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ONU cobrada para aumentar combate ao cólera no Haiti

Uma criança infectada com cólera descansa no chão do centro médico de Doin, na região haitiana de Artibonite. Foto: UN Photo/UNICEF/Marco Dormino

 

Washington, Estados Unidos, 23/7/2012 – Legisladores norte-americanos pediram à Organização das Nações Unidas (ONU) que aborde de maneira mais incisiva a epidemia de cólera no Haiti, que já está em seu terceiro ano e deixou milhares de mortos. Em carta dirigida à representante permanente dos Estados Unidos na ONU, Susan Rice, 104 membros do Congresso pedem urgência na intensificação da participação do fórum mundial nesse sentido. “É imperativo que as Nações Unidas atuem de modo decisivo para controlar a epidemia de cólera”, escreveu o representante John Conyers Jr. “Não agir levará a mais incontáveis mortes e também significará uma ameaça permanente à saúde pública”, destacou.

Alguns analistas vinculam o surto de cólera aos soldados do Nepal que integram a força da ONU, postados em 2010 no Haiti. Um estudo feito em 2011 e divulgado pelo The New England Journal of Medicine concluiu que a cepa do cólera introduzida no Haiti – a Vibrio cholerae – era semelhante a uma encontrada na Ásia meridional em 2002 e 2008. O foco de 2010 foi o primeiro registro de um caso de cólera no Haiti em quase um século, segundo o norte-americano Centros de Controle e Prevenção de Doenças. O presidente Bill Clinton (1993-2001), atualmente enviado especial da ONU para esse país, disse em março que um soldado da força de paz havia sido a provável causa do foco. A ONU não fez declarações formais à IPS em relação ao foco.

A carta dos legisladores norte-americanos foi bem recebida pelo Instituto para a Justiça e a Democracia no Haiti (IJDH), uma organização de direitos humanos com sede em Boston, Estados Unidos, que pediu à ONU, representando cinco mil vítimas do cólera, indenização de US$ 100 mil por pessoa morta e US$ 50 mil para cada infectada. “A cobrança do Congresso para a ação reflete um consenso cada vez maior de que a ONU tem a responsabilidade moral e legal de abordar a epidemia de cólera do Haiti, e que deve fazer isso urgentemente, antes que se perca mais vidas”, declarou em um comunicado o diretor do IJDH, Brian Concannon Jr.

A ONU nunca aceitou sua plena responsabilidade no foco. Porém, um informe de 2011 afirma que “uma confluência de circunstâncias” causou o foco e que a epidemia não é “culpa, ou ação deliberada, de um grupo ou indivíduo”. Segundo alguns, a contínua negativa pode ser atribuída ao fato de a ONU tentar salvar sua imagem. “Para eles é um pesadelo”, apontou à IPS o diretor de comunicações internacionais no Centro de Pesquisas Econômicas e Políticas, Daniel Beeton. “É o oposto de sua missão”, acrescentou.

Segundo a Organização Pan-Americana de Saúde (OPS), mais de sete mil pessoas morreram de cólera no Haiti desde o surgimento do surto, em 2010. Jon Kim Andrus, diretor-adjunto da OPS, afirmou que, além das vítimas mortais, o governo haitiano informou sobre mais de 520 mil casos de cólera. O surto teve efeitos adversos no Haiti, além das preocupações sanitárias, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). “Além do sofrimento humano causado pelo cólera, os focos desta enfermidade causam pânico, alteram a estrutura social e econômica e podem dificultar o desenvolvimento nas comunidades afetadas”, segundo a OMS. Esta entidade citou a experiência do Peru, que em 1991 sofreu um foco de cólera que causou prejuízo de US$ 770 milhões devido a “embargos ao comércio de alimentos e efeitos negativos sobre o turismo”.

O cólera, que causa diarreia e vômitos no paciente, o que potencialmente leva a uma desidratação extrema, está causando impacto em uma economia que já tem no desemprego 40% de sua população economicamente ativa, segundo a Agência Central de Inteligência (CIA) dos Estados Unidos. Em resposta ao surto e às crises humanitárias no Haiti, a ONU solicitou US$ 864 milhões em 2010 para os esforços de estabilização. O atual orçamento da Missão de Estabilização das Nações Unidas no Haiti (Minustah) é de US$ 793 milhões. Segundo a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (Usaid), o governo norte-americano já entregou ao Haiti mais de US$ 73 milhões em assistência, em resposta ao surto de cólera.

Esta enfermidade também se espalhou pelo Caribe. Agora, Cuba tem 170 casos confirmados, embora ainda não os tenha vinculado de maneira definitiva com o surto no Haiti. Porém, o Ministério da Saúde cubano disse que o último surto de cólera registrado no país antes deste ano foi pouco antes da Revolução de 1959. Anteriormente, o Haiti teve outros problemas com soldados da ONU, especialmente com denúncias de ataques sexuais e violência excessiva. Em março, as Nações Unidas retiraram três integrantes da unidade policial formada por paquistaneses que serviam na Minustah, depois de serem acusados de atacar sexualmente um adolescente de 14 anos. Também houve soldados acusados de submeter e violar um haitiano de 18 anos em 2011, fato que foi filmado com um telefone celular. Envolverde/IPS