“Há, ainda, muito a se avançar em eficiência energética em todo o mundo. Até mesmo o conceito de sustentabilidade, em sua concepção completa, ainda está em fase de amadurecimento, não só no setor de energia, como também em vários outros”, avalia José da Costa Carvalho Neto.
Confira entrevista com José da Costa Carvalho Neto, presidente da Eletrobras.
Segundo as metas anunciadas pela Eletrobras, a maior companhia do setor de energia elétrica da América Latina pretende tornar-se “o maior sistema empresarial global de energia limpa até 2020”. Quais são os caminhos que vocês pretendem percorrer para chegar até lá?
José da Costa Carvalho Neto: Basicamente, seguindo no rumo que temos traçado até agora. Hoje, a matriz de geração elétrica da Eletrobras é composta por mais de 84,5% de hidreletricidade, uma das energias mais limpas disponíveis para o homem. No momento, estamos investindo ainda mais na fonte hidrelétrica, com a construção das usinas de Jirau e Santo Antônio, no Rio Madeira, e Belo Monte, no Xingu, e começamos a avançar também na energia eólica, com a inauguração do Complexo de Cerro Chato, no Rio Grande do Sul. Também estamos iniciando pesquisas mais aprofundadas para viabilizar comercialmente a geração de energia solar, por meio do projeto Megawatt Solar, da Eletrobras Eletrosul.
Outra vertente do nosso trabalho, visando a sermos uma empresa sustentável, é a da eficiência energética. Por meio do Procel, estamos trabalhando para aprofundar o nível de consciência da importância do uso eficiente da energia elétrica entre as diversas camadas da população. Assim, temos o Selo Procel, voltado para o consumidor final de eletrodomésticos; o Procel Edifica, que trabalha com a indústria da construção civil, arquitetos e engenheiros civis, para disseminar os conceitos de eficiência bioclimática nas edificações; e o Procel Indústria, que trabalha com as indústrias que utilizam motores intensivamente, entre outros subprogramas.
Na sua opinião, qual é a contribuição de encontros regionais como o EIMA 8 para o desenvolvimento de projetos em sustentabilidade entre os países ibero-americanos? Quais são as suas expectativas em participar desse evento, em São Paulo?
José da Costa Carvalho Neto: Hoje, já participamos dos principais fóruns mundiais de decisão dos rumos da energia, mas consideramos que essa é apenas uma face da questão energética mundial. A outra face é a sustentabilidade, e encontros como o EIMA 8 permitem uma troca de experiências fundamental para que continuemos no caminho que traçamos para nos tornarmos a maior empresa de geração limpa de eletricidade do mundo até o fim desta década.
Especificamente no caso do EIMA 8, vamos tratar de temas urgentes como desenvolvimento sustentável, políticas de resíduos, economia verde, e poderemos trocar experiências sobre eficiência energética, além de discutir tecnologias como smart grid e os desafios do Rio+20. Portanto, minhas expectativas são as melhores – que o encontro possa gerar resultados positivos e estreitar a relação entre os países e entre as empresas.
Desde 2008, a Eletrobras passou a atuar efetivamente no exterior, dando foco à expansão dos negócios pelas Américas. Quais são as suas perspectivas para a integração dos países americanos, principalmente entre os latinos, em termos de produção, transmissão e cooperação energética? Existem projetos correntes que sejam capazes de ilustrar essas parcerias de integração?
José da Costa Carvalho Neto: O foco na integração na América Latina não é gratuito: há uma complementaridade no regime de chuvas entre o Brasil e seus vizinhos, o que, no caso das hidrelétricas, nos traz uma vantagem competitiva e uma segurança importante para o abastecimento de energia no país. Além disso, alguns de nossos vizinhos têm um potencial hidrelétrico muito maior que sua capacidade de consumo e outros, ainda, têm sua matriz elétrica baseada em térmicas, mais poluentes e caras que a energia hidráulica.
