Harare, Zimbábue, 11/1/2012 – Alec Marembo construiu sua fortuna fabricando tijolos em Dzivarasekwa, um denso subúrbio da capital do Zimbábue. Mas seu negócio começou a claudicar devido à crise econômica da última década. Embora inicialmente se mantivesse, finalmente foi vencido pela competição chinesa. “Não posso entender como nosso governo permite que os chineses cheguem e ocupem pequenos empregos que consideramos empresas familiares, e que os deem aos investidores”, disse Marembo à IPS, enquanto olhava à distância uma nova fábrica chinesa de tijolos.
O presidente Robert Mugabe introduziu a política de “olhar para o Leste” em 2004, depois que altos funcionários de seu governo e companhias estatais receberam sanções de Estados Unidos, Grã-Bretanha e outros países ocidentais por supostos abusos contra os direitos humanos. Isto estimulou a China e outras nações asiáticas a investirem no Zimbábue, sem estabelecer as condições que impunham os antigos sócios do Ocidente.
Os tempos foram duros para muitos zimbabuenses devido ao fechamento de várias indústrias em razão da crise econômica. Por isso, quando os investidores chineses começaram a chegar foram recebidos de braços abertos. No entanto, agora as relações comerciais começam a gerar tensões.
“Os chineses, como outros investidores, são recebidos, mas têm de vir e construir indústrias que ofereçam empregos às pessoas”, disse à IPS o comerciante Thulani Mkwebo, dono de um pequeno negócio no centro de Harare. “Se pudesse escolher, os retiraria daqui”, afirmou. O ressentimento contra os chineses pode ser sentido em muitas partes do país.
Nos últimos dias, houve greves espontâneas em várias empresas chinesas. No mês passado, cerca de 600 operários zimbabuenses empregados pela mineradora chinesa Anhui Foreign Economic Construction Company (Afecc) cruzaram os braços. Denunciavam desde abusos físicos até horários irregulares de trabalho e baixos salários, de US$ 4 diários, muito menos do que o salário mínimo exigido pelo Conselho Nacional de Emprego do Zimbábue para a indústria da construção, de US$ 1 a US$ 1,50 por hora.
Esta empresa constrói um colégio militar, de US$ 98 milhões, nos arredores de Harare, financiado com um crédito chinês que será pago com diamantes. A Afecc explora diamantes no leste do Zimbábue em sociedade com os militares deste país, segundo informou o Ministério de Minas.
Os chineses têm muitos interesses no Zimbábue, especialmente nos setores varejistas, manufatureiro, mineiro, agrícola e da construção. Segundo um informe de 2011, da Unidade de Pesquisa e Análise de Políticas Econômicas do Zimbábue, as exportações deste país para a China cresceram de US$ 100 milhões em 2000 para US$ 167 milhões em 2003, mas caíram para US$ 140 milhões em 2009.
Enquanto isso, as vendas chinesas para o Zimbábue passaram de US$ 30 milhões em 2000 para US$ 197 milhões em 2007. As vendas do Zimbábue para a China são fundamentalmente matérias-primas, sobretudo tabaco e minerais, enquanto Pequim fornece créditos e vários produtos acabados, a maioria dos quais é chamada pela população de “ZhingZhongs” (de má qualidade). No entanto, isto não desanima os investidores chineses, que continuam chegando a este país e abrindo pequenas empresas, obrigando os comerciantes locais a abandonar seus negócios por falta de competitividade.
Mara Hativagone, ex-presidente da Câmara Nacional de Comércio e atual presidente da Autoridade de Investimentos, disse que os chineses não deveriam competir em indústrias tradicionalmente reservadas aos empresários locais. “Queremos ver mais transferência de tecnologia por parte dos estrangeiros. Não devem vir aqui e fazer todo tipo de coisas, aproveitando-se das relações existentes entre os dois países”, afirmou.
“Não há forma de os zimbabuenses poderem competir com os chineses, pois estes podem usar mão de obra barata e produzir maciçamente, enquanto em nossas indústrias na metade das vezes não temos nem água nem eletricidade para produzir”, acrescentou Hativagone. Ela também acusou os chineses de enganarem. “Às vezes, a Autoridade de Investimentos do Zimbábue lhes dá licenças para fabricar, mas eles acabam abrindo restaurantes sob essas grandes marcas chinesas como Wing Wah International Hotel e Shangri-la”, afirmou.
Chris Mutsvangwa, embaixador do Zimbábue em Pequim entre 2002 e 2007 e agora diretor da firma de consultoria Moncris, que ajuda os investidores chineses a se instalarem neste país, se mostra mais cauteloso. Disse não esperar uma inundação de investimentos chineses sobre os tradicionais empregos zimbabuenses.
“A indústria de qualquer lugar no mundo deve estar reservada para os habitantes locais. Não espero que os zimbabuenses partam para a China a fim de competir com os pequenos negócios, e não espero que os chineses façam o mesmo”, argumentou Mutsvangwa. “Devem chegar para explorar outras áreas onde temos escassez, porém, não devemos descartá-los completamente, mas olhar as outras coisas que fazem por nós. Eles competiram com os norte-americanos”, acrescentou.
Depois que o governo lançou sua reforma agrária em 2000, capitais norte-americanos abandonaram em massa o Zimbábue, voltando-se para a África do Sul e privando os zimbabuenses de milhões em potenciais divisas. Pequim sabe do mal-estar gerado no Zimbábue, mas destacou a importância de manter sãs as relações bilaterais. “A China entende a necessidade da indigenização (do trabalho), mas esperamos que o Zimbábue proteja os legítimos direitos dos negócios chineses no país”, afirmou o vice-primeiro-ministro chinês, Wang Qishan, no ano passado em Harare.
Entretanto, há quem receba com gosto os investidores chineses. “Eles são bem-vindos, os amamos, nos trazem artigos baratos. Qualquer um que diga que não os quer, primeiro deve gerar empregos para nós’, afirmou Zvikomborero Moyo, funcionária de uma loja de roupa. “Graças à ajuda chinesa, podemos começar negócios. Compramos deles artigos muito baratos e os revendemos nos subúrbios, e assim podemos viver”, acrescentou. Envolverde/IPS