por Gero Rueter, Deutsche Welle –
Visto com vilão, por emitir grande parte dos gases que causam o aquecimento global, cultivo de terras tem potencial para proteger o clima. Mas, para isso, mudanças em métodos e comportamento alimentar são necessárias.
O solo é particularmente importante para a proteção do clima, ao absorver uma grande quantidade carbono. Se esse carbono escapar, ele se liga ao oxigênio e forma CO2 – o gás do efeito estufa. Neste processo, a camada de húmus no solo desempenha um papel fundamental armazenando quatro vezes mais carbono do que o presente na atmosfera sob a forma de CO2.
Rico em nutrientes, o húmus consiste em partes de plantas mortas que foram decompostas por inúmeros organismos, como bactérias, fungos e minhocas. Ele mantém a fertilidade do solo, é um nutriente importante para o crescimento de novas plantas, além de ser fundamental para a proteção do clima, graças ao carbono armazenado.
Sua proporção nos solos varia bastante. Na média global, há mais húmus nas pastagens naturais do que nas terras aráveis, e é especialmente abundante em zonas úmidas e pântanos.
Como resultado de uma prática agrícola com muitas monoculturas, há anos que o solo vem perdendo cada vez mais húmus – o que significa um aumento cada vez maior CO2 na atmosfera. A razão é simples: em vez de preservar o húmus através da rotação de culturas e do cultivo de diferentes plantas, as monoculturas desgastam o solo. Embora os fertilizantes químicos garantam as colheitas e economizem mão-de-obra, o teor húmico do solo é cada vez menor.
Por meio da rotação das culturas e da incorporação de resíduos vegetais, os agricultores podem preservar e aumentar a quantidade de húmus, e, dessa forma, também a fertilidade natural do solo. Tais técnicas eram usadas antes do surgimento do agronegócio, quando não havia alternativas. Para garantir as colheitas, os agricultores dependiam de um solo fértil, e, portanto, da preservação de húmus.
Outro fator na perda mundial de húmus é o aumento global de terras aráveis. Cada vez mais elas são necessárias para o cultivo de ração animal destinada à crescente produção de carne. Para isso, zonas úmidas e pântanos, ricas em húmus, estão sendo drenadas; pastagens estão sendo convertidas em terras aráveis, e mais e mais florestas estão sendo queimadas. Isso faz com que o carbono, até então retido nas árvores, seja perdido e escape na forma de CO2. E assim a quantidade de húmus no solo segue diminuindo ano após ano devido aos métodos de cultivo.
Gases de efeito estufa decorrentes da indústria de alimentos
A perda de húmus e, portanto, de solo fértil, também é uma grande ameaça à alimentação mundial, avalia a Organização das Nações Unidas (ONU). De acordo com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), a perda de húmus e florestas libera cerca de 5,8 bilhões de toneladas de CO2 na atmosfera a cada ano – ou seja, cerca de 11% das emissões globais de gases de efeito estufa.
Outros gases de efeito estufa surgem na agricultura por meio da pecuária, fertilização, produção intensiva de fertilizantes artificiais, pesticidas, processamento de alimentos, produção de embalagens e transporte.
No total, cerca de 31% do total das emissões globais de CO2 são geradas na produção de alimentos.
Para frear o aquecimento global, a agricultura precisa se tornar climaticamente neutra. Ela tem ainda o poder de reter o CO2 adicional da atmosfera por meio do cultivo de plantas. Um relatório especial do IPCC sobre uso da terra e segurança alimentar recomenda a redução de pastagens e terras aráveis em todo o mundo. Além disso, as florestas devem ser reflorestadas e o teor de húmus nos solos deve ser aumentando.
De acordo com especialistas, o reflorestamento é capaz de reter 3,6 bilhões de toneladas de CO2 por ano durante a fase de crescimento. Um aumento global de húmus, por sua vez, poderia reter outros de 2 a 5 bilhões de toneladas de CO2 por ano, segundo um recente estudo da Fundação de Ciência e Política (SWP).