Existem, assim, pelo menos duas frentes de atuação da Eletrobras nesses países – em geração, construção e operação de usinas hidrelétricas (binacionais ou não), usando a farta experiência da Eletrobras no assunto, cuja energia pode ser vendida no país de origem e no Brasil e, em transmissão, a construção de linhas que permitam, inicialmente, o aproveitamento dessa complementaridade, benéfica para o Brasil e para os nossos vizinhos. Como exemplo, temos a construção, já em andamento, da linha entre Brasil e Uruguai, cuja entrada em operação está prevista para 2013. Há, também, hidrelétricas em fase de estudo de viabilidade no Peru, na Nicarágua e na Argentina.
O Brasil ainda mantém um bom nível de energia limpa na matriz energética por causa das hidrelétricas. Contudo, frente à crescente demanda, o desafio brasileiro volta-se para a diversificação das fontes de energia renovável. Na sua opinião, depois das hidrelétricas, qual é o setor de energia limpa que mais ganhará espaço no Brasil? Como incentivar esse desenvolvimento dentro dos padrões da sustentabilidade?
José da Costa Carvalho Neto: Apesar de ainda termos um grande potencial hidráulico no Brasil, especialmente no Norte do país, entendemos que há limites para o aproveitamento desse potencial, o que nos leva a aprofundar o investimento nas fontes complementares, principalmente na energia eólica, que vem ganhando espaço e cujo custo vem diminuindo nos últimos anos.
A situação econômica atual no mundo também possibilita um investimento maior da Eletrobras nesse setor e, por isso, a ideia é sermos agressivos no mercado eólico. Há um grande potencial no Brasil e os custos são decrescentes, portanto é aproveitar o bom momento e incrementar a participação dessa fonte na matriz da Eletrobras e na matriz brasileira.
Não podemos esquecer, contudo, a importância de uma fonte “virtual” de energia, a eficiência energética, cujo retorno pode ser muito maior do que é atualmente. O desenvolvimento da energia eólica e da eficiência energética no país certamente será fundamental para que seja possível resolver aquele que é um dos maiores dilemas mundiais na atualidade – conciliar a demanda crescente por energia e a preservação ambiental.
Quais são os maiores atrativos que a Eletrobras oferece aos investidores estrangeiros? Qual é a contribuição das energias limpas como a eólica e a solar no sentido de valorização dos investimentos? Acerca de sustentabilidade, qual é a tendência do mercado de energia daqui para frente?
José da Costa Carvalho Neto: O Brasil tem uma posição extremamente favorável no mundo quando o assunto é a sua matriz energética. Se falarmos de energia elétrica, então, a matriz é majoritariamente limpa e renovável – 84,5% da matriz brasileira está inserida nesses conceitos – e, neste cenário, a Eletrobras é a maior empresa do setor no país. Assim, não só os investidores, mas governos e organizações de todo o mundo já entenderam o potencial de atuação da Eletrobras como incentivadora do uso da energia limpa em escala planetária, graças a sua experiência no ramo. Tanto que a empresa vem participando, nos últimos anos, dos principais fóruns mundiais e discutindo, ao lado das maiores empresas do mundo no setor de energia, as formas de disseminação de fontes como a hidráulica e a eólica, além da eficiência energética e até da universalização da energia renovável.
Podemos ver, para o futuro, uma tendência cada vez maior da utilização de energia renovável, até por um desejo da sociedade internacional, preocupada com a qualidade de vida agora e para as gerações futuras. Logo, a Eletrobras está inserida num mercado altamente promissor, que, por sua vez, já está trazendo resultados. Isto, por si só, já é um grande atrativo para qualquer investidor.
No seu ponto de vista, qual é o papel do conceito de eficiência em termos de energia? O que falta para engatilhar a ética da cidadania na produção econômica e nos mecanismos de cooperação internacional?
José da Costa Carvalho Neto: Há, ainda, muito a se avançar em eficiência energética em todo o mundo. Até mesmo o conceito de sustentabilidade, em sua concepção completa, ainda está em fase de amadurecimento, não só no setor de energia, como também em vários outros. Isto acontece porque os conceitos ainda são relativamente novos e, ao mesmo tempo, as exigências do mercado aumentam com rapidez. Estamos numa fase de transição mundial, em termos sociais, econômicos, ambientais. Esses conceitos, portanto, ainda estão sendo entendidos e internalizados pelas pessoas e, em maior escala, pelas organizações. Mas acredito na importância desses temas e que já há conquistas a serem comemoradas.