Por Thalif Deen, da IPS –
Nações Unidas, 27/10/2015 – Organizações da sociedade civil expressaram sua decepção pelo resultado da última rodada de negociações sobre mudança climática da Organização das Nações Unidas (ONU), na cidade alemã de Bonn, faltando cinco semanas para a reunião de cúpula definitiva em Paris.
Denise Fontanilla, do Movimento do Povo Asiático sobre a Dívida e o Desenvolvimento, disse à IPS que essas negociações sobre o clima, que terminaram no dia 23, foram as últimas antes da 21ª Conferência das Partes (COP 21) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática, que acontecerá em Paris, capital francesa, entre 30 de novembro e 11 de dezembro, para aprovar o tratado definitivo. “Qualquer coisa pode acontecer” a respeito, acrescentou.
Harjeet Singh, da organização ActionAid, disse que os acontecimentos em Bonn “demonstram que ainda resta uma montanha para escalar antes que surja um acordo no horizonte da cúpula de Paris. “Parece que a União Europeia (UE) se esqueceu de sua pretensão de estar junto com os pobres e vulneráveis do mundo”, afirmou.
A UE se mantém indecisa há meses sobre a forma com que o acordo da COP 21 ajudará os países pobres que já são afetados pela mudança climática. “O bloco vacila quanto a sair e ajudar as pessoas na tempestade”, pontuou Singh.
Chee Yoke Ling, diretora da Rede do Terceiro Mundo, afirmou que, se não se chegar a um acordo justo na COP 21, a temperatura média mundial subirá mais de dois graus centígrados e se perpetuará a injustiça contra os países em desenvolvimento e seus povos.
Segundo Ling, “a semana começou com um texto muito desequilibrado preparado pelos co-presidentes, que favorecia os Estados Unidos e seus aliados. Os esforços unidos dos países em desenvolvimento continuam sendo enfrentados, já que os principais países desenvolvidos persistem em solapar seus compromissos e a base de equidade da Convenção”.
Lidy Nacpil, coordenadora do Movimento do Povo Asiático sobre a Dívida e o Desenvolvimento, se referiu a um estudo da organização Oxfam sobre as promessas feitas pelos países com relação ao clima, e assegurou que os compromissos assumidos pelas nações ricas estão muito abaixo do que lhes corresponde, enquanto os do Sul em desenvolvimento superam ou cumprem o que lhes cabe.
“Todos os países têm que fazer o que lhes corresponde, mas o estudo mostra claramente que a responsabilidade de reduzir drasticamente suas emissões e proporcionar financiamento aos países em desenvolvimento recai sobre os países industrializados”, afirmou Nacpil.
Em seu informe, divulgado no dia 19 deste mês, a Oxfam diz que o fato de 150 países já terem apresentado publicamente seus compromissos de redução de emissões de dióxido de carbono demonstra que a COP 21 poderia se basear na cooperação internacional, em lugar da competição. “Mas ainda é preciso uma mudança de passo urgente de todos os países, porque o total combinado das promessas ainda representa uma aposta inaceitável que coloca em risco a segurança climática mundial”, ressaltou Nacpil.
A julgar pelas promessas, a Oxfam acredita que muitos países em desenvolvimento mostram uma liderança cooperativa, enquanto os ricos em geral precisam mostrar mais ambição. O informe considera que países como China, Indonésia, Quênia e Ilhas Marshall já prometeram ou superaram a proporção que lhes cabe na redução de emissões, segundo cálculos da Oxfam. O compromisso da Índia está em linha com o que lhe corresponde, enquanto o do Brasil é um pouco mais de dois terços.
“Alguns desses países fizeram promessas que poderiam transformar seriamente a forma do funcionamento de suas economias no futuro. Em consequência, isso poderia transformar as negociações da ONU”, afirmou Tim Gore, diretor de política climática da Oxfam. Essa organização, porém, considera que os países ricos devem aumentar consideravelmente suas ambições de mitigação.
Na COP 21, os governos deverão acordar um marco sólido que garanta que esses compromissos se fortalecerão antes de entrarem em vigor em 2020, e depois a cada cinco anos a partir de então, explicou Gore. “No momento, os países ricos continuam aferrados às reduções incrementais até chegar ao objetivo que, apesar de bem-vindas, simplesmente não alcançam a profundidade necessária”, ressaltou.
O Japão, por exemplo, contribui com um décimo do que lhe corresponde em redução de emissões de carbono, enquanto a Europa e os Estados Unidos entram com um quinto. Até agora, a Rússia não se comprometeu com nada, acrescentou Gore.
Singh apontou que “os países ricos sabem que não cumpriram suas obrigações de financiamento climático. Se negam a admitir ou fazem uma tentativa de boa fé para conseguir, em lugar de oferecer empréstimos e descontar a ajuda ao desenvolvimento como financiamento para o clima”. Em resumo, países do Norte industrializado falam grosso sobre uma solução de longo prazo, mas ainda sonham com o destino sem saber como farão a viagem, acrescentou.
“Os países ricos também seguem com seu truque igual ao do mágico Houdini e oferecem falsas soluções. A atual proposta de fixar um objetivo de longo prazo para reduzir o carbono significaria que os países desenvolvidos podem continuar com sua vida normalmente, enquanto os pobres são expulsos de suas terras a fim de absorver as emissões”, destacou Singh.
Um acordo climático que não esteja concebido para ajudar as comunidades pobres e vulneráveis servirá apenas para afiançar ainda mais a injustiça e a desigualdade, concluiu o representante da ActionAid. Envolverde/IPS