ODS 13

O que os pulmões não respiram, a cabeça não entende

Análise de duas pesquisas mostra como a combinação entre dados e percepção sobre mudanças climáticas é essencial para o engajamento no tema

O que os pulmões não respiram, a cabeça não entende

por Edson Capoano, pesquisador e professor da ESPM-SP

O que os olhos não veem, o coração não sente. Essa expressão popular pode soar rasa na era do big data e da inteligência artificial, mas duas pesquisas recentes demonstram como o senso comum pode dar a medida de como comunicar o desafio climático.

A Agência Internacional de Energia (EIA) divulgou relatório no último dia 16, em que aponta aumento mundial no consumo de energia, ainda dependente de combustíveis fósseis (80%). Segundo o estudo, a demanda por matrizes que emitem CO2 (petróleo, gás natural e carvão) vai chegar ao seu ápice até o fim da década, o que também resultará no topo da emissão de dióxido de carbono.

Isso significa o planeta está rumo a um aumento de 2.5ºC na temperatura média. Mas também quer dizer que talvez possamos mudar esse quadro, a partir dos anos 2030, se os setores que emitem carbono cumpram sua parte. Um cenário de apreensão, seguido de esperança.

Porém, apesar de os dados da EIA serem alarmantes, tratam de uma situação que na prática é ambicionada por indivíduos, economia e nações: crescimento no consumo energético é sinal de economia aquecida, que gera empregos, lucro e pagamento de impostos. Já a previsão de 2,5º C não afeta a vida cotidiana, nem gera mudança de comportamento pessoal ou comoção social.

A pesquisa Datafolha publicada no último domingo (20), por sua vez, informa que aumentou o percentual de brasileiros que percebem como as mudanças climáticas geram risco imediato à vida. O instituto interpreta que a alta de 8 pontos no último trimestre (52% para 60%) se deve às consequências da estiagem e das queimadas que assolaram o país nos últimos meses.

Curiosamente, as mudanças climáticas não foram o único causador dessa crise. Podem ter intensificado o El Niño, um fenômeno meteorológico regular. Também podem ter aumentado a quantidade e duração das queimadas pelo país, ainda que a maioria dos incidentes seja gerada por ação humana.

Mas a piora da qualidade de vida dos brasileiros, principalmente de regiões atingidas pela fumaça, aumentou a percepção de que as mudanças climáticas agem neste momento em nossas vidas.

Por isso, um dos desafios de comunicar as mudanças climáticas é conseguir combinar os dados e fatos sobre o fenômeno com a percepção que as pessoas têm dele. Superar a datatização do debate climático e perceber quais experiências cotidianas despertam interesse a curto prazo.

Edson Capoano  Doutor em Ciências pelo PROLAM-USP, Mestre e jornalista pela PUC-SP. Trabalhou na TV Cultura de São Paulo e na agência de notícias EFE, em São Paulo e em Madri. Organizador e autor de livros e artigos científicos sobre comunicação e jornalismo. Pesquisador sobre como jovens se envolvem com notícias climáticas. Atual professor da ESPM-SP, onde ministra a disciplina “Jornalismo e as Mudanças Climáticas”.