União Europeia: Crise e esperança para a integração latino-americana

Miami, Estados Unidos, agosto/2012 – No contexto da assinatura do Acordo de Associação entre América Central e União Europeia (UE), observa-se que a região latino-americana aparentemente está a salvo da crise da Europa.

Porém, esta percepção, confirmada pelos dados estatísticos de crescimento, se contradiz pelas próprias dificuldades em avançar nos planos de integração, além das experiências de cooperação e consulta interlatino-americanas.

É paradoxal que a América Central, uma sub-região de limites geográficos modestos, que parecia atrasada em completar seu processo de integração e que viu atraso na consecução do ansiado acordo, agora aparece como ganhadora da atenção europeia.

Da obsessão da UE pela aposta em um Mercosul com brilhante futuro, que foi se esparramando pelo resto do continente, chegou a prevalecer uma sub-região de limitadas proporções. Houve um regresso à origem da relação, quando a América Central recebia mais ajuda europeia do que o resto do mundo, com a recompensa de ter contribuído para a pacificação e a reconstrução.

É preciso meditar sobre o desenvolvimento dos sistemas de integração latino-americanos por uma variedade de razões, entre as quais se destacam dois tipos.

Um é o exame da evolução de cada um dos experimentos, já que todos, em certa medida, têm a inspiração do modelo europeu.

Outras razões correspondem à região como cenário receptor de investimentos, ajuda ao desenvolvimento e mútuas relações diretas, tanto em terrenos de passagem de emigração, como em temas conflitivos (narcotráfico). Toda atenção mútua deve sempre ter presente que a América Latina (junto com Estados Unidos e Canadá) é a região do planeta mais próxima da Europa por motivos históricos.

Convém reparar na incidência da crise do euro no próprio tecido de integração, base da consolidação da paz, da convivência democrática e da construção de um ponto de referência para o resto dos experimentos de integração, cooperação econômica e consulta entre Estados.

Especial atenção deve ser dada ao impacto que a conjuntura econômica tem na trama institucional da UE e em alguns países mais emblemáticos.

Em um plano geral da UE, são detectadas dúvidas sobre a viabilidade de sua essência, que os cidadãos veem como distante. Há reticências de alguns do Norte em continuar contribuindo, com o perigo de uma Europa a duas velocidades e a geração de um cisma. Esgotou-se o “método Jean Monnet” de integração e detecta-se um reforço do intergovernamentalismo.

Entre alguns remédios, ressalta a necessidade de “mais Europa”, maior aprofundamento do processo (eleições diretas para a Comissão, fusão das presidências do Conselho e da Comissão), a cuidadosa aplicação do minitratado de austeridade e maior dose de poder para o Banco Central Europeu.

No plano político, nota-se um desprestígio dos partidos históricos, o esfumaçamento da influência da socialdemocracia, a geração de formações de ultradireita, o reforço de alternativas da ultraesquerda e o renascimento do nacionalismo.

No setor econômico-social, há uma desconfiança com o sistema bancário, ausência de punição e correções para os “banksters”, o fracasso da hiperconstrução imobiliária, o alarmante nível de desemprego, especialmente juvenil, e a ameaça contra o estado de bem-estar.

Detecta-se uma generalizada corrupção em alguns países (Espanha), a sistemática violação de legislações fiscais e o crescimento de fuga de capitais.

Sobre o euro, é apontado como o principal culpado da crise, com a consequente dúvida de sua adoção. Entre as estratégias, se oscila entre “salvar o euro para salvar a Europa” e “salvar a Europa para salvar o euro”, e se debate, contraditoriamente, entre a necessidade do “euro a todo custo” e a equilibrada análise do “custo do euro”.

A atuação de alguns Estados-membros varia desde a firmeza da Alemanha em exigir disciplina fiscal ao progressivo isolamento da Grã-Bretanha.

A mudança política em Paris afetou a colaboração Alemanha-França. O duro resgate da economia portuguesa contrasta com o desastre generalizado político-econômico da Grécia e com a contundência do caso espanhol. É paradoxal que a Espanha, ainda a nona potência econômica mundial e a quarta europeia, agora esteja em uma situação financeira precária. Como dano colateral, este sintoma ameaça sua coesão social e seu próprio sistema político.

Com relação à ampliação da UE, há dúvida e arrependimento pela pressa em 2004, considerando o impacto da imigração, interna e externa, com a geração de racismo, intolerância e discriminação. No entorno próximo, se age com maior prudência quanto ao restante da antiga Iugoslávia e Turquia, enquanto nota-se a pressão das rebeliões árabes.

Entretanto, o balanço histórico mostra que, desde a fundação da UE, não houve em toda a história europeia um período tão longo de crescimento, aumento do nível de vida e de paz: cumpriu todas as suas missões fundamentais. Se morresse, morreria de êxito.

Apesar das dificuldades socioeconômicas e da deterioração política, a UE continua sendo o modelo ou ponto de referência insubstituível para qualquer experimento de integração regional. É – parafraseando Churchil – o pior sistema de integração, se forem desconsiderados todos os demais.

Mas a UE tem um conjunto de desafios: deve colocar em ordem seu próprio processo, mirar a economia, reforçar o estado de bem-estar e, consequentemente, mandar uma mensagem positiva ao exterior. Tudo isto diz respeito, direta ou indiretamente, à conjuntura latino-americana. Envolverde/IPS

* Joaquín Roy é catedrático Jean Monnet e diretor do Centro da União Europeia da Universidade de Miami ([email protected]).