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Agricultura cubana precisa de força jovem

Mercedes Cepero (D) trabalha no laboratório de saúde vegetal da cooperativa Viveiro Alamar. Crédito: Patricia Grogg/IPS

 

Havana, Cuba, 22/5/2013 – Quando a cubana Gabriela Blanco conta que trabalha em uma horta orgânica e se prepara para estudar na universidade, só vê caras de espanto. Ela não sabe muito bem de onde veio sua vocação para a terra, mas está certa de que é o que quer. Em Cuba, onde a agricultura se caracteriza por rendimentos insuficientes, tampouco são muitos os jovens como Blanco – de porte pequeno e apenas 20 anos, que deixou dois anos da carreira de matemática para se testar no Viveiro Alamar, uma Unidade Básica de Produção Cooperativa de sucesso, em Havana.

“Comecei a trabalhar aqui em setembro de 2012. Com três meses, me fizeram sócia da cooperativa, confirmei que realmente gosto e quero continuar aqui. O setor agrícola tem muitas possibilidades e inúmeros campos de pesquisa, uma experiência muito interessante e muito bonita”, disse Blanco à IPS. A vivência de Mercedes Cepero, de 18 anos, é semelhante, embora tenha chegado à cooperativa para fazer seu estágio como técnica de agronomia. “Já passei da fase de estudante e agora tenho que me preparar e aprender como trabalhadora”, detalhou Cepero à IPS. Ela também se prepara para os exames de ingresso na universidade, que acontecem este mês, porque quer ser engenheira agrônoma.

Ao contrário de Blanco, ouviu sobre esta carreira quando estava no ensino secundário. “A partir dali comecei a me interessar”, contou Cepero. Para Blanco, o desinteresse da juventude pelas profissões agrícolas tem a ver, em parte, com a sociedade atual. “Muitas pessoas veem a agricultura como algo que não se estuda, que não tem ciência, bastando plantar e colher. Outras veem o trabalho no campo como algo de muito esforço e poucos benefícios”, pontuou.

No Viveiro Alamar trabalham 20 jovens de 17 a 30 anos atualmente. No entanto, a maioria desiste quando encontra lugares mais de acordo com suas aspirações de renda e menor esforço. Cepero é mais dura ao julgar essa apatia pelos trabalhos agrícolas. Para ela, os jovens “são um pouco folgados e querem que tudo caía do céu”, declarou. Segundo dados do programa nacional de agricultura urbana e suburbana, há cerca de 70 mil jovens trabalhando no setor, ao qual pertence esta cooperativa, que fica na localidade costeira de Alamar, a 15 quilômetros do centro de Havana e cuja população é estimada entre 80 mil e cem mil habitantes.

Pesquisadores do Centro de Estudos sobre a Juventude indicam que a população jovem prefere locais de trabalho em áreas da economia emergente, como empresas e corporações estrangeiras, e despreza ofertas de trabalho vinculadas a serviços comunitários, construção e agricultura. “Existe a visão de que a agricultura é como se fosse um castigo. Quem se comporta mal, vai arar a terra. O filho do agricultor não quer continuar a tarefa dos pais, mas ir para Havana ser médico”, afirmou Isis Salcines, que se autodefine como trabalhadora multiofício da cooperativa e está prestes a se formar agrônoma.

Pouco depois de iniciar os estudos, Salcines decidiu criar um círculo de interesse em uma escola primária perto da cooperativa, que foi batizado de Chamacos Agroecológicos. Porém, antes fez duas pesquisas. Em uma perguntou: “O que quer ser quando crescer?”, e na outra: “Quando for grande quero ser…”, e entre as opções incluiu agricultor. Ninguém marcou esta alternativa para seu futuro.

Salcines, filha do fundador e presidente da cooperativa, Miguel Ángel Salcines, traçou a meta de ensinar em encontros semanais o manejo agroecológico da cooperativa e a necessidade de se alimentar de uma maneira mais saudável. Ao terminar o primeiro curso, os “chamacos” (as crianças) não deixavam nem o talo dos vegetais que comiam em saborosas saladas, sabiam como se trabalha no campo e a importância da produção de alimentos, e também conheciam o manejo integrado de pragas e enfermidades.

Em uma nova pesquisa realizada ao fim do primeiro curso, 15 de mais de 20 meninos e meninas marcaram agronomia entre possíveis carreiras a seguirem. “Esta experiência foi um estímulo. Mostrou-me a possibilidade de que, quando crescerem, muitos optem por este trabalho”, ponderou Salcines. Para Norma Romero, engenheira em saúde vegetal, a receita começa pela educação precoce, e continua com a oferta de garantias para que os jovens se sintam reconhecidos, estimulados e com vontade de permanecer no campo, acima das dificuldades.

Bons salários, flexibilidade de horário para estudar, café da manhã e almoço gratuito, roupa e calçado adequados para estes trabalhos, entre outros benefícios, são fatores que incentivam, “porque na agricultura há barro, muito sol, pó, condições realmente duras. Para nós é vital que a pessoa chegue e fique, sobretudo os jovens”, ressaltou Romero.

Como parte das mudanças do modelo econômico cubano, o Ministério da Educação ampliou em 2011 as especialidades de agronomia em níveis técnicos médios e ordenou fortalecer a orientação vocacional desde as primeiras séries primárias, de acordo com as características e necessidades de cada território. A agricultura absorve 20% do emprego total e sua contribuição direta para o produto interno bruto nacional é inferior a 5%, porque tem a menor produtividade do país. No ano passado, Cuba precisou gastar mais de US$ 1,633 bilhão com importação de alimentos. Envolverde/IPS