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Caça às baleias tem duvidosos benefícios para a Islândia

Dois barcos de caça de baleias rorquais comuns no porto de Reikjavik prestes a zarpar. Foto: Lowana Veal/IPS
Dois barcos de caça de baleias rorquais comuns no porto de Reikjavik prestes a zarpar. Foto: Lowana Veal/IPS

 

Reikjavik, Islândia, 20/8/2014 – Os caçadores das baleias rorquais comuns da Islândia enfrentam no último ano crescente rejeição à sua atividade. Apesar disso, os baleeiros zarparam novamente em meados de junho para sua primeira caça do verão boreal. No dia 14 deste mês, já haviam capturado 80 exemplares. O que ocorre com estas baleias uma vez que chegam à Islândia é, em parte, um mistério.

O que se sabe é que as baleias rorquais (Balaenoptera physalus), também conhecidas como baleias aladas, são esquartejadas. Mas onde a carne é vendida? Quanto dinheiro rende a atividade para a economia nacional? Seus custos superam os ganhos?

Toda carne de baleia é enviada para o Japão, o principal mercado da Hvalur hf, única companhia islandesa que caça esse tipo de baleia. Porém, esta companhia encontra grande resistência para transportá-las e teve que contratar um barco para fazer exclusivamente esse transporte , o que, sem dúvida, implica um custo adicional. A IPS pôde confirmar o destino final da carne de rorqual enviada ao Japão no começo deste ano.

Dois meses depois de chegar ao território japonês, uma fonte desse país consultada pela IPS, que pediu anonimato, declarou: “Um colega me contou que a gordura de baleia ainda estava em câmaras frigoríficas na aduana de Osaka”. A embaixada do Japão em Reikjavic reconheceu que pelo menos alguma carne de rorqual é vendida em seu país, mas as cifras reais não estão disponíveis.

No começo deste ano, um conjunto de organizações ambientalistas e defensoras dos animais da América do Norte começaram a pressionar as companhias da região para deixarem de comprar pescado da empresa islandesa HB Grandi, por seus vínculos com a Hvalur hf. Quase imediatamente, a companhia canadense-norte-americana High Liner Foods declarou que não compraria mais pescado da HB Grandi. Outras seguiram seus passos, entre elas a rede de alimentos Whole Foods dos Estados Unidos.

Os ativistas também pediram ao presidente norte-americano, Barack Obama, que use a Lei Pelly, que permite estabelecer um embargo sobre parte ou toda a produção pesqueira de países cujas ações ignorem um tratado de conservação. Neste caso trata-se do Convênio Internacional para a Regulamentação da Caça de Baleias. Obama decidiu aplicar a lei, mas até agora mediante uma ação diplomática e não econômica. Washington não convidou a Islândia para a conferência internacional Nuestro Oceano, organizada pelos Estados Unidos em junho.

Além do conhecido Acordo Pelly, também existem a emenda Packwood-Magnuson e a Lei de Gestão e Conservação Pesqueira Magnuson-Stevens, que habilita o presidente a impedir que uma frota estrangeira pesque em águas jurisdicionais dos Estados Unidos se considerar que o país envolvido diminuiu a efetividade de um programa de conservação internacional.

Em 1984, Islândia e Estados Unidos assinaram um acordo pelo qual o primeiro obteria permissão de pesca em águas norte-americanas se concordasse em deter a caça de baleias. Por várias complicações, e apesar de a Islândia ter deixado de caçar baleias em grande escala em 1986, não pôde pescar em águas dos Estados Unidos até 1989 e só foram algumas poucas toneladas.

Na última primavera boreal, a parlamentar Sigridur Ingibjorg Ingadottir, da Aliança Social Democrata, de centro-direita, e outros sete legisladores da oposição apresentaram uma resolução que ordena investigar as repercussões econômicas e comerciais da caça de baleias para a Islândia.

Não houve tempo para discutir a iniciativa na sessão parlamentar que acabou em maio, mas Ingadottir revisa e atualiza a proposta para apresentá-la na sessão que começará no final de setembro. “Há duas questões principais na proposta. Uma tem a ver com os interesses comerciais e econômicos do país, e a segunda com a imagem da Islândia em nível internacional”, explicou à IPS.

Segundo um informe publicado em 2010, entre “1973 e 1985, quando a Hvalur hf caçava baleias em grande escala, o processamento de baleias representava 0,07% do produto interno bruto. Mas não se conhece o aporte propriamente dito da atividade para a economia”. Estes números não incluem a baleia bicuda. Ingadottir, economista de profissão, considera que a cifra é muito baixa. “Naquela época, a caça de baleia era toda uma indústria e praticada de forma sistemática. Desde então apareceram diversas grandes empresas industriais e comerciais, por isso é provável que a cifra seja maior”, ressaltou.

Gunnar Haraldsson, diretor do Instituto de Estudos Econômicos da Universidade da Islândia e um dos autores do informe, apontou à IPS que “o problema é que não há dados oficiais dos ganhos deixados pelo avistamento de baleias e por vários outros parâmetros, sendo necessário coletar esses dados específicos. Assim, devemos realizar um novo estudo se quisermos saber realmente quais são os ganhos (e os custos)”.

A organização Whale Watching floresceu nos últimos anos e pelo menos 13 companhias organizam avistamentos de cetáceos. Entre 2012 e 2013, houve 45 mil novos interessados na atividade, e chegaram a ser cerca de 200 mil pessoas ao ano.

Três parlamentares pediram uma investigação sobre a caça de baleias no outono boreal de 2012. Depois disso foi criada uma comissão para controlar a organização e seus argumentos para a caça de baleias, mas deu em nada. “A comissão nunca foi dissolvida, mas tampouco se reuniu desde que assumiu o novo governo” (em maio de 2013), afirmou à IPS Asta Einarsdottir, do Ministério de Indústria e Inovação.

Einarsdottir explicou que a comissão era bastante grande e incluía representantes dos setores de conservação e avistamento, bem como da indústria de caça de baleias e de vários ministérios. De forma paralela, o conflito baleeiro acabou prejudicando o cordeiro islandês, que, nos últimos anos, foi exportado para os Estados Unidos e vendido na rede de comércios Whole Foods sob o nome Cordeiro Islandês.

No ano passado, a empresa decidiu não comercializá-lo como islandês porque as atividades baleeiras do país lhe deram má reputação. Mas como não foi registrado o aumento de vendas esperado, foi preciso exercer uma forte pressão para convencê-los de que, de todo modo, continuassem vendendo a carne.

Ingadottir foi franca ao perguntar: “Estão prejudicando nossos interesses? Estão protegendo um pequeno grupo em lugar do interesse nacional? O que protegemos na realidade com a caça de baleias? A Islândia deverá encontrar razões muito boas para manter a caça de baleias”, enfatizou. Envolverde/IPS