundidos com dirigentes partidários onde as decisões são centralizadas e de cima para baixo! Tínhamos uma história de luta a zelar, e se defendíamos o fortalecimento da democracia, então tínhamos de dar o exemplo a partir de casa!
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Entretanto, a cada embate percebia que perdia o prazer de participar da construção de um partido que estava indo no caminho oposto ao dos meus ideais. Não me sentia mais com a energia pessoal, nem com a competência política, muito menos apoiado por meus companheiros, muitos dos quais nomeados em cargos políticos ou com empregos na Administração Pública, para prosseguir nesse caminho. Percebi que meus caminhos e opções se estreitavam a cada embate, e decidi trocar de trincheira de luta, voltando minhas energias para o fortalecimento do movimento ecológico, para a democratização da informação socioambiental e para a literatura, onde esperava ser mais útil às lutas pela democratização da sociedade e por sua conscientização socioambiental.

Assim que me demiti da Prefeitura de São Gonçalo, permaneci um tempo sem trabalho, período em que me dediquei a escrever o livro “Ecologia para Ler, Pensar e Agir”, publicado pela Editora Paulus, onde me esforcei para colocar no papel o conjunto de ideais que me moviam e a minha visão de ser ecológico, que ultrapassava a idéia do ser humano enquanto espécie, para abraçar o universo inteiro!

Sábado é dia de faxina


Convidado pelo amigo e advogado Paulo Lemos, procurador da Companhia de Limpeza de Niterói – CLIN, voltei ao Governo Municipal, mas da cidade vizinha a São Gonçalo, Niterói, para ajudar na solução da limpeza em áreas de difícil acesso junto às comunidades carentes. Tratava-se de um desafio muito interessante para mim, pois pela primeira vez a Administração Municipal iria levar o serviço público de limpeza de forma sistemática às comunidades de baixa renda nos morros da cidade. A idéia de diminuir a distância entre as ‘cidades partidas’ me pareceu sedutora. Niterói é ainda uma cidade partida. Uma no asfalto, aonde os serviços públicos chegam, e outra nos morros da cidade, aonde os serviços públicos mal chegam, ou não chegam mesmo, onde habitam as comunidades de baixa renda, gente trabalhadora, humilde, que para ter água, por exemplo, precisa investir um dinheiro que não tem em bombas e canos d’água! É assim ainda até hoje em algumas comunidades, como a de Jurujuba, onde moro.Com a ausência de serviços de Limpeza pública nos morros, não restava alternativa a não ser lançar sacos de lixo encostas abaixo, os chamados ‘pombos voadores’, que formavam cortinas de lixo pesando no solo com as chuvas, provocando deslizamentos, perdas de casas e até mortes, além de constituir em foco de ratos, baratas, mosquitos e outras pragas que voltam voando ou rastejando para dentro das casas, trazendo risco de doenças. Os técnicos da CLIN, empresa responsável pela limpeza urbana na cidade não tinham como subir aos morros com os serviços tradicionais, como caminhões e tratores, pois as vielas, becos e escadarias só permitiam o acesso a pé.

Após estudar o problema, e visitar as comunidades, conclui o óbvio, se o serviço público de limpeza não conseguia chegar até onde o lixo estava então o lixo teria de vir até aonde o serviço público pudesse recolhê-lo. E para fazer isso, precisávamos da adesão da população, que em vez de jogar seu lixo pela janela, deveria ser sensibilizada, informada e educada a trazer seu lixo até o pé do morro.

Com os companheiros e técnicos da CLIN, comecei um trabalho de educação ambiental nas comunidades despertando a cidadania ambiental, mostrando que mesmo os moradores de comunidades de baixa renda tinham direitos e mereciam respeito, que assim como a Prefeitura encontrou um jeito de retirar o lixo das áreas onde tinha asfalto, também teria de encontrar um jeito de recolher o lixo nos morros da cidade, pois não existem cidadãos de primeira ou de segunda classe, e uma cidade não poderá dizer que respeita seus cidadãos enquanto existirem cidadãos desrespeitados!

O discurso ambiental procurou se aproximar da realidade das comunidades, onde tive de traduzir o ecologês adaptando-o para as suas carências e mostrei que a política de favores e privilégios devia ser substituída por uma política de resgate e respeito à cidadania, assegurando direitos, e também deveres. Deu certo. O lixo começou a descer dos morros em vez de ser lançado nas encostas. Ao pé dos morros a CLIN colocou galões e passou a recolher o lixo duas vezes por dia. Entretanto, e o passivo ambiental? As ‘cortinas’ de lixo que permaneciam nas comunidades? A solução foi a criação do Projeto “Sábado é dia de Faxina”, onde a cada sábado a CLIN levava uma força tarefa de técnicos, garis, caminhões, tratores, e também ferramentas de sobra para que a própria comunidade auxiliasse na limpeza. Não era fácil. As encostas, de tão íngremes, exigiam que os trabalhadores descessem amarrados em cordas. E após a limpeza, plantávamos árvores frutíferas no local, como uma estratégia para que o lugar não viesse a se transformar novamente em cortina de lixo.

Entretanto, não era justo convocar os moradores, a maioria trabalhadores humildes, que passavam a semana inteira trabalhando, às vezes em trabalhos pesados, para no sábado de descanso trabalhar de graça na limpeza da comunidade, ainda que o benefício fosse grande para a comunidade! A CLIN jamais faria uma proposta desta a um morador de um bairro chamado nobre! Entretanto, como remunerar estes trabalhadores sendo o dinheiro público? Teria de abrir licitação? Como assegurar que este dinheiro não fosse desviado para interesses políticos ou pessoais? O Paulo Lemos criou uma solução interessante, um convênio de cooperação técnica entre a CLIN e as associações de moradores, auditável pelo Tribunal de Contas do Município, que passaram a receber as ferramentas em regime de comodato durante um mês, para uso na comunidade, e um pró-labore para cada trabalhador que participasse do mutirão, com base no salário mínimo/dia de trabalho. A associação de moradores recrutava os trabalhadores e distribuía as ferramentas e os técnicos da CLIN orientavam o serviço e retiravam o lixo, e tudo era devidamente documentado com fotos, os trabalhadores devidamente cadastrados, a fim de fazer a prestação de contas do dinheiro público.

Então, uma surpresa! A criatividade das comunidades passou a transformar os sábados de faxina em verdadeiras festas que funcionavam como um fator de mobilização de todos e não apenas dos trabalhadores. Os trabalhadores preferiram trocar o pró-labore por angu à baiana, dobradinha, feijoada, etc. que a própria Associação se encarregava de comprar e preparar. Como coordenador, eu acompanhava cada mutirão e como fazíamos mais de um a cada sábado, em morros diferentes, então tinha de comer dobradinha, feijoada, angu à baiana, churrasco, mais de uma vez no mesmo dia, pois não podia cometer a desfeita de recusar!

Gostava de estar no meio daquela gente simples, que apesar das dificuldades, procurava se superar e mostrava-se disposta a arregaçar as mangas pela melhoria de sua comunidade. Bem diferente dos bairros de classe média em que eu morava, onde não conseguíamos nem conhecer direito o vizinho do lado!

O Projeto ‘Sábado é dia de faxina’ foi um sucesso que perdura até hoje e deu origem aos Garis Comunitários, trabalhadores escolhidos pela Associação de Moradores para a limpeza de forma regular e permanente nas comunidades. Em 2005, Paulo Lemos me indicou, junto ao vereador Fernando de Oliveira Rodrigues, para receber o título de Cidadão Niteroiense, o que muito me honra ser reconhecido pela cidade que escolhi para viver e morar, como seu cidadão!

Defensores da Terra

















A parceria entre os Defensores da Terra, ONG que presidi, e o mandado do então deputado estadual Carlos Minc, resultou no avanço dos direitos da Cidadania Ambiental. A foto mostra o momento em que derrubamos um muro construído ilegalmente dentro da Lagoa de Itaipu, em Niterói (RJ), numa ação direta da cidadania ambiental.No transcorrer destas lutas, fui amadurecendo em minha visão de ambientalista. De uma percepção negativa do poder público, para uma percepção sobre a importância do poder do Estado como regulador de algumas atividades humanas; passei de uma atitude de luta com predomínio exclusivo da ação de denúncia, do não pode isso, não pode aquilo, para uma definição mais precisa de fins e meios a utilizar para atingi-los, e o que pode, em que circunstâncias e limites; de uma visão grosseira do significado de ser ecologista para outra mais complexa; de um quase desprezo pela formação teórica dos militantes para uma valorização do trabalho teórico, profissional. Todo este processo de amadurecimento convergiu para a minha decisão em aceitar o convite do então deputado Carlos Minc, que mais tarde veio a ocupar o cargo de Ministro do Meio Ambiente, no segundo mandato do Presidente Lula, em participar da fundação de uma nova organização não governamental, ambientalista, os Defensores da Terra, com uma proposta mais política, embora não partidária.

Minc convidou-me também para assessorá-lo na Comissão de Meio Ambiente da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro. Aceitei de pronto, pois vi ali uma oportunidade de contribuir e ampliar minhas lutas em defesa do meio ambiente e da qualidade de vida, por um mundo melhor, mais pacífico, justo e ecológico. Principalmente, por que iria me permitir encurtar caminho através da elaboração de boas leis, que assegurassem direitos ambientais para a sociedade. Foi um período de intensa atividade, pois o mandato do Carlos Minc atuava em várias frentes. Desde o início, pude contar com o Minc e com a sua equipe, da qual passei a fazer parte, para o encaminhamento de demandas socioambientais que antes não tinha como atender. Aprendi muito na convivência com pessoas competentes e entusiasmadas como o Luiz Antônio Prado, o Roberto Mariano, o engenheiro Lúcio Flávio Campos, a Kátia Medeiros, a Lara Montanheiro, Beth, o Fernando Português e sua companheira Lúcia, a Denise, o pessoal de apoio, Ada, Cristine, Tony, Vadinho, e tantos outros companheiros e companheiras cuja ajuda foi muito importante para que pudéssemos assegurar benefícios para o meio ambiente e para a população fluminense. Elaborei cerca de quarenta projetos de lei que foram defendidos pelo Minc até que se transformassem em lei e, mesmo depois disso, continuamos na luta pelo seu cumprimento, com a campanha do “Cumpra-se”.

Destaco, em especial, duas iniciativas importantes.

A primeira, a lei inédita que passou a assegurar aos povos tradicionais, antes tratados como ‘estorvo ecológico’, o direito de viverem nos seus locais de origens mesmo depois de transformados em unidades de conservação, o que beneficiou milhares de famílias.

A segunda, a Lei do ICMs Ecológico, que trouxe do Paraná, e que hoje distribui valores em dinheiro aos municípios que efetivamente comprovarem que estão cuidando direito do meio ambiente. A iniciativa já surtiu efeito positivo nas municipalidades que passaram a criar seus Sistemas Municipais de Meio Ambiente, condição para habilitarem-se ao recebimento, como igualmente em relação a postura dos prefeitos, que passaram a adotar a temática ambiental em seus pronunciamentos.

Povos tradicionais

Seu Antônio Osório, com mais de 70 anos, entre eu e meu filho Leonardo, de calção azul, sem camisa, nos recebia sempre com muito carinho na comunidade da Vila do Aventureiro, na Ilha Grande, em Angra dos Reis (RJ) e falava com entusiasmo e lágrima nos olhos sobre as riquezas naturais e a cultura da comunidade e lamentava-se pela criação de uma Reserva Biológica onde viveu a vida toda e que agora, por causa disso, estava proibido de pescar nas lagoas, fazer roça ou construir uma casinha para o filho que havia casado recentemente. Morreu pouco tempo depois desta foto, dizem que de desgosto.

Entre estes projetos de lei, destaca-se a Lei Nº 2393, de 20 de abril de 1995, que assegurou às populações residentes e pescadores em unidades de conservação há mais de 50 anos o direito real de uso das áreas ocupadas. Em contrapartida, as populações beneficiadas devem preservar, recuperar e defender estas áreas. A lei foi inspirada no Aventureiro, uma comunidade de caiçaras que vive há cerca de 200 anos na Praia do Aventureiro, em plena Reserva Biológica da Praia do Sul, no lado oceânico da Ilha Grande, em Angra dos Reis (RJ), no litoral do Estado do Rio de Janeiro, uma região de grande beleza natural, que reúne, em cerca de 3.600 hectares, diversos ecossistemas em excelente estado de preservação. Conhecer sobre o Povo do Aventureiro foi aprender um pouco sobre a cultura caiçara, traço comum que une centenas de comunidades hoje marginalizadas e entregues à própria sorte. E mais. Foi também conhecer sobre os ecossistemas que habitam, verdadeiros paraísos de beleza natural. Seria como viver num paraíso, não fossem os inúmeros problemas que ameaçam os caiçaras do Aventureiro.

Vivendo quase sempre isolados, em regiões de praias, florestas, lagoas, rios cristalinos, sem infra-estrutura ou instrumentos de trabalho sofisticados, os caiçaras tiveram de se adaptar ao meio ambiente ao longo de sucessivas gerações. Dessa adaptação resultou um conjunto de saberes e um jeito próprio de lidar com os recursos naturais que tem garantido a sua preservação. A relação preservacionista que mantêm com a natureza não vem de nenhuma consciência ecológica tradicional, mas é uma exigência de preservação da própria subsistência da comunidade. Geralmente sem energia elétrica, portanto, sem geladeiras para conservar os alimentos, tiveram de aprender a usar a própria natureza como forma de assegurar a sobrevivência. Então, quanto mais preservada a natureza estiver, maior será a garantia de alimentos no futuro.

Sua cultura caracteriza-se pela tradição e é transmitida pela prática cotidiana e pela oralidade, através dos rituais de festas religiosas, longas ‘prosas’, canções e cirandas. Assim vão perpetuando o conhecimento sobre técnicas de pesca, caça e agricultura, qual a melhor época de extrair os recursos naturais sem extingui-los, como construir moradias e embarcações, o que se pode ou não comer, qual a melhor maneira de consumir os alimentos, que erva cura e qual mata, etc. Junto a esse conhecimento sobre o dia-a-dia, também são transmitidos valores morais, religiosos, estéticos, saberes que compõem a Cultura Caiçara.

A Reserva Biológica da Praia do Sul, no lado oceânico da Ilha Grande, no litoral do Estado do Rio de Janeiro – Brasil parece um pedaço do paraíso. Num trecho relativamente pequeno, cerca de 3.600 hectares, reúne-se o que há de melhor, mais especial e preservado de cinco ecossistemas diferentes: mata atlântica, restinga, manguezal, lagunas e litoral rochoso, onde se destacam duas lagoas de águas limpas e rios, como o Capivari, que possui grau zero de poluição, desde a nascente até a foz, um caso cada vez mais raro hoje em dia.

Não é só a riqueza natural do lugar que impressiona, mas também a importância histórica da Reserva. Ali se encontram sítios arqueológicos com mais de 3.000 anos, com sambaquis e oficinas líticas, onde os índios pré-históricos preparavam suas lanças e ferramentas de caça e pesca. Curioso foi os arqueólogos terem desenterrado um esqueleto pré-histórico, de um indivíduo masculino, que possuía um metro e oitenta de altura, o que contraria a tese de que os índios eram baixinhos.

O Povo do Aventureiro já chegou a ter 150 famílias, reduzida para menos de 50, devido, em parte, às restrições determinadas pela legislação ambiental que criou a Reserva Biológica da Praia do Sul, categoria mais restritiva de unidade de conservação existente na legislação brasileira, onde nem mesmo pesquisadores podem entrar sem permissão especial, que dirá servir de moradia a pescadores e agricultores, como os caiçaras. As leis ambientais brasileiras são relativamente recentes, e ainda estão em processo de amadurecimento. São leis restritivas, mais voltadas para a preservação da fauna e da flora. Hoje, a consciência ambiental já avançou a ponto de considerar o ser humano também como parte do ecossistema. Se antes a presença humana na natureza era vista unicamente como fator de agressão ambiental, hoje essa presença pode significar fator de preservação, como o caso dos caiçaras. É apenas questão de tempo para que a legislação venha a incorporar definitivamente essa mudança de conceito. Chico Mendes contribuiu bastante para acelerar tal processo. Sua luta deu origem a primeira unidade de conservação, as Reservas Extrativistas, criada para a preservação do ser humano não-indígena. No Estado do Rio de Janeiro, a Lei 2.393 (20/04/95) que redigi e que foi defendida pelo Carlos Minc, garante os direitos dos povos tradicionais viverem nas unidades de conservação do Estado, desde que já residam no local há mais de 50 anos e mantenham relação de preservação com o ecossistema. Já é um bom começo, mas entre direitos assegurados no papel e direitos de verdade, ainda existe um longo caminho de luta a ser feita. Meu filho mais novo, o Gustavo, biólogo pós-graduado em meio ambiente, e que me acompanhou em toda esta trajetória, desde criança, escolheu este tema para o seu mestrado.

Antes da criação da Reserva, os caiçaras do Aventureiro pescavam nas lagoas, sempre que o mar ‘engrossava’ e impedia a saída dos barcos, o que invariavelmente acontece e chega a durar, às vezes, meses. Era nas lagoas que eles se ‘safavam’, segundo suas próprias palavras. Hoje, essa pesca é proibida, assim como a caça de subsistência e mesmo o desmatamento para plantio de roça. Não se trata de um desmatamento em grande escala, mas pequenos cortes e queimadas no meio da floresta que, após a colheita de três ou quatro safras é abandonada, permitindo a recuperação total da floresta. Pesquisas científicas realizadas no local comprovaram que a técnica de ‘agricultura de toco’, ou coivara, não só não destrói a floresta como contribui para o aumento da biodiversidade. Em locais que se imaginava ser de mata primária, os pesquisadores encontraram no subsolo uma camada homogênea de dez centímetros de carvão, o que demonstrou que a área já havia sido uma antiga roça caiçara.

Outro fator que tem ameaçado a cultura caiçara no Aventureiro é a verdadeira invasão de pessoas de fora da comunidade, com cultura e hábitos diferentes, nas épocas de feriados prolongados, como carnaval, por exemplo. Embora proibido pela legislação ambiental, os freqüentadores sempre encontram um jeito de acampar nos quintais ou se abrigarem nas próprias casas dos pescadores. O Poder Público não dispõe de recursos para impedir a ‘invasão’. A questão é, sobretudo, conceitual. À luz da legislação ambiental, esses invasores são tão ilegais quanto os próprios caiçaras, o que gera uma cumplicidade entre eles absolutamente falsa e ilusória. Os caiçaras são atraídos pela fonte extra de renda e inventam desculpas para justificar a presença, como se fossem parentes distantes em visita à comunidade. Por ser proibida, essa ocupação não é planejada, como uma atividade tradicional de turismo. Não há banheiros públicos ou locais para lixo e o tipo de pessoa atraída para tais condições de precariedade e ilegalidade não são exatamente aquelas mais acostumadas a respeitar limites e obedecer a regras. São comuns entre os caiçaras histórias de turistas tomando banho nus, fumando maconha ou usando outros tipos de drogas, fazendo sexo ao ar livre, etc. Em épocas, como carnaval, por exemplo, já se chegou a contar mais de 1.000 pessoas no Aventureiro, um impacto relevante para uma comunidade que não ultrapassa 150 pessoas.

Esse impacto também se dá sobre os recursos naturais, já que é preciso alimentar uma população adicional muito superior à usual, forçando os caiçaras a pescarem além do normal e a lançarem mão de seus estoques agrícolas, obrigando-os, mais tarde, a terem de comprar o que antes tinham no fundo do quintal, isso sem falar nas verdadeiras montanhas de lixo, deixadas para trás. O impacto sobre os jovens caiçaras também é considerável, já que se recusam a aceitar a própria cultura, envergonham-se de serem caiçaras, como se fosse sinônimo de atraso, o que provoca uma pressão extra sobre os recursos naturais, já que tendem a acumular estoques para atingir o mesmo poder de consumo que os ‘turistas’.

ICMs Ecológico


Quando estive no Paraná, para palestras sobre meus livros no Colégio Positivo Júnior, conheci a experiência do Deputado Estadual Neivo Beraldim com a criação do ICMs Ecológico e quando voltei ao Rio de Janeiro, falei da idéia ao Minc que imediatamente me pediu para adaptar para o Estado, o que fiz, e que deu origem à Lei que hoje assegura recursos extras para municípios com áreas verdes e áreas de mananciais de abastecimento público. Uma compensação financeira por cuidarem bem desse patrimônio ambiental. A Lei n.º 5.100 de 4 de outubro de 2007, que alterou a Lei n.º 2.664, de 27 de dezembro de 1996, foi sancionada pelo governador Sérgio Cabral em outubro de 2007, estabelecendo novas regras para o repasse do ICMS aos 92 municípios do Estado do Rio. Foi regulamentada pelo Decreto n.º 41.844, de 4 de maio de 2009. Agora, as prefeituras que investirem na preservação ambiental receberão maior repasse desse imposto, que pode ultrapassar R$ 100 milhões, em 2011. O índice de repasse do ICMS Ecológico é composto pelos seguintes critérios: 45% para unidades de conservação; 30% para qualidade da água e 25% para a gestão dos resíduos sólidos. Em março de 2009, as prefeituras já começaram a ser beneficiadas.Município – Parcela do ICMS Ecológico recebida em 2010
Angra dos Reis – 12.072,45
Aperibé – 107.298,30
Araruama – 62.184,62
Areal – 114.150,05
Armação dos Búzios – 12.733,53
Barra do Piraí – 57.386,62
Barra Mansa – 26.682,48
Belford Roxo – 102.176,50
Bom Jardim – 11.016,85
Bom Jesus do Itabapoana – 31.579,14
Cabo Frio – 10.985,93
Cachoeiras de Macacu – 11.010,84
Cambuci – 9.261,07
Campos dos Goytacazes – 23.583,12
Cantagalo – 35.924,47
Carapebus – 109.024,99
Cardoso Moreira – 27.659,63
Carmo – 100.835,45
Casimiro de Abreu – 11.030,52
Comendador Levy Gasparian – 80.332,29
Conceição de Macabu – 99.851,94
Cordeiro – 52.833,39
Duque de Caxias – 27.388,45
Engenheiro Paulo de Frontin – 3.195,86
Guapimirim – 26.701,13
Itaboraí – 20.754,43
Italva – 31.619,65
Itaocara – 80.351,78
Itaperuna – 1.879,57
Itatiaia – 30,13
Japeri – 24.434,04
Laje do Muriaé – 1.655,97
Macaé – 95.251,38
Macuco – 7.415,51
Magé – 17.245,32
Mangaratiba – 75.849,23
Maricá – 25.851,69
Mesquita – 785,61
Miracema – 177,24
Natividade – 9.950,50

Fortalecimento das ONGs Ambientalistas – RJ


Inspirado no PROAONG, programa implantado em São Paulo, com sucesso, por iniciativa do então Secretário de Meio Ambiente Fábio Feldmann e coordenada pelo Enrique Svirsky, ainda no Mandato do Minc apresentei uma indicação legislativa sugerindo ao então Secretário Estadual de Meio Ambiente, Délio Leal a criação do PRO-AMB – Programa Estadual de Apoio às ONGs Ambientalistas. A idéia foi retomada mais tarde pelo sucessor do Délio, deputado Estadual André Correa, que me convidou para coordenar o projeto, através de uma consultoria do PNUD (Programa das Nações Unidas).Através do PRÓ-AMB conseguimos o apoio financeiro e de computadores e cursos de treinamento para as Organizações Não-Governamentais Ambientalistas que atuavam no Estado do Rio de Janeiro para seu fortalecimento institucional e implementação dos objetivos, políticos e mecanismos descritos na Agenda 21. Entre estes objetivos destacaram-se: a) intensificar o diálogo com as ONGs e suas redes a fim de discutir direitos e responsabilidades, para que possam canalizar eficientemente suas contribuições ao processo governamental de formulação de políticas ambientais; b) estimular e possibilitar a parceiras entre as ONGs e as autoridades governamentais, em atividades orientadas para o desenvolvimento sustentável; c) incluir e ampliar a participação das ONGs no campo da conscientização e da educação ambiental; d) tornar disponíveis e acessíveis às ONGs dados e informações que possam contribuir efetivamente para a pesquisa, formulação, implementação e avaliação de programas ambientais.

