por Samyra Crespo, especial para Agência Envolverde –
Um tour pelo corredor cultural da Avenida Paulista me levou, semana passada, a três exposições fotográficas que me trouxeram elementos provocativos à seguinte pergunta: a arte engajada social e politicamente determina trajetórias pessoais igualmente transformadoras? Há coerência entre o olhar e as opções políticas de quem fotografa e denuncia a dura realidade?
Vou tentar explorar as possíveis respostas a estas indagações analisando as três exposições fotográficas que visitei, respectivamente de um chileno, uma italiana e um brasileiro.
A primeira mostra, de Sergio Larrain, vi no IMS (Instituto Moreira Salles). Nascido nos anos 30 teve uma vida ativa e fascinante nos anos 50/60. Colaborou com o poeta Pablo Neruda e foi fotografo de O Cruzeiro internacional.
Fotografava o desamparo de crianças e jovens em Santiago, a pobreza e o provincianismo das cidades latinoamericanas, e fatos sensacionais da vida do Continente para os jornais que trabalhava. Com a maturidade foi adotando um comportamento cada vez mais retirado do mundo e terminou sua vida num centro de yoga, com uma rotina ascética, voltada ao autodesenvolvimento.
A segunda exposição, também no IMS é da fotografa italiana Letzia Battaglia.
Com poucos anos de profissão, nos anos 70 é enviada à Palermo pelo periódico L’Oro. Passa a cobrir as diatribes cotidianas da guerra de mafiosos na cidade: registra cenas de violência e de sofrimento de uma população acuada pela Cosa Nostra. Também é em Palermo que nos anos seguinte se desenrolaria a saga da Operação Mãos Limpas.
Letzia sai do jornalismo e vai para a política. Torna-se militante do Partido Verde e deputada regional.
A terceira exposição está no centro cultural SESC. É do fotografo Sebastião Salgado. Trata do garimpo na Amazônia, na Serra Pelada. É um ensaio de 1985 – mas atual como nunca. Ali vemos todo o delírio dos homens que correm atrás de um pote de ouro. As cenas são impressionantes. E podem se repetir com a fala irresponsável das autoridades atuais, que estão incentivando uma nova corrida à mineração.
Violência e destruição ambiental à vista e a prazo.
Sebastião Salgado tem uma longa trajetória na fotografia de denúncia.
Mais recentemente reflorestou uma antiga propriedade da família e criou uma fundação.
Tornou-se um ativista ambiental.
Vemos assim, em três fotogramas e alguns negativos, que a militância pessoal é um possível e natural caminho para quem, com sua arte e ferramentas, no caso câmeras, vê um mundo que é preciso transformar.
Não é interessante que dos três, dois tenham se inclinado à defesa do meio ambiente?
Samyra Crespo é cientista social, ambientalista e pesquisadora sênior do Museu de Astronomia e Ciências Afins e coordenou durante 20 anos o estudo “O que os Brasileiros pensam do Meio Ambiente”.
(#Envolverde)
(Este texto faz parte da série que escrevo, desde março para o site CartaCapital/Envolverde, sobre o ambientalismo brasileiro).