Como esperado, a União Europeia (UE) impôs uma proibição na importação do petróleo da Síria para os seus Estados-membros em reação às contínuas repressões violentas pelas forças de segurança do presidente Bashar Al-Assad contra os manifestantes pró-democracia. Com 95% das exportações de petróleo normalmente terminando em países europeus, essa última ação será sentida pela Síria com mais força que as anteriores, basicamente simbólicas: a proibição dos Estados Unidos para a importação do petróleo da Síria ou sanções europeias prévias sobre os bens de integrantes do regime. Contudo, pressionado, espera-se que o regime de Assad se prove adaptável e, com outro boicote danoso ao petróleo sírio apoiado pela Organização das Nações Unidas (ONU) aparentemente distante, essas sanções podem ter menos impacto que o esperado pelos líderes da UE.
Durante um encontro dos ministros do exterior europeus na Polônia, o Conselho Europeu aproveitou para anunciar, em uma declaração em 2 de setembro, que seria imposta uma proibição da “aquisição, importação e transporte de petróleo e outros produtos de petróleo da Síria”. Ainda segundo a declaração, nenhum serviço financeiro ou de seguro pode ser fornecido por causa das sanções. O anúncio veio após certa oposição por parte da Itália, que é um significante comprador de petróleo sírio. Para acalmar os italianos, as sanções não começarão até 15 de novembro.
A Síria produz atualmente 387 mil barris por dia de petróleo bruto, de acordo com o ministro do Petróleo, e exporta cerca de 145 mil barris por dia. O principal destino dessas exportações são refinarias na Alemanha, Itália e França. Desde a crise na Líbia, a Itália particularmente aumentou sua parcela de compra, adquirindo mais da metade do petróleo sírio para compensar a perda do produto na Líbia. Devido ao fato de as empresas de produção (Companhia de Petróleo Síria) e vendas (Sytrol) serem propriedades do Estado, a maioria dos lucros dessas vendas terminam no Tesouro sírio, abrangendo 20% a 25% da receita bruta total. A oposição síria exilada argumentou que o boicote ao petróleo sírio é uma forma de prejudicar as finanças do regime, com a qual financia a máquina militar constantemente colocada contra os manifestantes, sem danificar a economia e as pessoas comuns. Interessados em evitar sanções como as impostas a Saddam Hussein no Iraque nos anos 1990, que pioraram a vida de civis sem destituir o ditador, líderes europeus têm sido atraídos para a ideia da oposição de um boicote focado no petróleo.
Autocratas adaptáveis
Contudo, as sanções podem ter um impacto menor do que aquele esperado pela União Europeia ou pela oposição síria. Primeiramente, os europeus não têm sido capazes de persuadir outros Estados a se juntarem ao boicote e há uma vasta gama de compradores alternativos ao petróleo sírio fora da União Europeia. China, Índia e outros países asiáticos podem ser possíveis interessados, mesmo que possam vir a exigir um desconto por terem de recalibrar suas refinarias de petróleo para lidar com o óleo bruto pesado da Síria. Compradores asiáticos mostraram alguns receios no passado em relação a comprar petróleo de Estados sujeitos a sanções do Ocidente, como o Sudão.
Em segundo lugar, qualquer impacto que as sanções possam ter será lento devido ao seu adiamento até a metade de novembro. É provável que o regime não sentirá o aperto até o início do próximo ano, época na qual já pode ter esmagado a oposição. Em terceiro lugar, assim como se tem visto em outros lugares, os regimes autocráticos provam-se notadamente adaptáveis e criativos quando impostas sanções. Os aliados da Síria no Iraque irão certamente oferecer conselhos em como minimizar os seus impactos, baseado em suas experiências de várias sanções da ONU desde 2006.
Possibilidades positivas
As sanções da União Europeia não serão completamente inócuas, entretanto. Além de causar sérias complicações às finanças do regime, há ramificações políticas possíveis.
Por um lado, a oposição poderá ser fortalecida. Aliada com alguns líderes europeus se juntando ao presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, no chamado para que Assad “recue”, as sanções são uma mostra significante de solidariedade dos líderes ocidentais para com a oposição. Isto pode persuadir mais pessoas a se juntarem aos protestos no solo e pode encorajar a oposição em exílio a se organizar melhor – um problema notável no presente –, sabendo que os líderes ocidentais estão procurando por uma alternativa realista ao regime de Assad e estão dispostos a agir contra o mesmo. Uma segunda possibilidade é que os líderes de negócios sírios, que têm sido leais a Assad até o momento, podem começar a abandonar o regime após reconhecerem que a oposição ocidental está aumentando, podendo fundamentalmente infligir sérios danos à economia e a seus meios de vida. Certamente, quanto mais a pressão diplomática cresce, mais prováveis são as deserções de líderes comerciais.
Improvável sucesso das sanções da ONU
Entretanto, para que uma real pressão diplomática e econômica seja colocada em Assad, mais Estados precisam se juntar à União Europeia e Estados Unidos para penalizar o regime, o que parece improvável no presente. Tão logo as sanções da União Europeia foram aprovadas, a França começou a falar na possibilidade de um boicote ao petróleo sírio aprovado pela ONU. No entanto, China e Rússia, que têm poder de veto, são próximos da Síria e tendem a defender o direito do regime de lidar com protestos internos sem intervenção, e ainda estão vacilantes sobre os líderes ocidentais a ultrapassar os limites de uma resolução da ONU que apoiaram na Líbia. Além disso, os vizinhos da Síria, Turquia, Iraque e os Estados árabes, enquanto cada vez mais frustrados pelo comportamento de Assad, provavelmente não apoiarão nenhum tipo de sanção que possa prejudicar suas importantes relações comerciais com a Síria.
Seguro no entendimento de que ainda possui bastante tempo para tentar acabar com a revolta antes de qualquer alusão de sanções da ONU ao regime, Assad deve, portanto, provavelmente avançar e incrementar suas repressões contra a oposição, e desenvolver maneiras criativas de sobreviver ao boicote europeu do petróleo.
* Publicado originalmente na coluna The Economist Intelligence Unit, no site da revista Carta Capital.