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Êxodo de refugiados põe em risco metas de desenvolvimento na Índia

No acampamento de refugiados Serfanguri, em Kokrajar, as barracas não são suficientes para abrigar as duas mil pessoas que chegaram no dia 23 de dezembro. A da foto abriga 25 mulheres e crianças. Foto: Priyanka Borpujari/IPS
No acampamento de refugiados Serfanguri, em Kokrajar, as barracas não são suficientes para abrigar as duas mil pessoas que chegaram no dia 23 de dezembro. A da foto abriga 25 mulheres e crianças. Foto: Priyanka Borpujari/IPS

 

Kokrajar, Índia, 30/1/2015 – A lona, estirada e atada a postes de bambu, tem a dimensão de uma caminhonete grande. Entretanto, cerca de 25 mulheres, meninas e meninos dormem ao abrigo desses refúgios improvisados em vários acampamentos de refugiados nessa localidade do Estado de Assa, no nordeste da Índia. Os cerca de 240 mil refugiados em 118 acampamentos, dispersos em três distritos de Assam, fugiram de suas casas depois que um ataque matou 81 pessoas.

Trata-se de uma crise humanitária de grandes proporções, denuncia o Centro Asiático para os Direitos Humanos, já que constitui um dos maiores deslocamentos em razão de conflitos armados nesse país. A situação reflete a incapacidade do país em alcançar este ano os oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) e sugere que a violência que o afeta será um obstáculo para satisfazer as necessidades básicas de seus mais de 1,2 bilhão de habitantes.

No dia 23 de dezembro, a facção armada da Frente Democrática Nacional de Bodoland, Songbijit, que luta pela independência do povo bodo em Assam, atacou vários povoados habitados pela comunidade adivasi. Os ataques aconteceram em áreas delimitadas como Distritos da Autoridade Territorial de Bodoland, regidos pelo Conselho Territorial de Bodoland.

A comunidade adivasi que reside aqui está integrada por vários grupos indígenas que chegaram da Índia central a Assam, no ano 150 de nossa era, e centenas mais que foram levados à força pelos colonos britânicos para trabalhar nas plantações de chá.

Este menino, residente no acampamento Serfanguri, sofre uma infecção na pele. Sua mãe diz que ainda não recebeu medicamentos da Missão Nacional de Saúde Rural. Foto: Priyanka Borpujari/IPS
Este menino, residente no acampamento Serfanguri, sofre uma infecção na pele. Sua mãe diz que ainda não recebeu medicamentos da Missão Nacional de Saúde Rural. Foto: Priyanka Borpujari/IPS

 

Os enfrentamentos entre as comunidades adivasi e bodo em 1996 e 1998, na qual teriam morrido entre 100 e 200 pessoas, ainda causam pesadelos aos sobreviventes. Isso explica porque a maioria dos refugiados nos 118 acampamentos se nega a voltar para casa.

Apesar de as barracas parecerem a opção mais segura no curto prazo, as condições de vida aqui são deploráveis e o governo pretende realocar os refugiados em um local mais permanente. O acampamento na aldeia Serfanguri, em Kokrajar, carece de todos os serviços básicos de água e saneamento necessários para a sobrevivência. Cada uma das barracas chega a abrigar 25 mulheres e crianças.

“Os homens dormem em outra barraca ou ficam acordados à noite para nos proteger. Só mesmo por causa do frio conseguimos, de alguma maneira, passar toda a noite em um espaço tão lotado”, disse Maino Soren, do povoado de Ulghutu, onde os habitantes fugiram logo depois de um ataque que resultou em quatro casas queimadas. Agora há uma grave escassez de artigos de primeira necessidade, como cobertas, para ajudar a enfrentar o inverno, contou à IPS.

A violência interrompeu a educação de centenas de crianças refugiadas. Foto: Priyanka Borpujari/IPS

 

Neste país com 17% da população mundial, a violência recorrente e o posterior deslocamento geram uma enorme pressão nos cofres do Estado. Uma e outra vez, os governos devem lidar com populações de refugiados, o que representa grandes lacunas na história de desenvolvimento da Índia.

Fora de suas barracas em Kokrajar, crianças com baixo peso e visivelmente desnutridas trocam bolachas por bolas de açúcar de palma e arroz. Meninas de apenas sete anos carregam panelas com água sobre suas cabeças dos poços até o acampamento, cambaleando sob o peso dos recipientes. Outras ajudam suas mães a lavar a louça.

É pouco provável que a Índia alcance o ODM que a obriga a reduzir em 26% a quantidade de crianças com baixo peso até este ano. Segundo as últimas estatísticas, do período 2005-2006, a cifra real chega a 40% da população infantil.

Do mesmo modo, quando os dados do Sistema de Informação sobre Educação nos Distritos mostram que o país alcançou quase 100% do ensino primário para suas meninas e seus meninos de seis a dez anos, fatos como os de Assam impedem que muitas crianças continuem sua formação, embora possam estar matriculados.

“As crianças dos acampamentos estão autorizadas a serem admitidas nas escolas públicas próximas, mas não existe nenhuma disposição para alimentar as bocas adicionais durante as refeições do meio-dia. Assim, as crianças abandonam as aulas e sua educação fica prejudicada”, disse Anjuman Ara Begum, uma ativista social que estudou a situação de campos de refugiados por todo o país e contribuiu com os informes do oficial Centro de Monitoramento do Deslocamento Interno.

Além disso, nas localidades de Balagaon e Jolaisuri, onde foram instalados acampamentos para alojar os adivasi e os bodo, respectivamente, informou-se de vários casos de mortes de bebês. Muitos atribuem essas mortes ao frio, mas após a visita aos campos ficou evidente que estes não ofereciam atenção nutricional especial às mães lactantes nem às grávidas.

Esse cenário não é exclusivo de Assam. Em toda Índia, a violência e os conflitos armados comprometem seriamente a saúde materno-infantil, algo que também os ODM priorizam. Somente no centro e no leste do país, cerca de 22 milhões de mulheres vivem em áreas propensas a conflitos, onde o acesso aos centros de saúde é limitado pela presença de grupos armados e do pessoal de segurança.

Isso, por sua vez, complica os esforços da Índia para reduzir a taxa de mortalidade materna de 230 para cem mortes em cada cem mil nascidos vivos. Também significa, com toda probabilidade, que o país não poderá cumprir este ano o objetivo de reduzir a taxa de mortalidade dos bebês em 13%, e a da taxa de mortalidade dos menores de cinco anos em 5%. Envolverde/IPS