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Progresso social segue lentamente

Buenos Aires, Argentina, 28/2/2012 – Quase todas as análises na Argentina coincidem em afirmar que a pobreza, a indigência e a desigualdade estão diminuindo, mas a velocidade deste avanço social difere quando os números são apresentados pelo Estado ou por órgãos privados. O último informe do estatal Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (Undec), divulgado em 2011, mostra que a pobreza caiu até afetar 8,3% dos 40 milhões de argentinos, e a indigência estava em 2,4%. Estes dados mostram uma queda espetacular desde os respectivos 54% e 27,7% registrados em 2003, quando este país sofria as piores consequências do colapso econômico e político do final de 2001.

O Indec, cujos informes são colocados em xeque por privados e especialistas desde 2007, quando sofreu intervenção do Poder Executivo, também mostra que a brecha de desigualdade na renda caiu no último trimestre de 2011 em relação a medições anteriores. Assim, assegura que os 10% mais ricos concentravam 22,9% da renda e que os 10% mais pobres ficavam com 2,9%. Isto revela uma distribuição melhor entre os dois extremos em relação aos trimestres anteriores. Contudo, especialistas ouvidos pela IPS relativizam estes números.

Para o sociólogo Artemio López, da consultoria Equis, e para seu colega Ernesto Kritz, da Sel Consultores, houve avanços, mas não na magnitude mostrada pelo Indec. López afirmou que suas medições indicam que a pobreza afetava 17,6% dos argentinos em junho de 2011, com queda de 4,3 pontos percentuais em relação ao mesmo mês de 2010, enquanto a indigência passou, no mesmo período, de 5,4% para 4,3%. Os indicadores não melhoraram tanto como afirma este órgão oficial, mas melhoraram, e muito, ressaltou López. “A queda da pobreza por renda é tão significativa que constitui o registro mais baixo desde a recuperação da democracia” (1983), ressaltou este sociólogo que dirige a consultoria especializada em medições sociais.

Como exemplo do que assinala, mostra um trabalho publicado este mês pela Equis, que compara dados socioeconômicos de 1985 com os de 2011 para a região metropolitana de Buenos Aires. A pobreza diminuiu de 18% para 12% nessa área nestes 16 anos. Enquanto os setores médios em risco caíram de 35% para 27%, e os médios plenos, médios altos e altos aumentaram de 45% para 57%. As causas do progresso devem ser buscadas, segundo López, na maior geração de emprego, na melhoria salarial, inclusive dos que têm renda no setor informal, e no plano de transferência de renda que começou em 2009. Este programa chamado Destinação Universal por Filho, que atualmente concede 270 pesos mensais (US$ 62) para cada menor de 18 anos que vá à escola, filhos de pais desempregados ou com emprego precário e mulheres grávidas. Este plano, que no final de 2011 beneficiava mais de 3,5 milhões de pessoas, “é o mais importante da América Latina pela quantidade de dinheiro que entrega aos pobres”, destacou López.

Kritz apresentou mais dúvidas a respeito dos dados do Indec sobre pobreza e redução da desigualdade. Disse que entre a classe média baixa há melhores condições socioeconômicas que, no entanto, não aparecem nos 25% da população mais pobre. “Vejo poucas mudanças para esse quarto inferior da pirâmide populacional quanto a indicadores de emprego, acesso a saúde e condições de vida em geral”, destacou. No número de dezembro da revista da Sel, sobre a situação trabalhista e social da Argentina, são indicados os desafios sociais que, segundo esta organização, tem pela frente em seu segundo mandato a presidente Cristina Fernández, iniciado no dia 10 deste mês.

Nessa publicação Kritz destacou que a presidente terminou seu primeiro governo com “um balanço social dual”. Explicou que cerca de 25% da população argentina “emergiu da pobreza e se incorporou à classe média” desde que ficou para trás a crise de 2003, e também que, por outro lado, aproximadamente 20% da população “permanece em estado de privação”, apesar do crescimento sustentado da economia nos últimos oito anos e ao bom desempenho do mercado de trabalho. Kritz destaca que desde 2003 foram criados 3,4 milhões de empregos, 3,1 milhões deles na economia formal, e que o efeito deste fenômeno é positivo. “Dificilmente esta nova estrutura social cairá abaixo da anterior” a 2003, afirmou.

De todo modo, o especialista alerta que as mudanças necessárias para remover a pobreza e a indigência estão se mostrando mais lentos desde 2007, e apresentou uma dúvida sobre o impacto que poderia ter no desenvolvimento a crise que o mundo rico sofre. Em seu informe, diz que, apesar da geração de emprego e da redução do número de desempregados, cerca de um terço da força de trabalho na Argentina ainda está na informalidade, que hoje é “a principal causa da exclusão social”. Esta informalidade – prossegue – é a porta de entrada para o mercado de trabalho da maioria das mulheres, dos jovens e dos menos instruídos. Insistiu que, enquanto no setor privado há dois homens ocupados para cada mulher, no informal a relação é quase um a um. Kritz reconhece os esforços realizados para reduzir a informalidade e aumentar o orçamento educacional, mas alerta que, no entanto, a quantidade de jovens entre 15 e 24 anos que não estudam nem trabalham passaram de 8% para 10% do total entre 2003 e 2011. Desta forma, destacou a magnitude dos desafios pendentes. Envolverde/IPS