Uma outra maneira de aumentar a absorção de CO2 é o uso do chamado biochar: materiais orgânicos, como madeira e resíduos de plantas, são carbonizados com a ajuda de calor, pressão e expulsão de oxigênio e, em seguida, introduzidos no solo. Dessa forma, o carbono aglutinado pode permanecer no solo por séculos e, em combinação com húmus e bactérias, aumentar significativamente a fertilidade do solo.
De acordo com o estudo do SWP, a aplicação global desta tecnologia poderia armazenar entre 0,5 e 2 bilhões de toneladas de CO2 adicional por ano.
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Agricultura orgânica: um modelo sustentável
A agricultura industrial tem sido cada vez mais alvo de críticas. E isso não apenas por causa do equilíbrio de CO2, mas também por ser apontada como a principal causa da extinção global de espécies.
Iniciativas para melhorar as técnicas de cultivo existem em diversos setores, entre elas em uma estratégia da União Europeia batizada de “Farm to Fork”. “A estratégia de biodiversidade e a estratégia ‘da fazenda para a mesa’ constituem o cerne do ‘Acordo Verde’ e representam uma nova interação mais harmoniosa entre natureza, produção de alimentos e diversidade biológica. Trata-se, afinal, da saúde e do bem-estar das pessoas” explica o Comissário da UE para a Proteção do Clima, Frans Timmermans.
Com o objetivo de proteger o clima, o Ministério do Meio Ambiente da Alemanha também pretende reduzir as importações de rações como a soja. “A regionalidade dos bens agrícolas produzidos deve voltar a receber um nível de importância muito maior, a fim de contribuir para uma redução correspondente no desmatamento das florestas tropicais para o cultivo da soja”, disse uma porta-voz do ministério à DW.
Ao garantir o acúmulo de húmus sem utilizar fertilizantes sintéticos, pesticidas e ração importada do exterior, a agricultura orgânica reduz significativamente as emissões de gases de efeito estufa, tornando-se um modelo de proteção do clima e das espécies.
Outra chave para reduzir as emissões é diminuir o desperdício de alimentos. Estima-se que “um terço de todos os alimentos produzidos no mundo acaba no lixo”, afirma Rosa Rolle, gerente de projetos do programa Perda e Desperdício de Alimentos, da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO).
No total, são produzidos cerca de 1,3 bilhão de toneladas de alimentos que não são consumidos. De acordo com estimativas da FAO, isso representa cerca de 3,6 bilhões de toneladas de CO2 a cada ano.
Redução do consumo de carne e leite
Nos últimos 50 anos, a produção mundial de carne praticamente quadruplicou – e consequentemente aumentou rapidamente a demanda por terras aráveis para o cultivo de culturas voltadas para a produção de forragens, como soja, milho e trigo.
Segundo a Agência Alemã do Meio Ambiente (UBA), cerca de 71% das terras aráveis do mundo são atualmente usadas para pasto, enquanto apenas 18% são destinadas ao cultivo de alimentos. A fim de garantir a alimentação de uma população mundial crescente no futuro e, ao mesmo tempo, ter espaço suficiente para reflorestamento, os especialistas sugerem uma nova abordagem.
“Podemos consumir mais vegetais saudáveis e menos carne”, diz Johan Rockström, diretor do Instituto Potsdam para Pesquisa sobre o Impacto Climático (PIK) e copresidente da Comissão EAT-Lancet.
Em um relatório para uma vida e planeta saudáveis, a comissão recomenda um consumo médio de carne por pessoa em torno de 300 gramas por semana (16 kg/ano) e um consumo de laticínios de 630 gramas por semana (33 kg/ano). No momento, consome-se até sete vezes mais carne na América do Norte e do Sul, Europa e China. No caso de laticínios, principalmente na Europa e nos EUA, o consumo é quase oito vezes superior ao recomendado.
“Curiosamente, apenas mudar para uma dieta ‘flexitariana’, mais baseada em vegetais, pode reduzir as emissões de gases de efeito estufa da produção agrícola aproximadamente pela metade”, disse Rockström. A mudança na dieta “pode ajudar a manter todos saudáveis: o planeta e as pessoas”.
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