Ações cidadãs para conquista de direitos








“Se eu fui capaz de ver mais longe é porque estava de pé nos ombros de gigantes.” – Isaac Newton

Elegemos a prática da desobediência civil e da ação direta como forma de mobilizar a população para o enfrentamento de seus problemas e reivindicação de seus direitos, pois não basta fazer boas leis, é preciso lutar para vê-las cumpridas. Na comunidade caiçara da Praia do Sono, em Paraty, junto com eles começamos a demarcar a área com bambus, mas antes arrancamos as cercas de arame farpado colocada por grileiros usando o carro do Projeto Terralerta.

Nessa mesma época e região, realizamos uma nova ação direta pelo fim da privatização das praias pelos condomínios de luxo. As praias são um bem público, de todo o povo, e não podem ser privatizadas. Então, ‘invadimos’ o condomínio Laranjeiras, em Paraty, para irmos à praia! Isso gerou toda uma nova visão em relação à importância de se preservar e de se reivindicar o direito de acesso livre às praias. O Condomínio acabou criando uma passagem livre de acesso às praias, o que não havia antes.

Em janeiro de 1984, com a fundação dos Defensores da Terra, passei a coordenar o Projeto Terralerta e diversas campanhas em defesa de um meio ambiente, com ampla repercussão para a mídia de massa.

Entre estas campanhas, destaca-se “VAMOS TIRAR A NATUREZA DO PAPEL – ABRACE 92 EM 92”, lançada em 1991, visando a preservação das unidades de conservação do estado do Rio de Janeiro. Uma maneira de alertar aos participantes da ECO 92 que de nada adiantaria declarações pomposas e assinaturas em compromissos globais, se estes não fossem transformados em atos concretos. O Estado do Rio de Janeiro possuía mais de 90 unidades de conservação, entre parques, reservas e áreas naturais. Apesar de sua importância, e da legislação protetora, este rico patrimônio ambiental estava praticamente abandonado. Não existia fiscalização, planos diretores, regularização fundiária e programas de educação ambiental adequados. A campanha teve por objetivos básicos exigir das autoridades a implantação efetiva das unidades de conservação, tirar estas unidade de conservação do papel, com a solução de seus principais problemas. Visou também realizar ações diretas de proteção ambiental, esclarecer e mobilizar a opinião pública em defesa das unidades de conservação e estimular o fortalecimento das ONGs ambientalistas locais e proteger as populações nativas que dependem desses ecossistemas para subsistir. Desde o lançamento da campanha, algumas lagoas foram salvas, como Jacarepiá, parques acabaram instalados, como o estadual da Serra da Tiririca, e conseguimos aprovar leis importantes, como a que criou a Taxa Florestal, que destina recursos para a preservação ambiental.

Fotos:

(1) A equipe do Projeto Terralerta, da ONG Defensores da Terra. Da esquerda para a direita, Margarida Galamba, Vilmar, Alex Shoroeder, Raul Mazzei e Hélio Vanderlei. Financiado pelo Sindicato das Seguradoras do Estado do Rio de Janeiro e pela Refinaria de Manguinhos, o projeto equipou a organização e nos permitiu ganhar maior eficácia e combatividade na defesa do meio ambiente.

(2) Foto foi tirada pelo meu filho Leonardo, em nosso primeiro ‘abraço ecológico’ a uma unidade de conservação no Estado do Rio de Janeiro, quando lançamos a campanha “VAMOS TIRAR A NATUREZA DO PAPEL – ABRACE 92 EM 92”, no alto do Morro dos Cabritos, na Área de Proteção Ambiental de Grumari e da Prainha. Na ocasião, junto ao GAE, reivindicamos a incorporação da APA ao Parque Estadual da Pedra Branca.

(3) Durante a ECO 92, o mandato do Minc e os Defensores da Terra expuseram no Fórum Paralelo, no Aterro do Flamengo, um grande painel com a cabeça de um Pinóquio e por volta das 17hs, divulgávamos os resultados de nosso ‘monitoramento’ sobre o ‘índice de mentira no ar’ no evento oficial, que acontecia no Riocentro, na Barra da Tijuca. O nariz do Pinóquio, por exemplo, alcançou o índice máximo de mentira no ar por ocasião do discurso do Presidente dos Estados Unidos (Bush, pai), onde falou sobre a importância do cuidado com o meio ambiente ao mesmo tempo em que seu governo recusava-se a assumir limites para suas emissões ou para dar fim à destruição da biodiversidade. Passamos a ser uma espécie de contraponto às declarações oficiais e às vezes tínhamos de adiar um pouco a divulgação de nossos resultados para dar tempo a que as imprensa nacional e internacional tivesse tempo de vir da Barra da Tijuca até o Aterro do Flamengo, uns 30 quilômetros distantes um do outro!

(4) Com a campanha pelas Unidades de Conservação percorri com o ambientalista Raul Mazzei as mais de noventa unidades em todo o Estado, organizando ‘abraços ecológicos’ em parceria com os movimentos ambientalistas locais e com forte apoio da imprensa, e sempre contando com a ajuda estratégica e a orientação de um verdadeiro conselho informal de ambientalistas fluminenses como Arthur Soffiati, Mário Moscatelli, Paulo Bidegain, Rogério Rocco, Sérgio Ricardo, Gerhard Sardo, Miguel do Pó, Hélio Vanderlei, Franklin Mattos, e ambientalistas de outros estados, como o Mário Mantovani, e muitos outros companheiros. Este apoio permitiu que as questões ambientais deixassem de ser um assunto pouco prioritário para ganhar importância junto à sociedade.

(5) Em companhia da Univerde e do Mário Moscatelli, denunciamos o desmatamento do manguezal na Área de Proteção Ambiental de Guapimirim, em São Gonçalo (RJ).

(6) Em Campos (RJ), permanecemos durante uma semana até localizar a casa do chamado Rei do Desmatamento na região, responsável inclusive por desmatamento no Parque Estadual do Desengano. Era um sujeito perigoso com fama de matador e a Justiça já vinha a tempos tentando prender. Voltamos ao Rio de Janeiro e organizamos uma manifestação em frente à casa do sujeito. Na faixa uma grande frase: “Atenção Justiça, o Rei do Desmatamento mora aqui!”

(7) Fomos pioneiros em reivindicar o uso do gás natural inicialmente para os táxi, na Cidade do Rio de Janeiro, como forma de contribuir para combater a poluição do ar da cidade e ajudar aos taxistas a economizarem no combustível. Esta ação, entre outras vitórias, resultou na aprovação da Lei 3569/01, que autoriza a conversão para gás natural da frota de veículos dos poderes Executivo e Legislativo, de autoria do mandato do Carlos Minc. A partir do exemplo do poder público, mostramos ao setor privado a possibilidade de implantação de alternativas ao uso de combustíveis que poluem o meio ambiente e contribuem para o aumento do efeito estufa.

(8) Fizemos uma interdição ‘civil’ com fitas de perigo nas praias do Rio de Janeiro contaminadas por esgoto para alertar as autoridades sobre a necessidade de saneamento urgente.

Café com FHC



O tema principal do café da manhã do então Presidente da República Fernando Henrique Cardoso com os ambientalistas foi a mata atlântica, no Palácio Rio Negro, em Petrópolis (RJ), quando lemos e entregamos uma carta com reivindicações para a proteção da Mata Atlântica, comprovadamente o ecossistema mais rico em árvores do planeta segundo estudo da bióloga Luciana Dias Thomaz, da UNESP, de Rio Claro-SP. Na Estação Ecológica de Santa Lúcia, no Espírito Santo, ela comprovou que, em apenas um hectare de floresta, foram encontradas 476 espécies de árvores, entre as quais cinco espécies e (possivelmente) um gênero novo para a ciência, que estão sendo agora descritos. A pesquisa estabeleceu um novo recorde mundial. O anterior, de 450 espécies em um hectare também era da Mata Atlântica, só que no sul da Bahia.A reunião valeu, pois conseguimos que fossem atendidas algumas de nossas reivindicações como, por exemplo, a inclusão da Mata Atlântica no Programa Piloto Para a Conservação das Florestas Tropicais Brasileiras, o chamado PP-G7. Muito mais que os R$ 12 milhões de reais anunciados na ocasião, a disposição do Presidente para dialogar com os ambientalistas revelou uma mudança significativa de postura do Governo Federal em relação não só à Mata Atlântica, mas principalmente, às ONGs (Organizações Não-Governamentais) ambientalistas. O Presidente Fernando Henrique anunciou inclusive que já havia determinado os estudos para eliminar burocracias e viabilizar o trabalho conjunto com as ONGs.

Meu filho, Gustavo Berna, então com 16 anos, também participou do encontro com o Presidente e, na saída, bateu a foto dos participantes. Da esquerda para a direita: João de Orleans e Bragança, representando a ONG Parque das Ilhas (Paraty, RJ); professor Airton de Barros, coordenador do Projeto Managé/UFF, Fernanda Colagrossi, representante das ONGs da Região Sudeste no CONAMA e presidente da APANDE, ONG sediada em Petrópolis; Clayton F. Lino, coordenador técnico do Conselho Nacional da Reserva da Biofera da Mata Atlântica; Rui Rocha, do IESB – Instituto de Estudos Sócio-Ambientais do Sul da Bahia; Luiz Paulo de Souza Pinto, coordenador de projetos da ONG Conservation International; ao lado dele o representante do Deputado Fábio Feldmann, Secretário Estadual de Meio Ambiente de São Paulo; à frente, Aspásia Camargo, secretária executiva do Ministério do Meio Ambiente, abraçada pelo Embaixador Sérgio Amaral, Secretário de Comunicação Social da Presidência da República; José Pedro Costa, coordenador do Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica; Gisela, representante da ONG Biodiversitas; Samyra Cresppo, do ISER; Vilmar Berna, presidente da ONG Defensores da Terra e editor do Jornal do Meio Ambiente; Clóvis Ricardo S. Borges, diretor da SPVS – Sociedade de Pesquisa em Vida Silvestre; Eduardo Martins, presidente do IBAMA; e Maria de Lourdes Nunes, a Malu, da Fundação “O Boticário”. Também participaram do encontro, mas não aparecem na foto: Almirante Ibsen Câmara, representante da FBCN; Alfredo Sirkis, representando a ONG Onda Azul; Mário Mantovani, da Fundação SOS Mata Atlântica e o Ex-Secretário Estadual de Meio Ambiente, embaixador Flávio Perri, atual Secretário Estadual de Projetos Especiais.

‘A vida começa aos 40’, mas que vida?




A Ponta da Ilha, em Jurujuba, Niterói (RJ), às margens da Baía de Guanabara, em Niterói. Minha casa é a do coqueiro, que de brincadeirinha chamo de ‘ser superior’. Não precisa correr atrás de alimento para a sua sobrevivência, basta estender suas folhas para o Sol. Tem diversão garantida com os pardais, sanhaços e bem-te-vis que se alternam para fazer os seus ninhos. Curte uma paisagem deslumbrante da Baía de Guanabara, e ainda faz uma ‘média’ comigo, oferecendo deliciosos cocos de vez em quando…

“Não pretendemos que as coisas mudem se sempre fazemos o mesmo. A crise é a melhor benção que pode ocorrer com as pessoas e países, porque a crise traz progressos. A criatividade nasce da angústia, como o dia nasce da noite escura. É na crise que nascem as invenções, os descobrimentos e as grandes estratégias. Quem supera a crise, supera a si mesmo, sem ficar “superado”. – Albert Einstein

Não acredito nessa história de crise dos 40 anos, mas, coincidência ou não, neste período, por volta do ano de 1.999, tomei decisões difíceis que exigiram coragem. Foi um ano especial para mim também por que estive no Japão, onde fui receber o Prêmio Global 500 da ONU Para o meio ambiente, uma homenagem antes concedida a pessoas que eu admiro, como Chico Mendes e Betinho, então, me senti feliz pela indicação. Se por um lado eu tinha o privilégio de receber em vida as homenagens e o reconhecimento dos meus pares, por outro, mergulhava numa fase de crise e decisões difíceis. Diz-se que “a vida começa aos 40”, mas a pergunta é, qual vida? Talvez a transição dos 40 anos seja mais um dos ritos de passagem como a adolescência, em que não se é mais tão jovem, porém ainda não se é velho. Penso que a verdadeira crise, é a crise da falta de coragem para tomar decisões. O inconveniente das pessoas e dos países é a esperança de encontrar as saídas e soluções fáceis. Sem crise não há desafios, sem desafios, a vida é uma rotina, uma lenta agonia. Sem crise não há mérito. Falar de crise é promovê-la, e calar-se sobre ela é exaltar o conformismo. Então, decidi trabalhar duro para aproveitar a outra metade da minha laranja! Tragédia teria sido não querer lutar para superar a minha ‘crise dos 40’.

Foi mais ou menos por volta deste período de minha vida que minha saúde ‘de ferro’ começou a ceder lugar para as primeiras pedrinhas nos rins, logo depois o diabetes, seguido da pressão e do colesterol altos, sinais da natureza de que eu não era imortal! Logo, seria insensatez de minha parte pretender viver como se nunca fosse morrer! Pareceu-me mais sensato viver bem, um dia de cada vez, por que o futuro é incerto. Na verdade, só vivemos no presente, que é onde podemos tomar decisões e fazer escolhas. Então, também me pareceu sensato passar a cuidar melhor de minha saúde e se antes não sentia necessidade de ir a médicos ou tomar remédios, cuidar melhor da alimentação ou de fazer exercícios, agora a situação era diferente!

Foi um período importante em que olhei para minha vida em perspectiva, como se ela fosse uma laranja da qual eu já tivesse chupado a metade. Calculei que me restavam poucos anos realmente produtivos à minha frente. E sobre a outra metade, que me restava, já sabia que não iria aproveitar bem toda ela, primeiro por que teria de dormir pelo menos um terço de minha vida, e, segundo, por que naturalmente, ao finalzinho, o ‘caldo’ já não seria tão bom quanto agora, pois a natureza estaria se encarregando com cada vez maior competência para que mais cedo ou mais tarde eu desocupe este espaço…! Então, não tinha mais tempo a perder, e o tempo era bem curto! Na época, ao ler Ricardo Gondim, em Tempo que Foge, percebi que ele também tinha chegado, mais ou menos, à mesma conclusão:

Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para frente do que já vivi até agora. Sinto-me como aquele menino que ganhou uma bacia de jabuticabas. As primeiras, ele chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço.

Já não tenho tempo para lidar com mediocridades. Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflados. Não tolero gabolices. Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte.

Já não tenho tempo para projetos megalomaníacos. Não participarei de conferências que estabelecem prazos fixos para reverter a miséria do mundo. Não vou mais a workshops onde se ensina como converter milhões usando uma fórmula de poucos pontos. Não quero que me convidem para eventos de um fim-de-semana com a proposta de abalar o milênio.

Já não tenho tempo para reuniões intermináveis para discutir estatutos, normas, procedimentos parlamentares e regimentos internos. Não gosto de assembléias ordinárias em que as organizações procuram se proteger e perpetuar através de infindáveis detalhes organizacionais.

Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar da idade cronológica, são imaturos. Não quero ver os ponteiros do relógio avançando em reuniões de “confrontação”, onde “tiramos fatos à limpo”.

Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário do coral.

Já não tenho tempo para debater vírgulas, detalhes gramaticais sutis, ou sobre as diferentes traduções da Bíblia. Não quero ficar explicando porque gosto da Nova Versão Internacional das Escrituras, só porque há um grupo que a considera herética. Minha resposta será curta e delicada:

– Gosto, e ponto final! Lembrei-me agora de Mário de Andrade que afirmou: “As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos”.

Meu tempo tornou-se escasso ‘para debater rótulos.

Já não tenho tempo para ficar dando explicação aos medianos se estou ou não perdendo a fé, porque admiro a poesia do Chico Buarque e do Vinicius de Moraes; a voz da Maria Bethânia; os livros de Machado de Assis, Thomas Mann, Ernest Hemingway e José Lins do Rego.

Sem muitas jabuticabas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita para a “última hora”; não foge de sua mortalidade, defende a dignidade dos marginalizados, e deseja andar humildemente com Deus.

Caminhar perto dessas pessoas nunca será perda de tempo.

Baía de Guanabara


Em 2003, voltei ainda por um curto período à ALERJ, desta vez a pedido do Deputado Estadual e presidente do Partido Verde- RJ na época, Alessandro Calazans, para assessorá-lo na presidência da Comissão Parlamentar de Inquérito que tinha por objetivo investigar denúncias de desvio dos recursos destinados ao PDBG (Programa de despoluição da Baía de Guanabara). Aceitei o desafio, pois além de morar às margens da Baía de Guanabara, ela representa um patrimônio natural muito importante para o povo fluminense. Infelizmente, quase dez anos depois de iniciado o PDBG que, com os aditamentos, multas e juros, já custava mais de 1 bilhão de dólares para o povo fluminense, apenas cerca de 20% das obras conseguiram atingir seus objetivos. Ao abrir a ‘caixa preta’, o que descobrimos foi de indignar: dispensas ilegais de licitação, 80% por cento da obra foi aditada contrariando a legislação, multas, juros milionários, favorecimentos nas licitações, etc. A falta de planejamento e o fato de não priorizarem melhor as obras fez com que TODAS as Estações de Tratamento de Esgoto como São Gonçalo, Meriti, Sarapuí, Pavuna, por exemplo, apesar de prontas, tratavam menos de 10 % de esgoto pelo simples fato de que as redes de coleta não estavam prontas. Enormes reservatórios de água em São Gonçalo, São João de Meriti, Caxias e em outros pontos da cidade, permaneciam vazios ou inoperantes, em regiões onde a população sofre com a falta d’água e precisa gastar recursos para cavar poços e adquirir carros pipas. A água não tem pressão para encher os reservatórios por que os planejadores ‘esqueceram’ de investir em obras para ampliar e melhorar a pressão das redes de abastecimento de água. Redigi diversos Projetos de Lei que foram apresentados em nome conjunto de todos os parlamentares membros da CPI, entre os quais, o que autorizou a criação do Comitê da Bacia Hidrográfica da Baía de Guanabara – CBHBG; criou taxa sobre descarte de efluentes poluidores na Bacia Hidrográfica da Baía de Guanabara para viabilizar o pagamento de contrapartida do Programa de Despoluição da Baía de Guanabara – PDBG; fixou obrigatoriedade para renovação de licenças estaduais às empresas que provocaram danos ambientais no Estado do Rio de Janeiro; criou a Auditoria Ambiental Social. Também escrevi o livro “Baía de Guanabara – Cidadania Ambiental”, publicado em nome da CPI, com o dossiê sobre as vistorias às obras do PDBG.

Voluntários Ambientais






O amigo fotógrafo Paulo Chaffin registrou esta imagem em que eu conferia duas vítimas do acidente com óleo que não resistiram apesar de diversos banhos com água morna e cada pena lavada com cuidado e carinho pelos nossos voluntários.

“Nunca duvide da capacidade de um pequeno grupo de dedicados cidadãos para mudar rumos do planeta. Na verdade, eles são a única esperança para que isso possa ocorrer” – Margaret Mead

Em janeiro de 2000, por ocasião do vazamento de óleo na Baía de Guanabara, fotografei as aves cheias de óleo para que ninguém pudesse dizer mais tarde que aquilo não tinha acontecido, e para que não esquecêssemos das conseqüências de nossas escolhas. Nem empresas, nem governos, nem consumidores ou cidadãos querem que novos acidentes ambientais como este voltem a acontecer, mas enquanto nossa decisão for pelo uso do petróleo, esta é uma possibilidade bem concreta. Na ocasião, recolhemos centenas animais cheios de óleo, com a ajuda de mais de 200 voluntários ambientais, leitores e parceiros que atenderam a nossa convocação para, em vez de continuarem como passivos observadores do desastre, decidissem colocar a ‘mão na massa’. Esses bravos colaboradores fizeram a diferença no resgate e recuperação dos animais vítimas daquele enorme desastre ambiental, que de outra forma estariam condenadas à morte, embora a taxa de mortalidade ficasse em torno de 50%!

Saímos mais fortalecidos e maduros deste triste episódio. A própria Petrobrás, responsável direta pelo vazamento, investiu na modernização de suas instalações, no treinamento de seu pessoal, na aquisição de tecnologias ambientais para a prevenção de acidentes ambientais. Pelo nosso lado, descobrimos que não bastava ter boa vontade ambiental e disposição para o trabalho voluntário! Descobrimos que estávamos completamente despreparados para a tarefa, além de não dispor dos equipamentos necessários. Na ocasião, o presidente da Petrobrás desceu de helicóptero junto a uma de nossas equipes de voluntários, no manguezal de Magé, onde nos esforçávamos para resgatar as aves cheias de óleo, e viu nossas dificuldades, de capacitação e de equipamentos. Comprometeu-se em nos ajudar. Encaminhamos, a seu pedido, um projeto que visava capacitar e mobilizar os voluntários ambientais através da realização sistemática de mutirões ecológicos. Conseguimos que a Petrobrás nos financiasse três mutirões, o que permitiu treinar e mobilizar mais de 500 jovens voluntários. Em 2002, retiramos em 28 de julho cerca de 10 toneladas de lixo flutuante que chega pelas águas da poluída Baía de Guanabara na praia da Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro. Em 22 de dezembro, retiramos cerca de 6 toneladas de areia que entopem o lago da Cascatinha, no Parque Nacional da Floresta da Tijuca. Em 6 de abril de 2003, recolhemos 1 tonelada de lixo jogado por banhistas no rio ao lado da Reserva Biológica do Tinguá (RJ, com a ajuda dos calouros e estudantes de Geografia da UFF – Universidade Federal Fluminense, que trocaram seu trote pelo mutirão ecológico, a ONG Onda Verde, e os alunos e professores do UBEU.

Tentamos renovar o patrocínio com a Petrobras, mas infelizmente, talvez pela mudança na presidência da empresa, não obtivemos mais sucesso. Uma pena, pois hoje teríamos um enorme contingente de voluntários ambientais capacitados na prática para agir em novos casos de acidentes ambientais, que nenhum de nós quer que aconteça, mas que é certo acontecer enquanto a opção por pelo uso do petróleo.

“Vilmar tem feito um trabalho sério e constante em favor do entendimento das causas ambientais por uma parcela cada vez maior da sociedade.” – GREENPEACE – Renato Guimarães e Paulo Adário

“Vilmar tem o espírito do construtor de catedrais da idade média: começar, mesmo sabendo que a obra final outro é que vai ver.” – ROBERTO MESSIAS FRANCO, geógrafo e ambientalista mineiro, foi presidente do IBAMA na gestão do Ministro Carlos Minc. Ex-diretor para a América Latina do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente foi ainda diretor da União Internacional para a Conservação da Natureza, entidade que reúne 750 ONGs de 70 países.

“Vilmar representa um grupo de ambientalistas que não desiste de lutar pelos ideais de um cidadão emancipado que possa definir a qualidade da vida cotidiana, pela associação da justiça ecológica com a social e por uma ação militante que articule competentemente a dimensão da denúncia, da pressão e do confronto político com a realização das parcerias para a viabilização de necessárias melhorias imediatas.” – Prof. CARLOS FREDERICO B. LOUREIRO – Professor da Faculdade de Educação da UFRJ – Coordenador do Curso de Pedagogia da FE/UFRJ – Sub-Coordenador do Grupo de Estudos em Educação Ambiental – FE/UFRJ

Heróis brasileiros


Francisco Anselmo Gomes de Barros (Francelmo) – 65 anos, imolou-se com fogo em 12/11/2005, em Campo Grande (MS), durante ato público contra a instalação de usinas de álcool na região do Pantanal. Era presidente da Fundação para Conservação da Natureza de Mato Grosso do Sul (Fuconams).

“Heróis são pessoas que fizeram o que era necessário fazer, enfrentando as conseqüências.” – William Shakespeare

Que valor tem um mico-leão ou um ecossistema inteiro para uma jovem mãe que não tem o que fazer para alimentar os próprios filhos, ou para alguém que não consegue se libertar das drogas, ou vive na solidão, ou não consegue ser feliz? Pessoas infelizes, solitárias, exploradas, humilhadas tendem a não conseguir estender o olhar além de sua própria miséria pessoal. Como serão capazes então de sensibilizarem-se com a superexploração do Planeta, a poluição e destruição do meio ambiente, a extinção de espécies da fauna e da flora, se elas próprias se sentem ameaçadas de extinção? Segundo a OMS – Organização Mundial de Saúde, 19% de todas as mortes no Brasil poderiam ser evitadas. 84% da população residem nas cidades onde a poluição do ar urbano mata 12,9 mil pessoas/ ano. 22% das pessoas vivem abaixo da linha da pobreza, a deficiência de água tratada e de redes de esgoto tira a vida de 15 mil brasileiros/ano. No mundo a situação é pior. Cerca de 13 milhões de mortes poderiam ser evitadas por medidas que tornassem o meio-ambiente mais saudável, disse a OMC. Quantas vezes ouvimos alguns dizerem que as lutas ambientais não são para países pobres ou em desenvolvimento, mas apenas para países ricos, que já resolveram a maior parte de seus problemas. Revelam uma visão romântica da natureza, como se a espécie humana não fizesse parte dela.

