Diversos

Entre aflitos e apocalípticos, é preciso afirmar o valor da vida, do belo e da esperança

por Samyra Crespo – 

Tema nada simples e difícil de ser resumido. Mas vou me arriscar tal é a minha preocupação ao ver o que foi destaque nas redes sociais e no noticiário, na Semana do Meio Ambiente deste ano.

“Nada a celebrar” foi a tônica. Também abundaram notícias apocalípticas tipo “a vida acaba em 2030”, Planeta entra em rota de não retorno – nossa espécie vai para o beleléu.

Lições da História mostram que milenarismo e Armagedom levam ao desespero, fanatismo e morte. Assim foi no período medieval quando curas e igrejas ameaçavam os indivíduos com as imagens do inferno e das mais apavorantes punições: a perda da alma.

Nem por isso, digamos assim, houve a reforma da sociedade. Se houve, foi pelo anticlericalismo e pelo exercício da dúvida do iluminismo. A inovação não ocorre entre aflitos, mas entre buscadores corajosos, inspirados.

Tudo o que sei sobre a psicologia transpessoal e pela chamada “psicologia positiva” é que as ditas ‘mensagens bruxas’ – aquelas do tipo você não presta, não tem jeito, é ganancioso e mau – quando introjetadas na psicologia individual ou coletiva têm o estranho poder de ocorrer como autoprofecia, ou seja – se cumprem.

Preocupa -me a ênfase que nós ambientalistas estamos dando aos fatos e às tendências: sempre apavorando as pessoas e apontando a vilania humana.

Indo direto ao ponto: a vida humana está em perigo?

Sim, está – como esteve quando uma guerra nuclear era bastante possível (nas décadas que se seguiram ao Pos-Guerra). Ainda assim não recobriria o Planeta inteiro.

O aquecimento global, disseram -me três respeitados cientistas em recente conversa, trará sem dúvida sofrimento: perdas econômicas incalculáveis, muitas vidas sacrificadas e talvez a mudança drástica da paisagem e de tudo o que ela contém. Ainda assim a vida persistirá. Não será igual para todos. Alguns lugares até poderão viver ciclos de melhoria. O clima faz migrar certas condições e “O mar pode virar ser tão, e o sertão virar mar” ( música popular brasileira).

Digo isto não para minimizar problemas, mas aliviar angústias e a depressão que vejo se espalhar rapidamente nas gerações atuais.

O medo, quando excessivo, paralisa- e se move tem fôlego curto.

O que fizemos com a esperança? Porque não promover o amor em vez da dor?

São duas pedagogias diferentes, com diferentes resultados.

Não se trata de negar evidências científicas ou vender ilusões. Mas encontrar espaços de potência, do exercício da empatia e do amor. Mostrar sua beleza e eficácia.

Temos feito muito. Celebrar o crescimento da alimentação orgânica (somos o que comemos, biologicamente falando), as árvores plantadas simbólicas ou em massa, as passeatas dos jovens tipo Friday for Future), os jardins de chuva e as flores para atrair abelhas feitas no duro cavar do asfalto. Celebrar o avanço das tecnologias sustentáveis e das descobertas que apontam para um mundo nem ainda imaginado em todo o seu universo de possibilidades.

Buscar nos mestres – Boff, Marcelo Gleiser, Dalai Lama, Papa Francisco – esperança a bela estrela-guia que há de nos inspirar.

Muita cortisona e adrenalina no organismo matam.

Certos animais quando acuados se deprimem, outros se tornam extremamente agressivos, é há os que transam sem parar a fim de perpetuar seus genes.

Se tudo está perdido, se tudo vai se acabar numa quarta feira de 2030, vamos beber até morrer, buscar o prazer sem freios, irresponsável. Entenderam o verdadeiro perigo?

Amigos, este espaço não é suficiente para todas as implicações filosóficas aqui delineadas serem devidamente exploradas.

Fica o alerta: sejamos os arautos da esperança que vivifica e não os coveiros de um mundo que agoniza.

Hoje me emocionei com os passarinhos que cantaram à minha janela, e nem tinha amanhecido.

Fiquei agradecida quando o sol outonal entrou na forma de um raio cálido pela minha cozinha.

E minha alma entrou em êxtase quando ouvi Vivaldi na rádio MEC.

Tudo muito simples. Real. Ao alcance da nossa emoção.

O lado luminoso da Força.

Este texto faz parte da série sobre o ambientalismo brasileiro que venho publicando, desde abril, no site Envolverde/Carta Capital

Samyra Crespo é cientista social, ambientalista e pesquisadora sênior do Museu de Astronomia e Ciências Afins e coordenou durante 20 anos o estudo “O que os Brasileiros pensam do Meio Ambiente”.