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O que The New York Times sabe sobre jornalismo digital e a imprensa brasileira ainda não descobriu

Por Darlene Menconi – 

O sonho de qualquer jornal impresso é transformar seu modelo de negócios em digital. O centenário jornal com sede em Nova York está chegando perto disso: 40% da receita já vêm da plataforma digital. Na semana passada, a empresa anunciou o resultado financeiro do ano de 2018.

The New York Times gerou US$ 709 milhões em receita digital no ano passado. Ou seja, está quase atingindo a ambiciosa meta estabelecida em 2015, de atingir US$ 800 milhões em seu negócio digital até 2020.

A nova meta, anunciada pelo principal executivo, Mark Thompson, é alcançar 10 milhões de assinaturas até 2025. Hoje os assinantes são 4,3 milhes, contando tanto a versão digital quanto a impressa.

E por que o CEO do jornal esbanja tanta confiança assim? O Times arrecadou US$ 1,748 bilhão em 2018. Dadas as tendências, não deve demorar muito até que se atinja os 50% de ponto de inflexão entre o digital e o papel.

Para entender o progresso que o Times fez nessa transição, Joshua Benton, do NiemanLab, fez um levantamento das receitas de publicidade e circulação digital desde 2013, quando o jornal passou a separar a operação digital da impressa.

A tendência é clara: a cada trimestre, o jornal depende menos das receitas da versão impressa. Isso fica evidente no gráfico.

http://www.niemanlab.org/images/nytimes-revenue-digital-transition-chart.png
A linha azul representa a receita da circulação digital
A linha verde representa a receita com publicidade digital
A linha amarela representa circulação e receita de anúncios digitais

Os dados do Times mostram que a estratégia está dando resultado.

Cerca de US$ 50 milhões do faturamento digital de US$ 709 milhões vieram de “outras fontes”. Nessa categoria estão o Wirecutter, um site de análise de produtos e recomendações que o jornal comprou em 2016.

Outro exemplo foram as assinaturas internacionais, especialmente em mercados como Austrália e Reino Unido, onde o Times está fazendo “esforços coordenados com jornalismo, opinião e novas táticas de marketing”, segundo Mark Thompson.

Para atrair a audiência jovem, a aposta é o podcast The Daily, com um formato simples, essencialmente uma grande reportagem, ou duas, para aumentar o engajamento do público na plataforma.

A receita de assinatura digital respondeu por dois terços do faturamento e a expectativa é que isso seja uma tendência, apontou o principal executivo do jornal, em um comunicado à imprensa na primeira semana de fevereiro.

O grande objetivo do jornal era um dia ganhar dinheiro suficiente com a versão digital para cobrir o custo da redação. Neste momento, The Times poderia pagar pela redação duas vezes apenas com o faturamento online. A redação continua crescendo e emprega 1.600 jornalistas, um recorde histórico.

Enquanto isso, a empresa informa ter US$ 826 milhões em dinheiro em mãos. Mesmo contabilizando o custo esperado de recomprar seu prédio no final deste ano. Aliás, o aluguel de alguns andares do suntuoso prédio em Nova York foi uma das formas do jornal fechar as contas.

Sonho que se sonha junto é realidade

O relatório que prospectou o cenário do The New York Times para 2020, como uma compilação de princípios, prioridades e metas da redação, foi feito para ser um guia para entender a direção na qual o diário se move. Suas conclusões são interessantes principalmente porque os sete autores do texto “Journalism That Stands Apart” (Jornalismo Que Se Destaca), o chamado Grupo 2020, são jornalistas do time atual do jornal.

Eles afirmam que para crescer e se manter competitivo na economia digital, o gigante da imprensa mundial precisa mudar. Muito. E rápido. O relatório foi lançado em janeiro de 2017, fazia uma análise do que o jornal queria ser no futuro, olhava suas sombras e apontava soluções e caminhos a seguir.

A conclusão é de que as pessoas pagam por notícia – especialmente quando se trata do The New York Times. Mas não se iludam: muitos dos assinantes pagam exclusivamente pelos aplicativos de gastronomia e palavras cruzadas.

Desde 2011, a receita de assinatura digital do The Times aumentou 656% e a receita de publicidade digital aumentou 168%, enquanto a versão impressa continuou diminuindo.

Ao longo do tempo, Facebook e Google corroeram o mercado de notícias. Com isso, está sob ameaça até mesmo o império de 166 anos da família Ochs-Sulzberger, que embora detenha apenas 11% das ações, sempre elege dois terços do conselho de administração. Por isso The New York Times assumiu a mudança como seu plano estratégico e sua filosofia.

Descubra, planeje, execute e meça

Em tempos de transformação digital, conhecer a fundo seus recursos para planejar e sonhar são etapas fundamentais para o sucesso. Um dos fundamentos dos novos tempos vem do mundo do software, é o pensamento ágil, que vem do Manifesto Ágil. Uma de suas diretrizes: é mais importante responder às mudanças do que seguir um plano.

Não podemos esquecer de que vivemos em um mundo volátil, incerto, complexo e ambíguo, traduzido pelo acrônimo Vica. Um bom planejamento é vivo, mutante e flexível. Boa parte das vezes, ele precisa ser transformado e até engavetado para responder às mudanças da ordem do dia.

Para quem se assusta com a avalanche que a transformação digital traz, aviso: as tecnologias disruptivas não têm fim. Haverá mais e mais. E quer saber? Ninguém sabe como lidar com elas.

É por isso que Peter Bishop, coordenador do mestrado sobre futurismo da Universidade de Houston, tem a máxima de que estudar o futuro é tão importante quanto estudar história.

Falar do futuro permite pensar crítica e criativamente as mudanças, preparando-se para o que virá, com ferramentas e conceitos que permitem lidar com o mundo disruptivo. Que é incerto, mutante, complexo e ambíguo.

As empresas mais valiosas de hoje são aquelas que conseguem criar e gerenciar plataformas – modelos de negócios digitalizados, abertos e participativos que criam ecossistemas comercialmente conectados de produtores e consumidores.

É por meio dessas redes e mercados que empresas como Google, Airbnb, Uber e dezenas de outras estão mudando e abalando a estrutura de negócios e indústrias tradicionais.

A capacidade de alavancar mercados digitais não está mais restrita a startups e empresas iniciantes da internet.

Se sua empresa puder usar informações ou comunidades para agregar valor ao que vende, haverá potencial para criar uma plataforma viável para seus negócios. Ou mesmo uma revolução em sua indústria.

Aqueles que entendem o novo modelo de negócios podem construir a plataforma de amanhã usando os recursos que têm disponíveis hoje.

O futuro do The New York Times, e de todas as editoras de notícias, empresas, assim como o seu e o meu é um só: ele é digital. E o segredo está em se assumir uma metamorfose ambulante.

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