Copa do Mundo 2014 no contexto escolar

 

Foto: Divulgaçãp/ Internet
Foto: Divulgaçãp/ Internet

Após 64 anos, o Brasil receberá pela segunda vez, em junho, a Copa do Mundo de Futebol – FIFA, competição que movimenta diversas nações desde a sua primeira edição, realizada no Uruguai, em 1930. Durante um mês, doze cidades brasileiras sediarão jogos do mundial, tendo sua rotina completamente alterada. Os efeitos do evento no dia a dia do brasileiro vêm provocando uma série de debates em esferas diversas. No campo da Educação, a pauta versa sobre como fomentar a reflexão sobre o campeonato na comunidade escolar e como utilizá-lo como base para ampliar o processo de aprendizagem em sala de aula.

Segundo Diana Mendes Machado da Silva, pesquisadora do Grupo Interdisciplinar de Estudos sobre Futebol – GIEF e do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisas sobre Futebol e Modalidades Lúdicas – Ludens, ambos da Universidade de São Paulo – USP, “o futebol é tema de interesse nacional há muitos anos e não pode estar fora da escola, pois se trata de uma prática cultural e histórica”. A especialista, que também já atuou como professora da rede pública de ensino, acredita que esta é uma oportunidade para que as escolas pensem em uma pequena reformulação do currículo, sem alterar as diretrizes básicas da educação. “Os temas futebol e Copa do Mundo abrem um leque variado para os mais diversos trabalhos, para além das atividades realizadas em sala de aula, por meio de datas específicas, temas transversais e projetos especiais. É possível incluir a temática do futebol no currículo convencional”, explica.

Segundo Silva, a temática poderia ser abordada não só nas aulas de Educação Física, mas também por professores de História, Geografia e Português. “A trajetória do futebol está arraigada na história do século 20. Ao mesmo tempo, este momento histórico permite trabalhar o processo de reurbanização de cidades como São Paulo e Rio de Janeiro a partir da perspectiva do futebol. Nas aulas de Português, o professor pode abordar o momento em que a imprensa passa a ter um papel preponderante para a opinião pública, também no início do século 20, utilizando crônicas jornalísticas de escritores como Coelho Neto, Lima Barreto, Nelson Rodrigues, Mario Filho e José Lins do Rego”, exemplifica a pesquisadora.

Entre outros importantes temas transversais passíveis de abordagem pelo educador, Silva cita a diversidade cultural e o racismo. “No momento em que todos os olhos estão voltados para o futebol, o jogo em si passa ser um modelo de prática social e política. Em um encontro de nações, a diversidade cultural é um ponto central e o racismo não é tomado como uma prática possível. Isto é exemplar porque ensina valores para crianças e adultos. O futebol tem essa noção de isonomia e igualdade, os jogadores entram em campo e o desempenho mostra quem é o melhor naquele momento. Isso independe da cor, da idade, se o país é rico ou pobre”, elucida.

Ainda de acordo com Silva, o trabalho de pesquisa inicial pode ser árduo, mas, após se aprofundar no tema, o professor poderá analisar como as dimensões do futebol se relacionam com as disciplinas e o seu cotidiano. “Não é preciso que o educador saia, necessariamente, do seu dia a dia de trabalho para abordar o tema da Copa, embora também seja possível mobilizar a escola em projetos transversais e paralelos, como o de uma minicopa do mundo, em que as turmas possam representar seleções e, nessa medida, países, desenvolvendo pesquisas sobre as nações envolvidas. Afinal, esse é um encontro de troca cultural muito rico”, conclui.

Acesso à informação, leitura e Copa

muralDesde 2012, a Escola Municipal Francisco Leite, localizada em Salvador (BA), participa do projeto Todos Rumo à Copa 2014, lançado pela Prefeitura de Salvador, em parceria com o Escritório Municipal da Copa – Ecopa. A iniciativa tem como objetivo aproximar professores e alunos do processo de preparação do mundial por meio de um mural com notícias sobre o tema, instalado na entrada da escola. “No mural, colocamos tudo que gira em torno da Copa do Mundo, como a construção dos estádios e as visitas da FIFA. As matérias jornalísticas são atualizadas mensalmente pela coordenadora e os professores leem o conteúdo para os alunos, que são incentivados a coletar reportagens”, conta a diretora da E.M Francisco Leite, Maria Adelma Conceição Lima.
No Projeto Político-Pedagógico – PPP da escola também foi especificado que, neste ano, serão trabalhados três eixos temáticos: saúde, esporte e cidadania. “Já iniciamos um estudo para a Copa com os alunos e, com isso, esperamos que eles pesquisem sobre o mundial de diversas formas. Estamos utilizando o livro Show de bola e cidadania, enviado pela Secretaria de Educação durante a Copa do Mundo da África do Sul, em 2010. Pegamos esse gancho para iniciar o projeto e passamos o material para os alunos do período noturno. Já no diurno, o professor de Educação Física desenvolveu um trabalho direcionado à Copa”, explica Lima.