Por outro lado, só serão capazes de se dedicar às lutas socioambientais pessoas ricas, saudáveis, amadas e felizes? Em mais de duas décadas de militância convivi com parceiros e companheiros e companheiras de luta muitos já idosos, outros portadores de doenças graves, ou desempregados, ou pobres, mas que sempre encontraram – e ainda encontram – dentro de si a força e a capacidade de continuar lutando por causas coletivas, como as ambientais. Que mistérios movem o espírito humano que faz as pessoas superarem condições existenciais injustas e mesmo a se superarem em capacidades e talento para se dedicar a lutas como as ambientais, sem expectativa de algum ganho financeiro ou vantagem de qualquer natureza? E em boa parte dos casos sequer contarão com o conforto da vitória, pois geralmente se luta contra interesses econômicos e políticos poderosos! Muito menos devem contar com o reconhecimento da sociedade cuja opinião pode ser manipulada por pessoas inescrupulosas e gananciosas que colocam os ambientalistas contra a população, como se estes fossem inimigos do progresso, do emprego. O que faz pessoas comuns se transformarem em guerreiros incansáveis na luta pela defesa do meio ambiente, muitas vezes tirando energia da própria sobrevivência pessoal ou de sua família? O que faz essas pessoas mesmo ameaçadas de morte continuar lutando pelo direito de todos, a ponto de perderem a própria vida, assassinados, como Chico Mendes, Dionísio, no Tinguá (RJ), Paulo Vinhas, no Espírito Santo, e tantos outros mártires da causa ambiental no Brasil? O que faz uma pessoa como o Francelmo atear fogo no próprio corpo, em praça pública, numa tentativa de proteger o Pantanal ameaçado por usineiros de álcool e outros projetos predatórios?

Da mesma maneira, e por outro lado, o que existe no espírito dessa grande maioria de pessoas que, mesmo conscientes e sabedoras da gravidade dos problemas ambientais, ou da dor de semelhantes, escolhem ficar indiferentes, escolhem não lutar, escolhem usar a inteligência para encontrar desculpas para não fazer nada, em vez de arranjar um jeito de fazer alguma coisa?

O nome seria amor? Existem pessoas que amam demais, a ponto de entregarem seu talento, seu tempo e até mesmo sua vida pelo outro em sua acepção mais ampla, a ponto de incluir não só nosso semelhante, mas as plantas, os animais, o planeta inteiro? Existem pessoas incapazes de amar, de serem solidárias com o outro, que vêem apenas a si próprias e aos seus interesses? O Papa disse certa vez que o capitalismo falhou com a humanidade em não acabar com a pobreza, ao se transformar numa ferramenta eficaz de acumular riquezas, mas não de distribuir estas riquezas. Neste sentido, creio que cabe também dizer que as religiões falharam ao não conseguirem que as pessoas priorizassem em suas escolhas a solidariedade em vez da competitividade, do individualismo, da ganância; o cultivo do ser, da espiritualidade, em vez do ter, do materialismo, raízes do estilo de vida humana sobre o Planeta e que está levando ao rápido esgotamento dos ecossistemas, à degradação e à poluição.

Normalmente, diante da grandeza e da enormidade dos problemas ambientais, as pessoas costumam imaginar que a saída está no progresso da ciência e da tecnologia, como se a ciência fosse neutra e não fosse a responsável, por exemplo, pelas bombas atômicas ou pela tecnologia suja que queima combustíveis fósseis. Alguns preferem acreditar no senso de sobrevivência da humanidade e na tomada de consciência da opinião pública, mas esquecem que a maioria também erra, como no caso da crucificação de Jesus Cristo, ou na eleição de Hitler. Outros preferem apostar no surgimento de novos políticos, mais conscientes e comprometidos com os interesses do povo e não dos seus próprios. O que há de comum em pessoas que pensam assim é que o mundo melhor que imaginam, começa no outro, depende do cientista, do instinto de sobrevivência ou dos políticos. Esquecem que o mundo melhor que queremos depende de todos, claro, mas começa em nós, principalmente.

De nada adianta uma nova ciência ambiental e novas tecnologias limpas se continuarmos usando o Planeta e o próximo como se fossem descartáveis. A reciclagem das latinhas de alumínio no Brasil, por exemplo, não serviu para diminuir a produção de alumínio e assim poupar o Planeta. Ao contrário, serviu para que a indústria do alumínio pudesse lucrar mais vendendo a produção excedente para outros países que preferem não destruir e poluir o solo com a exploração da bauxita, nem arcar com a construção de novas fontes geradoras de energia para produzir alumínio.

Creio que é no espírito humano que vamos encontrar as verdadeiras causas – e as soluções – para nossos problemas, pois a destruição e poluição ambiental são efeitos de um estilo de vida egoísta, ganancioso, indiferente com a dor e o sofrimento alheios.

Conheci o Francelmo durante eventos nacionais de meio ambiente e a imagem que tinha dele é a de uma pessoa apaixonada pela natureza. Quando recebi sua carta e soube de sua imolação, tive um choque! Dizia ele, numa das 17 cartas, que enviou estrategicamente, na esperança que o seu gesto, de doação da própria vida, fosse capaz de salvar o pantanal!

“Meus queridos pares, pioneiros no Brasil na questão do meio ambiente, hoje somos passados para trás por interesses de maus políticos, maus empresários e PhD’s de aluguel. Em termos de Brasil, estamos vendo o barco afundar e ninguém diz nada.

São transgênicos entrando de contrabando pelo Sul, e o governo apoiando. São queimadas da Amazônia, e o governo impassível. Gente com terra do tamanho de um Estado, e a gente sem terra. É transposição do rio São Francisco, no lugar de revitalização.

No Pantanal, querem fazer do rio Paraguai um canal de navegação com portos para grandes embarcações e grandes comboios. É pólo siderúrgico, é pólo gás-químico. Agora, querem fazer usinas de álcool na Bacia do Alto Paraguai. Um terço dos deputados estaduais são a favor. Um terço contra. E um terço sem saber o que é. Já que não temos votos para salvar o Pantanal, vamos dar a vida para salvá-lo”.

Em sua última e derradeira carta, Francelmo denuncia a indiferença em nossa sociedade, onde “ninguém diz nada” diante do desastre ambiental que já compromete as presentes e futuras gerações, a indiferença diante da traição dos “políticos, maus empresários e PhD’s de aluguel”. Observem que Francelmo não tenta chamar atenção para si, ou diz que não tem jeito, que não há mais tempo de salvar a natureza e que por isso mesmo ele prefere retirar-se da vida. É o contrário, o gesto do Francelmo é um gesto extremo, de alguém desesperado, sim, um gesto que não recomendo a ninguém, mas é um gesto de amor e de esperança! Amor ao planeta, ao pantanal, ao meio ambiente, à natureza, e esperança de que a guerra da espécie humana contra a natureza, em última análise, contra sua própria sobrevivência, pode e deve ter um fim, que é possível dar um basta à indiferença que permite e destrói toda a Terra, que ainda seria possível livrar o pantanal das usinas de álcool que o ameaçavam, que esta guerra ainda poderia ser ganha, apesar de estarmos perdendo algumas batalhas para a cobiça, o egoísmo, a visão estreita de alguns e a indiferença da maioria.

Na natureza, é comum formigas-soldado sacrificarem-se pelo formigueiro e nem por isso são extintas, por que as demais formigas cuidam para que seus genes se perpetuem e continuem sempre existindo formigas-soldado que irão dar a própria vida para proteger a vida de todos. Francelmo não se sacrificou para que seu gesto caísse no vazio da indiferença ou por que cansou de ver a natureza agredida, mas por que tinha esperanças e confiava na capacidade da sociedade em acordar a tempo, e sabia que seu gesto poderia ajudar – como ajudou – aos seus colegas jornalistas, ambientalistas e tantos outros, a avançar na luta ambiental e obter conquistas que antes pareciam impossíveis. Francelmo ficaria feliz de saber que seu gesto não foi inútil, e que pelo menos, uma das questões de denunciava, a pretensão do governador Zeca do PT de implantar usinas de álcool no Pantanal, já não tem mais clima político favorável para ser aprovado.

Então, muito longe de ver a morte do Francelmo como um gesto de covardia, de alguém que tenha desistido de lutar e preferiu se retirar da vida, vi um gesto de extrema coragem! Jesus Cristo, em sua hora derradeira clamou aos céus “Meu Deus, Meu Deus, por que me abandonaste?” (Mt 27,46), e este é um dos mistérios que nos assombram. Entretanto, Francelmo estava tão determinado e consciente do seu gesto, que não reclamou, não se desesperou, não tentou pedir ajuda, não tentou desistir na hora final, deixou-se envolver pelas chamas como os monges budistas fizeram muitas vezes imolando-se em protesto contra a guerra do Vietnã.

“Se soubesse que o mundo se desintegraria amanhã, ainda assim plantaria a minha macieira. O que me assusta não é a violência de poucos, mas a omissão de muitos. Temos aprendido a voar como os pássaros, a nadar como os peixes, mas não aprendemos a sensível arte de viver como irmãos.” – Martin Luther King

Também conheci outros heróis que tombaram nessa guerra pela defesa do meio ambiente. Em abril de 1993, em Vitória (ES) foi morto com quatro tiros o biólogo e ambientalista Paulo Vinhas, que lutava contra empresas que exploravam areia de forma desordenada na região de Barra do Jucu, em Vila Velha (ES), no mesmo dia em que a prefeitura flagrou os irmãos Queiroz retirando areia da área embargada, depois de denúncia do ambientalista. O empresário Aílton Barbosa Queiroz foi condenado a 16 anos de prisão, em Guarapari (ES) pelo crime.

Seu Edu, foi espancado até a morte nas ruas de Itaipuaçu, em Maricá (RJ), em 1993, por que combatia o roubo de areia nas praias da região. As denúncias feitas por Seu Edu acusavam a formação de uma cratera pela extração de areia da Praia de Itaipuaçu. Apontava também diversos loteamentos irregulares em áreas da Mata Atlântica. Até hoje sua morte não foi esclarecida.

Fernando, da ONG Univerde, de São Gonçalo, que fundei em 1982, foi apedrejado até a morte no Terminal Norte de Niterói, em 1998. Ele denunciava invasões de manguezais na Baía de Guanabara.

Álvaro Marques (RJ) – 69 anos, assassinado em plena luz do dia, no centro Angra dos Reis, no dia 23/01/1999. Era presidente da SERENA – Sociedade Ecológica Para a Recuperação da Natureza e na ocasião estava denunciando agressões ao manguezal de Mambucaba.

Dionísio Júlio Ribeiro (RJ) – Assassinado em 22/02/2005 em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, por vingança de um caçador denunciado por ele. Era um defensor da Reserva Biológica do Tinguá.

Antes de serem efetivamente assassinados, estes ambientalistas receberam ameaças, avisos de amigos, perceberam sinais de perigo, mas tiveram a coragem de não se calar! Precisamos refletir sobre o que aconteceu com eles para que outros ambientalistas e jornalistas ameaçados não acabem tendo o mesmo fim.

Acho que todos os que escolhem desafiar o modelo predatório e injusto vigente sofre ameaças. Comigo não foi diferente, pois em algum momento, consciente ou inconscientemente, desagradei e mesmo prejudiquei pessoas e organizações que teimavam – e ainda teimam – em usar o planeta como um armazém de recursos infinitos, por um lado ou uma lixeira infinita por outra. Ao fazer críticas, nos expomos. Neste aspecto, Elbert Hubbard alerta que “para evitar críticas, não faça nada, não diga nada, não seja nada !” Entretanto, precisamos ter consciência dos riscos de nossas escolhas em defender o Planeta.

Ao nos colocar na contramão de um modelo predatório de desenvolvimento, automaticamente nos confrontamos com a ambição e a cobiça de pessoas e organizações que se sentirão prejudicadas em suas intenções de se apropriar dos recursos naturais ou de usar o meio ambiente como uma lixeira para seus restos. Isso significa que algumas dessas pessoas que ‘prejudicamos’ podem estar querendo se vingar. Ao escolhermos ser o que somos e agir como agimos, sabemos que iremos colher ônus e bônus por estas escolhas. William Shakespeare dizia que “um dia a gente aprende que as circunstâncias e os ambientes têm influência sobre nós, e nós somos responsáveis por nós mesmos.”

Aprendi que, ao receber uma ameaça, qualquer uma, não devemos tratar com indiferença, como se fosse algo banal, fofoca, intriga de vizinhos, etc. Quando aconteceu comigo, fui até a delegacia de polícia e registrei a ocorrência e pedi segurança para minha vida e de seus familiares. Entretanto, não espere que as autoridades efetivamente dêem proteção. A falta de estrutura e de pessoal é enorme e o risco de não poderem atender adequadamente é grande, permitindo que os ameaçados se transformem em alvos fáceis.

Muitas vezes ao defendermos o meio ambiente ameaçado entramos sem querer, ou sem saber, em linha de confronto com criminosos, organizados ou não. Uma das técnicas que eles usam a fim de dar segurança às suas atividades é promover a ocupação de áreas ‘vazias’ em volta da comunidade onde tem suas bases a fim de fazer um cinturão de segurança, colocando para morar nessas novas casas pessoas de confiança que comunicarão qualquer movimento estranho nas redondezas. Só que não existem ‘áreas vazias’, mas estão ocupadas com florestas, manguezais, etc. Ao denunciar possíveis crimes ambientais nas redondezas, os ambientalistas podem se tornar alvo fácil, pois atraem – e exigem – a atuação das autoridades, e aí, sem querer ou sem saber, viram alvo do crime organizado. Se o recado partir de algum traficante ou grupo ligado ao crime organizado, não tenha dúvida, no mesmo dia reúna a família, arrume as malas e se mude para a casa de um parente ou hotel e não deixe que saibam sua direção. Depois, de longe, cuide para fazer a mudança para uma nova residência e entregue na mão de um corretor do lugar a venda da propriedade, se for própria. Pois é possível reconstruir tudo de novo em outro lugar, mas vida só se tem uma, e é breve e frágil.
As ameaças podem não ter grande importância e ser uma brincadeira de mau gosto de algum vizinho contrariado ou mesmo um ato motivado por inveja. O invejoso não é aquele que quer ter o que você tem ou ser o que você é, pois geralmente não tem essa condição, mas é aquela pessoa que não quer que você tenha o que tem ou seja o que é. Também existe uma diferença entre tensão e controvérsia. A tensão não mostra a cara, é uma situação que pode persistir por anos, onde um vizinho ou grupo de vizinhos não gosta de outro vizinho ou de outro grupo de vizinhos. As pessoas têm o direito de não gostarem uma das outras, mas têm o dever de respeitarem-se. Martin Luher King, que morreu assassinado, já alertava que “aprendemos a voar como pássaros, e a nadar como peixes, mas não aprendemos a conviver como irmãos.” E Einstein, dizia que só conhecia duas coisas infinitas. O universo e a estupidez humana. E mesmo assim, declarava ter dúvidas se o universo era infinito.

Já uma controvérsia é clara, alguém quer uma coisa e você quer outra diferente, existe um conflito explícito, o que pode ser um caminho para uma negociação e um acordo. Como somos seres sociais e vivemos em comunidades, é natural que existam tensões e controvérsias e isso dará origem a diferentes políticas de vizinhanças onde cabe espaço para abaixo-assinados, debates, assembléias, etc., tudo natural num regime democrático e cabe a cada um, na medida de suas capacidades e escolhas saber o que é melhor para si. O que não se pode admitir é o uso de ameaças de morte e de agressões como estratégia política, por que aí deixa de ser um caso de política, e vira caso de polícia.

Ao ser ameaçado, procure dar transparência ao que está acontecendo, pois aumentam as chances dos seus ameaçadores terem medo de serem descobertos. Procure a imprensa e não deixe também de pedir ajuda aos amigos, primeiro por que não estando no foco das ameaças, podem ver com mais tranqüilidade detalhes que você pode não estar percebendo, segundo, por que ajudam a dar transparência ao que está acontecendo e, sobretudo, nossos amigos e amigas constituem uma rede de proteção espiritual e psicológica da qual fazemos parte, e tão importante quanto se sentir protegido fisicamente é sentir-se amparado por esta rede de afetos. E amigos não são apenas os que conhecemos em nossa vida, mas também todos aqueles que já morreram ou que não conhecemos pessoalmente, mas com os quais mantemos afinidades espirituais.
Com Clarice Lispector aprendi a ser o que quero ser, “porque você possui apenas uma vida e nela só se tem uma chance de fazer aquilo que se quer. Tenha felicidade bastante para fazê-la doce. Dificuldades para fazê-la forte. Tristeza para fazê-la humana. E esperança suficiente para fazê-la feliz. As pessoas mais felizes não têm as melhores coisas. Elas sabem fazer o melhor das oportunidades que aparecem em seus caminhos. A felicidade aparece para aqueles que choram. Para aqueles que se machucam. Para aqueles que buscam e tentam sempre. E para aqueles que reconhecem a importância das pessoas que passam por suas vidas. O futuro mais brilhante é baseado num passado intensamente vivido. Você só terá sucesso na vida quando perdoar os erros e as decepções do passado. A vida é curta, mas as emoções que podemos deixar duram uma eternidade. A vida não é de se brincar porque um belo dia se morre.”

Ambientalista recebe ameças



ENTREVISTA POR MARCELO MEDEIROS (RETS – Rede Brasileira do Terceiro Setor)Um dos mais conhecidos ambientalistas brasileiros, o jornalista Vilmar Berna, está sendo ameaçado de morte. No fim de maio, ele começou a ser avisado por amigos e vizinhos da possibilidade de ser “vítima de uma coça” e “acabar no mar”, assim como acontecera algumas semanas antes com outro morador da comunidade de Jurujuba, pequena praia de Niterói, no estado do Rio, onde reside. A região é cercada de áreas preservadas e, segundo o ambientalista, sempre foi foco de tensão.

Embora não consiga identificar possíveis interessados em sua morte, nem motivos para as ameaças, Berna prefere não ficar calado. “Não quero que aconteça comigo o que aconteceu com o Dionísio e o Chico Mendes, que não acreditaram nas ameaças e morreram”, diz. Ele se refere a dois outros defensores do meio ambiente que acabaram assassinados. Dionísio Ribeiro foi morto no início do ano passado, depois de uma vida de luta pela preservação da reserva ecológica do Tinguá, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. E Chico Mendes ficou conhecido por seu trabalho em prol da floresta amazônica e dos seringueiros do Acre. Foi assassinado em 1988, depois de receber várias ameaças. Mendes, assim como Berna, recebeu o prêmio Global 500, concedido pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente.

Para Berna, é difícil apontar suspeitos, pois já teve discussões com muita gente e também prejudicou diversas iniciativas que causariam danos ambientais. “Não posso entrar em teorias conspiratórias, mas já provoquei muito prejuízo. E como vingança é um prato que se come frio, é bom me prevenir”, lamenta. Ele já instalou equipamentos de segurança em sua casa, que fica de frente para a enseada de Jurujuba, área habitada por pescadores, que também já tiveram problemas com o ambientalista por não respeitarem lei ambientais. A polícia foi acionada, assim como a promotoria, e Berna aguarda as investigações. Mas diz que não vai parar de trabalhar, mesmo que as ameaças continuem. “Posso ficar quieto ou fazer algo. Prefiro a segunda opção”, garante.

Rets – Como e quando começaram as ameaças?
Vilmar Berna – No fim de maio. Um vizinho meu, o Maurício, me disse que tinha ouvido dizer que iam me dar uma coça [surra]. Dois ou três dias depois, um amigo chamado Wagner, que trabalha no Conselho Regional de Engenharia (Crea), me avisou a mesma coisa. Quando o Maurício me contou, pensei que fosse intriga de vizinho, pois já tive problemas com ele por causa da construção de um píer em frente à minha casa. Mas o Wagner falou que iam “me dar uma coça e jogar meu corpo no mar”, a mesma coisa que aconteceu no passado com uma pessoa não identificada. Um corpo apareceu queimado na praia, ficou por lá durante a tarde e, quando a polícia chegou, já o tinham levado para o mar. Pouco tempo depois dos avisos, recebi um telefonema, com voz de mulher, dizendo que eu poderia morrer a qualquer momento. Fui então à polícia, mas ela “sentou no inquérito”. Comecei a fazer barulho, os colegas jornalistas fizeram matérias e aí me chamaram na delegacia. O inquérito foi refeito e ontem [5 de julho] foi protocolado no Tribunal de Justiça. Agora quem cuida do caso são promotores, que devem convocar o Maurício e o Wagner para depor. Mas até agora não sei quem me ameaçou.

Rets – E quais poderiam ser os motivos?
Vilmar Berna – Os mais variados. A região de Jurujuba possui muitos conflitos de terra, e a União não se manifesta, apesar de serem áreas da Marinha. Minha casa é totalmente legal, por isso sou responsável por ela e pela área que ocupa, inclusive sua frente. Não posso, por lei, construir um píer, mas o vizinho quer ocupar essa área e eu não deixo, pois é minha responsabilidade. Por isso já discuti com ele, mas não foi nada demais. Os vizinhos também tentam ocupar o costão da praia e eu não deixo, reclamo.

Rets – Os vizinhos têm histórico de agressividade com você?
Vilmar Berna – Não. O Maurício, por exemplo, não é agressivo, é mais de jogar os moradores uns contra os outros para conseguir o que quer. O que tivemos foi apenas um entrevero.

Rets – Como é a região onde você vive?
Vilmar Berna – É uma comunidade pobre, onde a maioria da população é formada por pescadores. O problema é que eles usam malha fina, o que é proibido, pescam em época de defeso [período em que a atividade é proibida], o que também não é permitido. Também deixam restos de mariscos, que começam a aterrar a Baía de Guanabara. Eu sempre reclamo disso, daí acredito que eles prefeririam que eu não morasse ali. Mas não acho isso suficiente para ameaçar de morte. Afinal, uma coisa é política e outra, polícia. Podemos discutir, o que é político, mas não ameaçar, o que já se torna caso de polícia. Não sei dizer um motivo para estar sendo vítima, pois não sei quem faz a ameaça. Não posso entrar em teorias conspiratórias, mas já provoquei muito prejuízo. E como vingança é um prato que se come frio, é bom me prevenir. Afinal, são anos trabalhando pela preservação da natureza, por isso já provoquei prejuízo para muita gente. Mas não tenho como ficar revirando meu passado para saber quem poderia estar me ameaçando.

Rets – Que medidas você está tomando para se precaver?
Vilmar Berna – Não é minha função descobrir quem está fazendo isso, mas sim da polícia e da Justiça. Só não quero que aconteça comigo o que aconteceu com o Dionísio e o Chico Mendes, que não acreditaram nas ameaças e morreram. Eles não deram atenção ao que todos falavam. Nessa situação, temos duas opções: não levar a sério ou se acovardar. Proteção mesmo é falar o que está acontecendo, para gerar investigações. Se alguém ouviu falar, tem de dizer de quem. E assim por diante, até encontrarmos os culpados. Não tenho o poder de investigação da polícia. Essa história ainda tem muito pano pra manga.

Rets – Alguma medida de segurança foi tomada?
Vilmar Berna – Procuro me expor menos e viajar mais, não ser um alvo fácil. Durante umas semanas, contratei seguranças particulares, mas já os dispensei. Acabo de colocar um identificador de chamadas no meu telefone, além de ter instalado um sistema de segurança que grava tudo o que acontece ao redor da casa no computador. Podem até me matar, mas vão saber quem foi.

Rets – Você criticou o comportamento da polícia no caso. Esse tipo de procedimento é normal?
Vilmar Berna – Não tenho como dizer, pois não faço parte desse mundo, mas comigo foi o que aconteceu. Ninguém fez nada até o caso começar a sair nos jornais. Ou, pelo menos, não me procuraram. Dar publicidade ao caso ajuda, pois a sociedade começa a cobrar medidas para te proteger. Já tenho apoio de pessoas no exterior e em todo o Brasil.

