Nova política externa do Egito preocupa Washington

Washington, Estados Unidos, 6/5/2011 – Enquanto congressistas dos Estados Unidos ameaçam suspender a ajuda ao Paquistão por supostamente ter dado abrigo a Osama bin Laden, cresce a preocupação quando às relações com outro importante aliado: o Egito. Washington entregou a este país uma média de US$ 2 bilhões ao ano – cerca de um terço dos quais destinado às forças armadas – desde que o Egito assinou os Acordos de Camp David com Israel, em 1979.

Isso também fez com que outras nações e instituições financeiras internacionais se mostrassem mais generosas com o Egito, cujo aval tácito sob o regime de Hosni Mubarak às polêmicas ações de Israel contra os palestinos era considerado indispensável para manter um aceitável status quo no Oriente Médio. Mas a nova política externa do governo interino egípcio, que assumiu há quase três meses, causa nervosismo em Washington, particularmente no Congresso, onde a influência do lobby israelense é especialmente forte.

A preocupação aumentou especialmente depois que o Egito mediou um acordo de reconciliação assinado, no dia 4 no Cairo, pelos grupos palestinos Hamas (Movimento de Resistência Islâmica) e o secular Fatah, pacto que é muito criticado por destacados congressistas, e pelo próprio governo de Barack Obama.

A presidente do Comitê de Assuntos Exteriores da Câmara de Representantes, Ileana Ros-Lehtinen, e o principal representante do governante Partido Democrata nessa casa, Howard Berman, já disseram que a ajuda norte-americana deveria ser interrompida para qualquer governo palestino que inclua o Hamas, a menos que este movimento renuncie à violência, reconheça o direito de Israel existir e aceite acordos já assinados pela Organização para a Libertação da Palestina (OLP).

Embora ainda nada tenha sido proposto formalmente, cresce no Congresso a ideia de cortar a ajuda ao Egito como forma de frear a independência que demonstra em sua política externa. “Se o desejo do Cairo de uma política externa mais independente se traduz em vínculos mais estreitos com terroristas, o histórico apoio dos Estados Unidos aos militares egípcios deve ser reconsiderado”, escreveu no dia 3 o jornal neoconservador The Wall Street Journal, em um editorial no qual definia as últimas ações do Egito como uma “perturbadora antessala do que poderia emergir” da chamada Primavera Árabe.

A preocupação de Washington começou pouco depois da saída de Mubarak, quando o Egito permitiu que navios de guerra iranianos passassem pelo Canal de Suez para o Mar Mediterrâneo, uma ação que Israel e seus aliados insistiram em dizer que não tinha precedentes desde a Revolução Islâmica de 1979. O novo chanceler egípcio, Nabil Elaraby, assegurou que seu governo não tem a intenção de renunciar aos Acordos de Camp David. Mas, desde que assumiu, sua política exterior ganhou independência tanto dos Estados Unidos quanto de Israel.

No começo deste mês, Elaraby anunciou, após uma incomum reunião com diplomatas de alto escalão iranianos, que os dois países “abriram uma nova página”. Desde então, o Cairo deixa claro que tenta normalizar as relações com Teerã, algo que supõe um importante revés para os esforços norte-americanos e israelenses destinados a isolar a República Islâmica e forjar uma aliança de fato entre Israel, Egito e as monarquias sunitas da Jordânia e do Golfo.

“Todo o mundo mantém relações diplomáticas com o Irã, menos Estados Unidos e Israel”, disse na semana passada, ao jornal The New York Times, o porta-voz da chancelaria egípcia, Menha Bakhoum. “Vemos o Irã como um vizinho na região com o qual devemos manter relações normais”, acrescentou. Ao mesmo tempo, confirmou em uma entrevista à rede árabe de televisão Al Jazeera o que era comentado há semanas: o Egito abriria o posto de fronteira de Rafha com o território palestino, controlado pelo Hamas, o que poria fim a um bloqueio israelense de cinco anos, que Mubarak ajudou a manter em vigor.

O Cairo também acaba de aderir aos esforços da Autoridade Nacional Palestina (ANP) para ser reconhecida como Estado independente na próxima sessão plenária da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas em setembro, e teria exortado os Estados Unidos a fazerem o mesmo.

O governo de Obama disse que se opõe veementemente a essa iniciativa, alertando que minaria o “processo de paz”, embora este esteja suspenso desde setembro do ano passado. Entretanto, é improvável que Washington possa deter os esforços palestinos, que contam com apoio de potências da Europa ocidental. A nova política externa do Egito parece estar desenhada para satisfazer a opinião pública local que, segundo pesquisas, é cada vez mais contrária aos Estados Unidos, desde a invasão do Iraque em 2003, e mostra especial hostilidade em relação a Israel.

Na última pesquisa divulgada pelo Centro de Pesquisa Pew, 54% dos entrevistados disseram que os tratados de Camp David com Israel deveriam ser anulados, enquanto 36% afirmaram que deveriam ser mantidos. Já 43% preferem uma relação mais distante com os Estados Unidos com relação aos anos anteriores. A mesma pesquisa demonstrou forte apoio a Amor Moussa, ex-presidente da Liga Árabe e provável candidato presidencial egípcio, que é defensor de uma independência ainda maior em política externa.

Muitos observadores acreditam que os cortes na assistência proporcionada por Washington serão inevitáveis se o Egito mantiver a atual trajetória. Envolverde/IPS

* O blog de Jim Lobe sobre política externa dos Estados Unidos pode ser acessado em www.lobelog.com.