Por Guillermo Fuentes, da IPS –
Puerto Morelos, México, 17/2/2015 – Quando os habitantes de Puerto Morelos, ao norte do Estado mexicano de Quinta Roo, viram sua praia de areia branca ficar da cor do café, e diante da pouca efetividade das autoridades, decidiram que sua comunidade deveria agir com urgência e se organizaram para limpá-la. Mas a situação piorou.
O verão de 2014 será lembrado pelos cronistas de Puerto Morelos, na Riviera Maya, como um dos piores em matéria climática na história desta cidade portuária, porque não afetou apenas o ambiente costeiro, mas também a economia local e regional, dependente dos ecossistemas marinhos costeiros.
Segundo a Administração Nacional Atmosférica e Oceânica dos Estados Unidos (NOAA), nessa temporada de verão foram registradas no planeta as maiores temperaturas nas superfícies terrestre e marítima dos últimos 135 anos. E, como se não bastasse, toneladas de sargaço foram parar na costa caribenha, deixando a costa marrom e com cheiro fétido (sulfureto de hidrogênio) pela decomposição da alga.
O fato levou ao cancelamento de centenas de voos domésticos e internacionais e também de muitas reservas de hotel, o que teve forte impacto econômico, derivando na perda de postos de trabalho permanentes e temporários.
Nas costas do Caribe sempre houve sargaço, cujo nome se deve a um navegante português porque os bagos da alga são muito parecidos aos de uma uva de Portugal chamada “sargaço”. O sargaço é comum no Oceano Atlântico, ao norte do Equador, e na costa oriental da África.
No mar, a alga forma um ecossistema valioso, sustenta a cadeia alimentar, oferece abrigo especial e alimento para as tartarugas jovens e outras espécies com importância comercial, bem como para exemplares jovens de outras espécies em perigo.Na costa e em quantidades moderadas, propicia a presença de aves de praia porque atrai insetos, evita a erosão e fertiliza as plantas das dunas.
As correntes oceânicas transportam a alga até o golfo do México através do Mar do Caribe, e também as que procedem da América do Sul. Mas, em geral, chegam as mesmas correntes às duas partes.Mas, este ano, segundo pesquisadores da Universidade de Galveston, no Estado norte-americano do Texas, a mudança registrada nas correntes oceânicas pela elevação das temperaturas marítimasafetou a distribuição do sargaço e jogou toneladas de algas nas costas do Caribe.
Outra hipótese apresentada por Brian Lapointe, especialista em sargaço da Universidade Atlântica da Flórida, também nos Estados Unidos, é que nutrientes contaminados derivados de atividades humanas e da agroindústria chegaram ao mar através do rio Mississippi, agregando nutrientes ao mar, que foram utilizados pela macroalga.
Em Quintana Roo, Puerto Morelos se destaca por seus arrecifes de coral e por ser uma das maiores barreiras marítimasdo mundo. Também é conhecida por ser um estandarte da pesquisa científica e da conservação nesse Estado mexicano. A população local e as autoridades procuraram limpar as praias, mas a situação continuou se deteriorando porque, além do mais, foi proibido o uso de tratores coletores, pelo risco que implicam para a área onde as tartarugas fazem ninhos.
No dia 4 de agosto, foi realizado um fórum da cidadania intitulado Implantação de Ações Para Desfrutar de Praias Limpas em Puerto Morelos, liderado por Guadalupe VelázquezOlimán, hidróloga e diretora do Centro de Pesquisa e Inovação para o Desenvolvimento Sustentável.No fórum foram apresentadas seis propostas de solução para o problema de gestão do sargaço. A iniciativa procurou implantar mecanismos e ações, bem como contribuir para uma solução integral para lidar com a presença da alga nas praias e promover uma alternativa distinta da prevista pelas autoridades, que era depositá-las em buracos.
“Observou-se que, se a alga marinha é retirada antes de chegar à costa e coletada de forma constante, é possível eliminar antes, com maior eficiência e de forma mais barata, porque não será necessário peneirar a areia, assim evitando a erosão costeira”, explicou Velázquez.
A chegada maciça de sargaço causou grandes perdas econômicas e houve graves consequências para a quantidade, qualidade e localização do emprego. Para atenuar a situação, o governo aproveitou um fundo federal para um programa de emprego temporário. Mas a população local se queixou de que a falta de transparência na gestão dos recursos foi contra a eficácia e a duração da iniciativa, o que gerou desconfiança e descontentamento popular.
É importante divulgar, promover, investir e replicar projetos de inovação como os apresentados no fórum, pois pode gerar importantes oportunidades de renda e emprego em atividades como ampliação da proteção costeira ou científicas e de segurança alimentar, ao transformar a alga em fertilizante natural e insumo agrícola.
A demanda por serviços e atividades sustentáveis aumenta no mundo. Com a boa disposição que têm seus habitantes e a equipe de cientistas, Puerto Morelos quer se converter em um exemplo de adaptação ao clima. Envolverde/IPS
*Este artigo faz parte do Voices2Paris, concurso do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) sobre mudança climática, produzido graças a CatalinaArévalo, da Agência EFE.