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Violações na Índia revelam práticas policiais coloniais

Protestos em massa na Índia porque as mulheres temem ser violadas quando saem de casa. Foto: Sujoy Dhar/IPS

Nova Délhi, Índia, 9/5/2013 – A brutalidade da polícia na repressão dos protestos que sacodem a Índia desde dezembro, contra a onda de violações no país, traz consigo a demanda pela reforma de uma força que mantém características coloniais. O Supremo Tribunal de Justiça, irritado com os graves excessos contra mulheres manifestantes em Nova Délhi e outros Estados do norte do país, pediu em abril informações sobre o grau de cumprimento das instruções que essa corte determinou há seis anos sobre a reforma da polícia.

“Nem um animal faria o que fazem os oficiais da polícia todos os dias em diferentes partes do país”, afirmaram os juízes do Supremo Tribunal, se referindo, entre outros casos, à surra sofrida por uma mulher de 65 anos quando participava de um protesto na cidade de Aligarh, no Estado de Uttar Pradesh. “Como um policial pode bater em uma senhora desarmada?”, perguntaram os magistrados, ao fim de uma de suas sessões.

O juiz que presidiu a reunião, G. S. Singhvi, mencionou o caso de um policial que esbofeteou uma jovem que participava de uma manifestação no dia 19 de abril, nas proximidades de um hospital da capital, onde uma menina de cinco anos estava internada vítima de violação. “A polícia pode fazer pouco para reduzir crimes como a violação, mas os oficiais devem ser julgados pela forma como reagem diante deles”, afirmou Jyotiswaroop Pandey, que deixou no ano passado o cargo de diretor-geral da polícia no Estado de Uttarakhand.

Pandey, que agora integra a comissão de reforma policial, disse à IPS que é “inaceitável” a polícia não reagir às denúncias sobre o mau comportamento de um motorista de ônibus no dia 16 de dezembro de 2012. Horas depois, as forças de segurança detiveram o motorista e outros homens por maltratarem e violarem em grupo uma passageira de 23 anos.

Os agressores jogaram para fora do ônibus a vítima e seu companheiro, em uma agitada rua de Nova Délhi, nus e sangrando, onde permaneceram quase uma hora sem ninguém se atrever a intervir por medo de se ver envolvido em um caso policial. Em meio aos protestos públicos pelo fato, as autoridades levaram a jovem para um hospital de Cingapura, onde morreu no dia 29 do mesmo mês em razão dos graves ferimentos.

Em Nova Délhi, a polícia reprimiu os manifestantes que se dirigiam ao parlamento utilizando carros que lançam água e a golpes de cassetete. Também realizou detenções maciças. Pandey afirmou que a polícia “se esqueceu de que seu principal objetivo deve ser manter a paz e a ordem, sem recorrer à força ou exacerbar a tensão com seu comportamento, em lugar de usar empatia para acalmar os ânimos”.

Além da brutal repressão policial, os defensores dos direitos humanos se preocupam com o tratamento dado às vítimas de violação nas delegacias, que começa pela negação de registrar a denúncia. Em dezembro, uma mulher se matou tomando veneno, após ser violada por três homens na cidade de Patiala, no Estado de Punjab. Em uma nota ela acusou a polícia de não tomar medidas após sua denúncia e, pelo contrário, intimidá-la.

Pouco depois da agressão coletiva, a vítima apareceu nos canais de televisão relatando seu pesadelo, mas isso não comoveu a polícia. O suicídio tampouco bastou, e foi necessária a intervenção de um alto tribunal estadual para que as autoridades tomassem medidas contra três policiais e iniciassem um processo judicial contra eles. A organização não governamental Commonwealth Human Rights Intiative (CHRI) divulgou um comunicado, no dia 23 de abril, pedindo uma reforma da força policial. Também expressou sua “grande preocupação pela contínua falta de resposta às vítimas de violação”.

Nem mesmo a nova legislação, que prevê dois anos de prisão para os policiais que se negarem a registrar uma denúncia, parece ter modificado atitudes e comportamentos, segundo a diretora da CHRI, Maja Daruwala. Uma nova lei, redigida com base em amplas consultas à sociedade civil, considera perspectivas de gênero atualizadas e comportamentos patriarcais para modificar aspectos do Código Penal, que o regime colonial introduziu em 1860.

Entretanto, os últimos acontecimentos mostram que a lei, aprovada no parlamento em 20 de março, ainda não fez efeito. “As mudanças legais, impulsionadas pela violação de 16 de dezembro, não terão muito significado se a polícia continuar negando a justiça com suas práticas abusivas”, afirmou Daruwala.

A reforma legal, que aponta para julgamentos mais rápidos e castigos mais duros contra os violadores, foi criticada por evitar totalmente o assunto grave de modernizar a força policial voltada para o serviço à cidadania e não à repressão, tal como propõe o Supremo Tribunal de Justiça. “Se as diretivas apontadas pelo Supremo Tribunal em 2006 tivessem sido adotadas e implantadas, a polícia teria deixado de ser uma força temida e pouco confiável e se transformado em um serviço essencial para defender a lei”, opinou Navaz Kotwal, coordenadora do programa de reforma policial da CHRI.

Em razão de denúncias sobre a grande prepotência dos agentes ao lidarem com manifestações contra as violações, o alto tribunal pediu às províncias, no dia 6 de março, informes sobre o avanço da reforma policial. Mas algumas autoridades policiais são céticas, como o diretor-geral da força no Estado de Haryana, Vikash Narain Rai. Para mudar a polícia é preciso uma “reforma judiciária, rever os serviços correcionais e realmente empoderar a sociedade”, afirmou. Envolverde/IPS