Rets – Qual é a atual situação da área de Jurujuba?
Vilmar Berna- Temos problemas em mar e terra. Em solo, são ligados à especulação imobiliária. Temos muito desmatamento, mas nada feito em grande escala. É um trabalho de “formiguinha”, que só se percebe com imagens aéreas. São pequenos desmatamentos para construir casas de famílias de baixa renda. O outro lado da moeda é a invasão por quem tem dinheiro e não cuida de suas áreas como manda a lei, deixando de preservar um percentual mínimo de vegetação nativa. É um processo que as autoridades têm dificuldade de conter. É algo que acontece em outras áreas também. Temos duas opções em relação a isso: ficar quietos ou fazer algo. É a diferença entre esperar e ter esperança. Ter esperança é ser proativo e agir pela mudança.

Fonte: http://arruda.rits.org.br/notitia1/servlet/newstorm.notitia.apresentacao.ServletDeSecao?codigoDaSecao=10&dataDoJornal=1152284667000

Prêmio Global 500 da ONU





“Procure ser uma pessoa de valor, em vez de procurar ser uma pessoa de sucesso. O sucesso é conseqüência.” – Albert Einstein

Em 1999 tive a honra de ser indicado pelo então Deputado Federal Fábio Feldmann para receber, no Japão, o Prêmio Global 500 das Organizações das Nações Unidas, concedido às pessoas que mais se destacaram na defesa ambiental do Planeta. Fui o único ambientalista representante do Brasil e América do Sul naquele ano. O Brasil possui 16 laureados, segundo o site www.global500.org sendo Chico Mendes o primeiro brasileiro a receber o prêmio, em 1987. Em 1990, oito brasileiros foram premiados, Raulino Reitz, Paulinho Paiakan, Roberto M. Klein, Ivan Fonseca, Mary Zanoni Allegretti, Carlos Minc, Margaret Mee e Gert Roland Fischer. Em 1991, foram três ganhadores, Philip Martin Fearnside, Herbert Jose de Souza (Betinho) e Davi Kopenawa Yanomami. Em 1992, foram dois, Anesia do Amaral Schmidt e Oliver Henry Knowles. Em 1995, Anna and Livio Michelini, em 1996, Sonia Regina de Brito Pereira, e por último eu, em 1999.

Na ocasião recebi instruções muito claras de minha tradutora de que o protocolo proibia que os laureados dirigissem a palavra, tocassem ou fotografassem o Imperador do Japão, com quem teríamos audiência. A própria tradutora não era autorizada a traduzir as palavras do Imperador, honra limitada apenas aos tradutores da Casa Imperial.

No Brasil, na ocasião, estávamos apoiando a campanha das ONGs pela criação do Santuário do Atlântico Sul, para a preservação das baleias, e o Japão, não só vinha atuando contra a criação do santuário, como ainda fazia pressão na Comissão Internacional de Baleias para aumentar sua cota de caça de 440 para 600 baleias ao ano. Assim, assumi o risco de quebrar o protocolo, mesmo sabendo que teria de falar em português. Então escrevi uma carta ao Imperador para entregar em suas mãos na minha primeira oportunidade, pedindo que se associasse ao esforço dos ambientalistas pelo fim da caça à baleia. Não tinha idéia de que esse meu gesto de rebeldia fosse provocar tanto constrangimento. A embaixada do Japão queixou-se formalmente à ONU, que se queixou ao Feldmann, que me defendeu argumentando que eu era um ambientalista e não poderia esperar atitude diferente. Tive de enviar carta à Marilyn Mosley, então presidente Global 500 Forum, para explicar minha posição, mas reforcei novamente o que já tinha solicitado ao Imperador, o que deve ter desagradado ainda mais a Embaixada do Japão. Cheguei a achar que iriam ‘caçar’ o meu prêmio.

Coincidência ou não, o fato é que o Japão recuou de sua pretensão de ampliar em mais 140 baleias sua cota de caça. E para mim isso foi o melhor prêmio. Prefiro pensar que aqueles jatos de água que elas lançam para o ar ao respirarem são de alívio. Claro que a luta continua, pois 440 baleias continuam perdendo a vida todos os anos, mas penso que cada um de nós, sempre que tiver oportunidade, fará certamente a sua parte.

Minha idéia de um prêmio importante como o Global 500, nunca foi para pendurar na parede. Penso que o principal mérito desta láurea está em exatamente poder ampliar minha voz em defesa do meio ambiente e minha capacidade de ação para a formação de uma cidadania ambiental planetária.

Carta em Defesa das Baleias
Tóquio, 03/06/99
Ao Imperador do Japão
Majestade Imperial,

Rogo a V. Majestade pelo fim da caça às baleias no mundo. No Brasil, temos acompanhado de maneira apreensiva, as ações do governo Japonês para prorrogar prazos e obter autorizações que permitam sacrificar estes animais.

Como ambientalista e Prêmio Global 500, e tendo a oportunidade de estar em Vossa Presença, não poderia deixar de implorar pela vida de nossas baleias e, tenho certeza, levando em conta Vossa Sensibilidade com o meio ambiente, que temos grandes e boas chances de sermos ouvidos. Peço perdão se fui irreverente e ousado, mas cada baleia que tenha sua vida poupada, já terá valido o esforço e constrangimento.

Saudações Fraternas e ecológicas do
Vilmar

“Agradeço ao Vilmar pela força no tocante às baleias; certamente sua intervenção junto ao Imperador do Japão será mais um importante ponto de apoio para as pressões que estamos tentando aplicar nos japoneses & cia.” – José Truda Palazzo, Jr., fundador do Projeto Baleia Franca – IWC/BRASIL

“Fiquei feliz pelo Vilmar ter sido outorgado com o Global 500. Vejo agora suas iniciativas em Tóquio: de novo parabéns, principalmente pelas baleias! O governo brasileiro deveria também premiar o Vilmar pelo tanto que ele facilitou o trabalho deles!” – DENISE MARÇAL RAMBALDI – Presidente da Associação Mico-Leão-Dourado

Ao voltar ao Brasil, tive a honra de também receber uma Moção de cumprimento e parabéns aprovada em regime de urgência pelo Plenário do Conselho Nacional do Meio Ambiente, durante a 53ª reunião ordinária, em 30 de junho de 1999, por proposta do ambientalista Paulo Finnoti, representante das ONGs da Região Sudeste, pelos seguintes considerandos: importância da mídia, particularmente a escrita e periódica no que se refere ao processo de informação das atividades de conservação e preservação do meio ambiente; conseqüências benéficas da informação técnica, e porque não dizer científica, necessariamente transformada em leitura inteligível aos leigos, tão necessária à divulgação das “coisas do meio ambiente”; que o “JORNAL DO MEIO AMBIENTE” e seu editor o Senhor VILMAR BERNA estão exercendo a contento tais prerrogativas de informação, o que os coloca, o primeiro como um periódico de grande importância na divulgação de notícias ambientais e o segundo, como ambientalista e divulgador sério das atividades ambientais ocorridas no país, particularmente na Região Sudeste; prêmio Global 500 da ONU para o Meio Ambiente recebido pelo jornalista Vilmar Berna por suas atividades jornalísticas em defesa do meio ambiente.

Também fui homenageado com uma moção de congratulações e aplausos pela ALERJ – Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, aprovada na Sessão de 29 de junho de 1999, por proposição do Deputado Estadual Alessandro Calazans, publicada no Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro, em 6 de julho de 1999.

Recebi ainda do Núcleo Gonçalense de Memória, Pesquisas e Promoções Culturais – MEMOR – 1999 uma moção de congratulações, aprovada por unanimidade na reunião de 15 de junho de 1999, e assinada pelo Presidente Prof. Helter Jerônymo Luiz Barcellos, pelos seguintes considerandos: conjunto do trabalho de VILMAR BERNA no campo da preservação do meio ambiente gonçalense; extensão de sua obra científica, integrada por obras de real importância para a proteção da natureza; diversos lauréis recebidos, ressaltando-se o Prêmio Global 500.

Em 2002, recebi o título de Cidadão de Niterói, pela “digna e valiosa participação nas causas que contribuem para o continuado engrandecimento e progresso da Cidade de Niterói”, por iniciativa do vereador Fernando de Oliveira Rodrigues (Decreto Legislativo nº 353, publicado em 11/04/2002) e indicação do amigo Paulo Lemos.

Em 2003, recebi o Prêmio Verde das Américas, na categoria Jornalismo, “pelo seu trabalho comprometido com as questões socioambientais, carregando a responsabilidade de defender, preservar e proteger a natureza, em prol do equilíbrio ambiental do Planeta”, concedida pela ONG PALÍBER, coordenada pelo Ademar Soares Leal e entregue pelo Deputado Federal no cargo de Secretário Municipal de Meio Ambiente da Cidade do Rio de Janeiro, Airton Xerez.

Em 2005, recebi ainda o Título de Empreendedor Comprometido com a Causa do Desenvolvimento Sustentável no Brasil durante a II Conferência Nacional do Meio Ambiente, pelas mãos do então Ministro Gilney Viana, concedido pela Fundação ALPHA e pela Revista Ecoturismo, editada por Hercules Góes.

Vilmar é um dos grandes ambientalistas que conhecemos. Seu trabalho tem contribuído muito para as nossas conquistas.” – DENNER GIOVANINI, fundou a Renctas – Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres, em 1999 e desde então se dedica de corpo e alma ao combate do tráfico de animais silvestres. Em 2004, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) escolheu Dener para receber o Prêmio Unep-Sasakawa 2003, considerado um dos mais importantes prêmios ambientais do mundo.

“Desde o início de nossa luta pelos ecossistemas da Reserva Ecológica de Jacarepiá, em Saquarema, vimos contando com o valioso apoio do Vilmar. Daí aprendemos a admirá-lo quanto a sua competência e iniciativas para com a proteção do meio ambiente em todo nosso Brasil. Também confesso que não havia encontrado até então alguém com visão capaz de igualmente compreender os fenômenos extraordinários (mas ocultos) em relação a fauna e a flora. Já não me sinto tão sozinho!” – ERNANI ANDRADE – presidente da ONG ADEJA – Associação de Defesa Ambiental de Jacarepiá

“Gente como o Vilmar faz a diferença quando se precisa de exemplos de que estamos no caminho certo. O reconhecimento merecido pelo seu esforço vai ser sempre uma bandeira a mais a levantar na hora de contagiar outros brasileiros.” – AROLDO PARAGUASSÚ – SDS da Tribo

“Fiquei muito contente com a notícia de que o Vilmar havia ganho o Prêmio Global 500 da ONU. Esse prêmio só é dado a pessoas realmente engajadas na questão ambiental e que a levam com seriedade e coerência. Vilmar se junta agora a outras importantes personalidades que receberam este prêmio, como Fabio Feldmann e Davi Copenawa.” – Hilário Baptista ([email protected]) – Ouvidoria Ambiental – Secretaria de Estado do Meio Ambiente – São Paulo

“Todos, que militam na área, conhecem Vilmar por sua competência em dirigir as causas que abraça em defesa dos nossos ecossistemas. Particularmente, tenho um algo mais a falar. Por ser Presidente de uma ONG direcionada somente a causa da fauna, sempre tive em Vilmar um aliado e um cúmplice no combate aos crimes contra nossos animais. Vilmar nunca se importou se a causa era da ararinha azul, de um cachorro, de cavalos, de tartaruga marinha ou outro animal qualquer, como manda a nossa Lei de Crimes Ambientais. O seu exemplo deverá servir para certos ambientalistas das áreas governamentais que, com possibilidade de modificar tantas situações, se omitem e só querem saber dos “animais silvestres” como se, somente eles, fizessem parte da fauna. Este motivo me emociona muito e é, com um prazer enorme, que faço coro dos aplausos ao seu trabalho.” – SHEILA MOURA – Presidente da Sociedade Educacional “Fala Bicho”

“Nessa nossa sociedade que tão pouca importância dá à questão ambiental, questão essa que é decisiva para o nosso futuro, é com grande satisfação e destaque que vemos a atuação de pessoas como o Vilmar, que se dedica a uma causa tão nobre.” – Prof. GUSTAVO SOUTO MAIOR – coordenador do Núcleo de Estudos Ambientais (NEA) da Universidade de Brasília (UnB). Engenheiro e mestre em Gestão Econômica do Meio Ambiente pela UnB, participa do Conselho de Gestão da Reserva da Biosfera do Cerrado e do Conselho Consultivo do Parque Nacional de Brasília. Atualmente, preside a Associação Amigos do Parque Nacional de Brasília e entre os trabalhos publicados, destacam-se os que tratam das relações entre a economia e a conservação da natureza.

“É tão bom ver quem trabalha por uma causa nobre, com o Vilmar, ser reconhecido. As notícias que mais ouvimos são sempre aterrorizantes, a tal ponto que nos trazem a sensação de impotência e medo. Talvez seja este o maior desafio – despertar em cada um o poder transformador que temos para construir um mundo melhor. Notícias boas como o prêmio recebido pelo Vilmar nos enchem de esperanças e a certeza de que vale a pena lutarmos pelo nosso planetinha azul.” – SUZANA & CLÁUDIO PADUA e a turma do IPÊ

“Parabenizo o Vilmar desde Buenos Aires. Nuestras mas sinceras felicitaciones por el buen trabajo que estas desepeñando por el cuidado de nuestro medio ambiente.” – LILIANA HISAS – Fundacion Ecologica Universal – FEU Buenos Aires (1041) – Argentina

Escolhendo a democratização da informação socioambiental

“Se quisermos ter menos lixo, precisamos rever nosso paradigma de felicidade humana. Ter menos lixo significa ter mais qualidade, menos quantidade; mais cultura, menos símbolos de status; mais esporte, menos material esportivo; mais tempo para as crianças, menos dinheiro trocado; mais animação, menos tecnologia de diversão; mais carinho, menos presente!” – Gilnreiner

“Só existe opção quando se tem informação… Ninguém pode dizer que é livre para tomar o sorvete que quiser se conhecer apenas o sabor limão.” – Gilberto Diemnstein

A democratização da informação ambiental é fundamental para o exercício pleno da cidadania crítica e participava, pois quando as pessoas, o povo, ou as organizações não dispõem de informação de qualidade, fica comprometida a capacidade de fazer escolhas entre as diferentes alternativas e caminhos. Quando falo de informação ambiental de qualidade falo de uma informação que mostre os fatos geradores da crise ambiental, para que as pessoas tomem consciência e possam atuar sobre as causas e não apenas sobre os efeitos. Um tipo de informação que mostre as raízes de nossos problemas ambientais e não apenas que reforcem uma visão romântica do quanto a natureza é linda ou é vítima de nossa ganância.

Na raiz de nossos problemas ambientais existe um modelo econômico de apropriação dos recursos naturais para gerar concentração de renda e riquezas e que tem produzido, por todo lado, miséria e pobreza e, por outro, degradação ambiental e esgotamento dos recursos naturais. Ao divulgar os problemas ambientais, a mídia naturalmente ameaça privilégios e interesses poderosos.

A existência de uma mídia ambiental alternativa e independente é fundamental numa democracia para assegurar que nenhum grande grupo econômico ou político possa deter o controle dessa informação ambiental de qualidade.

O grande desafio é pretender – e conseguir – que os poderosos que se sentem incomodados e ameaçados pela mídia ambiental independente também financiem esta mesma mídia com seus anúncios. Não é de se estranhar a ausência dos veículos especializados em meio ambiente nos planos de mídia das grandes empresas poluidoras, com raras exceções. Estas exceções ficam por conta de dois fatores. Empresas líderes que aprenderam a conviver com a Democracia e aceitam as críticas como parte da regra do jogo e mesmo como um fator positivo que as leva ao aperfeiçoamento do sistema de gestão ambiental. E empresas que reconhecem o crescente grau de consciência ambiental da sociedade e sabem que precisam agregar valor ambiental às suas imagens corporativas e aos seus produtos, sob pena de perderem mercado ou terem cada vez mais dificuldade para aprovar novos licenciamentos ambientais ou renovar os existentes.

A conscientização do brasileiro em relação ao Meio Ambiente aumentou 30% nos últimos 15 anos. (MMA/Iser 2005), o que nos dá motivos para ter esperanças. Não há dúvidas que nosso atual estilo de vida ainda irá perdurar por gerações e irá provocar muitos danos e poluição ambiental, mas é inegável que cresce ano a ano a consciência ambiental em todos os países, especialmente no Brasil, país de maior mega-diversidade do Planeta. Esta nova consciência tem motivado a organização da sociedade nas chamadas ONGs, organizações não-governamentais, dedicadas às lutas ambientais, nova legislação ambiental cada vez mais rigorosa, novos veículos especializados em meio ambiente e espaço para a pauta ambiental nos veículos da chamada Grande Mídia, uma quantidade enorme de novos cursos, seminários e bibliografia sobre meio ambiente, políticos e administradores públicos e privados mais envolvidos com a causa ambiental e preocupados em dar retorno ao seu eleitorado, etc. Sem dúvida, a cada ano um maior número de pessoas toma consciência da gravidade da questão ambiental e da urgência de fazermos alguma coisa para inverter o rumo suicida de nossa espécie no Planeta.

Ao nos propormos a contribuir com a democratização da informação ambiental para que a sociedade desperte, precisamos tomar cuidado para não sermos agentes do seu adormecimento. Uma informação ambiental superficial pode gerar ainda mais dúvidas e confundir o público em vez de ajudar na direção de um modelo de desenvolvimento ambientalmente sustentável e socialmente mais justo. Por exemplo, o termo desenvolvimento sustentável virou palavra de ordem e senso comum entre empresários, ambientalistas, governantes, mas é preciso estar alerta sobre possíveis desvios de interpretação. Na sua origem, o termo propunha designar um tipo de modelo de desenvolvimento que assegurasse o atendimento das necessidades e a qualidade de vida das presentes gerações sem comprometer esta mesma qualidade de vida para as gerações futuras. Entretanto, temos visto o termo desenvolvimento sustentável sido empregado muito mais como sustentabilidade econômica, e não ambiental ou social. O argumento é que, para haver desenvolvimento sustentável, preservação ambiental, investimentos em projetos de responsabilidade sócio-ambiental é preciso primeiro, e sobretudo, haver lucros. Na verdade, são novas palavras para a velha idéia de que é preciso deixar o bolo crescer antes de pensar em dividi-lo. Esta receita de bolo tem sido extremamente útil para gerar acúmulo de riquezas, mas não para distribuir riquezas. Não é à toa que o Brasil encabeça a lista das nações do mundo com pior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) e com uma das maiores concentrações de renda do Planeta. Uma breve comparação entre o que as empresas lucram tirando recursos do Planeta e o que devolvem em projetos sócio-ambientais mostram que enquanto o bolo cresce enormemente por um lado, enquanto o meio ambiente e a sociedade têm de se contentarem com as migalhas desse crescimento. A velha tática continua de capitalizar lucros e socializar prejuízos, repassando à sociedade os custos de conviver com ambientes poluídos e degradados, com embalagens e produtos colocados no mercado por uma indústria que faz corpo mole para se responsabilizar pelo seu retorno, por que tem lucros deixando que as prefeituras e a sociedade paguem para se livrar dessas embalagens e produtos depois que são descartados.

Outra ilusão é achar que a ciência e a tecnologia limpa serão capazes de dar conta da crise ambiental, ou que a simples existência de informação ambiental e educação ambiental serão capazes de nos conduzir para fora da crise. Não vão por que por detrás da crise não está ausência de ciência, de tecnologia, de informação ou educação ambiental, mas sim uma estrutura de apropriação de recursos e de acumulação de riquezas que irá perdurar independente se a tecnologia é suja ou limpa, se existe ou não democratização da informação ambiental ou educação ambiental. Entretanto, se a ciência e a tecnologia, a informação e a educação ambiental, por si só, não são capazes de solucionar os problemas provocados pela crise ambiental, sem elas é que a sociedade não terá a menor chance de sair dessa crise.

É aqui que cresce e assume importância estratégica a existência do jornalismo ambiental e de uma mídia ambiental alternativa, independente, que seja capaz de olhar a floresta além das árvores. Ao informar o público e alertar as pessoas sobre os perigos ambientais que a cercam, esta imprensa tem desempenhado um papel vital, permitindo às pessoas recorrerem à ação para protegerem o meio ambiente. E diante do agravamento do superaquecimento do planeta e suas conseqüências o interesse do público pelo meio ambiente irá crescer a cada dia significando maior demanda por informação ambiental de qualidade.

Lideranças da sociedade civil organizada já revelam sua preocupação com a falta de informação ambiental a ponto de incluí-la, ao lado da educação ambiental, entre os três principais problemas ambientais brasileiros. Segundo a pesquisa de opinião com 1.141 dos 1.337 delegados participantes da “II Conferência Nacional de Meio Ambiente”, entre 10 a 13 de fevereiro de 2005, o principal problema ambiental brasileiro é o desmatamento (28%), seguido de recursos hídricos/Água (13%) e falta de informação sobre Meio Ambiente e Educação Ambiental (11%). A pesquisa foi realizada pelo ISER a pedido da Secretaria de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável (SDS).

A preocupação é objetiva, pois se somarmos todas as tiragens dos veículos impressos especializados em meio ambiente, e acrescentarmos os acessos aos sites e portais de meio ambiente, ainda estaremos longe de alcançar uns 10% da população brasileira. Então, sem perder nossa independência crítica, o desafio é conseguir recursos para o financiamento da informação ambiental e assim assegurar a continuidade dos atuais veículos e a ampliação das tiragens, a fim de atender a segmentos cada vez maiores da opinião pública brasileira.

A democratização da informação ambiental é como uma moeda com dois lados. Num está a informação ambiental de qualidade, no outro, o financiamento desta informação. Recebemos diariamente em nossas redações dezenas, centenas de releases de agências de imprensa, de empresas, de governos, do terceiro setor com sugestões de pauta, de fontes, na tentativa de serem incluídos na pauta. A maior parte deste material vai simplesmente para o lixo, por que não temos veículos suficientes para todas as potenciais notícias que mereceriam chegar à Sociedade. Trata-se de um paradoxo. As mesmas empresas e organizações que, por um lado, enchem as redações da mídia especializada com releases, por outro, excluem esses veículos de seus planos de mídia, talvez por que não queiram financiar, no fundo, uma mídia que as incomoda e ameaça na mesma proporção em que resiste e permanece independente e crítica.

Uma alternativa possível para o financiamento da mídia ambiental seriam verbas públicas, no mínimo para bancar os custos de produção editorial e gráfica e de postagem. Não se trata de uma idéia absurda por que a democratização da informação ambiental é – ou deveria ser – do interesse público já que a Lei Federal da Educação Ambiental, em seu artigo 5º, inclui a garantia da democratização das informações ambientais entre os objetivos fundamentais da educação ambiental a (Lei nº 9.795 de 27 de abril de 1999, art. 5º, inciso II). E, depois, o Governo Federal – e por sucessão, Governos Estaduais e Municipais – já financia a informação através das verbas de publicidade destinadas aos veículos da chamada Grande Mídia. Bastaria designar um pequeno percentual entre 5% e 10% dessas verbas já existentes para as mídias ambientais.

Durante a ECO 92, os países que participaram, claro, entre eles o nosso, assinaram o compromisso de criar “esquemas inovadores para subsidiar o acesso a essa informação ou para eliminar os impedimentos não econômicos” “sempre que existam impedimentos econômicos ou de outro tipo que dificultem a oferta de informação e o acesso a ela, particularmente nos países em desenvolvimento” (Agenda 21, capítulo 40). Entretanto, todos os nossos apelos para que o Governo Federal assuma sua responsabilidade para assegurar a democratização da informação ambiental em nosso país não resultaram ainda em nenhuma medida prática, a não ser a criação de um GT (Grupo de Trabalho), no âmbito do Ministério do Meio Ambiente, que não conseguiu sair do papel, até agora.

O FNMA – Fundo Nacional do Meio Ambiente, por exemplo, apesar de assumir o caráter demonstrativo dos projetos que financia, falha enormemente em não assegurar recursos, seja institucionais, seja nos próprios projetos, para divulgação dos resultados alcançados pelos projetos que financia. Deve contar com divulgação espontânea por parte de uma mídia ambiental cada vez mais raquítica e enfraquecida por falta de recursos. Se o FNMA designasse pelo menos 10% dos recursos do Fundo para a divulgação de seus resultados na mídia ambiental isso já asseguraria uma fonte de financiamento segura. Em 2006, encaminhamos ao FNMA um pedido de recursos para o fortalecimento da REBIA – Rede Brasileira de Informação Ambiental, mas o pedido foi negado.

