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Banheiros secos se multiplicam pelo campo cubano

O pastor Demas Rodríguez mostra uma latrina seca adubadora instalada na localidade de Babiney, na província de Granma, no leste de Cuba. Foto: Jorge Luis Baños/IPS
O pastor Demas Rodríguez mostra uma latrina seca adubadora instalada na localidade de Babiney, na província de Granma, no leste de Cuba. Foto: Jorge Luis Baños/IPS

 

Babiney, Cuba, 16/1/2015 – A maioria das pessoas em Cuba sem acesso a vaso sanitário usa a tradicional latrina, mas agora surge uma modalidade ecológica, que é novidade para o país neste tipo de serviço sanitário em comunidades rurais e pouco povoadas. Já existem no leste cubano 85 destes banheiros secos, como são chamados localmente, graças à promoção e ao apoio do ecumênico Centro Cristão de Serviço e Capacitação Bartolomé G. Lavastida (CCSC-Lavastida)

“Mais de 70% destes banheiros estão em San Agustín, povoado da província de Santiago de Cuba. O restante se distribui entre Boniato e o município de Santiago de Cuba, na mesma província, e em Caney, Babiney e Bayamo, na província de Granma”, disse César Parra, coordenador de Projetos Sociais do Centro, que realiza projetos nesta região e tem sua sede na cidade de Santiago de Cuba, a 847 quilômetros de Havana.

Também conhecidas como latrinas adubadoras secas, são um tipo de instalação sanitária que permite a coleta separada de urina e fezes para uso destas como adubo. Evitam a proliferação de vetores e a contaminação das fontes próximas de água, ao contrário da latrina clássica, que é abundante na área rural cubana.

“Replicamos no leste o trabalho pioneiro da Fundação Antonio Núñez Jiménez da Natureza e do Homem” (Fanj), contou Parra, veterinário de profissão, durante um intercâmbio sobre permacultura entre produtores da região, realizado em Babiney, na província de Granma.

Há cinco anos, a Fanj incluiu os banheiros secos no sistema de permacultura implantado no país. Esse método combina assentamentos amigáveis com a natureza e fazendas sustentáveis. A Fundação também propiciou a construção de outros 30 nas províncias de Sancti Spíritus, Camagüey, Matanzas, Cienfuegos e na periferia de Havana.

“No começo, as pessoas estavam céticas, mas viram as grandes vantagens destas latrinas, como a não contaminação dos poços próximos às suas casas. A qualidade da água melhorou, segundo estudos realizados nos lugares onde estão instaladas”, disse Parra. A aceitação é tanta que “o CCSC-Lavastida não tem capacidade de construção e recursos, nem pessoal para atender todos os pedidos de banheiro seco” mediante projetos que aportam os materiais e a mão de obra especializada.

Atualmente, a organização prioriza as famílias camponesas sem serviço de esgoto que vivem perto de rios e poços. E nas cidades beneficia as que mantêm hortas e pequenas áreas agrícolas. Em 2012, dos 11,2 milhões de habitantes de Cuba, 94,3% tinha acesso a tratamento de esgotos. Destes, 35,8% eram beneficiados com rede de esgoto e 58,5% usavam fossas sépticas e latrinas. Estas contaminam as fontes próximas de água com fezes e urina, o que piora se estão mal construídas ou carecem de limpeza adequada.

Segundo os últimos dados do Instituto Nacional de Recursos Hidráulicos, 79,9% da população rural, de 2,5 milhões de pessoas, conta com fossas e latrinas, enquanto 16,8% carecem de qualquer instalação sanitária.

Em nível mundial, 2,5 bilhões de pessoas carecem da vasos sanitários adequados e um bilhão são forçadas à insalubre prática de defecar ao ar livre ou na água, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU).

Em um território salpicado de elevações como Sierra Maestra, a maior cordilheira de Cuba, uma parte significativa da população do leste reside nas montanhas e em outras áreas rurais. E a seca açoita as províncias de Las Tunas, Granma, Holguín, Santiago de Cuba e Guantânamo, que formam a região com o menor índice de desenvolvimento nacional.

“Os banheiros secos não gastam água”, explicou Demas Rodríguez, pastor da Igreja Batista de Babiney. “São uma experiência nova para nós, por isso a igreja tem a responsabilidade de ensinar a comunidade a usá-los e explicar seus benefícios”, explicou o líder religioso, que está há uma década no lugar.

Os usuários das latrinas adubadoras devem jogar serragem, cinza ou cal na câmara para as fezes ao final de cada deposição, enquanto a urina é coletada em outro compartimento, para depois ser retirada ureia, que é utilizada para fertilizar. “A separação dos líquidos e sólidos não cria odores fortes”, afirmou Rodríguez, enquanto mostrava à IPS a primeira latrina adubadora de Babiney, na moradia da família Figueredo-Cruz.

“Está sendo terminado outro banheiro seco e mais quatro famílias daqui estão reunindo os materiais necessários”, disse Leonardo R. Espinoza, pedreiro deste povoado que constrói latrinas secas adubadoras e usinas de biogás para os beneficiários dos projetos do CCSC-Lavastida. “Em questão de material, fazer o banheiro seco sai caro porque exige pelo menos um metro cúbico de areia, 160 blocos ou 800 tijolos, seis sacos de cimento e 14 metros de aço”, explicou.

De acordo com os preços mais baixos dos materiais da construção em Cuba, são necessários pelo menos US$ 80 para a obra, quantia que aumenta se for colocada louça para melhorar a higiene.

Com blocos de concreto armado, Espinoza constrói para a coleta das deposições uma caixa de 60 centímetros de altura e sem drenar o terreno. “O tamanho total é calculado a partir da quantidade de usuários”, acrescentou. Sobre a câmara é colocada uma peça cilíndrica, com uma divisão interna para separar urina das fezes.

Cuba não produz estas latrinas. O CCSC-Lavastida as importou do México até que conseguiu um molde artesanal para fundir com concreto peças mais baratas e resistentes. Se a economia do usuário permite, pode-se usar lajotas de cerâmica.

“Em algumas casas com elevação da base sobre o solo, o banheiro seco pode ficar dentro de casa para melhor acesso das pessoas idosas ou deficientes, disse Espinoza. “Mas, em geral, são construídos fora da casa e exigem até quatro degraus para entrar em serviço”, acrescentou. Outros projetos completam o banheiro com uma ducha.

A agricultora Marislennys Hernández, de 32 anos, desconhecia os banheiros secos até que entrou para o movimento da permacultura. Ela tem em uso-fruto, junto com seu marido, Leonel Sánchez, a fazenda ecológica La Cristina, de 32 hectares, na localidade rural de El Castillito, em Santiago de Cuba.

“Para nós foi um bom beneficio porque não contamina, economiza muita água e nos garante um fertilizante natural”, opinou Hernández à IPS. “Há três anos, pudemos construí-lo (o banheiro ecológico) dentro de casa e completamente azulejado, paredes e chão. A ideia deve ter mais promoção entre os camponeses”, acrescentou. Envolverde/IPS