Foto: Clovis Fabiano
Foto: Clovis Fabiano

Conferência do Instituto Ethos de 2015 mostra que as empresas não abandonaram por completo seus planos de crescimento a partir de uma visão de negócios sustentáveis.

Por Dal Marcondes, da Envolverde

Quando o horizonte dos negócios fica nublado por incertezas, a visão tradicional do Business as Usual manda que o conservadorismo assuma as rédeas. Preservar os dedos é mais importante do que manter os anéis, portanto os adereços de sustentabilidade costumam perder força. Não está sendo diferente na atual crise econômica que assombra o mundo e que tem uma alavancagem maior no Brasil graças ao aditivo de uma crise política.

Tradicionalmente a primeira vítima das receitas de contenção de despesas das empresas eram as áreas de comunicação e marketing. Desta vez não foi diferente, no entanto essas áreas ganharam companhia, os departamentos e diretorias de sustentabilidade. Em muitas empresas eles praticamente deixaram de existir. Mas, ao contrário da comunicação, que sempre foi um nicho dentro das organizações, a sustentabilidade tem trabalhado ao longo dos anos para tornar-se uma transversalidade, ou seja, infiltrar-se em todas as áreas de forma a criar uma visão sistêmica que permeie todas as decisões, em todos os níveis de gestão.

Foi essa capilaridade que os diálogos realizados na Conferência Ethos deste ano procurou mostrar. Repetindo, com algumas evoluções, o modelo 360º adotado em 2014, o evento procurou criar um imenso espaço de relacionamento e construção de redes entre os milhares de participantes. Foram muitos os temas candentes, como mudanças climáticas, energias limpas, trabalho digno, finanças sustentáveis, modelos de gestão com foco em causas e uma imensa lista de inovações.

Uma pergunta estruturante para os negócios nessa era de incertezas é “Como meu negócio pode gerar lucro e ao mesmo tempo ajudar na qualidade de vida das pessoas e do planeta?”. Essa questão esteve presente na fala de Elizabeth Laville, fundadora e diretora da Utopies, uma consultoria francesa que procura mostrar como o valor dos produtos está migrando das marcas para as causas que eles representam. Um de seus exemplos foi uma campanha da montadora KIA, que oferece uma bicicleta a quem compra um de seus carros. A mensagem, segundo Laville, é de que as aparentes contradições na verdade representam complementos em qualidade de vida.

A construção de um futuro que tenha como norte a sustentabilidade, nesse momento da história, passa por uma definição das energias que serão disponibilizadas para as empresas e para a sociedade. O Brasil tem, nesse quesito, grandes vantagens competitivas, principalmente porque parte do “berço esplêndido” das hidrelétricas construídas nas últimas décadas, que hoje representam quase 70% da eletricidade, e de um programa que surgiu como substituição de importações de petróleo, mas que hoje permite que os brasileiros decidam em seu cotidiano por um biocombustível de qualidade, o etanol. Hoje, a participação total das energias renováveis no portfólio brasileiro de energia é de cerca de 40%, enquanto a média mundial não chega a 14%.

Dados apresentados durante a Conferência por André Nahur, coordenador de Mudanças Climáticas e Energia do WWF-Brasil, mostram que om país tem ainda um enorme potencial de crescimento em geração de energia fotovoltaica, um modal ainda pouco explorado. A região menos ensolarada do Brasil tem potencial de geração de 1.642 quilowatts por hora por metro quadrado (kWh/m²). Na Alemanha, que recebe cerca de 1.300 kWh/m² a geração fotovoltaica já representa mais da metade da demanda do país.

Em mais de quarenta atividades, realizadas nos dias 22 e 23 se setembro, os participantes puderam trabalhar conceitos e práticas de grandes empresas e organizações sociais que atuam na vanguarda das experiências em gestão. Questões relativas ao trabalho digno, ao combate a práticas abusivas e, principalmente, boas práticas de empresas de todos os portes e de diversas partes do mundo puderam receber atenção de especialistas. Para Jorge Abrahão, presidente do Instituto Ethos, as crises, política e econômica, oferecem a oportunidade de uma reflexão sobre o modelo de sociedade e de negócios que temos. “Os diagnósticos sobre os problemas do atual modelo de desenvolvimento estão feitos, muitas das soluções já são conhecidas, portanto não há mais o que esperar, é preciso acelerar as mudanças”, disse.

Para as pessoas que estiveram nesses dois dias de intensas atividades a experiência foi bastante motivadora, como explicou a gerente do Centro SEBRAE de Sustentabilidade, Suenia de Souza, que lidera em Cuiabá uma das mais inovadoras ações para o fomento de negócios mais sustentáveis. “A visão de modelos que estão à frente de seu tempo é um estímulo à inovação e à incessante busca por conhecimento”, disse. Esse é, talvez, o principal papel dessa conferência em um momento em que a crise intimida o espírito empreendedor e de transformação do modelo econômico. (Envolverde)