A consciência ambiental da população é um caminho sem retorno que só tenderá a crescer diante de leis que se tornam cada vez mais rigorosas, diante da demanda crescente por capacitação e formação ambiental que tem resultado no aparecimento de cursos de especialização, graduação e pós-graduação em meio ambiente em todo o país, o aumento de títulos sobre temas ambientais nas livrarias e bancas de jornal e revistas, o aumento de programas de televisão e rádio com o tema ambiental, o investimento das empresas e centros de pesquisa no desenvolvimento de novas tecnologias e produtos mais limpos, a quantidade de prêmios ambientais e de encontros, seminários, eventos nacionais e internacionais ligados à questão ambiental, como os Encontros Verde das Américas, coordenados pelo Ademar Soares Leal, dos quais participo deste a primeira edição e que, em 2009, chegou à sua 9ª edição, sempre com os auditórios lotados!

Hoje, ainda são muitas as dúvidas e incertezas sobre os novos caminhos e alternativas na direção de um modelo de desenvolvimento ambientalmente sustentável e socialmente mais justo, principalmente devido à falta de informação ambiental em quantidade e qualidade e à falta de alternativas tecnológicas viáveis economicamente. Trata-se apenas de uma questão de tempo para que estas lacunas sejam preenchidas, pois cresce a cada dia a quantidade de pessoas que buscam informações ambientais e se há mercado, a tendência é haver mais veículos de comunicação seja especializados em meio ambiente, seja com a inclusão dos temas ambientais nas pautas dos veículos tradicionais. Igualmente, é crescente o surgimento de novas tecnologias ambientais como assistimos ano a ano a cada FIMAI (Feira de Meio Ambiente Industrial) organizada pela Revista Meio Ambiente Industrial, sob a coordenação do Júlio Tocalino, e que também ultrapassou sua 10ª versão!

Outro exemplo desse interesse da sociedade é o número de pessoas que tem procurado o Portal do Meio Ambiente em busca de informações ambientais. Em junho do ano passado, no Dia Mundial do Meio Ambiente, tivemos mais de 22.000 acessos num único dia e este número vem crescendo ano a ano! Mensalmente, esta média de acessos tem se mantido em torno de 150.000 pessoas, o que constitui uma tiragem significativa por qualquer ângulo que se examine, especialmente por não ser um veículo de massa, mas especializado. É muito importante ressaltar que estes números além de serem auditados de forma independente, são acessíveis a qualquer pessoa interessada na página ‘estatísticas’.

Entretanto, há limites para a democratização da informação ambiental. Enquanto para a maioria das pessoas notícias sobre impactos e danos ambientais, principalmente diante de grandes acidentes, podem sensibilizar e contribuir para o despertar da consciência ambiental, para outras pode significar a necessidade de aumentar o controle e a posse aos recursos naturais ameaçados a fim de tomar para si tudo o que puder antes que o recurso acabe ou se comprometa de vez.

Assim, não basta apenas democratizar a informação ambiental, é preciso que ela esteja de mãos dadas com a educação ambiental comprometida em formar cidadãos mais críticos e participativos, e também menos egoístas e mais solidários. No fundo, uma questão de espiritualidade e cultura, onde ao nos tornarmos ambientalmente mais responsáveis nos tornamos também pessoas melhores, mais solidárias e éticas e menos egoístas, não só com os nossos semelhantes, mas com todos os seres vivos tripulantes deste planeta como nós.

E a sociedade precisa enfrentar o fato de que a informação socioambiental está muito longe de alcançar e atender ao povo brasileiro. Muito longe disso, apenas uma pequena parte da população brasileira tem acesso adequado à informação socioambiental! Este é um desafio de todos os que acreditam na democracia e na importância da formação da cidadania crítica, participativa e libertadora.

Apesar das enormes dificuldades, existe um pequeno grupo de brasileiros e brasileiras que têm empreendido um esforço quase militante para fazer a diferença e contribuir para o despertar da sociedade para a realidade socioambiental. Merece destaque o trabalho do André Trigueiro (Mundo Sustentável, rádio CBN e Cidades & Soluções, TV Globo), Carlos Tautz (Coluna Verde, Revista Viração); Whashington Novaes; Renè Capriles e Lucia Chayb (Revista Eco 21); Silvestre e Regina Gorgulho (Folha do Meio Ambiente); Júlio Tocalino (Revista Meio Ambiente Industrial); Peter Milko (Revista Horizonte Geográfico); Hiram Firmino (revistas JB Ecológico e Ecológica), Adalberto Marcondes (Envolverde), Rogério Ruschel (Business do Bem); Liana John (Revista Terra da Gente), e de vários outros brasileiros e brasileiras que bravamente vem se dedicando à democratização da informação socioambiental em nosso país.

A chamada mídia de massa também tem incluído cada vez mais o tema ambiental em suas pautas, mas não é – nem se propõe a isso – referência em informação ambiental, o que significa que nem sempre o leitor deste segmento da opinião pública consegue encontrar a informação ambiental quando precisa, ao contrário da mídia ambiental, que procura, dentro de suas limitações, cumprir este papel. Entretanto, os veículos da mídia de massa dispõem de recursos que a mídia ambiental não tem, por exemplo, na cobertura de um grande acidente ecológico, quando o interesse dos veículos não especializados dura o tempo em que o problema ambiental permanece visível. Já a mídia ambiental tende a manter o assunto na pauta mesmo depois de passado o problema, oferecendo à opinião pública uma análise mais aprofundada sobre as conseqüências, responsabilidades, desdobramentos. A informação ambiental de qualidade e em quantidade suficiente é ferramenta indispensável para a formação e mobilização da cidadania ambiental. Por outro lado, informação ambiental deficiente, mentirosa, incompleta, pode levar à desmobilização da cidadania.

“A má informação é mais desesperadora que a não-informação.” – Charles Colton

Quanto ao aspecto ideológico, a diferença entre diferentes mídias pode ser enorme. Os veículos da Grande Mídia são de propriedade de poucas famílias e tendem a reproduzir o pensamento do modelo econômico dominante. Já a mídia ambiental está mais ligada à resistência social, à denúncia, à crítica, à oposição a este modelo dominante. Existem exceções em ambos os lados, mas que apenas confirmam as regras. Entre os veículos da mídia ambiental, por sua vez, existem aqueles que focalizam em sua pauta mais os aspectos da natureza, seja suas agressões ou belezas, outros veículos focalizam mais os aspectos produtivos como gestão ambiental, tecnologias, legislação, licenciamento, e outros ainda os aspectos sociais e políticos. Então, mesmo entre os veículos da mídia ambiental, existe uma complementaridade entre eles.

O desafio da mídia ambiental tem sido o de sobreviver sem recursos diante de uma sociedade que, apesar de precisar de informação ambiental a fim de fazer escolhas melhores entre as diferentes alternativas, não se dispõe, pelo menos ainda, a comprar esta informação, seja nas bancas seja através de assinaturas! Este desafio tem sido enfrentado dia a dia pelas mídias ambientais e cada uma tem buscado seu caminho de sobrevivência, sempre com muita dificuldade, quase como uma missão de cidadania ambiental, uma espécie de apostolado. Existem organizações da sociedade civil, geralmente comprometidas com mudanças, que editam mídias ambientais de distribuição gratuita, mas são veículos que, apesar de importantes para democratizar informações institucionais, estão comprometidos em divulgar notícias e informações de interesse das causas que defendem, constituindo-se em veículos limitados para o grande público que não pertence a tais organizações. Resta uma pequena quantidade revistas, jornais, rádios, TVs e sites dedicados de forma plural à democratização da informação ambiental, entretanto, somadas as tiragens, não chegam a atender 10% da sociedade brasileira. É preciso admitir que apesar de sua importância, a mídia ambiental brasileira ainda é uma ilustre desconhecida da sociedade em geral. Não é à toa que o pensamento dominante na sociedade ainda considere a poluição e a degradação ambiental como preços a pagar pelo progresso. Apesar de falso, este pensamento tem contribuído para a desmobilização da cidadania e para a perpetuação do atual modelo dominante.

A alternativa de financiamento para a mídia alternativa não-institucional pode estar no acesso às verbas de publicidade dos governos federal, estaduais e municipais para a comunicação ambiental, como já é feito com os veículos da chamada Grande Mídia não-especializada, incluída, através de suas agências de publicidade, em seus planos de mídia. Também pode estar no financiamento através da publicidade de empresas líderes que, apesar de poluidoras, aceitam as críticas como inerentes a qualquer sociedade democrática, e mesmo vêem nas críticas uma possibilidade de se anteciparem a problemas que poderão gerar multas e perdas de produção.

O surgimento da REBIA

“A imprensa livre é o olhar onipotente do povo, a confiança personalizada do povo nele mesmo, o vínculo articulado que une o indivíduo ao Estado e ao mundo, a cultura incorporada que transforma lutas materiais em lutas intelectuais, e idealiza suas formas brutas”. – Karl Marx

Propus aos membros do IBVA – Instituto Brasileiro de Voluntários Ambientais, que havíamos fundado alguns anos antes, transformarmos o nome e os objetivos do IBVA para atuar mais diretamente com a democratização da informação socioambiental no Brasil. Surgiu então a Rede Brasileira de Informação Ambiental (REBIA), uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, tendo em seu conselho gestor e editorial Aristides Arthur Soffiati, David Man Wai Zee, Flávio Lemos de Souza, Ricardo Harduim, Rogério Ruschel, Kheyla Tavares, Paulo Braga, Bernardo Niskier, Rogério Álvaro Serra de Castro, Carlos Alberto Muniz, Fernando Guida, Raul Mazzei, Márcio Ferreira e JC Moreira.

A REBIA nasceu com o propósito de envolver cada vez mais pessoas e instituições com foco na democratização da informação ambiental no Brasil, promovendo sua ação articulada; difundir a “Cultura de Rede” e o fortalecimento dos laços entre os produtores e difusores de informações ambientais no Brasil; contribuir para identificação, análise e divulgação do cenário da informação ambiental no Brasil, na forma de um diagnóstico atualizado ano a ano; propiciar a produção, difusão de conhecimento, práticas e metodologias para a democratização da informação ambiental; estimular intercâmbio de experiências e parcerias para execução de ações com ênfase na continuidade da REBIA; promover a articulação da REBIA com as demais redes ambientais e outras de interesse, ampliando seu leque de parceiros; desenvolver serviços de informação capazes de operar de forma articulada com demais sistemas de Informação Ambiental no Brasil.

Aproveitei para promover uma reengenharia a partir do Jornal do Meio Ambiente que chegou, em junho de 2006, a 113ª edições, com mais de dois milhões de exemplares distribuídos gratuitamente graças ao financiamento das empresas conscientes de sua responsabilidade ambiental. Uma referência de informação socioambiental, em seus 10 anos de existência o Jornal acabou por incubar diversos outros produtos de comunicação que precisavam ganhar vida própria. Assim o Jornal deixou de existir para dar lugar a um novo veículo, a REVISTA DO MEIO AMBIENTE, uma publicação impressa, também distribuída gratuitamente por mala direta e que já estava em sua 27ª edição quando escrevi estas linhas. O então site do Jornal passou a chamar-se PORTAL DO MEIO AMBIENTE ( www.portaldomeioambiente.org.br ), e para o envio do boletim digital NOTÍCIAS DO MEIO AMBIENTE, atualizado e enviado diariamente para um cadastro de leitores com mais de 210.000 assinantes, criei a Agência REBIA de Notícias Socioambientais. O grupo de leitores do Jornal na internet, que estava em torno de 1.300 membros foi substituído por seis FÓRUNS REBIA, subdivididos em REBIA NACIONAL, REBIA CENTRO-OESTE, REBIA NORDESTE, REBIA NORTE, REBIA SUDESTE, REBIA SUL, e em pouco tempo mais que dobramos o número de membros nestes fóruns, número que continua crescendo, graças também ao apoio e ao trabalho dos voluntários da REBIA, que ajudam na moderação de cada Fórum e colaboram com informações e reflexões que estimulando os debates. Este material informativo e opinativo que circula nos fóruns da REBIA é importante para a atualização do Portal do Meio Ambiente e para a elaboração da pauta da Revista do Meio Ambiente, não sendo exagero dizer que, graças a este mecanismo de participação, os próprios leitores é que fazem o Portal e a Revista, indicando o que querem ler!

A REBIA tem adotado a prática de sempre buscar parcerias fortalecendo a idéia da rede de solidariedade socioambiental por um mundo melhor. Neste sentido, a parceria com a ASSOCIAÇÃO ECOLÓGICA PIRATINGAÚNA para a administração financeira da Revista do Meio Ambiente e dos projetos da REBIA tem sido muito proveitosa! A Associação Ecológica Piratingaúna é uma OSCIP – Organização da Sociedade Civil de Interesse Público com sede em Barra Mansa. Entre os projetos que resultaram de nossa parceria, estão os mutirões dos Voluntários Ambientais, e os Ecoclubes, em Barra Mansa, entre outros projetos.

O trabalho rumo a um mundo sustentável e de baixo carbono e pelo fortalecimento da cidadania socioambiental em nosso país seria mais fácil se as empresas, governos e organizações compreendessem que a democratização da informação ambiental não é uma mera questão comercial ou de marketing, mas é estratégica para nossa Sociedade, pois o efetivo exercício da cidadania ambiental, crítica e participativa, capaz de tomar decisões e fazer escolhas de forma consciente, pressupõe no mínimo a existência de informação ambiental acessível, de qualidade e independente, e ainda estamos bem longe disso.

Política e ‘políticas’ de Comunicação Ambiental

“Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados.” – Millôr Fernandes

Existem empresas e organizações que ainda adotam como ‘política’ de comunicação ambiental o NADA A DECLARAR: “quanto menos a gente se expor menor o risco de nos tornarmos alvo de ambientalistas radicais ou da imprensa que só gosta de pautar notícia ruim”. Ao agirem assim, negligenciam a importância estratégica que uma boa imagem ambiental da instituição ou de seus produtos tem para a aceitação junto à sociedade. Depois se queixam quando encontram dificuldades para aprovar o licenciamento ambiental de suas instalações, ou para emplacar um produto com apelo ambiental no mercado, ou quando, diante de um acidente ambiental, deparam-se com um público hostil.

Tem empresas e organizações públicas ou do Terceiro Setor que resumem suas ‘políticas’ de comunicação ambiental à implantação de um departamento de comunicação ou então contratam temporariamente uma empresa de assessoria de comunicação cuja principal atividade se limita a produzir releases e enviar aos veículos na esperança de serem incluídas na pauta, ou mesmo de ver seus releases publicados como notícias. Como se coubesse aos veículos financiarem a informação que precisam democratizar.

A situação se torna crítica quando a comunicação ambiental deve ser parte integrante para assegurar o sucesso de um projeto. Por exemplo, diante do financiamento de projetos ambientais como os do FNMA – Fundo Nacional do Meio Ambiente, FUNBIO, PD/A, etc., ou de projetos ambientais financiados por empresas e organizações como uma estratégia de marketing sócio-ambiental, como os da Petrobrás Ambiental ou os do Banco de Tecnologias Sociais da Fundação Banco do Brasil. Todos projetos de caráter demonstrativo, onde se pressupõe a importância estratégica da multiplicação dos resultados ou da informação, apesar disso, não há uma política de comunicação ambiental clara para demonstrar seus resultados, no máximo, também aqui, limitam-se a enviar release na esperança de que algum veículo financie a informação. O ideal, nesses casos, seria uma política de comunicação onde o público local fique ao encargo do recebedor dos recursos, pois estão mais próximos da comunidade e o foco da informação é menos institucional e no projeto individual. Os financiadores precisarão exigir dos recebedores a demonstração de como irão democratizar as informações e quem será o profissional de comunicação responsável. Em contrapartida, devem assegurar no mínimo 10% do total dos recursos do Projeto para o financiamento dessa informação. Já os públicos regional e nacional precisam ficar ao encargo das organizações financiadoras, pois o foco da informação não é um ou outro projeto em particular, mas todos os projetos financiados, assegurando um aspecto mais institucional à informação.

Estabelecer uma política de comunicação ambiental, aliás, qualquer política, pressupõe planejamento, reuniões com as pessoas responsáveis por sua execução, análise de estratégias, definição de públicos interessados, definição de produtos de comunicação para estes públicos, previsão orçamentária para o financiamento desses produtos, etc.

Não ter uma política de comunicação ambiental formal, não significa sua inexistência dentro de uma organização. Ela existe, só que cada um adota o método que acha mais adequado, não sendo possível nem avaliar sua eficácia muito menos corrigir desvios de estratégia.

A negligência das empresas e organizações em cuidar adequadamente de suas políticas de comunicação ambiental e a conseqüente ausência de recursos para financiar a informação ambiental podem resultar no fato do poder de decisão da alta gerência estar nas mãos de engenheiros, biólogos, advogados, pedagogos, sociólogos e uma infinidade de profissionais altamente qualificados, mas que não receberam formação em comunicação social, daí não percebem direito em quantos segmentos e públicos de interesse se divide a opinião pública, muito menos que produtos são mais ou menos eficazes dependendo de cada segmento, de que maneira uma mensagem deve ser apresentada ao público, etc.

Outro equívoco diz respeito ao financiamento da informação ambiental. Pouquíssimas empresas e organizações incluem a mídia ambiental em seus planos de mídia. O mercado já deu mostras evidentes de que não financia e não compra a informação ambiental. Basta visitar qualquer banca para constatar que, em meio a uma enorme variedade de títulos, não existe uma única publicação ambiental. Existem alguns títulos focados em ecoturismo ou paisagismo, mas nenhum que retrate a complexa realidade ambiental do país. E não é por que nenhum editor de mídia ambiental ainda não se animou em colocar seus veículos nas bancas. Já fizeram isso e o encalhe foi superior a 90%. É por que não vende mesmo.

Pela lei do mercado, se ninguém quer comprar a informação ambiental, então não devem existir veículos da mídia ambiental. Certo? Como ficam as empresas e organizações que têm o dever e o direito de se comunicar com os diferentes públicos de interesse? Como a sociedade brasileira poderá tomar decisões em direção a um modelo de desenvolvimento sustentável se não recebe informações ambientais em qualidade e quantidade suficientes?

A mídia ambiental brasileira cumpre um papel de interesse público em nosso país e, apesar disso, não existe qualquer programa público para o financiamento da informação ambiental, apesar do Governo Brasileiro ter aprovado entre os objetivos fundamentais da educação ambiental a garantia da democratização das informações ambientais (Lei nº 9.795 de 27 de abril de 1999, art. 5º, inciso II).

Os veículos da mídia ambiental brasileira ficam dependentes, então, da inclusão em planos de mídia das agências de publicidade contratadas por empresas públicas e privadas, onde têm de disputar espaço numa luta absolutamente desigual com veículos da chamada Grande Mídia como TV Globo, Jornal O Globo, etc., e o resultado acaba sendo a exclusão da mídia ambiental, sempre com as honrosas exceções, aliás, graças a elas, ou não existiriam mais veículos para a informação ambiental em nosso país.

A democratização da informação ambiental – um pequeno histórico

“A nova fonte de poder não é o dinheiro nas mãos de poucos, mas informação nas mãos de muitos.” – John Naisbitt

Tenho procurando reforçar a importância da democratização da informação. Em 1986, participei do XXI Congresso Nacional de Jornalistas, em São Paulo, com o tema “A comunicação e a Democracia”. Em 1989, participei em São Paulo do Seminário “A Imprensa e o Planeta”, promovido pela Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão e pela Associação Nacional de Jornais. Três meses depois, participei do encontro mais importante para o jornalismo ambiental brasileiro: o seminário da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ). A partir do seminário da FENAJ, realizado em Brasília, formaram-se núcleos regionais de jornalismo ambiental em São Paulo, Minas Gerais, Paraná e Rio Grande do Sul, com o objetivo de criar uma entidade nacional de jornalismo ambiental. No Rio de Janeiro, fundei o núcleo no Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Rio de Janeiro, do qual eu era diretor. Entretanto, apesar do entusiasmo inicial, sobrou apenas o Núcleo de Ecojornalistas do Rio Grande do Sul (NEJ/RS) que nasceu dentro do movimento ambientalista, no dia 22 de junho de 1990, num debate com o presidente da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural, filósofo Celso Marques, e o presidente da União Protetora do Ambiente Natural, jornalista Carlos Aveline.

Também participei da criação da rede de jornalistas de meio ambiente, uma das decisões do Encontro Internacional de Imprensa, Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizado entre 20 e 24 de maio de 1992, em Belo Horizonte, batizado de Green Press. Este encontro estava na agenda oficial da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Rio 92. A Eco 92 foi como um divisor de águas na consciência ambiental do brasileiro. A partir daí, a questão ambiental, que já era considerada importante antes, mas não era prioritária, passou a ser também prioritária e levada a sério no planejamento estratégico de empresas e governos.

Com Rogério Ruschel, da Revista Business do Bem e Adalberto Marcondes, da Envolverde, entre outros editores da mídia ambiental criamos a Ecomídias – Associação Brasileira de Mídias Ambientais, que entre as ações concretas, encaminhou ao Ministério do Meio Ambiente o pleito para a criação de uma política de comunicação ambiental que resultasse no financiamento das mídias ambientais, entre outras exigências. Em 30 de março de 2004, o Governo Federal criou o GT (grupo de trabalho) com o objetivo de formular uma política em relação à informação ambiental a fim de garantir mecanismos e instrumentos que garantam o direito à informação, como definido na Constituição do Brasil.

Em outubro de 2005, participei do I Congresso Brasileiro de Jornalismo Ambiental, no SESC de Santos, que contou com a presença de centenas de jornalistas de todo o Brasil e também de países como Cuba, Estados Unidos, Moçambique, Inglaterra, Uruguai, entre outros. O evento foi um momento de encontro para os participantes da Rede Brasileira de Jornalismo Ambiental (RBJA), lista de discussão online criada em 1998, que já conta com cerca de 500 jornalistas cadastrados. Realizado pela RBJA, Núcleo Paulista de Jornalismo Ambiental, Núcleo de Ecojornalistas do Rio Grande do Sul, Ecoagência Solidária de Notícias Ambientais e pela Agência Envolverde.

Durante a IIª Conferência Nacional do Meio Ambiente, em dezembro de 2005, participei do encontro entre jornalistas, editores e diretores de agências ambientais, no espaço do GTA (Grupo de Trabalho da Amazônia) que discutiu o papel da comunicação ambiental na construção das políticas públicas de meio ambiente e na formação da opinião pública. Esta temática do debate sobre Mídia, Política Ambiental e Opinião Pública, foi proposta pelo Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais (FBOMS). Para debater o assunto foram convidados além de mim, Francisco Costa, diretor de Educação Ambiental do MMA; José Arnaldo de Oliveira, assessor de comunicação do Grupo de Trabalho Amazônico (GTA); Mara Régia, apresentadora do programa Natureza Viva, da Rádio Nacional da Amazônia; Maristela Bernardo, jornalista e doutora em Sociologia. O moderador foi Juarez Tosi, da Ecoagência.

“O trabalho pioneiro de disseminação da consciência ecológica desenvolvido pelo Portal e pela Revista do Meio Ambiente vem colaborando para a transformação cultural, sem a qual as mudanças não têm consistência. A coragem do Vilmar para enfrentar riscos em prol da luta ecológica e o entusiasmo para levar adiante essa causa servem de referência para todos. O espaço aberto pelo Jornal do Meio Ambiente foi um respiradouro no qual os ambientalistas brasileiros nos inspiramos.” – Maurício Andrés – escritor, ex-Presidente da FEPAM, secretário executivo do CONAMA

“Vilmar mereceu receber o Global 500! A qualidade e dinamismo do veículo de comunicação ambiental que construiu são notáveis.” – Prof. Eduardo Viola – Department of International Relations and Center for Sustainable Development University of Brasilia

“A incansável batalha do Vilmar pela informação mantém viva a indignação e a esperança de um outro mundo, construção que começa bem aqui, na nossa casa.” – Jean-Pierre Leroy

“Vilmar Merece! Acredito que prestigiar um profissional e idealista que milita na área utilizando para isto os meios de comunicação e fazendo deles seus aliados para a difusão de uma cultura em prol da vida tem que ser valorizado e preservado a todo o custo. Pessoas como o Vilmar são um estímulo e um exemplo de esperança de que é sempre momento de lutar por algo melhor. É uma honra para todos nós, ambientalistas que trabalham a sério”. – SANDRA SINICCO E ARON BELINKY – Ecopress

Escolhendo a literatura

“Ao escrever, o escritor deve solicitar um pacto com o leitor, que ele colabore em transformar o mundo, a sua realidade…” – Sartre

“Escrever é fácil: você começa com uma letra maiúscula e termina com um ponto final. No meio você coloca idéias.” – Pablo Neruda

Não comecei como escritor, mas como leitor. Antes de pensar em escrever, li muito, conversei sobre idéias com outras pessoas, observei a vida à minha volta e, principalmente, fiz silêncio para olhar para dentro de mim mesmo! Escrever surgiu naturalmente depois disso. Mas a idéia nunca vem pronta. No início é apenas uma inspiração, um embrião de idéia, que começará a tomar forma quase sempre aos poucos, à medida que a gente começa a transcrevê-la para o computador, ou o papel, ou mesmo um quadro de pintura, ou uma fotografia.