Aprendizados linguísticos para o mundial

Instalado em São Paulo (SP), no distrito de Itaquera, local onde está sendo construído um dos estádios-sede da Copa do Mundo, o Centro de Estudos de Línguas – CEL da Escola Estadual Fadlo Haidar desenvolveu, no ano de 2012, o projeto Copa do Mundo: alunos do CEL em contexto profissional multilíngue. As atividades foram elaboradas com foco na capacitação dos alunos do CEL, para que eles possam atuar como agentes ativos no cenário do mundial, aproveitando as oportunidades que podem surgir na região por conta do preparo e realização do megaevento.

Segundo a coordenadora do CEL, Julieta Serra, o ponto de partida do projeto foi, justamente, a proximidade física do Centro de Línguas com o local em que será realizada a abertura do mundial, uma distância de, aproximadamente, 4 quilômetros. “A ideia era que os alunos aprofundassem o conhecimento da língua-alvo, partindo da necessidade real do momento da Copa. O projeto foi preparado durante seis meses, com a criação de uma página específica no site do CEL, na qual os alunos publicaram seus trabalhos. A página foi disponibilizada como fonte de pesquisa para que os turistas se informem sobre algumas expressões e sobre os principais pontos para visita na região”, conta.

O CEL oferece seis cursos gratuitos de idiomas e atende, atualmente, 1400 estudantes da rede estadual. De acordo com Serra, as atividades aproximaram os alunos da língua de estudo, além de inseri-los no próprio contexto da Copa do Mundo. “Deixamos claro para eles que algumas oportunidades de trabalho poderiam surgir na região e isso fez com que se empenhassem bastante. Em 2014, já com o site no ar, pretendemos desenvolver uma segunda etapa do projeto para aprofundar o trabalho, com a realização de vídeos de diálogos e expressões orais. Os alunos que participaram das atividades de 2012 já se formaram e temos um novo público no Centro de Línguas. Queremos dar a mesma oportunidade para os que estão conosco neste semestre”, explica a coordenadora do CEL.

Valores, educação e esporte

download-280x145A Organização dos Estados Ibero-Americanos executa, em dezenove países – e, no caso do Brasil, nas doze cidades-sede dos jogos –, o projeto Copa do mundo, o mundo em sua escola. A ação, promovida em parceria com o Ministério da Educação e a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, distribuiu materiais lúdico-pedagógicos para os professores trabalharem a temática do mundial a partir de questões como autoestima, perseverança, competitividade e conflitos.

Após a etapa das atividades nas escolas, os alunos foram convidados a escreverem uma redação sobre o tema Aprendendo por meio do esporte. Segundo a diretora da OEI no Brasil, Ivana de Siqueira, o material elaborado para as escolas está disponível na internet (aqui) e pode ser utilizado por outras escolas que não fazem parte do projeto. “Nós trabalhamos com doze capitais. No entanto, outras cidades do Brasil e alguns estados, como Minas Gerais, pediram para que realizássemos as atividades, independente da participação no projeto. Esse é um material que não deve ser usado apenas nesse período, pode ser abordado o ano todo já que favorece a aprendizagem, trabalhando valores como solidariedade, tolerância e respeito ao outro”, elucida Siqueira.

No mês de abril, o projeto culmina com a premiação das 33 melhores redações. “Em todos os países participantes, o futebol é um esporte enaltecido. Buscamos mostrar que essa é uma oportunidade de conhecer novas culturas, saber mais sobre outros países e tirar um pouco da ênfase competitiva, do ‘meu país é melhor que o seu’. Queremos mostrar que esse também é um momento de interação entre as nações e os povos”, afirma a diretora da OEI no Brasil.

* Publicado originalmente no Blog Educação.