Por Ivet González, da IPS –
Holguín, Cuba, 24/6/2016 – Cinco modernas e chamativas máquinas irrigam os 138 hectares da fazenda estatal La Yuraguana, na província de Holguín, a terceira mais importante de Cuba. Mas,“às vezes, não podem ser ligadas devido ao baixo volume de água”, explicou seu administrador, EdilbertoPupo.“Os últimos três anos foram tensos pelas poucas chuvas. E para regar nos abastecemos de uma represa que quase secou”, contou à IPS o responsável pela exploração, que em 2008 recebeu novos sistemas de irrigação graças ao financiamento internacional.
As máquinas do tipo com pivô central, montadas em Cuba com componentes europeus, irrigam pelo método de aspersão, que imita a chuva que cai sobre ou entre as plantas. Desde o final de 2014, Cuba sofre a seca mais severa dos últimos 115 anos, que alerta para a urgência de modernização e ajuste da gestão da água no setor agropecuário aos desafios climáticos, entre outros problemas, como desperdício devido ao mau estado das redes hidráulicas, ineficientes políticas de economia e pouca medição do volume entregue.
O processo de reformas,iniciadonesse país em 2008, ainda não conseguiu levantar o setor agropecuário, que, ainda assim, é o maior consumidor de água, ao absorver 65% do total de extrações para irrigação, aquicultura e pecuária.A situação se torna complexa para o futuro porque as secas serão cada vez mais estacionais no Caribe, como efeito da mudança climática, segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) anuncia em seu último estudo sobre a área, divulgado no dia 21 deste mês.
“A agricultura será o setor mais afetado, com graves consequências econômicas e sociais, já que a maioria da agricultura do Caribe é de terra seca”,além de se observar maior demanda de abastecimento de água doce pelo “uso cada vez mais generalizado da irrigação”.Dos 36 países com maior escassez de água no mundo, sete são caribenhos, segundo a FAO.Comono resto do leste cubano, a região do país que mais sofre secas, os camponeses da província de Holguín enfrentam o problema com outras alternativas e sabem que, em situações extremas, as máquinas de irrigação de pouco servem.
“Nos momentos mais críticos, tivemos que semear cultivos resistentes, como mandioca e banana, que se mantêm até serem colhidos”, explicouPupo, sobre a fazenda que vende hortaliças, grãos, frutas e tubérculos paraos 287.800 habitantes da cidade de Holguín, capital da província.A meta de produção para 2016 de La Yuruguana, com 93 trabalhadores, dos quais 14 são mulheres, é de cerca de 840 toneladas de alimentos, que são vendidos diretamente para mercados na cidade.
“Esperamos que São Pedro nos ajude, que chova e a represa encha para podermos regar e produzir sem parar”, destacouPupo, se referindo ao santo católico cuja data é comemorada no dia 29 de junho, e que os crentes rurais invocam porque lhe atribuem o poder de fazer chover. A área agrícola de Cuba chega a 6.240.263 hectares, dos quais apenas 459 mil dispõem de sistemas de irrigação, a maioria com tecnologias obsoletas, segundo o informe governamental Panorama doUso da Terra. Cuba 2015.
Atualmente, apenas 11% das terras cultivadas são irrigadas, mas a FAO prevê que, até 2020, a superfície equipada praticamente duplicará e cobrirá cerca de 875.600 hectares, mediante um programa, iniciado em 2011, de modernização das máquinas e reorganização da irrigação e da drenagem no setor agropecuário. A irrigação eleva em até 30% os rendimentos agrícolas, segundo especialistas do setor.
As autoridades cubanas desejam que a produção local alivie o gasto de US$ 2 bilhões anuais em alimentos importados, para atender a demanda dos 11,2 milhões de habitantes e dos turistas que chegam ao país, que em 2015 foram três milhões.O agrônomo Theodor Friedrich, representante da FAO em Cuba, opinou à IPS que “a irrigação não é a resposta à seca”.
Cuba“deveria reduzir o uso da irrigação em lugar de estendê-lo”, aconselhouFriedrich, porque espremer as fontes de água, sobretudo as subterrâneas, pode levar “à degradação e salinização acelerada dos recursos hídricos”.A alternativa “é aplicar técnicas de economia de água de forma imediata, como reduzir as perdas ao longo da rede de distribuição, evitar qualquer irrigação por aspersão, aplicar diretamente a água no solo e regar segundo as necessidades do cultivo, considerando também as previsões meteorológicas”, destacou.
Para o agrônomo, a solução sustentável reside “no manejo do solo”, com técnicas de conservação. Também destacou que a agricultura ecológica “permite produzir mais com menos água e abre os solos para que as futuras chuvas possam se infiltrar de forma completa e encher o aquífero”. Por sua geografia, sem grandes lagos e rios, Cuba depende das chuvas, cuja água retém em 242 represas e dezenas de microrrepresas.
Como o representante da FAO, especialistas locais desaconselham levar ao extremo a exploração subterrânea, porque há o risco de salinização e perda da fonte de água doce. Originada no fenômeno El Niño/Oscilação do Sul, que causou estragos este ano na América Latina, a atual escassez de água afetou 75% do território cubano, segundo fontes oficiais, com os maiores danos em Santiago de Cuba, província vizinha de Holguín.
Apesar de medidas que priorizam o consumo da população sobre a agricultura e as indústrias, um milhão de pessoas sofreu em maio alguma limitação no acesso a água, informou o estatal Instituto Nacional de Recursos Hídricos.
No dia 20 deste mês, a União Europeia anunciou que entregará cem mil euros adicionais a Cuba, por intermédio da Cruz Vermelha, para dar assistência a dez mil pessoas prejudicadas pela seca em Santiago de Cuba. O apoio busca melhorar o acesso a água segura, com a entrega de equipamentos de transporte, reservatórios e materiais para tratá-la. Apesar disso, responsáveis do setor agrícola e camponeses veem a irrigação como fundamental para disparar a produção.
“O rendimento com os ciclos exigidos de irrigação é muito maior do que quando se espera pela natureza”, argumentou Abdul González, vice-prefeito para a agricultura do governo municipal de Holguín. “Hoje, 80% de nossas áreas cultivadas estão desprotegidas de irrigação”, afirmou à IPS.“Os camponeses de todas as formas produtivas (Estatal, privada e cooperativa) pedem sistemas de irrigação, inclusive alguns fazem tanques e poços para minorar um pouco a situação”, pontuou.
Na Cooperativa de Créditos e Serviços Eduardo R. Chibás, próxima a La Yuraguana, Virgilio Díaz, usufrutuário com 22 hectares onde planta alho, milho, batata-doce, papaia e sorgo, atribui parte de seu êxito ao sistema de irrigação que pôde comprar em 2010,por intermédio da associação de 140 integrantes.“A renda aumentou em mais de 70%, e melhoramos os salários, pude pedir mais terra em usufruto e construí uma nova casa”, ressaltou à IPS esse produtor, que costuma obter, junto com seus cinco trabalhadores, 200 toneladas anuais de alimentos, em condições climáticas favoráveis. Envolverde/IPS