Por isso, pelo menos para mim, escrever, pintar, fotografar, são atividades para fazer sem pressa, sem ansiedade por resultados rápidos. Geralmente, levo mais tempo refletindo sobre a mensagem, a idéia ou idéias sobre as quais vou escrever, antes de materializar estas idéias na forma de texto.

Costumo encontrar a inspiração no dia a dia mesmo, à minha volta, por isso escrevo como uma forma de auto-conhecimento, sobre o que sinto e sobre minhas reflexões, como um diálogo comigo mesmo, uma maneira de deixar mais claras as coisas para mim. Quando começo, se o que irá resultar deste encontro comigo mesmo será um livro infantil ou para adultos, não tenho como saber, nem mesmo me preocupo com isso. Às vezes, quando a mensagem está clara ela ‘transborda’ para o papel quase naturalmente, mas isso é raro. Normalmente, tenho de ‘brigar’ com o texto, escrever e reescrever várias vezes, por isso é bom não ter pressa, nem preguiça, para escolher bem as palavras, as idéias, os conceitos até que tudo resulte numa forma harmônica, que é aquele limite do próprio talento e competência, quando você não consegue fazer melhor, o que não significa que outra pessoa, com mais talento do que você, não consiga melhorar quando você próprio já não consegue.

O papel da crítica pode ser muito importante no aperfeiçoamento do texto, afinal, como diz Alexandre Herculano “eu não me envergonho de corrigir meus erros nem de mudar minhas opiniões. Porque não me envergonho de raciocinar e aprender”. No início, as críticas me incomodavam, principalmente quando percebia uma pontinha de maledicência. Depois, descobri que, mesmo quando invejosas, as críticas me ajudavam a lançar um novo olhar sobre um texto que antes eu considerava pronto e acabado. Então, passei a me relacionar de forma mais fraterna com as críticas e não de forma reativa. Claro, sempre me reservo o direito de ‘espernear’, quando a crítica é muito injusta, mas faz parte do meu processo de convencimento. Lembro Antoine de Saint-Exupéry em seu livro O Pequeno Príncipe, que interpretei no teatro estudantil: “Disse a flor para o pequeno príncipe: é preciso que eu suporte duas ou três larvas se quiser conhecer as borboletas.”

Dependendo da mensagem, uma forma pode ser melhor que a outra. Ás vezes a idéia é boa, mas a forma não foi a mais feliz. O autor pode escolher entre a prosa, a parábola, a crônica, versos, romance, biografia, etc. e assim que tiver definido, ainda existirá um árduo e longo caminho à frente até que um texto esteja no ponto para se chamar de livro! A sensação é que o autor fica ‘grávido’ do livro e precisa se livrar dele, ou o livro se livrar do autor… Alguns livros saem num ritmo mais rápido, outros num ritmo mais lento, mas uma coisa é certa, dificilmente um texto fica pronto da primeira fez, por mais talentoso que seja um autor.

Em relação à mensagem do autor, um alerta, livro algum, por mais especial que seja, mesmo este daqui, não caminha nem decide por ninguém! Se ninguém tirar o livro da estante, ali ele permanecerá imóvel, sem ir a lugar algum. Quem faz as coisas acontecerem são os leitores. Os livros podem ajudar em nossas escolhas, mas não escolhem por nós. E nem sempre o que deu certo ou errado com o autor, significa que dará certo ou errado com o leitor, pois cada um tem seu jeito próprio de viver e decidir, e ninguém é capaz de saber a capacidade do outro em suportar a dor dos ônus ou a alegria dos bônus de suas escolhas, a não ser a própria pessoa!

Livros para ajudar a transformar o mundo

“Como ainda não somos uma sociedade leitora, não podemos esperar que o exemplo venha de casa. Ou acabaremos condenando as futuras gerações a também não ler… (É preciso) quebrar esse ciclo vicioso, criando em seu espaço um ambiente leitor.” – Ana Maria Machado, Nova Escola

Tenho me dedicado à literatura como forma de contribuir para o incentivo ao hábito da leitura, o despertar novo talentos literários, o estímulo à inclusão digital e à formação da cidadania socioambiental planetária dos jovens alunos. Nas condições de desigualdade que persistem na sociedade brasileira esta é uma tarefa complexa que exige esforços conjugados de todos que têm compromissos e responsabilidades com o país. De acordo com o Mapa do Alfabetismo no Brasil (INEP, 2003), a evolução da taxa de analfabetismo da população de 15 anos ou mais, no País, diminuiu de 65,3%, em 1900, para 13,6%, em 2000, realizando grande avanço neste campo ao longo do século passado. Apesar desse avanço, entretanto, o Brasil ainda possuía, em 2000, cerca de 16 milhões de analfabetos absolutos (pessoas que se declararam incapazes de ler e escrever um bilhete simples) e 30 milhões de analfabetos funcionais (pessoas de 15 anos ou mais, com menos de quatro séries de estudos concluídas). Ou seja, apenas um em cada quatro jovens e adultos brasileiros consegue compreender totalmente as informações contidas em um texto e relacioná-las com outros dados. Configura-se, assim, um quadro perverso de exclusão social, que deixa à margem do efetivo letramento cerca de três quartos da população brasileira. De acordo com os especialistas, uma das principais causas do elevado índice de alfabetismo funcional e das dificuldades generalizadas para a compreensão vertical da informação escrita se localiza na crônica falta de contato com a leitura, sobretudo entre as populações mais pobres.

Não é nenhum governo, nem um setor em particular, é a Sociedade brasileira que exige a consolidação de uma ação conjunta para o livro e leitura e para a educação socioambiental em nosso país. E, de todas as organizações da sociedade, a escola é a mais qualificada para exercer o papel central na garantia do direito à educação e, além dele, do direito a aprender sobre meio ambiente. Por isso, tenho procurado escrever livros que possam ser adotados nas escolas.

Educação Ambiental

“A educação deve ajudar o homem brasileiro a inserir-se criticamente no processo histórico e a libertar-se, pela conscientização, da síndrome do ter e da escravidão do consumismo”. – Paulo Freire

“Apenas a educação poderá superar as três necessidades humanas fundamentais: o progresso, a preservação do meio ambiente e a liberdade. A educação liberta o ser humano, assim como somente pela educação se poderá reduzir o consumo a níveis aceitáveis para a preservação do meio ambiente.” – Cristóvão Buarque

Em 1999, quanto estive no Japão para receber o Prêmio Global 500 da ONU Para o Meio Ambiente, participei de diversos eventos organizados pelo Governo Japonês com a participação das crianças. Ao observar o entusiasmo das crianças japonesas pelas questões ambientais, percebi que era o mesmo entusiasmo que via nas crianças e jovens das escolas brasileiras, especialmente entre 9 e 12 anos. Senti que havia um sentimento que unia aquelas crianças tão distantes entre si: o amor pelo Planeta, a preocupação com o futuro da humanidade e ao mesmo tempo uma espécie de apelo ao bom senso dos adultos, um pedido de ajuda aos líderes de hoje, para que houvesse um amanhã com um mínimo de qualidade de vida e sustentabilidade em nosso Planeta. Tive então a idéia de criar uma rede de Clubes de Amigos do Planeta, com base nas escolas, com a missão de executar pelo menos uma boa ação ambiental por mês pelo meio ambiente do lugar. Seria uma maneira de colaborar para dar sinergia a estes sentimentos e esforços, uma forma de usar o meu Prêmio Global para ajudar a reconhecer a importância de este despertar de consciência ambiental de nossos jovens, contribuindo para o seu fortalecimento e organização.

Ao voltar ao Brasil, lancei a idéia através de artigos e no último capítulo do meu livro Como Fazer Educação Ambiental, editado pela Paulus. Este livro, já em quarta edição, e adotado pela UFF – Universidade Federal Fluminense para seu curso de educação ambiental à distância (http://www.cursosonline.uff.br/curso_cfea.html ), tem estimulado alunos, pais e professores a organizarem clubes em diversas partes do país.

Na cidade de Barra Mansa, no Vale do Rio Paraíba do Sul, no Estado do Rio de Janeiro, onde em parceria com a OSCIP Associação Ecológica Piratingaúna, a Prefeitura implantou esses ‘Ecoclubes’ nas escolas da Rede Municipal. São mais de 40 Ecoclubes organizados, envolvendo mais de 500 estudantes, com idade entre sete e dezesseis anos, o que resultou na organização de diversas atividades concretas em defesa do meio ambiente como caminhada de conscientização ecológica com a distribuição à população de panfletos educativos, mudas de plantas nativas da Mata Atlântica e bilhetes com desenhos de alunos do ciclo básico, tudo com a intenção de sensibilizar a comunidade.

Também aceitei o convite do amigo e prof. Flávio Lemos, para escrever o “O Rio Muriaé e sua Ecologia: geografia e história”, editado pela ONG Puris de Ecologia e já com duas edições, patrocinadas por empresas do noroeste fluminense e o SEBRAE-RJ, e adotado por várias escolas da região. O objetivo é um projeto de natureza educativo ambiental, com abordagem didática, para ensinar sobre a importância da água, dos rios, dos princípios ecológicos relacionados, de gestão integrada de recursos hídricos, dos comitês e dos consórcios de bacias, de legislação, dos princípios de sustentabilidade econômico ambiental, e um pouco de historia e geografia da região estudada, utilizando o rio principal de uma determinada região (bacia hidrográfica), como referencial para despertar o interesse, a curiosidade e estimular o envolvimento do público-alvo junto às questões relacionadas à bacia hidrográfica e o uso racional da água, socializando o debate e potencializando a relação entre os componentes ambiental, econômico, sócio-cultural e histórico que aquele rio representa para aquelas pessoas.

Meu propósito é estimular e desenvolver projetos de educação ambiental que estimule novos valores, ambientalmente mais sustentáveis e também socialmente mais justos, e que também capacite as pessoas para encontrarem as soluções técnicas e alternativas que assegure qualidade de vida, emprego, alimento, segurança, desenvolvimento sustentável, especialmente aos setores excluídos da sociedade, sem que com isso venhamos a comprometer o futuro de nossos filhos e netos, por que não recebermos o planeta de herança dos que vieram antes de nós, mas os estamos tomando emprestado dos que virão depois de nós, já alertou Henry Brown. E mais. Estou convencido que só a educação ambiental e a comunicação ambiental não serão suficientes para prover as mudanças rumo à sustentabilidade solidária, por que é preciso promover profundas mudanças nas estruturas econômicas e políticas da sociedade, e isso só será possível com um cidadão ambiental planetário, fortalecido pela organização em rede, capaz de agir com um consumidor responsável, que diga sim a produtos ambientalmente sustentáveis e solidários, e promova campanhas e boicotes contra produtos, empresas, projetos, atividades que estejam na contramão de um novo modelo sustentável e solidário; e ao mesmo tempo um cidadão político crítico e participativo, capaz de cobrar e monitorar seus governantes e representantes políticos para que o compromisso com a sustentabilidade solidária seja mais que apenas discursos em períodos eleitorais.

“Amigos do Planeta” – eu faço a minha parte


Escrevi o livro “Amigos do Planeta” para contribuir com pais e educadores que enfrentam o desafio de sensibilizar e formar uma nova geração de cidadãos ambientais, críticos e participativos, estimulando, na escola e na comunidade, a ação concreta por um mundo melhor, por meio da criação dos Clubes de Amigos do Planeta. O livro pode ser especialmente marcante para crianças e jovens em idade escolar, que vivem uma fase importante de construção e fortalecimento dos valores de cidadania ambiental, propiciando o acesso a práticas em causas ligadas ao bem comum, a serem desenvolvidas pelo menos uma vez por mês, possibilitando a multiplicação de ações concretas para a melhoria do meio ambiente na comunidade, entendendo-se a defesa do meio ambiente como um valor inseparável do exercício da cidadania.O mundo, como nossos pais e avós e nós próprios, adultos, conhecemos, mudou. As escolhas das gerações que nos antecederam, da era pós-industrial, aqueceram o planeta e as conseqüências desse aquecimento já começam a ser sentidos por todo o planeta, inclusive no Brasil. Além de tentar mitigar os problemas, precisamos também nos adaptar a esta nova realidade de um planeta mais aquecido, cuja tendência será aquecer ainda mais. E entre as conseqüências já previstas para as próximas décadas, o aumento do nível dos oceanos está entre os maiores danos à infra-estrutura urbana e rural nas cidades litorâneas.

Como as escolas estão vendo esta nova realidade? Como a escola está se preparando para este novo desafio? Algumas escolas líderes já estão adotando a educação ambiental de forma multidisciplinar para formar um novo cidadão socioambiental planetário, mas muito poucas foram além e adotaram também práticas de gestão ambiental. E, sem coerência entre o discurso e a prática, as escolas terão dificuldade para agregar credibilidade ao que ensinam! Segundo a Pesquisa MEC/Unesco de 2005, “O que fazem as escolas que dizem que fazem Educação Ambiental”, organizada por Rachel Trajber e Patrícia Ramos Mendonça, que abrangeu cerca de 418 escolas em todo o país, com quase a totalidade das escolas de ensino fundamental com Educação Ambiental, a queima de lixo ainda é uma prática comum a 36% das escolas, em 2001, crescendo para 41%, em 2004, e a reciclagem continua extremamente reduzida.

Faça um pequeno teste para saber se a sua escola tem coerência entre o discurso e a prática: ela adota uma política de gerenciamento de seus resíduos? Pratica a coleta seletiva de lixo? Tem uma preocupação com a ecoeficiência nos gastos com energia, água, ar-condicionado? Combate o desperdício? Reaproveita a água da chuva? Tem uma política de compra ecológica que se preocupe com a origem da carne ou da madeira que compra, para não estimular o desmatamento da Amazônia? Usa matérias biodegradáveis? Estimula a reciclagem e o uso dos reciclados? Faz o inventário e neutraliza suas emissões de carbono?

Se a resposta for não, ainda dá tempo de mudar. Ghandi afirmava que “Só existem dois dias do ano em que não podemos fazer nada. O ontem e o amanhã”. Como forma de contribuir com as escolas coerentes, ou seja, aquelas que são realmente sinceras em seus compromissos ambientais e estão dispostas a irem além do simples marketing ecológico, lancei o projeto “Amigos do Planeta’ para as escolas adotarem práticas integradas de gestão ambiental do estabelecimento e neutralizarem suas emissões de carbono e ainda implementar um Clubes de Amigos do Planeta com a participação de seus alunos. É só querer arranjar um jeito para fazer em vez de procurar uma desculpa para não fazer.

10 Mandamentos da Escola Ambientalmente Coerente

O desafio que propomos é que a escola seja o exemplo que quer ver em seus alunos, para que seu discurso seja coerente com a sua prática, e possa ter credibilidade como instituição de ensino realmente comprometida com este novo mundo de baixo carbono e sustentabilidade socioambiental e assim ganhar o respeito de seus alunos, pais e da comunidade do entorno.

1 – Estabeleça princípios ambientalistas – Estabeleça compromissos, padrões ambientais que incluam metas possíveis de serem alcançadas.

2 – Faça uma investigação de recursos e processos – Verifique os recursos utilizados e o resíduo gerado. Confira se há desperdício de matéria-prima e até mesmo de esforço humano. A meta será encontrar meios para reduzir o uso de recursos e o desperdício.

3 – Estabeleça uma política ecológica de compras – Priorize a compra de produtos ambientalmente corretos e que tenha a origem socioambiental comprovada, especialmente em relação à madeira e à carne usada na merenda escolas, pois podem estar vindo de áreas que desmataram a Amazônia. Existem certos produtos que não se degradam na natureza. Procure certificar-se, ao comprar estes produtos, de que são biodegradáveis. Procure por produtos que sejam mais duráveis, de melhor qualidade, recicláveis ou que possam ser reutilizáveis. Evite produtos descartáveis e de difícil reciclagem, incentive copos e canecas de uso permanente em vez de descartáveis, etc.

4 – Incentive seus colegas – Fale com todos a sua volta sobre a importância de agirem de forma ambientalmente correta. Sugira e participe de programas de incentivo, estabeleça sistemas de medição de resultados que permita premiar os que se destacam na busca de formas alternativas de combate ao desperdício e práticas poluentes.

5 – Não Desperdice – Ajude a implantar um sistema de gerenciamento de resíduos e participe da coleta seletiva de lixo. Você estará contribuindo para poupar os recursos naturais, aumentar a vida útil dos depósitos de lixo, diminuir a poluição. Investigue e combata o desperdício de energia, água, alimentos, recursos naturais em geral. Localize e repare os vazamentos de torneiras. Desligue lâmpadas e equipamentos quando não estiver utilizando. Mantenha os filtros do sistema de ar-condicionado e ventilação sempre limpos para evitar desperdício de energia elétrica. Use os dois lados do papel, prefira o e-mail ao invés de imprimir cópias e guarde seus documentos em disquetes, substituindo o uso do papel ao máximo. Promova o uso de transporte alternativo ou solidário, como planejar um rodízio de automóveis para que as pessoas viajem juntas ou para que usem bicicletas, transporte público ou mesmo caminhem para o trabalho. Considere o trabalho à distância, quando apropriado, permitindo que funcionários trabalhem em suas casas pelo menos um dia na semana utilizando correio eletrônico, linhas extras de telefone e outras tecnologias de baixo custo para permitir que os funcionários se comuniquem de suas residências com o trabalho.

6 – Evite Poluir Seu Meio Ambiente – Faça uma avaliação criteriosa e identifique as possibilidades de diminuir o uso de produtos tóxicos. Converse com fornecedores sobre alternativas para a substituição de solventes, tintas e outros produtos tóxicos. Faça um plano de descarte, incluindo até o que não aparenta ser prejudicial como pilhas e baterias, cartuchos de tintas de impressoras, etc. Faça a regulagem do motor dos veículos regularmente e mantenha a pressão dos pneus nos níveis recomendáveis. Assegure-se que o óleo dos veículos está sendo descartado da maneira correta pelos mecânicos. Certifique-se que os mecânicos de ar-condicionado e de geladeiras estão recolhendo o gás em vez de simplesmente liberarem na atmosfera. Certifique-se que os efluentes líquidos estão sendo adequadamente coletados e tratados ou encaminhados para tratamento.

7 – Evite riscos – Verifique cuidadosamente todas as possibilidades de riscos de acidentes ambientais e tome a iniciativa ou participe do esforço para minimizar seus efeitos. Não espere acontecer um problema para só aí se preparar para resolver. Participe de treinamentos e da preparação para emergências.

8 – Anote e divulgue seus resultados – Registre cuidadosamente suas metas ambientais e os resultados alcançados. Isso ajuda não só que você se mantenha estimulado como permite avaliar as vantagens das medidas ambientais adotadas.

9 – Comunique-se – No caso de problemas que possam prejudicar seu vizinho ou outras pessoas, tome a iniciativa de informar em tempo hábil para que possam minimizar prejuízos. Busque manter uma atitude de diálogo com o outro.

10 – Faça o inventários e neutralize as emissões de carbono – Não adianta você ficar só estudando e conhecendo mais sobre a natureza. É preciso combinar estudo e reflexão com ação. Considere a possibilidade de dedicar uma parte do seu tempo, habilidade e talento para o trabalho voluntário ambiental a fim de fazer a diferença dando uma contribuição concreta e efetiva para a melhoria da vida do planeta. Você pode, por exemplo, fazer o inventário das emissões de carbono de duas atividades e organizar um mutirão voluntário de plantio de árvores nativas do ecossistema local junto a um parque ou reserva natural mais próximo, ou uma mata ciliar, para compensar estas emissões, adotando estas árvores para sempre e não simplesmente plantando a muda e esquecendo-se dela depois. Promova palestras e seminários de educação ambiental na escola, abertos à comunidade, etc.

“Fiquei muito contente no mestrado quando a professora encerrou a aula sobre o meio ambiente com “os dez mandamentos ambientais” do Vilmar. Parabéns!” – Tania Suckow

Gestão Ambiental


No livro ADMINISTRAR COM CONSCIÊNCIA ECOLÓGICA, publicado pelas Paulinas, reuni experiências e idéias em gestão ambiental a partir de consultorias que fiz a empresas no Brasil. A UFF (Universidade Federal Fluminense) também disponibiliza o conteúdo deste livro através de Curso à Distância.Os ambientalistas devem ajudar numa parceria pró-ativa a aplicar os princípios ambientalistas à administração das empresas. Trata-se de um desafio de parte a parte, onde a primeira grande barreira a ser vencida é o preconceito. Tanto por parte daqueles ambientalistas que vêem em todo empresário um poluidor e degradador do ambiente, quanto por parte daqueles empresários que vêem em todo ambientalista um radical incompetente, incapaz de dar solução aos problemas que aponta.

Embora as críticas de parte a parte devam continuar, e até mostrem-se produtivas ao estimular a busca pela melhoria contínua, parece provável que já estejamos bem adiantados num novo período em que todos os interessados buscam minimizar os impactos da tecnologia industrial sempre que é possível mudar, em vez de simplesmente procurar culpados.

O sucesso de longo prazo da Política Ambiental está intimamente ligado a sua capacidade de envolver o pessoal de escalões inferiores na consecução de seus objetivos. Isso só pode acontecer se o interesse da alta direção for autêntico e contínuo. Logo, declarações por escrito de políticas aprovadas pela Diretoria são uma indicação de apoio, porém sinais informais são igualmente importantes, como participação nas reuniões com a equipe responsável pela implantação da Política Ambiental, solução rápida e efetiva dos problemas.

Segundo pesquisa da Symnetics, com empresas de faturamento entre R$ 200 milhões e R$ 500 milhões, planos estratégicos da empresa, como a Política Ambiental, acabam ficando mais na cabeça da alta administração, que não consegue passar o recado para os seus subordinados. E até mesmo na alta administração das companhias, há quem não saiba traduzir a mensagem do Presidente. A pesquisa apontou que 5% da alta administração não sabem qual a visão de futuro da empresa. Descendo na estrutura hierárquica, a miopia se acentua. O estudo indica que 14% da média gerência sequer entendem o planejamento da empresa e 48% tem uma compreensão mediana. No nível operacional, a situação é ainda pior. A pesquisa constatou que 38% dos operários não têm idéia de quais sejam as metas futuras da organização e 43% têm uma vaga idéia do que se trata.

A solução é investir em programas de conscientização e sensibilização dos funcionários para as políticas da empresa, especialmente a ambiental, já que consciência ambiental não se dá por portaria ou de cima para baixo, mas de dentro para fora. Neste sentido, não basta implantar uma boa Política Ambiental ou obter a ISO 14.001. É preciso, antes, estimular e sensibilizar os funcionários, prestadores de serviços e fornecedores a desejarem ‘ecologizar’ o trabalho, não por que a direção da empresa quer ou determinou, mas por que a adoção de princípios ambientais pode ser uma oportunidade para que os trabalhadores possam dar uma contribuição concreta, em seu próprio ambiente de trabalho, para a melhoria das condições do Planeta. Mais que uma exigência da Direção, portanto, é uma oportunidade da qual os trabalhadores poderão se orgulhar junto a sua família e à comunidade, ao se revelarem os resultados positivos do trabalho ambiental desenvolvido na empresa. Neste sentido, vale a pena todo o esforço da Empresa para sensibilizar e mobilizar seus funcionários, tais como palestras com ambientalistas, distribuição gratuita de assinaturas de jornais especializados em meio ambiente, encontros com escritores para autógrafos a livros com tema ambiental, distribuição de boletins por intranet ou fotocópia com informações sobre a Política de Gestão Ambiental, entre outras iniciativas.

