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Gestão de população no Pacífico nas mãos das mulheres

As nações insulares do Pacífico asseguram que o empoderamento das mulheres é a chave para abordar o crescimento da população na região. Foto: Catherine Wilson/IPS
As nações insulares do Pacífico asseguram que o empoderamento das mulheres é a chave para abordar o crescimento da população na região. Foto: Catherine Wilson/IPS

 

Port Vila, Vanuatu, 11/7/2014 – Os especialistas preveem que a população de muitos países da Melanésia, na zona das ilhas do sudoeste do Pacífico, duplicará no prazo de uma geração, o que ameaça os esforços regionais e nacionais para melhorar os baixos indicadores de desenvolvimento econômico e humano. Arnold Bani, diretor-executivo da Associação de Saúde Familiar de Vanuatu na capital, Port Vila, acredita que, se os problemas de saúde reprodutiva não forem abordados nos próximos dez ou 15 anos, o resultado “será um desastre para o país”.

Vanuatu é um arquipélago de 82 ilhas a oeste de Fiji, com população de 247.262 habitantes e crescimento demográfico anual de 2,4%, em comparação com a média mundial de 1,1%. Do mesmo modo, o crescimento demográfico dos sete milhões de habitantes de Papua Nova Guiné é de 2,1%, como nas vizinhas Ilhas Salomão, onde vivem 550 mil pessoas.

Enquanto o mundo celebra hoje o Dia Mundial da População, e devido à elevada taxa de gravidez de adolescentes na região, os especialistas afirmam que é importante empoderar as mulheres nas decisões sobre planejamento familiar para modificar a conduta das gerações mais jovens. A tarefa não é fácil, considerando as fortes pressões culturais e sociais imperantes para ter famílias numerosas.

“É o entorno familiar que cobre a maior parte das necessidades básicas e a atenção das pessoas”, disse Helen (nome fictício), uma mãe em Port Vila, onde o uso de anticoncepcional é de 38%. “Por isso, se uma mulher toma decisões sobre planejamento familiar, haverá uma briga na família”, afirmou à IPS.

Há razões práticas para ter muitos filhos, explicou Alec Ekeroma, presidente da Sociedade do Pacífico para a Saúde Reprodutiva em Auckland, Nova Zelândia. “As famílias numerosas são como uma apólice de seguro para a sobrevivência da família”, afirmou à IPS. “Ter mais filhos implica que ajudarão com os meios de vida rurais e que alguns sobreviverão além da infância, já que cuidar dos pais é considerado um dever dos filhos, especialmente nos países onde não há serviços sociais”, acrescentou.

Mas Helen disse que manter uma família numerosa é uma luta neste país, onde a renda média mensal é de US$ 300. A taxa global de fecundidade (TGF) caiu de sete para quatro desde os anos 1960, enquanto em Papua Nova Guiné é de 3,8 e nas Ilhas Salomão de 4,1. Uma população estável tem TGF de 2,1. Os especialistas consideram necessário aumentar o uso de anticoncepcionais, que oscila entre 35%, em Papua Nova Guiné, e 22% em Kiribati, bem abaixo da média dos países menos avançados, que é de 56%.

Um informe publicado na revista Reprodutive Health em 2013 afirma que, se Vanuatu aumentar o uso de anticoncepcionais para 65%, em 2025 terá uma população sustentável, reduzirá os nascimentos de alto risco em 54%, os partos de adolescentes em 46% e o número médio de gravidezes não desejadas em 68%, de 76 para 12 em cada mil mulheres.

Os anticoncepcionais e as famílias menores ajudariam a salvar vidas. Em Vanuatu ocorrem 110 mortes maternas em cada cem mil nascidos vivos, contra 120 em Tonga, 130 em Kiribati e 733 em Papua Nova Guiné. Mas prestar serviços de saúde reprodutiva às populações principalmente rurais e dispersas das ilhas é um desafio devido à escassez de infraestrutura, serviços de transporte e pessoal sanitário capacitado

A escassa educação formal e a influência dos tradicionais curandeiros nas comunidades rurais também influem, segundo Rufina Latu, da Organização Mundial da Saúde (OMS). Mesmo quando existem os anticoncepcionais, seu uso pode se complicar pelo medo dos efeitos secundários ou da redução da fecundidade, pela oposição religiosa e pelo analfabetismo.

Em Shefa, a maior província de Vanuatu, apenas 27% da população sabe ler e escrever, segundo pesquisa realizada pela Associação da Ásia e do Pacífico Sul para a Educação Básica e de Adultos. Uma das principais preocupações das mulheres é a desigualdade de gênero e o fato de os maridos determinarem o tamanho das famílias, disse Leias Cullwick, diretora do Conselho Nacional de Mulheres de Vanuatu. O medo da violência de gênero, muito arraigada, também afeta o comportamento feminino, ressaltou.

Segundo Latu, “as estatísticas indicam que muitas mulheres preferem os anticoncepcionais de ação prolongada como injeções de Depo-Provera (acetato de medroxiprogesterona), para que seus maridos não fiquem sabendo”. Não é raro o marido pensar que suas mulheres mantêm relações extraconjugais se utilizarem anticoncepcional, acrescentou.

A desigualdade de gênero também influi na elevada fecundidade das adolescentes de Vanuatu, onde há 66 nascimentos em cada mil mulheres entre 15 e 19 anos. Nas ilhas da região do Pacífico, 25% dessas jovens são mães. Calcula-se que um terço dos jovens urbanos carecem de conhecimentos básicos sobre saúde reprodutiva e que muitos são contra o acesso aos respectivos serviços.

A participação juvenil é uma prioridade urgente devido ao impacto negativo que tem a gravidez na vida das jovens, como o baixo nível de educação, a pobreza e a mortalidade materna. O risco de morte das mães menores de 15 anos nos países de renda baixa e média duplica em relação ao das mulheres adultas, informou o Fundo de População das Nações Unidas.

O ensino sobre população e saúde reprodutiva deve começar na infância e a “educação para a vida familiar deve ser obrigatória nas grades curriculares em todos os níveis”, pontuou Latu, acrescentando que “se poderá conseguir um contexto mais propício para o empoderamento das mulheres se os homens e os cônjuges também participarem” da tarefa da mudança social.

Cullwick sugeriu que os enfermeiros de Vanuatu se capacitem para sensibilizar os homens sobre a igualdade de gênero e o planejamento familiar. “Com a alta taxa de analfabetismo, não se pode imprimir e distribuir folhetos. É preciso um homem que fale com outros homens para gerar um diálogo e fazê-los entender o que vivem as mulheres”, explicou. Envolverde/IPS