A devastação do Código Florestal

Estão desmatando o Código Florestal. O quê? Você não conhece o Código Florestal? Nunca esteve lá? Mas essa mocidade está mesmo precisando sair da cidade…

Como o próprio nome diz, o Código Florestal é uma floresta. Já bem devastada, é verdade, mas uma floresta de respeito. Apesar das áreas já abertas pelo homem, o Código Florestal ainda constitui uma complexa comunidade de vida em que cada ser depende dos outros para sobreviver, o que significa que a floresta depende de seus integrantes para continuar existindo de forma sustentável. Mas, conforme eu já alertei, estão desmatando o Código Florestal. A ameaça vem das propriedades vizinhas, sob a forma de um “correntão”. A ideia dos tratores é otimizar a biodiversidade simplificando-a em uma só espécie, que pode ser uma planta com potencial econômico direto (a soja, por exemplo) ou indireto, caso do capim para a criação de gado. Antes que você diga que o assunto não passa de conversa para boi dormir – e pastar –, devo dizer dos perigos que o desmatamento representa para o Código Florestal, antes que seja tarde e os bois nos mandem pastar em outro lugar.

O primeiro perigo diz respeito à área conhecida como Reserva Legal. Trata-se da cobertura vegetal que conseguiu permanecer de pé no Código Florestal e que garante minimamente (se é que garante) a reprodução da vida no local. Além de comprometer o ciclo da água na região (já que menos árvores transpiram menos, o que diminui as chuvas), a supressão da Reserva Legal, abrigo dos seres que insistem em viver ali, significa séria ameaça a esses seres e, por consequência, ao Código Florestal.

Outro ameaçado é o principal curso d’água da região, o córrego florestal. A grande cobertura de árvores das suas margens – não por acaso chamada de Área de Proteção Permanente (APP) – protege o córrego do assoreamento e o mantém vivo, o que, por sua vez, garante água para boa parte da comunidade de vida local. O desmatamento das APPs pode romper com esse equilíbrio: a parte remanescente não seria suficiente para proteger o córrego florestal e, em última instância, o Código Florestal.

Finalmente, o único agente de combate às agressões ao Código Florestal, responsável pela punição aos invasores, também tem sido seriamente afetado. Estou falando do lendário Curupira. Com o desmatamento, ele tem perdido muitos de seus esconderijos, o que compromete a sua atuação como defensor da floresta. (É claro que os agressores vão ser castigados de qualquer jeito, quando, num futuro próximo, suas produções forem afetadas pela falta de chuvas ou por pragas resultantes da destruição do Código Florestal, mas isso não diminui a importância da punição imediata.) Há quem diga que as ações punitivas do Curupira não passam de lenda, mas é bom lembrar que toda lenda tem um pé (mesmo que virado ao contrário) na verdade, ainda que essa verdade seja apenas um desejo da população brasileira. De qualquer forma, o desmatamento inviabiliza o trabalho do velho Curupira e, com isso, penso eu, o próprio Código Florestal.

Estão desmatando o Código Florestal. E eu não tenho medo de afirmar: com a devastação que está em curso, o pouco que sobrar da floresta não vai servir para mais nada.

* Mateus do Amaral é jornalista.