“Foi com grande alegria que soube da escolha do Vilmar para o Global 500, sem dúvida o maior reconhecimento internacional para os que atuam defendendo as causas do meio ambiente. Sem dúvida a escolha foi merecida. O trabalho didático, pioneiro e de excepcional qualidade e atualidade a frente dos veículos de comunicação que edita e as suas idéias mais do que atuais sobre como devemos atuar no desenvolvimento sustentável foram agora reconhecidos, e como! Nada mais justo.” – Alexandre Nogueira, assessor de Segurança e Meio Ambiente das Indústrias Nucleares do Brasil.

Pensamento Ecológico

“Tudo o que existe e vive deve ser cuidado para continuar a existir. A essência humana reside na capacidade de tomar este cuidado. Talvez seja este, o maior desafio da capacidade inventiva do ser humano, despertar a sensibilidade e a responsabilidade com os cuidados com a terra…” – Leonardo Boff

Nasci entre duas gerações bem diferentes: a geração de meus pais, que via a natureza como fonte inesgotável de todos os recursos e capacidade infinita de receber nossos restos, e a geração dos meus filhos, que busca desesperadamente por uma saída sustentável que evite o colapso ambiental já anunciado pelos cientistas, no caso de não sermos capazes de mudar nosso rumo. Sou contemporâneo desta triste época, em que se contabilizam os prejuízos sociais e ambientais como nunca antes ocorreu na história da humanidade!

Nunca houve uma apropriação tão grande dos recursos naturais em nome do progresso e do desenvolvimento humano, mas que só serviu para produzir uma brutal concentração de renda e exclusão social por um lado, e poluição e degradação ambiental por outro. O mundo atual é uma ‘fábrica’ gigantesca e incontrolável de exclusão social e de degradação ambiental.

Os padrões de produção e consumo no mundo, hoje, estão 20% acima da capacidade de reposição da biosfera, isso considerando que existe mais de 1 bilhão de pessoas passando fome. Entre 1500 e 1850 foi eliminada uma espécie em cada 10 anos. Entre 1850 e 1950 foi eliminada uma espécie em cada ano. Em 1990 desapareceram 10 espécies por dia. Atualmente, cerca de uma espécie está desaparecendo por hora. Entre 1975 e 2000 desapareceram aproximadamente 20% de todas as espécies de vida. Para muitos cientistas esta é a maior onda de extinções desde o desaparecimento dos dinossauros há 65 milhões de anos. Quase 24% dos mamíferos, 12% dos pássaros e quase 14% das plantas enfrentam essa ameaça, em grande parte devido à destruição do seu habitat. Somente no Brasil, mais de 87 culturas humanas foram perdidas e, nos próximos 10 a 20 anos, o mundo verá a perda de milhares de espécies de plantas e de animais.

A partir de 1950 perdeu-se a quinta parte da superfície cultivável e das florestas tropicais. De 1970 a 1988 o desmatamento foi de 20 milhões de hectares. Atualmente, cerca de 10 milhões de hectares são desmatados ou degradados por ano, o que representa uma área do tamanho de um campo de futebol a cada dois segundos.

A floresta amazônica está desaparecendo três vezes mais rápido do que na década de 90. 20% dela já foi destruída. 80% das florestas originais já foram destruídas e somente 20% das florestas nativas permanecem intactas. Uma árvore é plantada para cada dez que são derrubadas. Nesse ritmo, a floresta tropical restante estará destruída até 2035. O planeta já perdeu metade de sua extensão florestal original, principalmente nos últimos 100 anos.

Na última metade do século passado o mundo perdeu 62% de suas reservas de água potável. A quantidade de água potável que está acessível – seja em lagos, rios ou represas – representa menos de 0,25% do total de água doce. Em 1995, 27% da população da América Latina e do Caribe não tinham acesso à água potável. Estima-se que mais de 2 bilhões de pessoas no mundo não tenham acesso à água potável e mais de 5 milhões (um número dez vezes maior que o de mortos em guerras em todo o mundo), crianças na maioria, morram, a cada ano, de doenças causadas por água contaminada que provoca mais de 1 bilhão de enfermidades.

A cada ano 500 milhões de toneladas de lixo perigoso são produzidas no mundo. Apenas os Estados Unidos da América são responsáveis por 50% desse lixo! A biodiversidade dos ecossistemas de água doce diminuiu 45% de 1970 até 1996. Já o ecossistema marinho perdeu 35% de sua biodiversidade nestes mesmos 26 anos. O consumo de fertilizantes aumentou de 12 para 80 milhões de toneladas por ano no intervalo de 26 anos.

Quando nossos desejos e não nossas necessidades passam a comandar as escolhas que fazemos, nada nos parece ser suficiente! A inveja, a cobiça, a ganância, a sede de poder ou de riqueza, foram transformados em valores a serem cultivados. O que conta não é “eu preciso”, mas “eu quero, eu posso, eu mereço”. E aí, não basta ter uma boa casa para morar, ou uma boa roupa para vestir, ou um dinheiro guardado para os tempos difíceis. Queremos mais. Queremos ter muitas e muitas casas, muitos e muitos carros e roupas, muitos e muitos milhões e bilhões guardados! Queremos a bolsa, o tênis, a roupa de marca! Queremos o carrão da marca preferida pelas Estrelas e Artistas, por que merecemos e não por que precisamos!

As pessoas querem ser reconhecidas, amadas, respeitadas, e isso é bem humano e legítimo. Entretanto, em vez escolher o caminho de se tornarem pessoas melhores, menos egoístas, mais solidárias, as pessoas tem preferido exibir seus bens como se fossem colares e miçangas. Os ricos se esforçam para mostrar carros, iates, mansões, contas bancárias cada vez maiores que a dos outros ricos que invejam. Guardadas as devidas proporções, os pobres também fazem o mesmo ao, por exemplo, gastar boa parte do salário para pagar cerveja no bar para os ‘amigos’, quando às vezes falta leite em casa para os filhos, ou quando gasta boa parte do salário para comprar um tênis caríssimo que está na moda, ou mesmo apresentar-se com uma imitação, para parecer aos demais que pode comprar algo tão caro!

Na ânsia por mais e mais, sofrem com alegrias efêmeras, pois logo serão superados por alguém que invejam. Se possuir um milhão os elevou à lista dos que possuem um milhão, que antes invejavam, os deixou de fora da lista dos que tem um bilhão, e que passam agora a invejar!

Não é apenas a natureza que vem sofrendo com nossa ganância e consumismo. As pessoas estão se embrutecendo em relação aos nossos próprios semelhantes e mais ainda aos que não são semelhantes, como os animais, que têm tanto direito à vida e à qualidade de vida quanto à espécie humana, e que foram transformados em simples objetivos desprovido da capacidade de sofrer ou sentir dor!

Nosso estilo de vida tem transformado a Vida numa espécie de corrida de obstáculos pelos recursos naturais, onde os que podem mais chegam na frente e se apropriam dos recursos mais que os outros. Ainda que para isso tenham de deixar atrás de si uma terra arrasada e pessoas na miséria! Somos cada vez mais insensíveis ao sofrimento alheio, e em vez de dirigir nossa crítica a um sistema econômico que permite e estimula a concentração de renda, preferimos criticar os pobres por serem ‘preguiçosos’ e viverem de ‘jeitinho’, de ‘malandragem’… logo, vivem na pobreza por que merecem! E aí, nos surpreendemos quando vemos jovens abastados divertindo-se em ‘queimar mendigos’ ou surrar ‘prostitutas’.

A maior poluição que existe está invisível aos nossos olhos. Ela escureceu nossa capacidade de ver a Vida como o nosso mais precioso bem e confunde nossos sentidos e valores. Queremos ser felizes, e o que conseguimos é ser cada vez mais infelizes e tornar as pessoas infelizes. Neste sentido, a cada pessoa que morre, a Vida faz um apelo ao nosso bom censo, afinal, ninguém, por mais rico e poderoso que seja, conseguiu sair vivo deste mundo e muito menos levou consigo um único níquel de sua fortuna!

É um erro a maneira como a nossa espécie humana tem lidado com o planeta, usando os recursos naturais como se fossem ilimitados. E logo nós, que nos julgamos mais inteligentes que as outras espécies! É um erro achar que somos os donos da Natureza e podemos fazer com ela o que quisermos. Hamawt’a afirmou “o dia em que vocês envenenarem o último animal… quando não existirem nem flores, nem pássaros, se darão conta de que dinheiro não se come.” Segundo a Carta da Terra, “a escolha é nossa: formar uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos outros, ou arriscar a nossa destruição e a da diversidade da vida.”

Ao propor aos alunos, pais, professores, clientes, funcionários que repensem seus hábitos e atitudes, a Escola, Empresa ou organização deve ser capaz de demonstrar ao público que também está fazendo o mesmo, assumindo publicamente Compromissos Sócio-Ambientais com a Sustentabilidade e demonstrando que tais compromissos apóiam-se em ações concretas, indo além do marketing ou de declarações pomposas que acabam não se cumprindo. Para começar é preciso sensibilizar o público de interesse levando em consideração os diferentes graus de consciência e de ações ambientais já em andamento, de forma a poder compartilhar e equilibrar a política ambiental entre todos os departamentos.

Definitivamente, este é um caminho sem voltas, pois a tendência é de aumentar a cada dia a consciência ambiental na sociedade. Resta saber se o Planeta conseguirá sustentar a vida humana pelo tempo necessário até que todas as mudanças que estão em curso consigam produzir seus efeitos. Mas a crise nos faz crescer e pode nos fazer encontrar os novos caminhos!

Todos nós dese¬jamos viver num mundo melhor, mais pacífico, fraterno e ecológico. O problema é que as pes¬soas sempre esperam que esse mundo melhor comece no outro. Por exemplo: preferem esperar que um vizinho ou amigo con¬vide para plantar uma árvore ou começar uma coleta seletiva de lixo, em vez de tomar a iniciativa.

Se quisermos um planeta preservado, de verdade, não basta apenas lutar contra poluidores e depredadores. É preciso também que nos esforcemos para mudar nossos valores consumistas, hábitos e comportamentos que provocam poluição, atitudes predatórias com os animais, as plantas e o meio ambiente. Mas só isso não basta, pois não há coerência em quem ama os animais e as plantas, mas explora, humilha, discrimina, odeia seus semelhantes. Por isso, precisamos, além de nos tornarmos ambientalmente corretos em nossas ações, nos esforçar-nos para sermos também mais fraternos, democráticos, justos e pacíficos com os nossos semelhantes.

“A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais a alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar”. – Eduardo Galeano

Acho que a questão mais fundamental não é se o ser humano irá conseguir escolher ser sustentável eco-socio-economicamente ou se irá permanecer na atual trajetória suicida. Por trás dessas escolhas estão questões muito mais antigas no espírito humano sobre as quais filósofos e líderes religiosos têm se debruçado a milênios: como o ser humano pode ser sensibilizado a escolher entre a generosidade e a mesquinhez, o engajamento e a indiferença, a ganância e a solidariedade? A história nos mostra que algumas sociedades conseguiram mudar, e por isso prosperaram, e outras não, e por isso desapareceram. Albert Einstein dá uma dica: “Nosso maior erro é fazer sempre as mesmas coisas e esperar resultados diferentes.”

O desejo de ser feliz, de ser aceito, respeitado, reconhecido em sua sociedade é bem humano e tem impulsionado nossas vidas. Entretanto, a sociedade de consumo conseguiu capturar nosso imaginário com a falsa idéia de que para sermos felizes ou reconhecidos, precisamos ter em vez de ser! Precisamos trabalhar para trocar nosso tempo de vida útil por dinheiro, para com este dinheiro ter acesso aos bens que irão atender às nossas legítimas necessidades e também aos nossos desejos de felicidade e reconhecimento. Cada produto que consumimos, tem seus recursos retirados de um único lugar, o Planeta, e seus restos gerarão lixo que serão destinados também a um único lugar, o Planeta! Não existe ‘lá fora’ no Planeta Terra. As pedras que atirarmos para cima cairão em nossas cabeças, ou nas cabeças de nossos filhos e netos! As conseqüências das mudanças climáticas e do esgotamento dos recursos naturais atingirão a todos, mas as perdas serão maiores para aqueles que não dispõem de recursos para se defender, como os mais pobres.

É falsa a idéia de que o problema em nossa sociedade é devido ao crescimento populacional. Se a quantidade de gente num lugar fosse determinante para avaliar a maneira com lidamos com os recursos naturais, então, em cidades com poucos habitantes o meio ambiente estaria preservado! Se gente demais fosse o problema, gente de menos seria a solução, e está longe disso. Uma única pessoa com uma caixa de fósforos sozinha no meio de um imenso cerrado num tempo seco pode causar mais danos à natureza que milhões de pessoas vivendo de maneira sustentável numa cidade! Ao lado da sociedade de consumo somos também a sociedade do desperdício! Quase a metade dos alimentos produzidos é desperdiçada, ou por que apodrecem pelo caminho, ou por que o preço de mercado não compensa sua venda, ou por que deixamos sobrar no prato, etc.! Então é mentira que existam milhões passando fome por que o Planeta já não consegue produzir alimentos para todos. Gandhi tentou nos alertar quando disse que “a Terra tem o suficiente para a necessidade de todos, mas não para a ganância de uns poucos”.

Espiritualidade

“Não devemos acreditar numa coisa simplesmente porque ela nos é dita, nem aprovar as tradições apenas porque elas descendem da Antiguidade, nem admitir os escritos sábios apenas porque eles foram escritos pelos sábios. Nós devemos aceitar apenas aquilo que recebe a aprovação de nossa consciência; é por isso que eu vos ensinei a crer apenas quando vós sentirdes aquilo que vos apresentam em vossa própria consciência interior. Depois disto, podeis aproveitar largamente.”- Buda

Durante a minha infância e adolescência, tive contato com diversos valores religiosos que ao longo de minha vida influenciaram em minhas escolhas, principalmente as lições que aprendi entre os cinco e dez anos, quando convivi com a família ‘de criação’ que seguia a fé evangélica da Igreja Batista, e me levava todos os domingos à Igreja, onde eu freqüentava a Escola Dominical.

“Todos pensam em mudar o mundo, mas ninguém pensa em mudar a si mesmo”! – Léon Tolstói

O estudo e a leitura da Bíblia eram estimulados. Aprendi que não deveria poluir o corpo com comida e bebida em excesso, uso de drogas, fumo, prática de prostituição, preguiça e outras escolhas que colocassem meu corpo em risco de doenças, pois ele é sagrado, segundo I Coríntios 6:15,19 e 20: “Não sabeis que o vosso corpo é o templo do Espírito Santo, que habita em vós, proveniente de Deus, e que não sois de vós mesmos? Porque fostes comprados por bom preço; glorificai, pois a Deus no vosso corpo, e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus.”

Aprendi que era pecado matar, furtar, cometer adultério ou cobiçar “a casa do teu próximo, a mulher do teu próximo, o servo, a serva, o boi, o jumento, qualquer coisa do teu próximo” inclusive “dar falso testemunho contra teu próximo” – Êxodo 20:1-1. O conceito de furto ia além de simplesmente tirar alguma coisa de alguém. Incluía se apropriar de qualquer coisa que não lhe pertencesse, ainda que o dono tivesse perdido. O ditado popular de “achado não é roubado, quem perdeu é relaxado”, não funcionava. Se achar, e não é seu, deixe onde está que o dono provavelmente está procurando e pode encontrar, ou, se preferir, pode pegar o objeto perdido e entregar nos Correios ou em algum estabelecimento de achados e perdidos, pois o dono irá procurar.

Os Jogos de azar, qualquer um deles, mesmo os legalizados, como a Loteria Esportiva, eram proibidos, por serem atividades que dependem da boa ou da má sorte e do infortúnio humano, e seu objetivo único e imediato é econômico, com a vantagem de um e a desvantagem de muitos. Um verdadeiro crente não devia ajuntar tesouros na terra (Mateus 6.19-20) e não importa quão importante seja a coisa, se ela fosse adquirida por meios ilícitos jamais poderá trazer bênção ao seu possuidor (I Samuel 5.1-12). De fato, os jogos de azar são responsáveis por muitos males sociais, emocionais e jurídicos no povo, tanto de crentes como de não crentes. Um dos primeiros efeitos é o empobrecimento. Há pessoas que são cativadas pelo vício de jogar e, diariamente estão jogando. E, como só um ou poucos ganham, há pessoas que passam a vida toda jogando sem nunca ganhar. Os pobres gastam em loteria aproximadamente o mesmo que pessoas de classe média, mas por terem menos dinheiro, um maior percentual de seus ganhos vai para as loterias. Isto faz da loteria uma forma de atividade que empobrece em vez de enriquecer. Como os jogos são promovidos pelo próprio Governo e tantos recursos acabam indo para o próprio Governo, não é de se admirar que haja tanto incentivo para que se jogue mais e mais, e assim se promove uma prática lesiva ao povo. Em Mateus 7.12, Jesus diz: “Portanto, tudo o que vós quereis que os homens vos façam, fazei-lho também vós, porque esta é a lei e os profetas”. Ao casar dinheiro, neste caso, eu deveria desejar que todos ganhassem e eu perdesse.

Apesar de o Brasil ser tradicionalmente conhecido como o país do carnaval, ele era proibido para os Batistas. Não só a participação, mas até mesmo assistir na televisão. O carnaval, em latim carnevale, significava um tempo de orgias e festas na Roma antiga. Durante o carnaval, o culto à sensualidade de homens e mulheres é um convite para o pecado, para desejar a mulher do próximo, para contaminar o corpo, sagrado para Deus, com bebidas alcoólicas e luxúria. “Porque vós, irmãos, fostes chamados à liberdade. Não useis então da liberdade para dar ocasião à carne, mas servi-vos uns aos outros pelo amor.”- Galátas 5:13,24

Aprendi também que era pecado adorar imagens de qualquer espécie! “Então falou Deus todas estas palavras, dizendo: Eu sou o Senhor teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão. Não terás outros deuses diante de mim. Não farás para ti imagem esculpida, nem figura alguma do que há em cima no céu, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra. Não te encurvarás diante delas, nem as servirás; porque eu, o Senhor teu Deus, sou Deus zeloso, que visito a iniqüidade dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração daqueles que me odeiam, e uso de misericórdia com milhares dos que me amam e guardam os meus mandamentos.” (Êxodo 20:1-1). Os Batistas repudiavam a fé Católica por sua adoração às imagens. Eu nunca deveria entrar numa Igreja Católica e, se por alguma razão tivesse de ir, deveria olhar para as imagens não com um sentido de adoração, pois seria pecado, mas como esculturas, obras de arte, manifestações culturais, ídolos de barro. Então, ‘correr’ atrás de doces de São Cosme e Damião, nem pensar! São ídolos de barro! Nem mesmo aceitar os saquinhos com doce eu podia!

Também não era permitido comemorar o Natal, o que me deixava chateado, pois via meus coleguinhas ganharem presentes, e eu não. O presépio continha imagens de ídolos de barro para adoração, o que era considerado pecado. Além disso, não havia referências bíblicas sobre o dia 25 de dezembro como a data que nasceu Jesus. Na verdade, a data de 25 de dezembro já era velha conhecida da humanidade desde o primórdio da civilização. Vários povos antigos do hemisfério norte celebravam, no fim de dezembro, o solstício de inverno (noite mais longa do ano). A partir daquela data, o Sol começava a ficar cada vez mais tempo no céu e eles comemoravam, portanto, o ‘renascimento’ do Sol, que nos aquece e garante luz. Era o pretexto para comilanças homéricas, que duravam dias e homenageavam deuses ligados à fertilidade. Os babilônios faziam festa para o deus Sol. Os Persas, para Mithra. Os Egípcios, para Osíris. Os Gregos para Dionísio. E os romanos esbaldavam-se nas saturnais, festanças em homenagem ao deus Saturno. Para não entrar em conflito com todas estas tradições milenares, a igreja cristã, da época, então a religião oficial do Império Romano, por volta do século 4 depois de Cristo, escolheu a data de 25 de dezembro. Para os Batistas, comemorar o nascimento de Cristo não fazia o menor sentido, pois o importante era comemorar a sua Ressurreição, que confirmava a condição de filho de Deus.

Lembro que cantávamos “Cuidado olhinho com o que vê, cuidado boquinha com que o que fala, cuidado mãozinha onde pega, cuidado pesinho onde pisa, o Salvador do Céu está olhando para você, cuidado olho, boca, mão e pé!” Foi um período muito importante em minha formação de valores, mas tenho de reconhecer que foi um mau começo na construção da minha idéia de deus. Construí na minha imaginação uma idéia de um deus rancoroso, vingativo e cruel, um velho com longas barbas brancas, e que vestia um roupão igualmente branco, morava no céu, vivia cercado de anjos e que sentava num trono de rei, com um enorme livro à sua frente, onde anotava os meus pecados! Eu achava que tinha muitos pecados, principalmente bater no meu irmão menor, dizer palavrões, roubar goiabas na árvore do vizinho… Quando orava a Deus, jurava que não iria mais pecar, e, como não conseguir cumprir as promessas, já me imaginava sendo enviado ao inferno para ser queimado vivo por toda a eternidade, como minha mãe deve ter sido queimada no episódio do incêndio no Armazém do meu pai!

Quando meu pai me batia, por qualquer motivo fútil, questionava esse deus que considerava pecado maldizer o pai, mas deixava que ele fosse violento comigo! Não tinha com quem conversar sobre aqueles assuntos, e me sentia abandonado pelo próprio Deus! Desde muito cedo tive de lidar muito mais com as minhas dúvidas que com minhas certezas. Até que compreendi que aquele deus que me fizeram acreditar era uma obra da imaginação humana! E se existisse um Deus verdadeiro, certamente seria bem diferente desse deus de mentirinha!

Os livros “A Criação e a Ação Humana” e “Deus Existe?”, ambos editados pela Paulus, reúnem algumas de minhas reflexões deste período, onde me dedico não a falar de um Deus de verdade sobre o qual me declaro incompetente para compreender. Entretanto, isso não me impediria de denunciar o ‘deus de mentira’ criado à imagem e semelhança dos homens, por arrogância intelectual ou para preencher seus vazios espirituais ou a ausência da graça da fé num Deus verdadeiro!

Não se encontra a compreensão da divindade pela razão, mas pela fé. Então, a fé não tem de ser aprovada pela razão, nem condicionada a ela. Primeiro a gente acredita e depois a razão surge para iluminar o conhecimento da realidade. E, como este conhecimento nos chega através dos sentidos, a visão, a audição, o olfato, o paladar e o tato, e como estes sentidos nos enganam freqüentemente, então a nossa compreensão da realidade também poderá nos enganar. Entretanto, existem muitas perguntas para as quais nossa inteligência, estimulada pelos sentidos, não consegue obter respostas! Por exemplo, o que Deus quer e não quer de nós? Qual o propósito de sua Criação? Por que admite o mal, a fome, a miséria, a crueldade, a violência? Por que mesmo sabendo que cometeremos um mal qualquer não intervém antes, como qualquer pai humano faz com um filho, para protegê-lo até que tenha capacidade para fazer escolhas adequadamente, sabendo sobre os ônus dessas escolhas? Se Deus criou tudo, então criou também o Diabo, ou permitiu que o diabo se criasse, ou se formasse? E por que fez isso, ou permitiu isso, se é amor e só quer o bem? E se criou, ou permitiu, em que momento fez isso, já que o diabo estava lá no paraíso, onde assumiu a forma de serpente e parecia bem à vontade para influir e alterar a obra de Deus? Por que, sendo um Deus que tudo sabe e tudo vê, admitiu a presença do Diabo no Paraíso? Por que deixou que o Diabo, assumisse a forma de uma serpente para tentar a natureza humana se Ele já sabia que Adão e Eva eram frágeis e despreparados para fazer escolhas e assumir com os ônus, primeiro por que não nascemos sabendo escolher e este será um aprendizado para a vida inteira, segundo, por que, vivendo num paraíso, onde o mau não existia, Adão e Eva não tinham como exercitar a capacidade de fazer escolhas? Qualquer pai humano sabe que se não tutorar as decisões de seus filhos e filhas quando pequenos eles não saberão escolher o melhor para si próprios! Podem escolher brincar em vez de estudar, comer doces antes da hora do almoço ou trocar a guloseima pela refeição! Então, se Deus que tudo sabe, sabia que Adão e Eva não tinham capacidade para fazer escolhas, por que deixou que sucumbissem à tentação do Diabo, se já sabia dos resultados, se já sabia que eles não teriam a menor chance diante da tentação? Se Deus não protegeu Adão e Eva deles próprios, por que faria isso por mim, por exemplo, quando faço escolhas pensando que serão boas para mim e resultam num desastre, ou quando o Diabo se aproveita desse meu desconhecimento do futuro ou das conseqüências para influenciar em minhas escolhas? Se ao Diabo é permitido influenciar em minhas escolhas para o mau, por que para Deus não é permitido influenciar em minhas escolhas para o bem? Por que para o diabo é permitido não respeitar nosso livre arbítrio, pois age em nossas escolhas para mal, mas Deus deve respeitar e nos deixar refém das forças do mal sem a necessária oposição das forças do bem? Então, quem é que manda mais, Deus ou o Diabo? Pela vontade de Deus, o paraíso continuaria sendo o paraíso. Mas o Diabo foi lá e mudou os planos de Deus, com o conhecimento e o consentimento Dele, que tudo sabe e tudo vê. Por que Deus deixou que o Diabo nos usasse para alterar seus planos de um paraíso perfeito que criou para nós? Qual foi o propósito de Deus a admitir tal interferência em sua Obra? O fato é que este mundo onde vivemos e como o conhecemos, de dores e sofrimentos, mas também de alegrias e felicidades só se tornou possível por que Adão e Eva foram expulsos do Paraíso!

