por Baher Kamal, da IPS
Istambul, Turquia, 24/5/2016 – Com numerosos chefes de Estado e de governo expondo suas medidas para aliviar o sofrimento humano e prometendo mais, e representantes de organizações humanitárias e da sociedade civil denunciando a falta de honestidade política, enquanto trilhões de dólares continuam sendo entregues à indústria armamentista, começou, no dia 23 e termina hoje, a Cúpula Humanitária Mundial.
A Organização das Nações Unidas (ONU) informou que a comunidade internacional destina US$ 25 bilhões à assistência para salvar a vida de aproximadamente 125 milhões de pessoas devastadas por desastres naturais e guerras, enquanto o Instituto Internacional de Estudos para a Paz de Estocolmo (Sipri) estima que o gasto militar chegou a US$ 1,6 trilhão em 2015.
“Não importa, esta cúpula é extremamente importante”, destacou um diplomata asiático qu
e pediu para não ser identificado. “Os líderes dos países mais ricos, especialmente da Europa e dos Estados árabes do Golfo, são perfeitamente conscientes da magnitude do desafio humanitário que têm pela frente”, acrescentou.
Segundo o diplomata, “alguns deles serão sinceramente sensíveis ao sofrimento humano, outros se preocuparão mais com sua paz política interna; a maioria dos países industrializados, em particular da Europa, está desejosa de que as crises humanitárias sejam atendidas e resolvidas além de suas fronteiras”.
Os governantes temem que, se a atual crise, sem precedentes, se agravar de forma exponencial como indicam os prognósticos, inevitavelmente leve a mais conflitos e maior instabilidade, prejudicando seu bem-estar político e econômico, destacou o diplomata asiático.
Essa Cúpula procurará movimentar entre US$ 20 bilhões e US$ 30 bilhões para enfrentar a pior crise humanitária em curso, disse Stephen O’Brien, secretário-geral adjunto da ONU para Assuntos Humanitários e coordenador da Ajuda de Emergência. “Não devemos subestimar a gravidade do que nos espera nestes dias, uma oportunidade única na vida para colocar em marcha uma agenda ambiciosa e de longo alcance para mudar a forma como aliviamos, mas, e mais importante, prevenimos o sofrimento das pessoas mais vulneráveis do mundo”, ressaltou à IPS.
Para os 5.500 participantes da primeira Cúpula Humanitária Mundial, os fatos mostram que, nos últimos anos, os conflitos e os desastres naturais geraram um número de pessoas necessitadas de assistência que aumenta com rapidez, e uma falta de fundos para ações humanitárias de aproximadamente US$ 15 bilhões, segundo estimativas da ONU.
“É muito dinheiro, mas não está fora do alcance de um mundo que gera um produto interno bruto (PIB) de aproximadamente US$ 78 trilhões”, diz um informe do grupo de alto nível dedicado ao financiamento das operações humanitárias e promovido pela ONU. “Cobrir o déficit econômico significaria que ninguém tivesse que morrer ou viver sem dignidade por falta de fundos”, acrescenta o documento.
“Os desastres, naturais e produtos das atividades humanas, são cada vez mais frequentes, mais complexos e mais intensos. Mais de 60 milhões de pessoas serão obrigadas a abandonar suas casas em razão de conflitos e violência”, afirmou Jan Eliassonin, vice-secretário-geral da ONU, em entrevista coletiva às vésperas da Cúpula. Atualmente, as Nações Unidas estimam que mais de 130 milhões de pessoas necessitem de ajuda e proteção em diferentes partes do mundo.
As necessidades humanitárias aumentam ano a ano, e cada vez mais pessoas precisam de ajuda por períodos prolongados. Isso também eleva os custos da assistência e da proteção. Os pedidos de fundos pela ONU aumentaram seis vezes e passaram de US$ 3,4 bilhões, em 2003, para quase US$ 21 bilhões, atualmente. O informe Aderessing the Humanitarian Financing Gap (Atendendo o déficit de fundos para ações humanitárias) indica que cobrir o déficit “seria uma vitória para a humanidade quando mais se necessita dela”.
Dentro da preparação da Cúpula, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, designou um grupo de nove especialistas para buscar soluções para a falta de fundos. O grupo identificou e analisou três elementos importantes e interdependentes do desafio econômico para as operações humanitárias: reduzir as necessidades, mobilizar fundos mediante mecanismos tradicionais e inovadores, melhorar a eficiência da assistência.
O documento também é importante no contexto dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), pois ressalta que, somente nos concentrando em atender o crescente número de pessoas desesperadas para receber ajuda, poderemos cumprir com esses objetivos. O grupo reconheceu que a melhor forma de enfrentar as crescentes necessidades humanitárias é atender as causas.
“Isso requer uma forte determinação no mais alto degrau da hierarquia política mundial para prevenir e resolver conflitos, bem como aumentar o investimento na redução de desastres”, pontua o documento. E conclui que, “como o desenvolvimento é a melhor forma de construir resiliência, o grupo acredita que os escassos recursos mundiais da assistência oficial ao desenvolvimento devem ser destinados para onde mais são necessários, em situações de fragilidade”.
Representantes de 177 países, entre eles 68 chefes de Estado e de governo, comunidades afetadas por crises, organizações da sociedade civil, o setor privado e agências da ONU participam da cúpula de Istambul. Na sessão plenária, houve previstas mesas-redondas com figuras de alto nível. O primeiro dia foi o do Segmento de Líderes para chefes de Estado e de governo.
Nessa instância foram tratadas as cinco principais áreas da Agenda para a Humanidade: liderança política para prevenir e terminar conflitos; defender as normas que preservam a humanidade; não deixar ninguém de fora; mudar a vida das pessoas, desde fornecer ajuda até acabar com a necessidade, e, por fim, investir na humanidade. Envolverde/IPS