A agricultura pode impulsionar o desenvolvimento, melhorar a segurança alimentar e o crescimento do emprego para tirar as pessoas da pobreza e para que não tenham que abandonar as zonas rurais em busca de oportunidades geradoras de renda.
Por Kanayo Nwanze*
Roma, Itália, 17/10/2016 – O primeiro dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) exige de nós “o fim da pobreza em todas suas formas em todo o mundo” até 2030, uma meta e um prazo ambiciosos, sem dúvida, mas como deve ser, porque não podemos nos dar o luxo de perder tempo. A pobreza está tão ligada à fome, às migrações, ao deslocamento forçado, aos conflitos e à degradação ambiental, que priorizar sua erradicação não é só um imperativo moral e econômico, como também é essencial para atender os mais graves assuntos globais de nosso tempo.
Para erradicar a pobreza devemos concentrar nossa atenção nas áreas rurais dos países em desenvolvimento, onde vivem três quartos das pessoas mais pobres e que mais passam fome no mundo. A renda de 2,5 bilhões de pessoas ainda depende diretamente de pequenas propriedades rurais, por isso é fundamental começar o desenvolvimento da produção dos pequenos agricultores e facilitar seu acesso aos mercados.
Em termos de pobreza, é particularmente perturbadora a situação na África subsaariana. Embora o Banco Mundial assinale que mais de um bilhão de pessoas saíram da extrema pobreza entre 1990 e 2012, a situação nessa região, de fato, piorou desde 1990 e há cerca de 330 milhões de pessoas pobres.
É importante perguntar por que o continente não consegue avanços na luta contra esse flagelo e o que se pode fazer a respeito. Os recursos naturais extrativos representam três quartos das exportações da África subsaariana, mas os milhares de milhões de dólares que geram têm um impacto limitado na redução da pobreza. Em alguns casos, o incentivo a essas indústrias prejudicou os investimentos no setor agrícola.
Entretanto, numerosos estudos coincidem em apontar que o crescimento da agricultura é até 11 vezes mais efetivo para reduzir a pobreza do que qualquer outro setor nessa região. Não se deve subestimar a capacidade da agricultura para levar prosperidade a milhões de pessoas. Na verdade é a atividade que mais emprego gera no mundo e constitui fonte de renda para 40% da população economicamente ativa no mundo e para 60% da África.
O potencial do continente africano sem explorar é enorme: possui 25% das terras cultiváveis do mundo e metade das terras não cultivadas, mas boas para a produção de alimentos. O crescimento da população africana, de 2,7% ao ano, implica que a demanda por alimentos duplicará a cada 30 anos. A agricultura pode impulsionar o desenvolvimento, melhorar a segurança alimentar e o crescimento do emprego para tirar as pessoas da pobreza e para que não tenham que abandonar as zonas rurais em busca de oportunidades geradoras de renda.
Apesar de todas as possibilidades que oferece, lamentavelmente, a agricultura não é uma prioridade para muitos governantes africanos. Em 2003, muitos governos do continente se comprometeram a destinar 10% de seu orçamento à agricultura e ao desenvolvimento rural nos cinco anos seguintes, mas em 2012 apenas 13 países haviam cumprido a meta.
Em lugar de desenvolver sua própria agricultura, o continente destina US$ 35 bilhões ao ano à importação de alimentos, dinheiro que poderia ser aplicado na geração de emprego local, particularmente nas áreas rurais. Os governantes costumam esperar que o crescimento econômico por si só leve à redução da pobreza, mas uma coisa não leva necessariamente à outra.
Em setembro, o Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Fida) divulgou o Informe de Desenvolvimento Rural 2016, que analisa a transformação rural e a redução da pobreza em mais de 60 países em desenvolvimento. Uma das conclusões centrais do estudo é que as políticas dirigidas à transformação das zonas rurais são essenciais para eliminar a pobreza.
Trata-se de iniciativas que promovem maior produtividade agrícola e maiores excedentes comercializáveis, oportunidades profissionais fora das práticas agrárias e melhorias no acesso a serviços e infraestruturas. É necessário dotar-se dessas políticas e investir, elas não acontecem sozinhas.
A experiência do Fida de quase quatro décadas evidencia que, quando as populações rurais têm facilidade de acesso a terras, recursos naturais, infraestrutura, tecnologia, fundos e mercados, melhora sua renda e suas comunidades florescem, o que contribui significativamente para o crescimento econômico.
Quando pensamos nos pequenos agricultores em termos de empresários rurais e em suas propriedades como negócios viáveis e rentáveis, torna-se evidente a importância de investir na agricultura para garantir sua prosperidade.
O resultado é que as áreas rurais se tornam centros dinâmicos de emprego e prosperidade e que os 600 milhões de jovens que na próxima década buscarão emprego nos países em desenvolvimento não terão que emigrar para as cidades nem para outros países a fim de encontrarem oportunidades de trabalho.
Naturalmente, erradicar a pobreza não é só responsabilidade dos governos, mas requer que todos os atores, agricultores, investidores locais da cadeia de valor alimentar, instituições de pesquisa, agências de desenvolvimento, instituições de ensino, entre muitos outros, trabalhem juntos para um objetivo comum.
Com governantes visionários, políticas e investimentos dirigidos e esforços coordenados, a erradicação da pobreza não é apenas um ideal ambicioso, mas um objetivo alcançável. E devemos reconhecer a urgência e atuar agora. Envolverde/IPS
*Kanayo Nwanze é presidente do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Fida).