A verdadeira fé não deveria se opor à razão, não deveria ser irracional. Nicolau Copérnico mostrou que a terra girava ao redor do sol. Mais de cem anos depois, isso ainda era discutido, porque os espíritos ainda não haviam assimilado as provas de Copérnico, não tinham tido fé na revelação científica. Escreve Chesterton:

“A ameaça é que o intelecto humano tem a liberdade de destruir-se a si mesmo. Da mesma forma como uma geração pode evitar a existência da geração seguinte, se todos entrarem para um convento, ou se atirarem ao mar, também um grupo de pensadores pode, de certo modo, evitar que, no futuro, se pense, ensinando às gerações vindouras que o pensamento humano não tem valor algum. É sempre inútil falar da alternativa entre a razão e a fé. A razão já é de per si uma questão de fé. É um ato de fé afirmar que os nossos pensamentos têm qualquer relação com a realidade. Quem for meramente cético acabará, mais cedo ou mais tarde, perguntando a si mesmo: “Por que é que alguma coisa está certa, quer seja uma simples observação ou uma dedução? Por que é que a boa lógica não é tão falaz como a má lógica, se ambas são meros movimentos do cérebro de um macaco desnorteado?” O novo cético diz: “Eu tenho o direito de pensar para mim”. Mas o velho cético, o cético completo, dirá: “Eu não tenho o direito de pensar para mim. Não tenho direito absolutamente algum de pensar”. Todo o pensar é um ato de fé. O nominalismo desconfiou do conceito universal que associa coisas de uma mesma espécie, mostrando que a mente precisa de elementos que vem dela mesma para pensar a realidade. E estes elementos são aceitos numa espécie de fé no bom senso do pensamento. H. G. Wells, no século XX, fiel aos princípios do nominalismo e do ceticismo do século XV, insiste em afirmar que cada coisa separada é “única” e que não existem categorias. Isso também é meramente destrutivo. Pensar significa ligar as coisas e o pensamento pára se não puder estabelecer tais conexões. É desnecessário dizer que essa espécie de ceticismo, proibindo o pensamento, proíbe, forçosamente, a fala, e ninguém poderá abrir a boca sem contradizê-lo. Assim, quando Wells diz que “todas as cadeiras são completamente diferentes”, faz não só uma afirmação falsa, mas também contraditória. Se todas as cadeiras fossem diferentes, nunca poderíamos chamar-lhes “todas as cadeiras”. A razão acompanha a religião porque ambas são da mesma natureza primária e autoritária. Ambas são métodos de prova não prováveis em si mesmos. E ao destruirmos a idéia da Autoridade Divina, destruímos, em grande parte, a idéia daquela autoridade humana por intermédio do qual fazemos uma conta de dividir”.

A única resposta que consegui encontrar para tantas questões é que eram mistérios que permaneceriam mistérios enquanto eu fosse honesto comigo mesmo e reconhecesse minhas limitações em pretender compreender com tão poucos recursos e inteligência algo que está além de minha compreensão. Caso eu continuasse tentando, correria o risco de ficar como aqueles gatinhos que correm atrás do próprio rabo sem conseguir alcançar, e só quando desistem de lutar, e resolvem seguir a vida, descobrem que o rabo os segue, sem esforço, para onde forem. Então, tive de fazer uma escolha em relação a estes mistérios. Ou continuava insistindo, e correria o risco de acabar inventando respostas de conveniência, para atender à arrogância de minha inteligência, ou à minha necessidade de dar sentido à minha vida e existência, ou seguia minha vida de maneira correta, aproveitando os ensinamentos da Bíblia, como um livro muito inspirado e cheio de sabedorias, de onde eu deveria extrair tudo o que fosse útil e importante para a minha vida, como uma abelha que colhe o néctar de diferentes flores para fabricar o mel.

Quanto à minha culpa de desistir de tentar compreender tais mistérios, li em Efésios 2:8, “Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus”, e aceitei o fato de que a capacidade para ter fé não nasce comigo, mas é uma decisão do próprio Deus e parecia-me óbvio que sem essa ajuda divina, e com os meus poucos recursos intelectuais, dificilmente eu conseguiria compreender algo tão maior que eu. Em São Gregório Magno aceitei esta minha incapacidade de compreensão quando ele diz que “todo aquele que estuda para chegar à iluminação, à contemplação do sagrado, devia começar perguntando a si mesmo quanto ama. Pois o amor é a força motriz da mente, que o tira do mundo e o inspira para o alto.” A partir de então, questionar a existência ou não existência de Deus ou do Diabo pareceu-me um esforço fadado ao fracasso, e, pior, se continuasse tentando, poderia distorcer a verdade para atender a meus propósitos ou necessidades. Então decidi viver a minha vida de forma a que eu me ‘elevasse’ a ponto de me tornar digno de um Deus, qualquer que fosse, e não por Ele, mas por mim próprio e pelos que eu conseguisse amar e fazer feliz neste mundo e, por outro lado, me mantivesse afastado do diabo existisse ou não, fosse quem fosse.

O apóstolo Paulo, em 1Tim 6,18 recomenda que “se façam ricos em boas obras” . E ainda: que “Deus retribuirá a cada um segundo suas obras” (Rom. 2, 6). E completa o apóstolo Tiago 2:24 “o homem é justificado pelas obras e pela fé” porque a “fé sem obras é morta” (17)!

“Falar sobre o futuro só é útil se levar à ação agora. E o que podemos fazer agora, enquanto ainda estamos em condições de afirmar que ‘a vida nunca foi tão boa’? (…) Cem gramas de prática geralmente valem mais do que uma tonelada de teoria.” – E.F. Schumacher

Então, se eu não tinha sido contemplado com a graça de uma fé sem dúvidas, pelo menos podia me dedicar às boas obras. E aí, se Deus não existisse, não seria perda de tempo orientar minha vida pelo caminho do bem e do amor. Em Lucas , aprendi que “do mesmo modo como quereis que os homens vos tratem, tratai vós também a eles”. Pareceu-me um conselho prático e honesto para com os outros e para contribuir para fazer deste mundo um lugar melhor, independente de deuses e de diabos.

Caso contrário, se realmente existisse um Deus, Ele seria um Deus de amor, conforme afirma a Bíblia em 1 Jo 4, 16: “Deus é amor, e quem permanece no amor permanece em Deus e Deus nele”. E, claro, então Ele me compreenderia.

Na Bíblia, declaro minha preferência pelo Eclesiastes, escrito pelo Rei Salomão, ou por alguém inspirado que viveu em sua época, onde ressalta a importância de se viver bem a vida, aqui e agora. “Portanto, vá, coma o seu pão com alegria e beba o seu vinho com satisfação, porque com isso Deus já foi bondoso para com você. Que suas roupas sejam brancas o tempo todo, e nunca falte perfume em sua cabeça. Goze a vida com a esposa que você ama, durante todos os dias da vida fugaz que Deus lhe concede debaixo do sol. Essa é a porção que lhe cabe na vida e no trabalho com que você se afadiga debaixo do sol. Tudo o que você puder fazer, faça-o enquanto tem forças, porque no mundo dos mortos, para onde você vai, não existe ação, nem pensamento, nem ciência, nem sabedoria.” (9:10) Eclesiastes me ensinou que a melhor coisa que podemos ter da vida é o prazer de viver! E que não devemos nos preocupar demais com minúcias do que pode ou não acontecer, por que nunca conseguiremos dominar todas as contingências da vida! Eclesiastes ensinou-me, ainda sobre o que realmente deve importar nessa vida: conservar as amizades e dedicar tempo a conversar e cuidar das pessoas que estão à nossa volta. “Então, considerei outra vaidade debaixo do sol, isto é, um homem sem ninguém, não tem filho nem irmã; contudo, não cessa de trabalhar, e seus olhos não se fartam de riquezas; e não diz: Para quem trabalho eu, se nego à minha alma os bens da vida? Também isto é vaidade e enfadonho trabalho. Melhor é serem dois do que um, por que têm melhor paga do seu trabalho. Porque se caírem, um levanta o companheiro; ai, porém do que estiver só; pois, caindo, não haverá quem o levante. Também, se dois dormirem juntos, eles se aquentarão; mas um só como se aquentará? Se alguém quiser prevalecer contra um, os dois lhe resistirão; o cordão de três dobras não se rebenta com facilidade” (4:7-12).

Cicatrizes

“A vida me deu mais do que pedi e mais do que mereci. Aliás, prefiro sempre falar da vida com olhos de esperança. Meus planos, afinal, são viver, ou seja, escrever, rir, amar.” – Jorge Amado

A vida me deu muito mais do que sonhei e quando ela me fez sofrer, foi para permitir que eu amadurecesse! Cada minuto valeu a pena, e aceito com generosidade minhas cicatrizes, pois assim como as carrego no corpo físico por conta de uma vesícula que tive de extrair por volta dos 35 anos – e isso não me impede de viver e ser feliz -, também as carrego na alma. Quando sinto aquela tristeza sem causa aparente, procuro identificar tais cicatrizes e os sentimentos que elas provocam e não as deixo que me faça sofrer ainda mais do que os fatos que as geraram já fizeram.

Muitas vezes temos à nossa mão tudo o que precisamos para ser felizes, mas, insatisfeitos, sempre estamos à busca de mais alguma coisa que falta. Nossos desejos devem ser generosos e incluir os que ainda dependem de nós, mas na medida de nossas forças e possibilidades. Devemos nos esforçar sinceramente para fazer tudo o que estiver ao nosso alcance, e não tudo o que preciso ser feito, pois devemos ter a humildade de reconhecer que existem problemas que foram criados por sucessivas gerações ou por milhares de pessoas, e não será uma pessoa, por mais bem intencionada que esteja, que conseguirá assumir para si ou seu pequeno grupo, sozinha, as dores do mundo. Muito menos devemos assumir para nós, mesmo que o consigamos suportar, os fardos de outras pessoas, especialmente das que nos são próximas, pois cada um deve ser capaz de assumir os riscos e os perigos dessa vida, responsabilizando-se pelos seus atos, caso contrário só irá gerar mais sofrimento inútil e não irá adquirir o necessário aprendizado moral que forja os bons seres humanos.

O que mais podemos querer? Um mundo melhor, onde a idéia de não-violência seja mais que uma promessa, mas uma possibilidade concreta. E que não seja apenas uma idéia bem aceita para os que admiramos ou conseguimos tolerar, mas inclua também – e principalmente – os que nos são indiferentes, e mais os nossos inimigos e adversários. Por mais ingênuo e arriscado que seja, e efetivamente é, é preferível viver num mundo em que – coletivamente – acreditamos que todos são bons, generosos, honestos até que – individualmente – nos provem do contrário e nos obriguem a nos defender e tomar providências.

E que a idéia de não-violência seja mais ampla, e inclua os que não são semelhantes, os animais e o próprio planeta. E que esses novos compromissos sejam mais que palavras, e se confirmem em atos concretos.

Mesmo imperfeitos, precisamos seguir


Aumenta dia a dia o número de pessoas preocupadas com o meio ambiente, e muitas vão além da boa intenção e da simples reclamação e estão agindo, colocando a mão na massa em ações concretas, o que renova nossa esperança de que a espécie humana ainda terá chances de sobrevivência. O problema é que, apesar de mais e mais pessoas estarem conscientes e mais ativas, ainda permanecem enfraquecidas em sua capacidade de fazer pressão e defender os seus direitos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.Um dos motivos desse enfraquecimento nasce da falsa idéia de que para defender a natureza temos de ter conhecimentos técnicos. A cidadania ambiental não requer capacitação, não é um atributo apenas para especialistas. Claro que capacitação e conhecimentos técnicos ajudam e muito, por que a questão ambiental é de enorme complexidade, entretanto, as pessoas podem – e devem – estabelecer parcerias entre si para complementar suas limitações. Qualquer pessoa que toma consciência da crise ambiental e resolve agir pode ser considerado um cidadão ambiental, seja criança, jovem, adulto ou idoso, empregado ou empregador, analfabeto ou doutor. Nos Clubes de Amigos do Planeta, por exemplo, conheci crianças mais comprometidas e mais ativas que muitos adultos e professores, também conheci pessoas analfabetas ou sem qualificação técnica inteiramente comprometidas com a defesa do meio ambiente, assim como conheci pessoas altamente qualificadas, mas indiferentes à crise ambiental.

Outra falsa idéia que contribui para a desmobilização da sociedade é de que existem ações ambientais mais importantes que outras. As pessoas esquecem que não existe um único tipo de ação ambiental. Tem cidadãos e cidadãs que escolhem agir na defesa da fauna, da flora, defendem a criação de parques e reservas, combatem o desmatamento e o tráfico de animais silvestres, lutam pela defesa dos animais domésticos, etc. Outros preferem agir no ambiente de trabalho, associando cidadania ambiental com exercício profissional, adotando técnicas de ecoeficiência, controlando melhor os processos e resíduos, reciclando e reaproveitando materiais, etc. Outros, ainda, agem nos aspectos sociais da questão ambiental, defendendo os mais pobres e excluídos, os povos tradicionais, os indígenas, os operários que se contaminam no ambiente do trabalho, etc. Não são ações antagônicas. Muito pelo contrário, são complementares, pois a questão ambiental é de tamanha complexidade que nenhuma corrente de pensamento e ação, por mais poderosa que seja, conseguirá dar conta sozinha da enormidade da tarefa.

Não é verdade que a luta pela fauna e flora, ou pelos animais domésticos, seja menos importante que outras lutas ambientais. Graças à biodiversidade e aos ciclos da natureza recebemos oxigênio e descartamos gás carbônico, encontramos alimentos e remédios, temos acesso à água e a recursos naturais fundamentais para nossa sobrevivência.

Também não é verdade que seja desprovido de mérito a ação ambiental de empresas e profissionais em busca da sustentabilidade nos processos industriais, da gestão ambiental ecoeficiente, etc. Assim como dependemos da natureza também dependemos do setor produtivo que transforma recursos naturais em bens de consumo para atender as necessidades das pessoas. Infelizmente, sérias distorções no modelo econômico, motivado pela ganância, têm gerado concentração de renda e corrupção, que por sua vez resultam em miséria, pobreza, violência.

Tão importante quanto à preservação da natureza e a ecoeficiência nas empresas é ainda a luta de cidadãos e de organizações por justiça social e melhor distribuição de riquezas, especialmente naqueles segmentos da sociedade que dependem do meio ambiente preservado para sua subsistência, como os pescadores, agricultores, e também os indígenas, entre outros. Nossa espécie também faz parte da Natureza. A pobreza, a fome, a violência, extinguem seres humanos.

É preciso reconhecer que o fato de nos tornamos mais conscientes dos problemas ambientais não nos torna também mais democráticos, fraternos, justos. Existem pessoas devotadas sinceramente à causa ambiental, mas que permanecem arrogantes, autoritárias, tramam umas contra as outras, infelizmente. Os motivos podem ser vários, desde culpa pelo tempo em que estiveram indiferentes antes de tomar consciência da questão ambiental, ou pelo sentimento de urgência, ou por interesse de aparelhamento partidário, ou por que pretendem obter visibilidade para si ou para sua organização, ou por inveja mesmo, etc. Apesar disso precisamos seguir em frente, pois a crise ambiental não pode esperar até que nos tornemos seres humanos melhores.

É possível ser feliz – mas não é fácil

“Há pessoas que perdem a saúde para juntar dinheiro e depois perdem o dinheiro para recuperar a saúde. Por pensarem ansiosamente no futuro, esquecem o presente de tal forma que acabam por nem viver no presente nem no futuro. Vivem como se nunca fossem morrer e morrem como se nunca tivessem vivido”. – Confúcio ( 551 e 479 a.C.)

Quando queremos fazer alguma coisa bem feita, como cozinhar um alimento, por exemplo, precisamos nos planejar antes, ter todos os ingredientes à mão, nos assegurar do modo de fazer, da condição do fogão, etc. Na vida não é muito diferente. A felicidade não é obra do acaso, mas depende de uma série de fatores, entre eles, ter objetivos razoáveis, possíveis de serem alcançados, compatíveis entre si, e a determinação de persegui-los de forma consciente e de coração aberto às novas possibilidades, mas sempre lembrando que não há vida perfeita, felicidade perfeita, assim, devemos considerar como natural e razoável uma certa margem de erro e de incapacidade em alcançar os objetivos.

Procuro extrair qualidade de vida em cada momento, desde no cuidado com a alimentação, no respeito às horas necessárias de sono, na presença de uma boa música, em evitar engarrafamentos e barulho, no uso racional da televisão que tende a ocupar todo o nosso tempo livre e ainda gerar o entorpecimento dos sentidos e dos valores. Também valorizo e me esforço em manter minha casa e o lugar onde vivo e trabalho sempre limpo, organizado, perfumado, para que eu tenha prazer em voltar sempre e me sentir em paz e protegido.

Busco a coerência entre o meu pensamento, meu discurso, minhas emoções e minha prática, mas, sobretudo, me aceito como sou, com capacidades e limitações, como qualquer outro ser humano. Recuso estereótipos ou preconceitos sobre como um homem ou uma mulher devem agir e procuro ser eu mesmo. Nem exijo de mim mais do que sou capaz de dar. Não me comparo com outros. Não exijo de mim que tenha de vencer sempre. Só tenho que ser feliz e fazer o melhor que tiver ao meu alcance.

Continuo empenhado e acreditando no trabalho voluntário pois se temos a consciência de que o mundo precisa melhorar, nada mais coerente que nos empenharmos nessa melhoria, mas na medida de nossas possibilidades e limites, e não das necessidades de tudo o que precisa ser feito. Não penso que estou ajudando apenas o mundo, mas a mim próprio, sentindo-me útil e valorizado.

Hoje escolhi ser feliz

“Esqueça, de uma vez por todas, que você é imprescindível. No trabalho, em casa, no grupo habitual. Por mais que isso lhe desagrade, tudo anda sem a sua atuação, a não ser você mesmo.”- Guerdjef

Estou no meio da semana, mas resolvi desligar o despertador mesmo assim, para acordar naturalmente no dia seguinte, apenas quando não sentisse mais sono. Quando acordei, em vez de fazer como todos os dias, levantar logo e me preparar para mais um dia de trabalho, resolvi ficar na cama mais um pouco, fazendo preguiça.

O primeiro sentimento que tive de bloquear foi o de culpa, por chegar atrasado a algum compromisso, ou decepcionar pessoas já desde cedo envolvidas em seus afazeres. Resisti. Continuei na preguiça, sentindo o calor do colchão, a maciez do travesseiro.

Sem perceber, minha mente foi sendo invadida por pensamentos sobre problemas reais e imaginários, e normalmente começaria a organizar o dia, o que fazer primeiro, para quem ligar, que contas pagar ou não pagar, aonde ir. Resisti novamente e espantei tais pensamentos para me concentrar no canto de um bem-te-vi que fez ninho no coqueiro perto de minha janela.

Então resolvi levantar, mas, em vez de me arrumar ligeiro, como todos os dias, para o trabalho, abri as cortinas e a janela e fui saldado pelo sol de uma manhã de inverno, senti um ventinho frio em meu rosto. Senti vontade de espreguiçar, todos os músculos, lentamente, e enquanto me espreguiçava, ouvia os pássaros, o balançar do coqueiro, a luz prateada do sol nas folhas do coqueiro.

Então decidi que não estava pronto para o trabalho. Vesti uma roupa mais leve e saí para caminhar naquela manhã ensolarada, sem rumo, sem culpa, sem metas, talvez para chegar só até a esquina e parar para ficar conversando com os vizinhos, ou então ir mais além e sentar num banco da praça para ver as crianças brincando, e pegar uma carona no olhar delas, na maneira despreocupada com que brincam, e criam e resolvem seus conflitos, e gritam, pulam, correm de um lado para o outro para não chegar a lugar algum, só por alegria e brincadeira!

Entretanto, naquela manhã todos pareciam muito ocupados em seus afazeres, e não havia vizinhos interessados em conversar, nem crianças brincando na praça. Então continuei caminhando, sem pressa, e logo cheguei até a praia. Em vez de ir pelo calçadão, resolvi seguir descalço na areia, junto ao mar, prestando atenção no som ritmado das ondas para que minha mente não fosse invadida novamente por problemas, soluções, prioridades, emergências.

Vi um grupo de pescadores puxando com alguma dificuldade uma rede para a praia e resolvi ajudar. Surpresa! Pegaram muitos peixes. Estavam contentes. Fiquei contente por eles. Resolvi continuar o meu caminho, e me despedi deles. Rapidamente colocaram uma boa quantidade de peixes numa sacola e me ofereceram, o que recusei prontamente, pois não ajudei para ganhar peixes em troca, e não tinha a menor intenção de carregar sacolas naquele momento, muito menos de peixes! Já estava satisfeito por ter ganhado a oportunidade de compartilhar daquele momento especial. Mas os pescadores fizeram questão. Disseram ser uma tradição compartilhar o resultado de uma boa pescaria com quem ajudou a pescar e que se eu não os aceitasse poderiam ter dificuldades nas próximas pescarias. Então aceitei, para agradar a eles. Mas realmente, carregar a sacola, e pesada, não estava em meus planos. Então levei o meu presente até um quiosque próximo e presenteei ao comerciante. Ele não queria receber, pois achava que eu estava querendo vender. Expliquei que era uma doação. Aí ele aceitou e me disse que passasse mais tarde ali que ele iria preparar e me ofereceria uma porção. Meu almoço ficou garantido.

Voltei para casa, tomei um banho e aí, sim, fui trabalhar. Descobri que a felicidade não se mede em quanto tenho de dinheiro no bolso.

Dediquei aquela manhã ao amigo poeta e jornalista Rafael Pimenta, editor do Jornal Enseada, assassinado com um tiro nas costas durante um assalto, no bairro São Francisco, em Niterói. Estava num dos momentos mais produtivos de sua vida, maduro, cheio de sonhos e projetos.

SOBRE O AUTOR

“Eis um teste para saber se você terminou sua missão na Terra: se você está vivo, não terminou.”- Richard Bach

Vilmar Sidnei Demamam Berna é gaúcho, nascido em 11/10/1956, em Porto Alegre (RS) e vive em Jurujuba, Niterói (RJ), em frente à Baía de Guanabara, numa comunidade de pescadores artesanais.

Por sua luta constante pela formação da cidadania ambiental planetária foi reconhecido pelas Organizações das Nações Unidas – ONU, em 1999, no Japão, com o Prêmio Global 500 Para o Meio Ambiente. Em 2002, recebeu o título de Cidadão Niteroiense e, em 2003, o Prêmio Verde das Américas, entre outros.

Participou da fundação de várias organizações da sociedade civil, sem fins lucrativos, dedicadas às lutas por um mundo melhor, mais ecológico, pacífico e democrático, entre as quais se destacam a UNIVERDE, em 1980, em São Gonçalo (RJ), os Defensores da Terra, em 1984, na Cidade do Rio de Janeiro, e mais recentemente a REBIA – Rede Brasileira de Informação Ambiental, em Niterói (RJ).

Fundou e colabora voluntariamente na edição da Revista do Meio Ambiente e do www.portaldomeioambiente.org.br distribuídos gratuitamente com o objetivo de contribuir na formação de uma nova consciência ambiental e na cidadania ambiental em nossa sociedade.

www.escritorvilmarberna.com.br