Por Fabíola Ortiz, da IPS –
Assunção, Paraguai, 15/8/2016 – A geração descentralizada de eletricidade com base em fontes renováveis, especialmente a abundante proporcionada pelo sol, é a solução mais sustentável e economicamente viável para que a luz chegue às suas comunidades mais isoladas do Paraguai. É nessas localidades, de zonas semiáridas ou semiúmidas com baixa densidade populacional, que vivem camponeses, indígenas e pecuaristas, e onde ainda há falta de eletricidade.
Segundo especialistas consultados pela IPS, a geração elétrica distribuída e descentralizada utiliza tecnologias de micro ou pequena escala, que proporcionam eletricidade em pontos próximos ao consumidor, é a ideal para atender essas populações. Esse sistema começou a ser impulsionado nos últimos anos no país, devido à má qualidade da distribuição da energia elétrica, apesar de a cobertura elétrica em nível nacional se aproximar dos 98%.
A evolução tecnológica também favorece a implantação a custos menores de painéis fotovoltaicos em um país que registra mais de 250 dias de sol no ano. O Paraguai, como a maioria dos países da América Latina, conseguiu um alto nível de eletrificação, mas experimenta problemas na chamada “última milha”, que se refere a chegar às populações afastadas, explicou à IPS uma das coordenadoras mundiais da Iniciativa Aldeias Inteligentes, Claudia Canales.
O programa, impulsionado pelas universidades britânicas de Cambridge e Oxford, tem por objetivo fornecer aos tomadores de decisão, doadores e agências de desenvolvimento, novas ideias sobre o acesso a energia em comunidades não ligadas à rede elétrica em países do Sul em desenvolvimento. Só na América Latina existem 24 milhões de pessoas que ainda não têm acesso a eletricidade e 65 milhões que dependem de lenha para cozinhar, segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU).
“A geração descentralizada é a única solução possível”, apontou Canales ao afirmar que as estratégias de micro e pequena escalas são normalmente mais sustentáveis, além de permitirem às populações rurais “tomarem nas mãos sua própria situação energética”. A seu ver, “a pobreza energética segue junto com a falta de recursos e de possibilidades econômicas”.
Para Canales, “o problema de muitas comunidades que não contam com eletricidade é que ficam em zonas isoladas, com casas dispersas e difíceis de se chegar. Os recursos necessários para estender a rede elétrica a essas comunidades e muito alto e pouco factíveis. A geração distribuída é a única opção econômica viável e a mais ecológica”.
Eduardo Viedma, presidente da Associação Paraguaia de Energias Renováveis, que reúne as oito empresas do setor,concordou que a melhor forma de mitigar a deficiência estrutural de energia do país é a geração distribuída, ou descentralizada.“Seria um negócio para todos, para o Estado, para os particulares e para as comunidades”, pontuou à IPS, destacando os inúmeros cortes de luz que ocorrem tanto nas cidades paraguaias, incluída a capital Assunção, como em pequenos povoados conectados à rede.
“O problema da distribuição elétrica no Paraguai é grave, porque é de qualidade muito ruim e com grandes perdas até chegar às residências. Estamos falando sobre falta de investimento na rede de distribuição de pelo menos 20 anos”, afirmou Viedma. O país não tem projetos consistentes de aproveitamento de fontes renováveis: todos ainda estão em fase-piloto ou foram investimentos pontuais para empreendimentos pecuários, resumiu. “Ainda não temos um mapeamento energético do país”, acrescentou.
O Chaco paraguaio, também conhecido como Região Ocidental, é o mais carente de infraestrutura nesse país de 6,9 milhões de pessoas, incrustrado entre Argentina, Bolívia e Brasil, com densidade inferior a 17 habitantes por quilômetro quadrado. Com 60% do território paraguaio, o Chaco tem apenas 5% da população e somente uma linha de transmissão da Administração Nacional de Eletricidade, que conecta apenas quatro localidades de aproximadamente dez mil habitantes cada uma. “A cobertura é baixíssima e as distâncias são longas” nessa região com partes semiáridas e outras semiúmidas, destacou Viedma.
Em 2014, foram licitados projetos para melhorar a eficiência energética e a geração elétrica, mas somente para instalações estatais na região, como destacamentos militares. Em outubro acontecerá a primeira licitação para um parque solar de 500 quilowatts, que será instalado em uma área sem eletricidade do município de Bahía Negra, no Chaco, 859 quilômetros ao norte de Assunção.
Um plano aprovado em 2011, mas que só agora começa a ser concretizado. Trata-se de substituir os geradores a diesel por painéis solares. O custo por quilowatt/hora de um sistema fotovoltaico equivale a cerca de US$ 0,40, enquanto o do combustível fóssil pode chegar a US$ 1.
“A energia solar seria uma solução ideal. Pode-se instalar painéis em escolas e hospitais e garantir que esse fornecimento de energia seja constante. Esse parque será emblemático para o Chaco”, ressaltou Viedma, acrescentando que a instalação deverá começar em 2017. A geração distribuída pode ser factível inclusive para famílias com baixa renda que vivem perto dos centros urbanos paraguaios, disse. “Há um cinturão de pobreza localizado nas periferias. Essa gente vive em condições bastante insalubres e têm acesso de forma ilegal a energia elétrica”, observou.
O diretor de Energias Alternativas do Vice-Ministério de Minas e Energia, Javier Saldaña, indicou à IPS que o principal desafio para a região do Chaco é gerar polos de desenvolvimento que justifiquem o aproveitamento de recursos energéticos renováveis em uma área remota e escassamente povoada. “O potencial renovável do Chaco paraguaio é muito bom, mas ainda é necessário fazer medições mais específicas. Uma alternativa seria a de oferecer esse potencial a quem está interessado em explorá-lo para proporcionar energia elétrica à região”, acrescentou.
Saldaña recordou que o Paraguai prepara uma nova Política Energética Nacional (PEN), que começou a ser elaborada em 2014, e cuja meta é que em 2040 as energias renováveis representem 60% de toda a matriz energética. A diversificação da geração elétrica é uma prioridade, reafirmou, embora “no momento não existam metas específicas por tipo de fonte na PEN, que entraria em vigor no final deste ano”.
Atualmente, a energia hídrica fornece 99,5% da eletricidade no país, graças à hidrelétrica binacional de Itaipu, que compartilha com o Brasil, no rio Paraná. Para Saldaña, contar com essa gigantesca fonte, “por um lado é muito favorável, já que se trata de uma fonte limpa e renovável, porém, devemos entender que, entre outras coisas, uma matriz energética baseada apenas em uma fonte de geração não é nada sustentável”.
“Não temos mais alternativas, a não ser basear a sustentabilidade do setor em fontes de energia como a solar e a eólica, além da bioenergia”, declarou o responsável da área renovável. Uma vez que a PEN entre em vigor, será criado o marco regulatório da geração distribuída e descentralizada.
“Consideramos de transcendental importância essa lei, pretendemos instalar uma massa crítica, que permita medir o fornecimento da geração alternativa ao Sistema Interligado Nacional e fortalecer o setor privado, de maneira que comece a ser competitivo”, explicou Saldaña. “Nada disso seria possível sem uma normativa que dê vantagens ao consumidor e que faça com que seu investimento represente benefícios para a economia familiar”, acrescentou. Envolverde/IPS