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A música se faz ouvir no Irã

A Sala da Música no histórico palácio de Ali Qapu. Foto: Leonidas Ntilsizian/IPS

Teerã, Irã, 31/8/2011 – O garçom em um café da capital do Irã se movimenta rapidamente para dar uma olhada do lado de fora. Dentro, um jovem músico começa a tocar o saxofone. Tem cinco minutos, pois não pode se arriscar a ser pego em uma blitz. Quando começa a tocar, os garçons servem suposto suco de laranja fresco em garrafas de cerveja. Há música ocidental e álcool em Teerã. “Você deve saber que na República Islâmica do Irã tudo é possível”, diz Ali (nome fictício), correspondente de um jornal iraniano de língua inglesa.

A música sempre esteve presente na cultura deste país, como recorda aos visitantes o sexto andar do palácio de Ali Qapu, em Esfahan, ao sul de Teerã. Ali, imagens de instrumentos musicais estão talhadas nas paredes do prédio, construído pelo xá Abbas da Pérsia no começo do Século 16. Silêncio na terra da música, suco de laranja em garrafa de cerveja, todos sinais de uma sociedade complexa repleta de opostos. “Analistas e a mídia falam do Irã como se soubessem tudo sobre nós, mas, em geral, perdem o centro da questão”, disse um ancião enquanto bebia uma xícara de chá.

Os rigorosos islâmicos querem proibir a música, mas esta sempre está por ali. Música tradicional toca o táxi de Ahmad, de 23 anos, enquanto viaja por montanhas e desertos. Teerã é irreconhecível à noite. Acontecem festas em estilo tipicamente ocidental, com álcool em abundância e música para dançar. Chegam muitas mulheres, quase nenhuma usando o véu islâmico. Porém, correm riscos. “Na noite passada, muitas pessoas foram detidas em uma festa particular em uma casa próxima”, disse Hanna, de 30 anos. Apesar disto, os bailes continuam.

Amir, um jovem de 25 anos que atua como DJ em festas, sempre está em perigo. Quer sair do Irã o quanto antes. Já foi detido por tocar música ocidental. A polícia prendeu algumas pessoas famosas na festa, mas informa que deteve “certos manifestantes”, contou Hanna. E ela aponta outra contradição: em uma garrafa de Pepsi onde a data de vencimento indica “87/11/10”, utilizando o ano 1387 do calendário persa. Trata-se de uma bebida fabricada por uma companhia que constitui um popular símbolo dos Estados Unidos, rival do governo islâmico, mas é engarrafada na “segunda cidade mais sagrada do Irã”, destacou Hanna.

Entretanto, ela vê mais contradições. A embaixada norte-americana permanece fechada desde 1979. As comunicações com Washington são feitas por intermédio da embaixada da Suíça em Teerã. “É um jogo jogado pelos Estados Unidos e pelo Irã nos bastidores”, afirmou. Farsad, de 24 anos, da cidade de Shiraz, ao norte de Teerã, é gay e toca violão. “Não temos homossexuais no Irã”, teria declarado o presidente Mahmoud Ahmadinejad. Este jovem, que deseja conhecer como é a vida da comunidade gay na Europa, sabe que sua opção sexual o coloca em maior perigo do que a música.

A “fornicação” e as relações entre pessoas do mesmo sexo são consideradas crimes no Irã e recebem castigos semelhantes aos aplicados em casos de homicídio. A polícia garante encontrar drogas nas festas noturnas clandestinas de Teerã. A maioria das execuções realizadas no país, segundo se informa, são por crimes relacionados com narcóticos. Porém, há casos em que são executados ativistas políticos.

O Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos declarou, no começo deste ano, que o Irã, em lugar de atender aos chamados desta agência, “parece que incrementou o uso da pena de morte”. Muitos turistas passam pela porta de Quran, em Shiraz, cidade onde está o túmulo de Hafez, mestre da poesia lírica persa, no qual idosas se oferecem para prever o futuro das pessoas. No entanto, sobre o Irã, 32 anos depois da Revolução Islâmica, não é possível fazer previsões seguras. Envolverde/IPS