Por Paula Manoela dos Santos, gerente de Mobilidade Urbana do WRI Brasil
Os ônibus elétricos são a tecnologia mais madura de que dispomos para descarbonizar o transporte coletivo ao mesmo tempo em que melhoramos a qualidade e o conforto do serviço, essencial para o bom funcionamento das cidades. O sucesso nesse processo pode colocar o Brasil em um papel de protagonista regional na transição para um transporte coletivo limpo. Com uma frota de mais de cem mil ônibus urbanos, o país tem uma ampla janela de oportunidade para descarbonizar o setor, de forma a fortalecer o mercado local e manter a plataforma produtora e exportadora de ônibus.
Apesar disso, o Brasil avança lentamente na adoção da tecnologia — em grande parte, devido ao alto custo inicial dos veículos e da infraestrutura. Por isso, o anúncio do Governo Federal de que apoiará 47 cidades e seis estados em projetos de renovação de frota com aquisição de 2.296 ônibus elétricos, é promissor, mas precisa ser complementado por conhecimento. Como toda nova tecnologia, há uma curva de aprendizado a ser vencida
As especificidades técnicas de ônibus elétricos significam que é necessário construir capacidades para sua adoção por municípios e estados. Entre esses desafios específicos, estão o redesenho da operação levando em consideração a autonomia dos veículos e as diferentes estratégias de recarga. Também as adequações necessárias nas garagens para receber a nova tecnologia, a infraestrutura de recarga e os treinamentos para as equipes de operação e manutenção.
São esses os temas que o WRI Brasil e o Ministério das Cidades estão abordando esta semana em um treinamento que tem ainda o apoio da TUMI Missão Ônibus Elétricos, ITDP e Prefeitura de Salvador. Participam do treinamento cidades e estados contemplados no PAC, e outros participantes do Grupo de Benchmarking QualiÔnibus, que o WRI Brasil coordena desde 2017.
Há cidades de diferentes portes e, naturalmente, capacidade para planejar a transição. Pelo menos três das cidades — Salvador, Campinas e Curitiba, somando 404 ônibus — já elaboraram planos e metas de eletrificação. No caso de Salvador, onde acontece o treinamento, os primeiros ônibus elétricos começaram a rodar em seu sistema BRT em 2002 e, no ano seguinte, inaugurou o maior terminal de recarga em área pública do país. Tem a meta ambiciosa de eletrificar 30% dessa frota até o ano que vem. A inclusão da cidade entre as contempladas no Novo PAC, com o financiamento de 94 veículos, a coloca mais perto da meta.
Para todas as cidades contempladas, esta será uma oportunidade importante de capacitação e aprofundamento no tema – vital, portanto, para o sucesso do projeto.
O cenário externo tem outros ventos animadores. O novo Marco Legal do Transporte Coletivo, por exemplo, em tramitação no congresso, firma bases regulatórias para renovar o modelo de contratação do serviço, prevendo indicadores de qualidade, novas fontes de receita e a possibilidade de separar a operação e a provisão da frota. Esses são alguns dos mecanismos que podem ser empregados para estimular a descarbonização; há outros, como modelos de compra agregada e incentivos fiscais.
Os ônibus elétricos podem contribuir para as metas climáticas do país. Mais importante e significativa ainda é seu efeito benéfico para a vitalidade das cidades, a saúde da população e o acesso de quem depende do serviço às oportunidades urbanas. A oportunidade está lançada.
Paula Manoela dos Santos, gerente de Mobilidade Urbana do WRI Brasil – Ao longo da carreira no WRI Brasil, ela trabalhou no aperfeiçoamento do SimBRT. Foi uma das pioneiras do desenvolvimento dos indicadores de qualidade do transporte coletivo do WRI Brasil. A partir do trabalho com transporte coletivo, Paula passou a estudar com profundidade a questão do acesso às estações de transporte e a influência das conexões para pedestres e ciclistas na operação do sistema. É autora dos manuais 8 Princípios da Calçada, Acessos Seguros e Manual de Programas e Projetos para Incentivar o Uso de Bicicletas em Comunidades.